Restrição na publicidade infantil quer agir sobre obesidade

Pesquisa diz que 71,6% da publicidade televisiva de alimentos é de produtos com altos teores de açúcar, sal e gordura, e que 50% dessa taxa é direcionada às crianças. A proibição da publicidade infantil, se aprovada, poderá funcionar como uma aliada na promoção de hábitos de alimentação mais saudável.

A criança balança uma cordinha onde está suspenso um chocolate Batom como pêndulo, e diz para a câmera, em tom hipnótico: “Amiga, dona de casa, olhe fixamente para esse chocolate. Toda vez que você sair com o seu filho, vai ouvir minha voz dizendo: compre Batom, compre Batom, seu filho merece Batom”.

A propaganda descrita acima parece encantadora à primeira vista, mas defensores dos direitos das crianças afirmam que anúncios como este estimulam o consumo de produtos pouco saudáveis. Por isso, esperam que o Projeto de Lei (PL no. 5921/01) que proíbe a publicidade de produtos destinados a crianças, aprovado pela Comissão de Defesa do Consumidor da Câmara dos Deputados no dia 9 de julho, possa se tornar um importante mecanismo para conter o avanço de doenças crônicas não transmissíveis, tais como obesidade, diabetes e hipertensão.

De acordo com Elisabetta Recine, coordenadora do Observatório de Políticas de Segurança Alimentar e Nutrição (Opsan), da Universidade de Brasília (UnB), a Lei poderá ter um efeito importante na difusão de hábitos alimentares mais saudáveis entre as crianças. “Praticamente 50% da publicidade de alimentos é dirigida diretamente para o público infantil. Podemos inferir que este tipo de mensagem seja uma das grandes fontes de informações sobre o que elas devem consumir em termos de alimentos”.

No início deste mês, mais uma medida foi tomada com o objetivo de mudar esse quadro. O Conselho Nacional de Segurança Alimentar (Consea) entregou ao ministro da Saúde, José Gomes Temporão, documento com propostas para a promoção da nutrição e alimentação saudável. Entre elas está a regulamentação da publicidade de alimentos.

A Associação Brasileira de Anunciantes (ABA) declarou à ComCiência que não vai se posicionar sobre o PL nem sobre as propostas do Consea. A assessoria de imprensa do Conselho Nacional de Auto-Regulamentação Publicitária informou que o Conselho também não está se manifestando sobre o assunto.

Propagandas de alimentos

Recine coordenou a pesquisa “Monitoramento de Propaganda de Alimentos Visando à Prática da Alimentação Saudável”, realizada pelo Opsan. Os resultados, divulgados em junho, mostraram que 71,6% dos anúncios publicitários de alimentos veiculados em quatro canais de TV (dois abertos e dois infantis fechados) eram de produtos ricos em açúcar, sal e gordura. E 50% desses anúncios eram voltados para as crianças.

Essa percentagem de 71,6% é composta pela soma dos cinco tipos de alimentos mais freqüentes nas peças de publicidade: fast-food (18,4%); guloseimas e sorvetes (16,9%); refrigerantes e sucos artificiais (13,7%); salgadinhos de pacote (12,8%); e biscoitos doces e bolos (9,8%).

Sobre a importância do PL, Recine ressalta que as crianças são mais vulneráveis às propagandas televisivas, sobretudo porque a TV é a sua principal fonte de lazer. “E uma criança obesa tem fortes probabilidades de se tornar um adolescente obeso e, posteriormente, um adulto obeso, sendo a obesidade a patologia ’de base’ de outras doenças crônicas”.

Além disso, entre as conclusões da pesquisa do Opsan está a de que as peças publicitárias utilizam estratégias de marketing voltadas ao público infantil, que provocam a identificação das crianças com os produtos – geralmente alimentos relacionados ao aumento da incidência de sobrepeso e obesidade entre a população.

