Questão indígena na escola não desperta interesse da mídia

Resultado da mobilização social, a lei que recupera a questão indígena despertou pouco interesse da mídia. Especialistas acreditam que, com sua implantação, há possibilidade de ganhar visibilidade.

Sancionada em 10 de março de 2008, a Lei 11.645 inclui o ensino da história e da cultura indígenas no currículo oficial do ensino. Em 2003, a Lei de Diretrizes e Bases (LDB) já havia sido modificada pela lei 10.639, para incluir no currículo o ensino da história e cultura afro-brasileira, deixando de lado, no entanto, a questão indígena. Apesar de ser resultado de ampla mobilização social, a nova lei despertou pouco interesse da mídia.

Na opinião do secretário de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade do Ministério da Educação (MEC), André Lázaro, a repercussão na mídia ficou muito aquém do esperado, mas ele acredita que aos poucos sua implementação irá despertar o interesse. De acordo com ele, o trabalho desenvolvido pelo MEC junto às comunidades gerou materiais tanto para as comunidades, quanto para a formação de professores. Lázaro explica que a capacitação dos professores será feita, em um primeiro momento, utilizando o material que já está disponível no site Domínio Público.

A intenção da secretaria é convidar as comunidades indígenas e indigenistas para a produção de material novo, que mostre o passado e o presente. “É um modo da sociedade brasileira abraçar e valorizar a identidade indígena no Brasil”, explica o secretário. Essa é também a opinião do historiador da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), John Manuel Monteiro. “Acredito que um elenco mínimo deveria incluir: as questões da diversidade, no passado e presente; as formas como os índios enfrentaram os desafios da conquista, recolocando o problema da ‘conquista’; e a participação de atores indígenas na história, seja como rebeldes, trabalhadores, soldados ou habitantes das aldeias, vilas e cidades”, argumenta Monteiro.

De acordo com a pesquisadora do Instituto Socioambiental (ISA) e do Núcleo de Estudos de População (NEPO) da Unicamp, Marta Maria Azevedo, conhecer as culturas e a história desses povos é importante para conhecer a nossa própria história, a nossa formação atual. “Para entendermos como nós somos hoje precisamos entender o que herdamos dos povos indígenas e dos povos africanos, porque essa herança, embora seja desconhecida, está nas nossas relações sociais, na nossa cultura musical, literária, etc. Essa lei vem justamente corrigir um pouco essa distorção”.

Da mobilização à Lei

Monteiro explica que não foi a lei 11.645 que criou a idéia de inclusão da história indígena no currículo do ensino médio e fundamental. De acordo ele, “essa lei captou um movimento que já vinha se adensando ao longo dos últimos 25 anos, no qual pesquisadores, educadores e autores de livros didáticos e para-didáticos propuseram uma ampla revisão na maneira pela qual se costuma tratar a temática indígena na escola”.

Azevedo complementa que, na época em que saiu a lei 10.639, as organizações indígenas, a Coordenação de Educação Escolar Indígena do Ministério da Educação (MEC) e a Coordenação de Educação Indígena da Funai reclamaram e batalharam muito para que a lei 11.645 fosse criada. A expectativa, de acordo com a pesquisadora, é a de que ela possa contribuir para diminuir o preconceito. “O preconceito é fruto, entre outras coisas, da falta de conhecimento. Quando as pessoas conhecem um grupo social, fica mais fácil extinguir noções e comportamentos preconceituosos. A ignorância em relação aos índios é resultado daquilo que as escolas não ensinaram e até daquilo que ensinaram”, diz ela.

Wilmar D’Angelis, lingüista da Unicamp, chama a atenção para o fato de que, se por um lado a lei é resultado de mobilização, ela é também resultado de outra mudança, no Estado brasileiro. “O Estado – afirma D’Angelis – nunca foi monolítico, mas já foi mais elitista. Há técnicos que vêm atuando nos últimos anos em vários órgãos do governo e que têm essa compreensão, criando e abrindo novos espaços”.

A pluralidade no currículo

No Brasil há mais de 200 sociedades indígenas com línguas e organizações sociais diferentes. Para resolver essa questão no currículo escolar, D’Angelis espera que aconteça uma regionalização. “Por exemplo, na região sul, o professor pode buscar materiais sobre história e cultura de índios do sul, ainda que ele dê algumas informações mais gerais sobre a diversidade lingüística e cultural dos índios no Brasil”.

Azevedo explica que existem alguns autores, como Araci Lopes da Silva, Luis Donizete B. Grupioni, John M. Monteiro, Benedito Prézia, entre outros, que já publicaram livros que tratam da temática indígena e podem ser utilizados na sala de aula. Mas de acordo com ela, o material existente ainda é escasso e, muitas vezes, desconhecido. Por isso cabe ao MEC distribuir os livros às escolas e incentivar cursos de capacitação para professores.

