UFSCar cria vagas exclusivas para indígenas

A UFSCar abre nesse mês as inscrições para o seu primeiro vestibular indígena. A iniciativa faz parte da Política de Ações Afirmativas da universidade e do Plano de Desenvolvimento Institucional, que prevê ainda a reserva de vagas para alunos de escolas públicas, em especial negros e pardos. No vestibular exclusivo para índios, que será realizado em fevereiro de 2008, cada curso contará com uma vaga criada exclusivamente para indígenas.

A Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) abre agora em novembro as inscrições para o seu primeiro vestibular indígena. A iniciativa faz parte da Política de Ações Afirmativas da universidade e do Plano de Desenvolvimento Institucional, que prevê ainda a reserva de 20% das vagas para alunos de escolas públicas das quais 35% para alunos negros e pardos saídos do ensino médio público (a meta é 50% até 2017).

O Grupo Gestor do Programa de Ações Afirmativas da UFSCar estudou durante dois anos a experiência de outras universidades. Segundo Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva, coordenadora do grupo, também foram promovidos debates no campus e realizadas consultas com lideranças indígenas e negras para discutir quais ações seriam implementadas.

No vestibular exclusivo para indígenas, que será realizado em data diferente dos demais (fevereiro de 2008), o objetivo é não só avaliar a educação formal mas contemplar os conhecimentos dos povos indígenas. “É importante lembrar que não será um vestibular mais fácil, apenas diferente”, destaca Petronilha.

Cada curso contará com uma vaga criada exclusivamente para indígenas. Diferentemente da USP, por exemplo, que oferece um curso exclusivo para professores indígenas, a UFSCar abre a possibilidade do índio se inscrever para qualquer um dos cursos. Não existe motivo para determinar quais cursos serão mais “adequados”.

Para concorrer às vagas exclusivas, o candidato deverá apresentar uma carta da liderança da aldeia onde vive e ter realizado ensino médio em escolas públicas. “Já recebi ligações de três estudantes do Alto Xingu interessados nos cursos”, lembra Petronilha que acredita que, mesmo não tendo indígenas nas proximidades, a UFSCar não pode restringir sua atuação às realidades locais. A universidade terá que rever seu programa de bolsas para alimentação, moradia e material, para que os ingressantes, vindos de comunidades distantes, possam permanecer no curso até sua conclusão.

O Grupo Gestor do Programa de Ações Afirmativas enxerga estas ações como parte integral das funções sociais da universidade pública, e entende que os mais diferentes segmentos da sociedade devem estar nela representados. Segundo a coordenadora do grupo, a universidade reproduz as desigualdades vigentes na sociedade: a grande maioria dos seus alunos é branca, oriunda das escolas particulares, tendo pouca ou nenhuma representação dos demais grupos.

Assim como a luta por maior participação política nas diferentes esferas do governo e da sociedade, pela garantia de direitos sociais e pelo respeito ao seu modo de ser e viver, o acesso à universidade também passa a ser uma reivindicação dos povos indígenas.

O objetivo do Programa de Ações Afirmativas da UFSCar que acontece a partir do vestibular de 2008, baseado em critérios sócio-econômicos e étnico-raciais, é trazer para a universidade populações à margem do ensino superior. Por essa razão, a universidade ganhou o Prêmio Camélia da Liberdade, destinado a instituições promotoras de ações que valorizem a cultura afro-brasileira, reconheçam e destaquem suas capacidades profissionais e estejam engajadas na luta contra a discriminação racial.

Raios cósmicos de energias elevadas têm origem externa à Via Láctea

Solucionado embate científico de 56 anos. Cientistas da colaboração do Observatório Pierre Auger anunciam que os raios cósmicos são produzidos fora da Via Láctea, e sua fonte mais provável são galáxias vizinhas à nossa, que possuem buracos negros em seu centro.

