O resultado econômico e ambiental de armazenar CO2 em reservatórios de petróleo

O chamado “seqüestro geológico de carbono” foi o tema da tese de doutorado da engenheira química Ana Teresa Gaspar Ravagnani, na Unicamp, que fez uma análise da viabilidade técnica e econômica da injeção de carbono em campos de petróleo, com o objetivo de calcular tanto os resultados financeiros como os ambientais.

O chamado seqüestro geológico de carbono, que “enterra” CO2 em reservatórios de petróleo para que o gás não contribua com o aquecimento global, foi o tema da tese de doutorado da engenheira química Ana Teresa Gaspar Ravagnani, desenvolvida no curso de pós-graduação em Ciências e Engenharia do Petróleo e apoiado pelo Centro de Estudos de Petróleo, ambos da Unicamp. Ela fez uma análise da viabilidade técnica e econômica da injeção de carbono em campos petrolíferos, com o objetivo de calcular tanto os resultados financeiros como os ambientais. A tese levou em consideração a injeção de gás em um campo representativo do Recôncavo Baiano e foi orientada pelo geólogo Saul Suslick, do Instituto de Geociências da Unicamp.

Injetar dióxido de carbono (CO2) em reservatórios com produção em declínio é uma técnica utilizada há 40 anos pela indústria do petróleo. A novidade é que hoje ela está sendo aperfeiçoada para que o CO2 que retorna à superfície com o óleo recuperado seja reinjetado, para que boa parte dele não retorne mais à atmosfera. Uma vez “enterrado”, o CO2 não contribui para o aumento do efeito estufa, um dos causadores do aquecimento global.

Além de determinar os principais custos da injeção de CO2, o trabalho de Ravagnani envolveu a elaboração de um modelo computacional de simulação dinâmica que reproduz o comportamento do sistema ao longo dos anos. Entre as variáveis, foi incluído um fator novo, a geração de créditos de carbono. Ao retirar CO2 da atmosfera, as empresas brasileiras – que não têm obrigações de reduzir suas emissões, segundo o Protocolo de Kyoto – poderiam vender esses “créditos de carbono” a empresas de países desenvolvidos. Estas, por sua vez, poderiam continuar com suas emissões, investindo em fontes limpas de energia em países em desenvolvimento.

Ravagnani acredita que, associada à recuperação de óleo residual, a injeção de carbono poderá promover a reativação de campos que já passaram pelos processos convencionais de produção, e com isso, viria o renascimento econômico em regiões como a Província Petrolífera do Recôncavo Baiano. O dióxido de carbono não é usado na fase inicial de produção de um campo, mas só na chamada terceira fase de produção. O seqüestro de carbono pode ser um incentivo para que campos que ainda possuem óleo, mas que já foram abandonados por não apresentarem mais viabilidade econômica, sejam reativados.

Com o avanço da produção, a pressão de um poço vai caindo. Quando ela atinge um certo nível, torna-se desinteressante economicamente continuar produzindo pelo método natural. Começa, então, a fase de recuperação secundária, na qual é injetada água para pressionar o óleo a subir. A injeção de água também tem o seu limite, e quando ele é atingido, é hora da fase suplementar: processos químicos, térmicos ou injeção de fluidos ou gases. Nessa fase entra o CO2 como uma das técnicas mais utilizadas.

Subproduto de inúmeros processos que vão desde a respiração celular até a queima de combustíveis, o CO2 é um dos gases causadores de efeito estufa. Isso quer dizer que o dióxido de carbono colabora para que os raios infravermelhos do sol fiquem retidos na atmosfera, aumentando, assim, a temperatura média do planeta.

A presença desse gás na atmosfera tem crescido exponencialmente desde a Revolução Industrial. Na era pré-industrial, a concentração de CO2 na atmosfera era de 280 ppm (partes por milhão). Menos de um século e meio depois, pairam hoje em nosso ar mais de 370 ppm de CO2, um número que vem aumentando à taxa de 0,4% ao ano desde 1980. Os combustíveis fósseis – em sua grande maioria derivados do petróleo – são os principais responsáveis por esse aumento e correspondem a aproximadamente 80% da oferta global de energia primária.

