Expedição à Amazônia testa tecnologias para monitoramento florestal

Entre os dias 16 e 23 de outubro, uma equipe formada por cientistas do Centro de Pesquisas Renato Archer e do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia fará uma expedição ao Morro dos Seis Lagos, no Amazonas. A viagem contribuirá com dados para o projeto Cognitus, organizado pela Petrobras, que visa desenvolver e implementar ferramentas cognitivas para proteger a floresta de possíveis derramamentos de óleo.

Entre os dias 16 e 23 de outubro, uma equipe formada por cientistas do Centro de Pesquisas Renato Archer (CenPRA) e do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) fará uma expedição ao Morro dos Seis Lagos, 70km ao norte da cidade de São Gabriel da Cachoeira (AM), a cerca de 800km de Manaus. A expedição contribuirá com dados para o projeto Cognitus, organizado pela Petrobras, que visa desenvolver e implementar ferramentas cognitivas para proteger a floresta de possíveis derramamentos de óleo. O maior objetivo da viagem é analisar a atividade de peixes elétricos nos lagos, usando robôs e sensores desenvolvidos pelo projeto.

A empresa petrolífera brasileira extrai gás natural e petróleo da região amazônica e usa seus rios para transportar os derivados de petróleo. Procurar entender melhor a biodinâmica da floresta, ou seja, o comportamento da bacia hidrográfica na época das cheias e de seca, e evitar possíveis derramamentos de hidrocarbonetos, são os objetivos maiores do projeto “Cognitus, Ferramentas Cognitivas para a Amazônia”, iniciado há cerca de três anos.

Para atingir o objetivo de compreender melhor a biodinâmica da floresta, o projeto utiliza uma equipe multidisciplinar: existem pesquisadores na área de mecatrônica, que constroem robôs capazes de navegar pelos rios da região e locomover-se nas suas planícies; um segundo grupo, de nanobiotecnologia, responsável pela construção de sensores para captar as características da floresta, como temperatura, pH (índice de acidez), umidade, presença de hidrocarbonetos, atividade elétrica, entre outras. E, finalmente, há uma equipe composta por filósofos e estudiosos de semiótica que atuam na interpretação destes dados obtidos.

Segundo Roberto Tavares, pesquisador do CenPRA que coordena a equipe de robótica, os maiores avanços, até o momento, são a obtenção de uma tecnologia totalmente nacional que atende às demandas específicas da região amazônica. “Construímos robôs e sensores que são capazes de locomover-se por áreas inundadas, planícies, ir ao fundo dos rios, medir a erosão das áreas desflorestadas e a subida das águas, sempre coletando dados para compreender melhor a floresta”, explica. Tavares ressalta ainda a importância do envolvimento de pesquisadores de diversas áreas, pois isto permite que a complexidade do ecossistema seja estudada através dos prismas de diferentes áreas do conhecimento.

Um dos principais objetos de estudos do projeto e da expedição é o peixe-elétrico, conhecido em línguas indígenas como poraquê. Existem aproximadamente 150 espécies de peixes na bacia amazônica que utilizam sinais elétricos para analisar as características do ambiente. Estas correntes elétricas permitem que os animais se localizem, busquem alimentos, percebam a temperatura, disputem fêmeas na época do acasalamento, defendam-se de predadores e analisem as características das águas em geral.

A equipe de pesquisadores desenvolveu robôs que captam esses sinais para a análise. Em testes de laboratório, já foram identificados dois fatores que alteram os sinais elétricos dos peixes: a temperatura e o pH da água. “Nossa meta ambiciosa e de longo prazo é ter robôs que naveguem de forma autônoma e que captem e interpretem os sinais dos peixes”, afirma Tavares. Isto ainda não é possível, mas no futuro o pesquisador vislumbra que estes robôs poderão perceber as alterações na floresta e, no caso de um derramamento de óleo, enviem sinais por satélite para avisar o acidente ou até mesmo coloquem automaticamente barreiras de contenção na área.

A expedição envolvendo o CenPRA e o Inpa é importante para o projeto da Petrobras, pois servirá para acrescentar novos dados à base do Cognitus. O Morro dos Seis Lagos é um acidente geográfico bastante peculiar na planície amazônica. Trata-se de uma formação rochosa de 16km2 e quase 300 metros de altura. Os lagos são isolados hidricamente do resto da bacia amazônica e cada um tem uma cor, devido a diferentes componentes químicos. Além disto, o Morro é rico em nióbio, um metal raro e caro, utilizado pela indústria aeronáutica, mas que não pode ser extraído, já que o local encontra-se em uma reserva indígena.