Segundo informações disponíveis na página do Projeto Criança e Consumo, do Instituto Alana, a televisão é a principal mídia utilizada pela publicidade. Ao cruzar essa informação com dados do Painel Nacional de Televisores (Ibope 2007) – que mostra que a criança brasileira passa mais de quatro horas e meia por dia assistindo à programação televisiva – o impacto da publicidade na infância ganha dimensões preocupantes.

Publicidade Infantil

Além de proibir qualquer tipo de propaganda direcionada às crianças, o PL, que tramita em caráter conclusivo, restringe a publicidade dirigida a adolescentes e estabelece mecanismos de fiscalização, bem como multas aos infratores. (Ver boxe)

Para Isabella Henriques, coordenadora geral do Projeto Criança e Consumo, regulamentar a publicidade infantil é necessário para que crianças e adolescentes sejam colocados a salvo do bombardeio publicitário a que são submetidas diariamente. “A publicidade passa valores consumistas e propaga a idéia de que para ’ser’ é necessário ’ter’. Quando dirigida às crianças, é nociva porque elas não compreendem seu caráter persuasivo. Se a publicidade diz que determinado produto é essencial para a sua vida, elas acreditam”.

Panorama mundial

No livro “A publicidade dirigida às crianças e adolescentes – regulamentações e restrições” (Memória Jurídica, Porto Alegre, 2002), a advogada Noemi Momberger traça um panorama mundial sobre o tema.

A autora mostra que em países da Europa e de outras partes do mundo a publicidade infantil é regulamentada. Na Suécia, é proibida a propaganda voltada para crianças em horário anterior às 21h, tanto em TV como em rádio. De forma semelhante, a Noruega proíbe publicidade televisiva dirigida às crianças, bem como a veiculação de comerciais durante os programas infantis. Já na Holanda, é vetado às televisões públicas transmitir qualquer tipo de publicidade durante programas direcionados a menores de 12 anos.

Em países como Inglaterra, Estados Unidos e Canadá, a publicidade infantil não é proibida, mas restrita e condicionada à observância de uma série de requisitos.

Boxe

Restrições previstas pela PL

Caso a PL seja aprovada, os publicitários e anunciantes terão que observar alguns aspectos antes de colocar uma campanha publicitária no ar:

  • É considerada publicidade e comunicação mercadológica dirigida às crianças aquela que apresenta aspectos como linguagem infantil, efeitos especiais e excesso de cores, trilhas sonoras de músicas infantis ou cantadas por crianças, pessoas e celebridades com apelo entre o público infantil, desenho animado ou animação, entre outros.
  • Publicidade e comunicação mercadológica abrange anúncios impressos, comerciais de TV, spots de rádio, banners e sites na internet, embalagens, promoções, merchandising e disposição dos produtos nos pontos de venda;
  • Fica proibida a participação de crianças em qualquer tipo de publicidade ou comunicação mercadológica, voltada para as crianças ou não (exceto campanhas de utilidade pública);
  • A publicidade voltada para os adolescentes deve seguir alguns princípios gerais, como não permitir que a influência do anúncio leve o adolescente a constranger seus responsáveis e não induzir, mesmo implicitamente, sentimentos de inferioridade no adolescente, caso este não consuma determinado produto ou serviço.
  • Os infratores estarão sujeitos a multas, cujo valor será decidido conforme a gravidade da infração e situação econômica do infrator e não poderá ser inferior que 1 mil, nem superior a 3 milhões de Unidades Fiscais de Referência.

Fonte: Portal da Câmara dos Deputados

Leia mais:

O controle social sobre a publicidade infantil

Instituto Alana (Projeto Criança e Consumo)

Resultados da pesquisa realizada pelo Opsan

Plantas medicinais: mais um aliado para o tratamento de alergias

Pesquisadores estudam a aplicação terapêutica e profilática de plantas medicinais para o tratamento de alergias. Lafoensia pacari (dedaleira ou magava brava) e Solanum asperum (coça-coça ou jurubeba-branca) são apontadas como possíveis fontes de metabólitos secundários com propriedades antiinflamatórias.