“A indústria do petróleo, conhecida por contribuir para o aumento do efeito estufa, tem o seqüestro geológico como uma importante ferramenta para reduzir a emissão de CO2”, analisa Ravagnani. Estima-se que cada barril de óleo extraído produza o equivalente a 436 quilos de CO2. Segundo os cálculos da pesquisadora, a injeção de dióxido de carbono em um pequeno campo hipotético da Bacia do Recôncavo, ao longo de 20 anos, produziria 3,65 milhões de barris de petróleo e ainda reduziria 37% da concentração desse gás na atmosfera. Essa porcentagem considera também as emissões adicionais de CO2 inerentes ao processo desde a etapa da captura até o consumo final dos derivados do petróleo. “É importante notar que nem todo CO2 fica armazenado. Parte dele volta à superfície, onde é separado do óleo e novamente injetado”, explica. Praticamente metade do gás utilizado retorna à tona com o óleo.

E os custos para promover o seqüestro de carbono durante a operação de recuperação de óleo compensam? É para essa questão que o trabalho da engenheira química tenta servir de base. São vários fatores a serem analisados, como a profundidade em que o reservatório se encontra, o tipo de óleo e seu valor de mercado, só para citar alguns. A pesquisadora acredita que o maior obstáculo para um uso mais amplo dessa técnica, o alto custo, pode ser reduzido aos poucos através de novas tecnologias e de incentivos para a redução de emissão de carbono, entre eles os créditos vendidos a empresas de países industrializados.

Os custos da injeção do CO2 se dividem nas quatro estapas necessárias para a sua utilização: separação (quando o gás é isolado), compressão, transporte e injeção. Geralmente, os custos maiores estão na separação, cujos gastos dependem da concentração de CO2 no composto de onde se tira o gás. A compressão e o transporte dependem de eletricidade, e este último tem o custo relacionado diretamente à distância até o campo de petróleo. A injeção costuma ser a etapa de menor custo.

Mesmo sem os incentivos de créditos de carbono, existem campos em fase madura, como os do Recôncavo Baiano, em que uma operação economicamente viável pode ser associada à redução de dióxido de carbono, unindo, desse modo, as faces financeira e ambiental de uma indústria que está entre os maiores responsáveis mundiais pela emissão de CO2. Utilizar reservatórios maduros como sepulturas de dióxido de carbono, seria uma redenção parcial do setor de petróleo e ajudaria o nosso planeta a ficar um pouco menos quente.

Legislação de Propriedade Intelectual gera polêmica

Entre os diversos assuntos debatidos no último Fórum de Inovação da Unicamp, foram destaque a proteção da propriedade intelectual e industrial do país e os benefícios sociais para o desenvolvimento científico e tecnológico, assim como o papel da universidade pública nesse contexto. Entretanto, alguns pesquisadores discordam da legislação brasileira de propriedade intelectual, acusando o sistema de privatizar instituições públicas e pesquisas.

A Unicamp sediou neste mês um fórum sobre Legislação da Propriedade Intelectual, organizado pela Agência de Inovação da universidade. Foram destaque no evento a proteção da propriedade intelectual e industrial do país e os benefícios sociais para o desenvolvimento científico e tecnológico, assim como o papel da universidade pública nesse contexto. Entretanto, alguns pesquisadores discordam da legislação brasileira de propriedade intelectual, acusando o sistema de privatizar instituições públicas e pesquisas.

Os direitos à propriedade intelectual garantem reconhecimento do trabalho de pessoas físicas ou jurídicas como a concessão de patentes, direito do uso de marcas e direitos. Uma vez reconhecidos e concedidos, os direitos podem ser comercializados ou licenciados. Por um lado, as leis protegem o desenvolvimento tecnológico e científico, pois assegura os direitos dos que investem em pesquisas, o retorno de seus investimentos e a continuidade da atividade. Por outro lado, a adoção de medidas de proteção pode representar um cerco ao avanço do conhecimento científico, já que nem todos têm acesso às inovações.