Essa opinião é partilhada por D’Angelis. Ele acrescenta que, com a lei, existe mais uma oportunidade da intelectualidade indígena se expressar: “eu acredito que seria o momento dos próprios órgãos federais abrirem espaço para que haja formas de publicar trabalhos dessa intelectualidade indígena, já que os próprios índios podem se expressar e se apresentar à sociedade brasileira”.

Sabonete repelente pode ser coadjuvante no combate à dengue

Em meio à epidemia de dengue no Rio de Janeiro, pesquisadores desenvolvem produtos capazes de atuar como repelentes do mosquito Aedes aegypti. Enquanto a Uenf aposta em um sabonete repelente, a Fiocruz e a Embrapa pesquisam inseticidas naturais.

A epidemia de dengue no estado do Rio de Janeiro já contabilizou mais de 43 mil casos da doença este ano. Até esta segunda-feira (dia 31), 67 mortes eram atribuídas oficialmente à dengue no estado. Atentos a essa realidade, pesquisadores da Universidade Estadual do Norte Fluminense (UENF) estão desenvolvendo um sabonete repelente que pode atuar como coadjuvante no combate à doença.

A equipe do Laboratório de Ciências Químicas da universidade, capitaneada por Edmilson José Maria, realiza a pesquisa desde outubro de 2007. O objetivo é obter um sabonete que tenha ação repelente de seis horas e baixo custo para a população.

“A fêmea do mosquito Aedes aegypti atua no período diurno e nossa intenção é a utilização de um sabonete repelente nesse horário para diminuir o tempo de ataque da fêmea e reduzir gradativamente o número de casos”, explica José Maria.

O pesquisador afirma que, ao contrário do uso de repelentes corporais, o banho já é um hábito incorporado, o que facilitaria a aceitação do produto. “Além disso, repelentes corporais, elétricos e inseticidas têm uma relação custo benefício elevada para o padrão da população brasileira”, avalia.

Segundo ele, o sabonete deve ser passado preferencialmente nas áreas do corpo que ficam descobertas, evitando mucosas e feridas, bem como a utilização por crianças com menos de seis anos e mulheres grávidas. “O produto terá as mesmas propriedades dos sabonetes tradicionais e poderá substitui-los em algumas circunstâncias, podendo ser usado em partes do corpo ou em toda sua extensão, dependendo do local onde a pessoa esteja”, explica José Maria.

O sabonete tem em sua composição, além de glicerina, óleos essenciais com comprovada ação repelente contra mosquitos e pernilongos, extraídos de plantas como o capim-limão, a citronela e o cravo-da-índia. “Faremos testes para verificar a eficiência também contra carrapatos”, diz. A fórmula conta ainda com outras substâncias, mantidas em sigilo, que ajudam a aumentar o tempo de ação do produto.

A idéia de produção de um sabonete repelente surgiu quando Edmilson José Maria passou a integrar o grupo de pesquisas sobre biodiesel da UENF e sugeriu a coleta do óleo de fritura usado em estabelecimentos comerciais e associações de moradores para suprir tais pesquisas. “A partir dessa idéia, preconizamos a utilização de parte desse óleo usado e do subproduto do biodiesel, a glicerina, para fazermos sabão, e, posteriormente, pensamos em agregar ao nosso produto substâncias repelentes a mosquitos e pernilongos”, conta.

No momento, o sabonete está em fase de testes com concentrações variadas para delineação do maior poder repelente. Os testes estão sendo efetuados em parceria com as áreas de bioquímica e biologia da universidade. “Nossos esforços estão concentrados somente nessa pesquisa para disponibilizarmos o produto final o mais rápido possível, preferencialmente antes do final do primeiro semestre”, informa Maria. “Nosso intuito é disponibilizar o produto para aquisição preferencial por órgãos públicos ligados à saúde e, posteriormente, pelo público em geral”, completa.

Os pesquisadores, que pretendem patentear o produto, estão abertos a novas parcerias para realização da pesquisa e também para a colocação do produto no mercado. O desenvolvimento de outros produtos com os mesmos efeitos também estão sendo analisados, como uma versão para lavagem de roupas, com maior poder repelente, cremes e adesivos autocolantes.

Larvicida: outra arma

O biolarvicida Bt-horus, desenvolvido pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), também promete contribuir na luta contra o mosquito da dengue. O inseticida biológico, atóxico e eficaz contra as larvas de Aedes aegypti, foi desenvolvido em parceria com a empresa Bthek e consiste na utilização de uma bactéria. Misturada em uma solução, ela serve de alimento para as larvas do mosquito que, ao ingeri-la, tem seu intestino destruído e morrem.