A expedição contará com robôs que medirão a atividade bioelétrica dos lagos. Será a primeira vez que tais estudos serão feitos. Devido ao isolamento dessas águas, Tavares acredita que será possível analisar os sinais elétricos dos peixes em um ambiente diferente, dando ao grupo uma nova base de dados que servirá para uma melhor compreensão da “linguagem” dos poraquês.

O exército auxiliará os pesquisadores no transporte por rio até o Morro dos Seis Lagos e na instalação do acampamento. Para chegar até o local, é necessária uma viagem de um dia e meio através dos igarapés até a chegada à base. Para alcançar o alto do morro, o grupo ainda precisa enfrentar uma trilha de aproximadamente seis horas. “Diante das dificuldades, o apoio do exército é essencial, para que nós pesquisadores possamos focar somente nos experimentos”, conclui Tavares.

Células-tronco do tecido adiposo como alternativa às da medula óssea

Projeto que avaliou a capacidade de células-tronco mesenquimais humanas regularem respostas imunológicas in vitro ganhou o 5º “Prêmio Destaque do Ano na Iniciação Científica”, na categoria Ciências da Vida, concedido pelo CNPq. Células obtidas tanto da medula óssea quanto do tecido adiposo apresentaram similar atividade reguladora.

O projeto “Estudo da atividade imunomoduladora das células-tronco mesenquimais humanas” ganhou o 5º “Prêmio Destaque do Ano na Iniciação Científica”, na categoria Ciências da Vida, concedido pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), em parceria com o British Council. A entrega da premiação aconteceu em Brasília, no último dia 2.

Os pesquisadores isolaram células-tronco mesenquimais a partir de duas fontes – medula óssea e tecido adiposo – com o objetivo principal de estudar a capacidade dessas células humanas regularem respostas imunológicas in vitro. “A observação de que ambas linhagens apresentam similar atividade reguladora e, considerando as dificuldades inerentes à obtenção de células mesenquimais de medula óssea, as obtidas do tecido adiposo podem ser utilizadas como uma fonte alternativa de células mesenquimais, uma vez que são facilmente obtidas e expandidas in vitro”, destaca a pesquisadora Kellen Faé.

Células-tronco mesenquimais, uma população de células do estroma do tecido (parte que dá sustentação às células), têm a capacidade de se diferenciar em diversos tecidos. Por conta desta plasticidade, essas células têm sido utilizadas para reparar ou regenerar tecidos danificados como ósseo, cartilaginoso, hepático, cardíaco e neural. Além disso, essas células apresentam uma poderosa atividade imunosupressora, o que abre a possibilidade de sua aplicação clínica em doenças imuno-mediadas, como as auto-imunes e também nas rejeições aos transplantes. Em adultos, residem principalmente na medula óssea e no tecido adiposo.

Conduzido pela aluna de biologia da Universidade de São Paulo (USP), Carolina Lavini Ramos, e orientado em parceria por Faé e Jorge Kalil, do Laboratório de Imunologia do Instituto do Coração (InCor), os pesquisadores observaram que ambas linhagens foram capazes de inibir a proliferação de linfócitos T, células do sistema imune que, em condições patológicas, participam do processo de agressão tecidual. Esta imunossupressão foi observada tanto após um forte estímulo inespecífico (usando um anticorpo anti-CD3) quanto em experimentos que imitam as respostas de rejeição aos transplantes, a chamada reação linfocitária mista.

Analisaram também outros parâmetros como expressão de marcadores de superfície, o tipo de linfócito que a célula mesenquimal regula, quais moléculas (citocinas) são produzidas. Além disso, realizaram um experimento denominado transwell, em que avaliaram se a inibição das células mesenquimais requer contato direto com os linfócitos ou apenas fatores solúveis. Observaram que ambas vias são importantes para a regulação em questão.

Inserido dentro de um projeto maior que estuda a resposta imune de pacientes com insuficiência cardíaca tratados com células-tronco autólogas (próprias), o trabalho passou por uma etapa inicial de padronização do cultivo para obtenção das células mesenquimais.

Iniciação científica

Carolina Ramos, premiada pelo CNPq, destaca que “a iniciação científica é uma oportunidade de vivenciar o dia-a-dia da carreira científica, além de permitir conhecer diversas áreas da Biologia, e escolher a que mais lhe interessa”.

“Este prêmio também mostra a qualidade do programa de iniciação científica do CNPq, programa único do mundo, que contempla mais de 20.000 estudantes em todo o Brasil. Como orientadora, é o reconhecimento de todo um trabalho de muita dedicação e a esperança de poder contribuir para a formação de novos pesquisadores para o nosso país”, ressalta Kellen Faé.

