A melhoria das estradas é considerada crucial para se alcançar o tão desejado “crescimento econômico”. Na análise de Augusto Hauber Gameiro, professor da USP, as rodovias são um bem público que “o mercado ‘falha’ ao tentar ofertá-lo espontaneamente”. Por isso o governo precisa investir na recuperação e manutenção das rodovias.
A melhoria das estradas é considerada crucial para se alcançar o tão desejado “crescimento econômico”. Pelas rodovias brasileiras passam 96% do transporte de passageiros e 62% do transporte de carga do país. No entanto, cerca de 75% da malha rodoviária nacional apresenta algum tipo de deficiência, segundo a Confederação Nacional de Transportes (CNT). Isso acarreta aumento nos gastos com combustível e manutenção de veículos; alta no valor do frete e, conseqüentemente, nos preços dos produtos ao consumidor; e eleva a emissão de gás carbônico. Isso sem falar nos riscos de acidentes envolvendo pedestres, motoristas e passageiros. Na análise de Augusto Hauber Gameiro, professor da USP, a maior parte das rodovias é caracterizada pelo que se chama na Teoria Econômica de bem público. “De forma bastante resumida, poderíamos dizer que um bem dessa natureza é aquele em que o mercado ‘falha’ ao tentar ofertá-lo espontaneamente. Ou seja, se o Estado não prover, ninguém mais o fará. O mais liberal dos economistas sabe disso”, afirma.
Tendo isso em vista, o Ministro dos Transportes afirmou que o programa de manutenção e recuperação das estradas brasileiras deve ser uma das prioridades do governo já em 2007. Paulo Sérgio Passos afirmou, durante o seminário “Desenvolvimento de Infra-Estrutura de Transportes no Brasil – Perspectivas e Desafio”, que o governo tem consciência da importância dos transportes para o desenvolvimento do país. E parece ter mesmo. No seminário, a ministra-Chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff anunciou investimentos de R$ 55,8 bilhões para o setor de transportes nos próximos quatro anos. “O Brasil precisa fazer um grande esforço para recuperar a infra-estrutura de transportes existentes em todas as áreas. Assim, será possível viabilizar o desenvolvimento econômico”, justificou ela.
O setor espera que, de fato, se cumpra o prometido. De acordo com o próprio ministro dos Transportes, entre os anos 2000 e 2004 foram investidos em média cerca de R$ 0,7 bilhões para manutenção da malha rodoviária brasileira. O valor evoluiu, atingindo recursos da ordem R$ 2 bilhões em 2005. Ainda na avaliação do ministro, as Parcerias Público-Privadas (PPP), no setor de transporte, devem merecer atenção especial.
“As PPP são a esperança do governo no sentido de conseguir canalizar o capital necessário para a concretização dos investimentos. Mas por mais que a iniciativa privada se interesse – e se esforce para investir nesse setor – provavelmente nada vai acontecer sem o forte e eficiente envolvimento público, tanto na coordenação das políticas quanto na alocação de recursos financeiros”, avalia Gameiro, que também é pesquisador do Grupo de Pesquisa e Extensão em Logística Agroindustrial (Esalq-Log), da Escola Superior de Agricultura “Luiz Queiroz” (Esalq/USP).
A participação da iniciativa privada ocorre por meio da concessão de trechos de rodovias, situação em que, por um período pré-estabelecido em contrato, deve cumprir um cronograma de investimentos, sob a fiscalização do Estado. Ao final da gestão privada, a rodovia volta ao Poder Público com todas os benefícios realizados, como a ampliação e modernização da malha rodoviária, a custo zero para o Estado. A vantagem da concessionária é a exploração do pedágio durante o período de concessão. Contudo, em trechos em que o tráfego de veículos não é intenso a ponto de compensar, via pedágio, o investimento que deve ser realizado, a responsabilidade recai sobre o governo – caracterizando então o “bem público”.
Mas com tantas outras prioridades na área social, de onde viriam os recursos do governo? Flávio Benatti, presidente da seção de cargas da Confederação Nacional de Transportes (CNT), explica: “recursos para isso existem e são originados pela Cide (Contribuição para Intervenção no Domínio Econômico), que desde a sua criação [2001] já arrecadou R$ 34 bilhões, dos quais apenas R$ 11 bilhões foram aplicados nas estradas” – trecho extraído da revista CNT.
A revista também traz a opinião do economista Raul Veloso, segundo o qual os investimentos no setor de transportes triplicariam se a parte do dinheiro da Cide que deveria ser aplicada nas estradas tivesse realmente essa destinação. De acordo com a revista, “toda vez que um carro é abastecido, R$ 0,28 por litro de gasolina, R$ 0,17 por litro de álcool e R$ 0,07 por litro de óleo diesel são destinados para a Cide (considerando o preço médio desses combustíveis nas grandes cidades em outubro de 2006)”.
Condições das estradas
A CNT divulgou em Brasília, em outubro, a Pesquisa Rodoviária 2006, que avaliou as condições de toda a malha federal pavimentada, as rodovias concessionadas e as principais estradas estaduais, num total de 84.382 km. Os resultados mostram deficiências em 75% dos quilômetros analisados, indicando necessidade de investimentos da ordem de R$ 22,5 bilhões para que as rodovias fiquem em perfeito estado e mais R$ 1 bilhão por ano para mantê-las nessa condição.
Conforme o estudo, o pavimento das estradas foi considerado regular, ruim ou péssimo em 54,5% dos quilômetros avaliados; 40,5% do total não possuía acostamento e 70,3% apresentava sinalização com problemas. Apenas 25% da malha avaliada foi classificada positivamente (11% ótima e 14% boa). As melhores estradas do país estão localizadas no Estado de São Paulo.
Pesquisa do Instituto de Pesquisas Econômicas e Aplicadas (Ipea), divulgada em outubro, calcula que os acidentes de trânsito nas rodovias brasileiras geram um custo de R$ 24,6 bilhões ao país por ano, incluindo perda de veículos, gastos com hospitais e funerais.
Ratificando os prejuízos causados pela má condição das estradas, Daniela Bacchi Bartholomeu, em tese de doutorado defendida em novembro na Esalq/USP, mostra que se as rodovias em pior estado de conservação fossem recuperadas, haveria uma redução de 4,8% no consumo de combustível e de 4,5% na emissão de gás carbônico, além de uma economia, para o motorista, de quase R$ 34,00 a cada 100 quilômetros rodados.