Foi da casca da mangava brava, uma planta típica do cerrado, que pesquisadores derivaram um extrato alcoólico que se mostrou eficaz no tratamento e prevenção de alguns sintomas da asma, em camundongos. O artigo, publicado este ano no periódico científico European Journal of Pharmacology (Vol.580; n.1-2, 2008), “abriu perspectiva para o uso dessa planta no tratamento de processos alérgicos”, destacou Lúcia Faccioli, da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto, da Universidade de São Paulo (USP), líder do trabalho realizado em colaboração com Momtchilo Russo, do Departamento de Imunologia da USP.

Lafoensia pacari (arbusto e detalhe da casca) Foto: Maria de Fátima Barbosa Coelho

Faccioli contou que a idéia de estudar a mangava brava, também conhecida como dedaleira (Lafoensia pacari St.Hill), surgiu após contato com Deijanira Albuquerque, da Universidade Federal do Mato Grosso, que pretendia demonstrar cientificamente as propriedades antiinflamatórias da planta usada popularmente para úlcera gástrica, combate a febre, tônico e cicatrizante. No Paraguai, a planta é chamada de morosyvo e é utilizada para o tratamento de câncer.

Conduzido principalmente por Alexandre Rogério, os trabalhos resultantes dessa linha de pesquisa já haviam mostrado efeitos antiinflamatórios da dedaleira em modelos experimentais de infecção. Além disso, o ácido elágico – composto fenólico encontrado em muitos alimentos, dentre eles o morango, e um dos metabólitos secundários da dedaleira – foi identificado como responsável por esses efeitos, explica Faccioli.

No trabalho atual, os pesquisadores utilizaram o modelo clássico de induzir alergia em camundongos usando o alérgeno ovalbumina, uma proteína de ovo de galinha. Quando administrada em condições e intervalos adequados, a proteína leva ao desencadeamento de vários sintomas da asma, como intensa infiltração de células no pulmão, liberação de moléculas inflamatórias, dificuldade em respirar quando desafiado com substância broncoconstrictora, produção exacerbada de muco no pulmão, entre outros.

Quando tratados com o extrato da planta, assim como com o ácido elágico, os camundongos apresentaram uma diminuição no número de eosinófilos e neutrófilos – células inflamatórias – no pulmão em comparação com os alérgicos não tratados. Além disso, os pesquisadores observaram também uma inibição na liberação de citocinas como IL-5, IL-4 e IL-13, moléculas aumentadas em processos inflamatórios com predomínio de eosinófilos, como aqueles que ocorrem nas alergias, na asma e em algumas parasitoses, afirma a pesquisadora.

Mas nem todos os atributos importantes da asma foram controlados com o tratamento. O extrato da mangava brava foi incapaz de inibir significativamente a síntese de substâncias (leucotrienos), que causam broncoconstricção, secreção de muco e aumento da permeabilidade vascular característicos da asma. Contudo, os pesquisadores observaram uma tendência do tratamento com ácido elágico em diminuir a síntese de leucotrienos. E concluem: “Esses tratamentos reduziram alguns dos mais significativos fenótipos relacionados com a asma”, o que confirma o uso popular da mangava brava como agente antiinflamatório. Além disso, Faccioli destaca que “há indicativos que o extrato alcoólico da Lafoensia pacari não é tóxico”, com base em ensaios in vitro e in vivo.

Extrativismo

E de onde são coletadas as plantas para a obtenção do extrato? “É um problema uma espécie ser indicada para uso farmacológico e não ser cultivada”, destaca Maria de Fátima Barbosa Coelho, da Universidade Federal Rural do Semi-Árido, no Rio Grande do Norte. A pesquisadora afirma que desconhece que a Lafoensia pacari seja cultivada para a extração da casca para uso medicinal. No entanto, isso não seria problema, uma vez que “suas sementes germinam com facilidade, pode-se fazer mudas e transplantar para o campo aos cinco ou seis meses, e com cerca de três anos algumas plantas já apresentam um bom desenvolvimento do tronco e poderiam fornecer cascas”, orienta a pesquisadora. Laércio Wanderlei dos Santos, que desenvolveu sua dissertação de mestrado com Maria de Fátima Coelho, obteve bons resultados com adubação orgânica da mangava brava em Barra do Garças, Mato Grosso.