Solucionado embate científico de 56 anos. Cientistas da colaboração do Observatório Pierre Auger anunciam amanhã, no periódico científico Science, que os raios cósmicos são produzidos fora da Via Láctea, e sua fonte mais provável são os chamados Núcleos Ativos de Galáxias, ou galáxias vizinhas a nossa que possuem buracos negros em seu centro. “A era da astronomia de raios cósmicos chegou. Nos próximos anos nossos dados permitirão identificar as fontes exatas destes raios cósmicos e como elas aceleram estas partículas”, comemorou o ganhador do prêmio Nobel James Cronin, da Universidade de Chicago e um dos idealizadores do Auger.

Descobertos no início do século passado, os raios cósmicos são partículas que viajam o universo e bombardeiam a Terra depois de chegarem de todas as direções do céu e colidirem com átomos presentes na atmosfera, em um processo sucessivo que gera novas partículas até perderem energia suficiente para continuarem as interações. A este fenômeno dá-se o nome de chuveiro atmosférico. O fluxo de raios cósmicos presente em nosso planeta pode ser muito intenso, no caso dos que possuem baixa energia, até se tornar muitíssimo baixo conforme as partículas são mais energéticas.

Nesta fase, os cientistas do Auger, maior observatório de raios cósmicos do mundo, analisaram as partículas de maior energia, tão raras que caem na Terra em uma frequência equivalente a uma partícula por metro quadrado por século. Sua energia chega a ser 100 milhões de vezes mais elevadas do que as de partículas produzidas pelos aceleradores mais poderosos do mundo. Quanto mais elevada for a energia da partícula menos interferência ela sofrerá com o campo magnético da nossa própria galáxia e, portanto, maior a probabilidade de que sua direção de chegada na Terra aponte para a fonte que a produziu.

Concepção artística de técnicas mistas de detecção de chuveiros atmosféricos Crédito: Colaboração Auger

A colaboração Auger analisou 81 partículas de energias superiores a 40 EeV (eletron volts) registradas entre janeiro de 2004 até 31 de agosto deste ano. Destas, apenas 27 com energia superior a 57 EeV atenderam a critérios relativos à significância estatística adotada pela colaboração Auger para estabelecer, sem ambigüidades, uma correlação com fontes. A detecção e reconstrução dos chuveiros atmosféricos são feitas de maneira mais precisa no Auger, porque o Observatório combina duas técnicas que eram antes aplicadas de maneira isolada: tanques detectores de partículas e telescópios que medem luz de fluorescência. Até agora estão instalados 1400 dos 1600 tanques projetados, separados por uma distância de 1,5 quilômetro em uma área total de 3 mil quilômetros quadrados, além de outros quatro “olhos de mosca”, estruturas compostas, cada qual, por 24 telescópios, todos localizados em Malargüe, na Argentina. Os dados indicaram uma forte correlação da trajetória dos raios cósmicos ultra-energéticos com as coordenadas de Núcleos Ativos de Galáxias (AGNs, na sigla em inglês), em uma clara distribuição que privilegia algumas direções no céu ou, no jargão técnico, anisotrópica, em contraposição a uma distribuição isotrópica, como se pensava. Os autores da descoberta, no entanto, são cautelosos ao afirmar que os AGNs são as fontes responsáveis por acelerar estas partículas misteriosas, apontando que talvez os AGNs sejam verdadeiros traçadores das fontes.

Desde 1950, a física de raios cósmicos se dividia em duas linhas para explicar a origem dessas partículas de energias elevadas que atingem a Terra em uma frequência rara. Enquanto os soviéticos defendiam nossa galáxia como sendo a fonte, os norte-americanos e ingleses diziam que a fonte era externa à Via Láctea. Uma das características marcantes da astronomia é estudar os objetos com o maior número de sondas, tais como luz visível, raio X, ondas de rádio. “Agora estamos oferecendo aos astrônomos uma outra sonda, qual seja, as partículas carregadas de altíssimas energias cujas informações devem complementar as informações utilizadas pelos astrônomos”, afirma Carlos Escobar, coordenador da parte brasileira do Auger.

