É difícil imaginar que uma simples gota de água do mar possa esconder tantos mistérios, criaturas tão distintas e inusitadas. Formas, cores, texturas, transparências e brilhos foram revelados na série de fotos “Vida marinha ampliada”, do fotógrafo David Liittschwager, ganhador do prêmio World Press Photo 2008, na categoria natureza. Os vencedores foram anunciados em fevereiro e os prêmios serão entregues no final de abril, em Amsterdam.
Dentre as fotos premiadas, figuram uma água-viva conhecida como “botão azul”, um polvo filhote, filamentos espiralados de cianobactérias, algas retangulares chamadas diatomáceas, ovas de peixes, assim como larvas de camarão e caranguejo (do tamanho de um grão de arroz). Um molusco saindo de sua frágil concha, com pés modificados que parecem “asas”, também foi flagrado pelas lentes do fotógrafo. As fotos referem-se a amostras do plâncton marinho – organismos que vivem na água, têm pouca capacidade de locomoção e vivem à mercê das correntes oceânicas.
“Fui feliz em ter tido a chance de achar e de fotografar uma larva de peixe-espada e um ovo incubando. Eu não tinha uma lista de determinados peixes que eu gostaria de fotografar porque você nunca sabe o que vai encontrar”, diz Liittschwager, ao comentar o que mais o impressionou, em suas anotações de campo.
As amostras, coletadas no Havaí juntamente com cientistas do navio de pesquisa NOAA (National Oceanic and Atmospheric Administration), foram obtidas do material preso nas redes dos pesquisadores. “Para as criaturas mais frágeis, eu saía em um barco pequeno e fazia a coleta com redes menores, ou mesmo só amostras retiradas diretamente de um balde”, conta Liittschwager. Um estúdio fotográfico foi montado no navio de pesquisa e outro na costa.
O ganhador do prêmio diz ter ficado impressionado com o universo dos minúsculos estágios larvais de crustáceos e peixes e seus mecanismos primários de defesa, principalmente aqueles baseados na invisibilidade. E ser invisível é uma característica que desafia o fotógrafo.
Para Alberto Lindner, do Centro de Biologia Marinha (Cebimar) da Universidade de São Paulo e curador da exposição Oceano: Vida Escondida, uma das maiores dificuldades de se fotografar a vida marinha é obter iluminação adequada para se conseguir boas imagens. “Muitos animais marinhos, como as águas-vivas, são transparentes, o que requer uma boa iluminação para a sua visualização. O mesmo é verdadeiro para animais de mar profundo, que vivem em um ambiente com pouca ou nenhuma luz”, explica Lindner. Além da transparência, muitos animais são pequenos, o que dificulta a profundidade de foco necessária para visualizar suas estruturas. E, apesar de existirem aos milhares ou milhões nos oceanos, muitas espécies são difíceis de serem encontradas. “Um exemplo são as lulas gigantes. Apesar de grandes e abundantes, apenas recentemente foram obtidas imagens destes animais no seu ambiente natural”, lembra Lindner.
Para Fernando de Tacca, professor do Departamento de Multimeios, Mídia & Comunicação da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), fotografia da natureza é uma especialidade que combina técnica aguçada para cada caso específico, conhecimento profundo do assunto e uma grande dose de paciência. Além disso, “a sorte do fotógrafo de estar no lugar certo, perceber o evento da natureza, criar enquadramento e ajustar a técnica”. Essa junção entre técnica e conhecimento pode ser observada na foto abaixo da Baía de Pinciguaba feita por Tacca.

Sobre o prêmio
O World Press Photo, junto com o Prêmio Pulitzer, são os dois mais conceituados prêmios internacionais de fotografia de imprensa. Para Tacca, é possível identificar, nos dois casos, uma clara independência dessas organizações, com autonomia em relação à grande mídia: agem dentro de parâmetros éticos nas escolhas das melhores fotos de cada ano. Além disso, “no caso de fotos de natureza existe uma certa estetização do mundo não visível, longe de qualquer cotidiano, tanto em fotos macros, quanto em amplas imagens do espaço”, comenta Tacca.
Resgatando um pouco da história de prêmios de fotografias nacionais, Tacca explica que o Prêmio Esso de Fotografia, criado em 1955, teve forte influência sobre as gerações passadas, ainda é muito relevante atualmente e se tornou um ícone da nossa fotografia. “O ‘primeiro’ prêmio de fotografia foi um ‘voto de louvor’ a uma foto de Campanela Neto realizada em 1960 sobre o conhecido movimento de oficiais da Aeronáutica que se rebelaram contra o governo federal em Aragarças – Goiás”, mas somente em 1965 foi criada a categoria Prêmio Esso de Fotografia.