O produto, inofensivo para outros organismos e de fácil aplicação pelos próprios moradores, já foi usado nas cidades de Rio das Ostras (Rio de Janeiro), São Sebastião (Distrito Federal), Três Lagoas (Mato Grosso do Sul) e Sorriso (Mato Grosso). Em todas, o índice de infestação pelo mosquito diminuiu. O Ministério da Saúde ainda não tem previsão para a utilização do produto.

A Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) também desenvolveu um inseticida natural para combater as larvas do mosquito da dengue. O novo biocida é feito a partir de uma substância da Piper solmsianum, planta da família das pimentas. Nativa da Mata Atlântica, a planta é atóxica e não deixa resíduos químicos. Colocado em reservatórios de água, o biocida mata as larvas de insetos. O estudo está em fase de testes de campo e levantamento de custo e o produto deve chegar ao mercado em até quatro anos.

Para saber mais:

Um banho para vencer a batalha contra o mosquito da dengue

Trabalhadores da cana estão ficando à margem do setor produtivo

Queima da cana para facilitar colheita manual coloca em risco a saúde dos cortadores, segundo estudo do Departamento de Saúde Ambiental, da Universidade de São Paulo (USP). Por outro lado, colheita mecânica reduz empregos e exige capacitação à qual os cortadores não têm acesso.

Num país de tantos contrastes, não é de se estranhar que a expansão do setor sucro-alcooleiro se dê às custas dos cortadores de cana. Uma revisão da literatura científica publicada na Revista de Saúde Pública revela os riscos à saúde associados à queima da cana a que estão sujeitos esses trabalhadores, que agora se vêem ameaçados também pela substituição da queima pela colheita mecanizada. A nova ameaça é o desemprego.

Segundo o estudo, as partículas e os gases emitidos na queima – entre eles, o cancerígeno benzopireno – têm efeitos negativos sobre a saúde. Os trabalhadores dos canaviais e a população do entorno são as principais vítimas dessa poluição. As partículas geradas podem penetrar rapidamente nas vias respiratórias e nelas se depositar. Durante exercício físico – neste caso, o trabalho nos canaviais -, em função da maior ventilação pulmonar, o total de partículas depositadas pode aumentar quatro a cinco vezes, e a maioria consegue atingir a corrente sanguínea. Os idosos e os portadores de diabetes e de doenças coronárias e pulmonares correm maior risco.

A queima serve para eliminar a palha e facilitar a colheita manual da cana ou reduzir seu volume. Essa prática aumentou com a expansão do setor sucro-alcooleiro no Brasil, que representou a construção de mais de cem novas usinas, tudo isso graças à ampliação da participação do álcool na matriz energética. Segundo o artigo, no Brasil – que é o maior produtor e exportador mundial de álcool – a produção de cana-de-açúcar atingiu 436,8 milhões de toneladas na safra 2005/2006. O Estado de São Paulo contribui com cerca de 60% desse montante.

Mas, nos canaviais paulistas, a queima da palha da cana está com os dias contados. A lei estadual 11241 de 2002 determinou a eliminação gradual da queima, que deve ser completamente substituída pelas colheitadeiras (colheita mecânica) até 2031. Porém, segundo a autora do estudo, a geógrafa Helena Ribeiro, professora do Departamento de Saúde Ambiental da USP, o uso da colheitadeira traz alguns problemas. “Seu custo elevado (quase um milhão de reais) torna mais complicada sua adoção por proprietários menores e menos capitalizados”, diz ela. Ribeiro acrescenta que a colheitadeira tomba com certa facilidade em terrenos com maior declividade e não elimina o excesso de palha que, mesmo se usada como combustível em usinas, eleva o custo de transporte e, se for deixada no campo, dificulta a germinação da cana. A geógrafa explica ainda que, sem a queima, a cana fica mais susceptível a pragas e doenças.

Para Ribeiro, a eliminação da queima e a substituição pela colheitadeira gerariam ainda muito desemprego no campo e nas pequenas cidades onde a população vive da cana. “Por isso, a lei previu um processo gradual, concomitante com uma capacitação daquela mão de obra empregada na colheita. Acontece que esta capacitação não aconteceu, os novos empregos exigem conhecimento técnico e os cortadores, geralmente com baixa escolaridade, estão ficando à margem do processo produtivo”, alerta. Ribeiro conta ainda que as usinas sentem falta de trabalhadores mais qualificados e que empresários, órgãos de classe e o governo teriam que oferecer cursos técnicos.

Ribeiro acredita que a falta de uma lei nacional que proíba a queima se deve à omissão da sociedade e ao imenso contingente de cortadores do nordeste do país que migram temporariamente para diferentes regiões, seguindo a safra da cana. “Estes têm uma situação ainda pior, pois passam grande parte do ano longe das suas famílias, em alojamentos segregados, exercendo um trabalho pesadíssimo e sem receber nenhum investimento em sua capacitação para que possam assumir outro trabalho”.