O prêmio, criado em 2003, tem o objetivo de reconhecer os trabalhos de destaque entre os bolsistas de iniciação científica do CNPq, sob os aspectos de relevância e qualidade do seu relatório final, e as instituições participantes do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC) que contribuíram de forma relevante para o alcance das metas do Programa.

Segundo Jorge Kalil, “a ciência normalmente não enche o bolso de dinheiro, mas sim o coração de alegria e reconhecimento pelos pares, e satisfação profissional, tudo no caminho da felicidade pessoal. O trabalho da Carolina é de tema super atual que trata da repercussão das células-tronco no sistema imune com grandes conseqüências terapêuticas”.

Durante a cerimônia de premiação, que aconteceu junto com a abertura da Semana Nacional de Ciência e Tecnologia, os bolsistas vencedores receberam um prêmio em dinheiro (valor equivalente a 12 meses de bolsas de iniciação científica) e a garantia de uma bolsa de mestrado, além de passagem e hospedagem para participarem da reunião anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) de 2008.

Jornal inaugura nova modalidade de artigo científico

O Journal of Visualized Experiments abriu um novo canal de comunicação audiovisual com o mundo da pesquisa e suas peculiaridades. Por meio de artigos científicos publicados na forma de vídeos, os vídeos-artigos, é possível conhecer um pouco mais como a pesquisa de laboratório em biologia é realizada.

Bruno Latour e Steve Woolgar, no livro A vida de laboratório – A produção de fatos científicos, já havia nos aproximado do dia-a-dia dos cientistas. O Journal of Visualized Experiments (JoVE) faz o mesmo, abrindo um novo canal de comunicação audiovisual com o mundo da pesquisa e suas peculiaridades. Por meio de artigos científicos publicados na forma de vídeos de livre acesso (vídeos-artigos), é possível conhecer um pouco mais como a pesquisa de laboratório em biologia é realizada. Para o público em geral, é uma maneira de se aproximar da prática científica. Para os cientistas, uma forma de visualizar detalhes técnicos pouco explorados na resumida sessão de “Materiais e Métodos” dos artigos científicos.

Lançado em dezembro de 2006, o periódico estadunidense foi idealizado pelo biólogo Moshe Pritsker enquanto fazia seu doutoramento na Universidade de Princeton. “Eu sofria para reproduzir experimentos a partir dos artigos impressos, até que percebi que eles não funcionam por não descreverem de maneira clara a complexa realidade dos experimentos”. Surgiu, então, a idéia de apresentar as mais diversas experiências na forma de vídeos-artigos. “Percebi que, para aumentar a reprodutibilidade, os experimentos precisavam ser mostrados”, explica o editor-chefe.

Com 300 a 500 acessos diários exclusivos, o JoVE é dividido nas sessões protocolos básicos, neurociência, biologia do desenvolvimento, biologia celular, biologia vegetal, microbiologia e imunologia. Seu conselho editorial conta com a participação de cientistas de renomados centros de pesquisa, como as Universidades de Harvard, Princeton, do Sul da Califórnia, Quioto, Zurique e Wuerzburg, assim como de pesquisadores do Centro Nacional da Pesquisa Científica (CNRS, na sigla em francês), na França, e do Instituto Nacional de Saúde (NIH, na sigla em inglês), nos Estados Unidos.

Como são feitos os vídeos-artigos

Os vídeos-artigos seguem a estrutura dos papers acadêmicos, com uma breve introdução, metodologia, resultados e uma discussão no final focada nos principais problemas metodológicos da técnica descrita.

Embora alguns vídeos sejam enviados pelos próprios cientistas, hoje em dia o JoVE conta com uma infra-estrutura organizacional que permite filmar em centros acadêmicos de pesquisa de diferentes cidades. A ajuda profissional de produção – filmagem e edição – acontece em 15 cidades nos Estados Unidos e algumas outras como Tóquio e Berlim.

Em meio à erlenmeyers, tubos de ensaios, pipetas, placas, reagentes, células e uma bancada normalmente bagunçada, diferentes metodologias podem ser acompanhadas e também utilizadas em instituições de ensino.

“Sinceramente, não conhecia o JoVE, mas quando olhei a página fiquei impressionado com a qualidade e apostando na idéia. Vou divulgar dentro de meu âmbito”, destaca Gilson Volpato, professor do Departamento de Fisiologia da Universidade Estadual Paulista (Unesp), que atua também na área de Redação Científica.

Um pouco de brasilidade pode ser vista no vídeo-artigo publicado no JoVE sobre infecção da mosca drosófila pela bactéria Wolbachia, tema comentado também por Marcelo Leite em sua coluna, no início de setembro, no caderno Mais!, do jornal Folha de S. Paulo.