Plano de Gestão de Bacia tem dificuldades para ser aceito em São Carlos

A USP propôs a implantação de um Plano de Gestão de Bacia Hidrográfica para solucionar o problema numa região de São Carlos atingida constantemente por enchentes. O primeiro passo para o Plano, segundo os pesquisadores, é a criação de uma Associação de Usuários de Bacia no local.

A Universidade de São Paulo (USP) de São Carlos propôs a implantação de um Plano de Gestão de Bacia Hidrográfica para solucionar o problema da região do Varjão, localizado na estrada SP-318, que liga São Carlos a Ribeirão Preto. O local é atingido constantemente por enchentes e, no final do ano passado e início deste ano, a situação foi tão crítica que, em fevereiro, os moradores protestaram, interditando a rodovia. O plano, porém, não é aceito pela prefeitura do município, que sugere medidas insuficientes para a região.

O bairro de São Carlos, que apresenta de 3 a 5 mil habitantes, foi loteado em áreas de várzeas de inundação de uma bacia afluente do córrego do Jararaca. A crescente urbanização da parte alta da bacia pode estar contribuindo para inundar a parte baixa, onde há casas, chácaras de recreio e comércio.

Para os pesquisadores do Núcleo Integrado de Bacias Hidrográficas (NIBH) da USP, o Plano de Gestão de Bacia é justificado com base em vários princípios, dentre eles dois que são fundamentais do direito ambiental: o de reparação do dano ambiental e de poluidor-pagador. O primeiro tem como base o artigo 225 da Constituição Federal, que diz que “as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas às sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados”. A Lei 6.938 de 1985 também obriga o poluidor e o predador a recuperar e/ou indenizar os danos causados. O princípio do poluidor-pagador tem base na Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, de 1992.

“Para aplicar esses princípios para conflitos de recursos hídricos, como no caso das inundações, deve-se escolher uma unidade territorial básica. As leis federais e estaduais são claras ao respeito: a unidade territorial é a bacia hidrográfica, independente do tamanho e limites de propriedade”, explica Eduardo Mendiondo, coordenador do NIBH da USP e pesquisador na área de gestão de risco de inundações do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

Segundo Pedro Caballero, pesquisador do NIBH e coordenador regional adjunto da Defesa Civil do Estado de São Paulo (Região Central), a idéia do Plano de Gestão é interferir de forma controlada na bacia. Assim, podem ser propostas as áreas que serão destinadas à agricultura e florestas novas, além da permissão de ocupação de locais em áreas de várzea. Medidas de macrodrenagem, reuso da água, sistemas coletores de esgoto, além da criação de laboratórios de treinamento comunitário para proteção pessoal em momentos de inundações, são elementos indispensáveis em planos de bacia desse tipo. No caso do Varjão, este plano teria um custo de R$ 20 milhões e seria um planejamento para toda a bacia para os próximos 20 anos.

Entretanto, o primeiro passo para a implantação deste plano, deve ser a criação de uma Associação de Usuários de Bacia. Esta é uma iniciativa pioneira e já foi implantada pela USP em São Carlos, com experiência na criação da Associação de Bacia do Tijuco Preto. Cristiane Guedes, pesquisadora do núcleo, explica que toda associação deve possuir CNPJ, estatuto e regimento interno. A comunidade participa de reuniões e toma decisões sobre a bacia, avaliando a qualidade da água, consumo e o uso racional. “A criação da Associação de Usuários no Varjão é imprescindível”, afirma Marcos Funari, promotor do meio ambiente de São Carlos, que acompanha o caso.

Histórico

No final de 2005, os moradores haviam instaurado um processo no Ministério Público que resultou em cinco reuniões com a participação da prefeitura, da construtora Encalso (responsável pelos condomínios), da concessionária da rodovia (a Autoban), além dos próprios moradores. Foram apresentados dois projetos: um deles (com custo de R$ 2,5 milhões) seria a construção de dois canais de concreto, que se encontrariam escoando as águas até o córrego do Jararaca; o outro (com custo de R$ 1,8 milhões) previa a construção de um canal que levaria a água para o mesmo córrego, mas exigiria a desapropriação de pelo menos 15 chácaras. Para os pesquisadores do NIBH, estes projetos são medidas de curto prazo, que só serviriam para afastar o problema, já que a área está localizada em bacias embutidas (uma bacia dentro da outra), ou seja, a inundação que ocorre em uma seria repassada para a outra.

Para Caballero, a adoção de um destes planos emergenciais poderia prejudicar a qualidade da água no local, visto que todas as casas apresentam fossas e, uma canalização sem controle pode fazer o esgoto residencial ir direto para o córrego. Há ainda, no local, fazendas de alto potencial de ecoturismo, com cachoeiras que podem ter a qualidade da água comprometida e, portanto, uma perda de atração regional.

Segundo Ricardo Martucci, Secretário Municipal de Habitação e Desenvolvimento Urbano de São Carlos, a idéia de um plano emergencial foi descartada. Eles farão somente um plano de macrodrenagem para o município todo, previsto como projeto complementar do plano diretor do município. “As obras no Varjão começam logo que cessarem completamente as chuvas, já que o trabalho precisa ser feito com o terreno totalmente seco”, afirma Martucci.

Mas este projeto de macrodrenagem seria apenas um dos pontos incluídos no Plano de Gestão de Bacia, de acordo com os pesquisadores do NIBH, sendo necessárias outras medidas. No final de abril, a Prefeitura de São Carlos foi multada pelo Ministério Público em R$ 4,5 milhões porque não estava atendendo os planos de conservação ambiental na bacia do Tijuco Preto.