De acordo com o pesquisador Sérgio Salles Filho, do Instituto de Geociências da Unicamp, entender o sistema de proteção de pesquisas e inovações é fundamental no mundo onde o conhecimento é gerador de riquezas: “É senso comum dizer que o que é feito na instituição é público e deve ser divulgado. No entanto, dados mais recentes afirmam que, justamente por ser pública, a informação deve ser protegida para gerar benefícios mais objetivos e efetivos”, afirma Salles. De acordo com sua linha de pesquisa, as políticas de proteção devem ser coerentes com o desenvolvimento científico e tecnológico do país e aplicadas em diferentes graus de liberdade, dentro da lei.

Mas nada é tão simples. Uma das maiores polêmicas sobre o assunto gira em torno da Lei de Patentes e Proteção de Cultivares (Lei 9279, de 1996). O acordo internacional Trips, assinado em 1994, na Rodada Uruguai, estabelece o direito de patentear microorganismos e processos não-biológicos e microbiológicos para a produção de plantas. De acordo com Carlos Jorge Rossetto, pesquisador do Instituto Agronômico de Campinas (IAC), a Lei de Patentes é reflexo disso e deixa patenteáveis processos biológicos não naturais e microorganismos, embora proíba patentear seres vivos. Para o economista David Hathaway, “a lei só impede o patenteamento direto de plantas e animais, mas deixa abertas portas para o exercício indireto das patentes sobre esses organismos superiores”. Dentre essas aberturas, Hathaway explica que não há limitação sobre a patente de genes de transgênicos quando estes são transferidos para dentro do genoma de uma planta ou de um animal. Isto é, a reprodução de transgênicos implica na reprodução ilegal de um gene patenteado”, afirma o economista. Um exemplo do debate jurídico possível sobre reprodução ilegal de um gene patenteado é o do agricultor canadense Percy Schmeiser versus Monsanto.

Rossetto argumenta que essa forma de funcionamento da patente retira o chamado Direito do Melhorista, ou seja, o direito de utilizar a planta patenteada em cruzamentos com outras variedades para obtenção de uma nova variedade superior. De acordo com o pesquisador, se uma pesquisa destinar-se a buscar o melhoramento de uma planta a partir de cruzamentos, e se essa pesquisa envolver uma planta que contenha um gene patenteado, o pesquisador fica dependente de pagar direitos a empresa detentora da patente. É nesse sentido que as patentes podem, para Rossetto, impedir a continuidade das pesquisas, das inovações e atrelar o desenvolvimento a grandes empresas ou corporações internacionais. “As corporações têm interesse que seus genes sejam utilizados e inseridos no maior numero de cultivares no mundo, pois isso representa fonte de faturamento”, alerta o pesquisador.

Vislumbrando esse contexto, Rossetto acusa que as leis de patentes e de proteção de cultivares induzem a privatização da pesquisa pública agropecuária do Brasil. Em sua opinião, as corporações multinacionais não vão constituir instituições de pesquisa próprias em cada região ao redor do planeta para essa tarefa. Por isso é necessário que as Instituições de Pesquisa e Universidades locais o façam em parceria com elas. É nesse contexto que as formas de parceria entre universidade e empresas são observadas por Rossetto como forma de privatização. Ele inclui em seus argumentos a análise dos meandros legais e das propostas que nos últimos anos têm concretizado essas privatização das pesquisas. Como exemplo, cita a proposta de 1997 de transformar o IAC em organização pública não-estatal. Ele sinaliza que são mudanças como essa que permitem a longo prazo a privatização da pesquisa. Inclusive porque “A Lei de Inovação privatiza resultados de pesquisas públicas de instituições científicas, incentivando-as a trabalhar para organizações privadas. Cria obstáculo legal para publicação dos resultados, o que vai contra princípios constitucionais da administração pública da impessoalidade e da publicidade”, denuncia.

Para Sérgio Salles, um dos autores da proposta de mudanças no IAC, há mitos que devem ser quebrados para que os processos de transferência de tecnologia e proteção intelectual avancem nas universidades. Um deles seria exatamente o fato de que o desenvolvimento tecnológico e sua proteção significam privatizar a universidade pública. “Exatamente por ser pública é que a instituição deve proteger o conhecimento, gerar riquezas e empregos. No exterior há regras para divulgação de pesquisas. Lá elas são protegidas. Aqui no Brasil, isso não acontece, pois abrimos todas as informações. Temos que ter regras porque o dinheiro usado para financiar a inovação é público”, afirma.