Apesar da descoberta ser um importante passo na física de raios cósmicos, ainda falta, de acordo com Escobar, “refinar as técnicas de análise do Auger no sentido de melhorar a compreensão dos chuveiros e sua composição”. Ainda não é possível afirmar do que são formadas as partículas de energias elevadíssimas, mas os resultados do projeto apontam para um cenário compatível com a composição por prótons.

Área de cobertura do céu pelo Observatório Auger na Argentina.Crédito: Colaboração Auger

O Brasil é um dos 17 países dessa colaboração internacional e participa com 24 dos 370 cientistas. Aqui são cinco agências de fomento que investiram cerca de US$ 3 milhões na parte de instrumentação e software de simulação, reconstrução e análise dos chuveiros atmosféricos. Entre os equipamentos nacionais estão o projeto e execução de tanques Cerenkov de polietileno com 12 mil litros de capacidade, e componentes para os telescópios.

O Observatório Pierre Auger ocupa uma área suficiente para observar todo o céu do hemisfério Sul e muito pouco do hemisfério Norte (veja imagem). A equipe brasileira segue na expectativa da colaboração de que os resultados agora divulgados seduzam o governo norte-americano a concretizar os planos de construção de um observatório no hemisfério Norte. “Um sítio no Norte nos permitirá olhar mais galáxias e buracos negros, aumentando a sensibilidade de nosso observatório. Também existem mais AGNs próximos no céu do hemisfério Norte do que no hemisfério Sul”, afirmou Giorgio Matthiae, colaborador do projeto pela Universidade de Roma. O local escolhido fica no Colorado (EUA) em uma área três vezes maior do que a utilizada pelo seu irmão da Argentina. Serão cerca de 10.370 quilômetros quadrados, o que exigirá um investimento de aproximadamente US$ 100 milhões, ou pouco menos do dobro do custo do Auger do Sul.

Brasil não permite patenteamento de células-tronco

Na maioria dos países do mundo, inclusive no Brasil, o patenteamento de células-tronco é proibido. A Lei de Propriedade Industrial proíbe a concessão de patentes para seres vivos, no todo ou em parte, com exceção dos microrganismos transgênicos que atendam aos requisitos de patenteabilidade que não sejam mera descoberta.

Na maioria dos países do mundo, inclusive no Brasil, o patenteamento de células-tronco é proibido. A Lei de Propriedade Industrial (Lei n.º 9.279/96), em vigor desde14/05/97, proíbe a concessão de patentes para seres vivos, no todo ou em parte, com exceção dos microrganismos transgênicos que atendam aos requisitos de patenteabilidade que não sejam mera descoberta. Na verdade, a patente tem que ser concedida em cima de invenções e não de descobertas ou de conhecimento. Assim, o material modificado em laboratório ganha natureza de “invenção e pode ser patenteado. A simples produção de células-tronco não pode ser protegida por patente, a menos que se agreguem conhecimentos para torná-las tecnicamente úteis e comercialmente aplicáveis.

De acordo com o doutor Nivaldo dos Santos, professor da Universidade Católica de Goiás e da Universidade Federal de Goiás e coordenador do Núcleo de Patentes e Transferência de Tecnologia do estado de Goiás, “ nos termos da Lei n.º 9.279/96, são patenteáveis as invenções que atendam aos requisitos da novidade, atividade inventiva e aplicação industrial.” Para ele, “dentro do ordenamento jurídico brasileiro não há possibilidade de apropriação patenteária ao que diz respeito às células-tronco. Muito embora haja inúmeros pedidos de depósitos de patentes no INPI (Instituto nacional de Propriedade Industrial) nessa área, a lei proíbe tal concessão”.