Inovar para competir com a China, defendem participantes da Anpei em Salvador

As empresas brasileiras precisam investir em pesquisa e desenvolvimento para inovar e garantir sua inserção no mercado internacional. O motivo: a concorrência dos produtos asiáticos, em especial os produzidos na China. Essa é uma das conclusões dos debates que aconteceram durante a VII Conferência da Associação Nacional de Pesquisa, Desenvolvimento e Engenharia das Empresas Inovadoras (Anpei).

As empresas brasileiras precisam investir em pesquisa e desenvolvimento para inovar e garantir sua inserção no mercado internacional. Se antes a inovação nas empresas nacionais era uma sugestão, agora ela ganha tom de necessidade. O motivo: a concorrência dos produtos asiáticos, em especial os produzidos na China. Essa é uma das conclusões recorrentes nos debates que acontecem durante a VII Conferência da Associação Nacional de Pesquisa, Desenvolvimento e Engenharia das Empresas Inovadoras (Anpei). Um encontro anual que reúne pesquisadores, empresários e representantes de entidades de classe para discutir temáticas ligadas ao setor produtivo. A conferência teve início ontem, dia 05 de junho, em Salvador, Bahia.

A preocupação com a concorrência chinesa justifica-se pelos números. De acordo com os dados apresentados por Carlos Ganem, da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), a China aumentou 407% sua participação em exportações de produtos de alta tecnologia entre 1994 e 2004. A variação no Brasil, no mesmo período, foi de 32%. Ganem foi enfático ao afirmar que o país precisa pensar em um sistema de inovação que reúna diversos atores: “Se desenvolvermos ações junto com a academia, a sociedade civil e o governo, colheremos resultados associadamente”. E completa: “mais do que nunca, a inovação está na moda”.

Luiz Antonio Rodrigues Elias, do Ministério de Ciência e Tecnologia (MCT), também lembrou da concorrência asiática. Destacou dados da Pesquisa de Inovação Tecnológica (Pintec), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que mostram que, entre 2000 e 2003, apenas 30% das empresas brasileiras consultadas pela pesquisa realizaram inovação, seja de produto ou de processo (inovação aqui entendida como a introdução no mercado de um produto ou processo novo, ou significativamente aprimorado). Além disso, Elias também apontou que, no mesmo período, as empresas solicitaram ao governo (Finep) quatro vezes mais apoio para aquisição de máquinas e equipamentos, do que para realização de pesquisa e desenvolvimento, o que mostra que a preocupação principal das empresas ainda é com a infra-estrutura.

Em relação aos recursos humanos para realização de pesquisa e desenvolvimento nas empresas, outro ponto discutido: faltam pesquisadores no mercado. Para o presidente da Anpei, Hugo Borelli Resende, apesar de o Brasil formar um grande número de doutores por ano (aproximadamente 10 mil por ano), faltam doutores nas áreas de concentração que o setor produtivo precisa, como física, engenharia e computação.

Tecnologias de Informação (TIs)

O desenvolvimento da China foi novamente lembrado em relação às Tecnologias de Informação. Junto com a Índia, o país tem se destacado na área de TI (apesar das desigualdades internas de acesso às novas tecnologias de informação e de comunicação). Mas de acordo com Stephen Minton, vice-presidente da International Data Corporation (IDC), o Brasil e outros países denominados por ele de “mercados novos”, como Rússia e México, também podem ter a sua fatia no bolo. A participação desses países na produção internacional de TIs, que hoje é de 11%, deve dobrar nos próximos 10 anos.

O encontro da Anpei segue até amanhã (dia 06), em Salvador. A escolha da Bahia para a realização do evento não foi mero acaso: o estado tem investido na atração de empresas para a região e, de acordo com o seu governador Jacques Wagner (PT), presente no evento, a Bahia vai ganhar, ainda neste ano, o seu parque tecnológico, que deve levar o nome de Tecnovia. A previsão é de uma área de um milhão de m2 para a concentração de empresas de tecnologias de ponta, com prioridade para áreas como biotecnologia, energia e TIs.