As empresas de biotecnologia, após modificarem o material encontrado, buscam proteção para seus investimentos junto às patentes. “A patente em si é o modo de proteção que o inventor possui”, diz Santos. Entretanto, o patenteamento de produtos da biotecnologia pode fazer com que os pesquisadores se tornem menos receptivos em compartilhar material e informação. De acordo com Santos, “é natural que ocorra essa falta de receptividade, os investimentos são altos e, normalmente, quando os resultados já podem ser vistos, os investidores desejam logo o que foi investido e os lucros”.

Ludmilla Evelin, pesquisadora do Núcleo de Patentes e Transferência de Tecnologia de Goiás e da Rede Estadual de Propriedade Intelectual e Gestão da Inovação, defende o patenteamento das células-tronco, contudo antes de defender esse lado tão problemático e detentor de diversos debates éticos, apoia um instrumento jurídico capaz de tutelar a pesquisa em todos os seus aspectos, e mais que as pesquisas, o direito à vida. “O desenvolvimento do Brasil deve ser o primeiro objetivo quando esse assunto for discutido. As pesquisas devem acontecer e o patenteamento também, desde que esse conhecimento colabore para a melhoria da qualidade de vida de nossa sociedade e abra maiores oportunidades de concorrência com os demais países”, defende.

Europa

Na Europa são permitidas as patentes de microorganismos como bactérias e vírus até linhagens celulares e elementos isolados do corpo humano, como seqüências de material genético, mas o patenteamento do corpo humano como um todo ou de suas partes, nos vários estágios de sua constituição e de seu desenvolvimento, bem como a simples descoberta de um de seus elementos não podem constituir invenções patenteáveis. As células-tronco, como são parte do corpo humano, não podem ser objeto de direitos de propriedade industrial, bem como qualquer procedimento que inclua este tipo de célula ou outras obtidas a partir delas.

De acordo com Santos, “na Europa, sobretudo na França, o debate bioético tem enfatizado a censura à comercialização do corpo humano. Em 1987, o Comité Consultatif National d’Etique francês emitiu um aviso sobre o uso de células humanas, manifestando posição contrária à sua comercialização. Essa posição foi recentemente confirmada em outro parecer sobre patenteamento das seqüências de DNA identificadas no âmbito do Projeto Genoma Humano. Por outro lado, a Comissão Européia, defendendo a adoção de um instrumento mais abrangente de proteção patenteária, dá relevo à importância da indústria biotecnológica na área médica e considera a ameaça à indústria européia representada pela concorrência de empresas norte-americanas e japonesas.”

Estados Unidos

Os EUA são a única nação que emitiu patentes sobre células-tronco embrionárias humanas, tanto para o método de extração como para as próprias células-tronco. A Suprema Corte declarou, em meados da década de 80, que um microorganismo vivo feito pelo homem é matéria patenteável como manufatura e composição de matéria, relata Santos.

Em 1998, a equipe do biólogo James Thomson, na Universidade de Wisconsin, isolou as primeiras células-tronco de embriões humanos e a patente dessas células foi parar nas mãos da Fundação de Pesquisa Wisconsin Alumni (Warf), ligada à universidade. A Warf licenciou então a patente para a Corporação Geron, companhia californiana que pagou por grande parte da pesquisa de Wisconsin e que possui direitos exclusivos de comercialização no país para três tipos de células derivadas de células-tronco embrionárias, tidas como as mais promissoras em termos clínicos.

Entretanto, muitos pesquisadores americanos temem que as restrições da Warf possam atrasar o desenvolvimento da pesquisa com células-tronco no país. Com o controle de uma patente como esta, a Warf e a Geron poderiam bloquear o caminho da pesquisa com células-tronco, tanto pelo controle de taxas para os pesquisadores usarem as células patenteadas como pela proibição de seu uso. Então, em setembro de 2001, a Wisconsin permitiu que cientistas de outras universidades conduzissem suas próprias pesquisas baseadas nessas patentes.