Opções de plantas medicinais não faltam na vasta biodiversidade brasileira. Outra possibilidade que vem sendo aventada pelos pesquisadores é o uso de flavonóides – substâncias químicas encontradas principalmente em frutas e verduras vermelho-alaranjada, em polens e em flores – para o tratamento e prevenção de alergias. Karina Carla de Paula Medeiros e Márcia Regina Piuvezam, do Programa de Pós-Graduação em Produtos Naturais e Sintéticos Bioativos da Universidade Federal da Paraíba, desenvolvem atualmente projeto em colaboração com Russo, para o estudo de um flavonóide derivado do kanferol, extraído das partes aéreas da planta Solanum asperum Richard, conhecida popularmente por coça-coça, jussara, jurubeba-branca ou velame-bravo. O objetivo é avaliar o efeito da administração desse flavonóide tanto na prevenção quanto no tratamento da asma já estabelecida, no mesmo modelo experimental em camundongos descrito acima. Dados preliminares sugerem que o derivado do kanferol inibe reações inflamatórias, bem como melhora a função pulmonar relacionada com a asma alérgica; no entanto, os mecanismos envolvidos do flavonóide para tais efeitos ainda estão em investigação. “Entendendo os mecanismos básicos é possível desenvolver produtos que atuem durante a sensibilização com o alérgeno ou diminuam os sintomas do indivíduo já sensibilizado”, conclui Russo.

Solanum asperum Richard e flavonóide derivado.
Foto: Tania Maria Sarmento da Silvav

Lançado primeiro guia sonoro para identificar sapos

Você já ouviu a barulheira de uma lagoa ao cair da noite? Às vezes não sabemos se são sapos, insetos ou mesmo a vegetação que range, imagine ainda poder distinguir entre as diferentes espécies de anfíbios ali presentes. Assim o faz o CD Guia Sonoro dos Anfíbios Anuros da Mata Atlântica lançado neste mês, produzido sob a coordenação de Célio Haddad, do laboratório de Herpetologia da Unesp de Rio Claro, e que reúne amostras do canto de 70 espécies de sapos, rãs e pererecas (anuros) da Mata Atlântica, além de um livreto com fotos e informações básicas em português e inglês.

Você já ouviu a barulheira de uma lagoa ao cair da noite? Às vezes não sabemos se são sapos, insetos ou mesmo a vegetação que range, imagine ainda poder distinguir entre as diferentes espécies de anfíbios ali presentes. Assim o faz o CD Guia Sonoro dos Anfíbios Anuros da Mata Atlântica lançado neste mês, produzido sob a coordenação de Célio Haddad, do laboratório de Herpetologia da Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Rio Claro, e que reúne amostras do canto de 70 espécies de sapos, rãs e pererecas (anuros) da mata atlântica, além de um livreto com fotos e informações básicas em português e inglês.

Além de um agradável som, o material traz importantes dados que permitem a qualquer curioso identificar o animal e saber onde procurá-lo (na água, na beira da lagoa, na folhagem ou outros locais). Algumas espécies aparecem em mais de uma faixa, como é o caso do macho da rã-assobiadora que coaxa de forma bem diferente se seu intuito é atrair fêmeas ou espantar adversários. Além disso, há também exemplos de coros. Entre eles há um em que se pode ouvir a perereca-de-colete, a pererequinha-do-brejo, a perereca-verde, o sapo-ferreiro e a perereca-do-litoral, que se não puderem ser identificadas em conjunto, podem ser ouvidas individualmente nas faixas correspondentes. Os coaxos destes animais estão presentes no CD. Da esquerda para a direita: perereca-de-colete, pererequinha-do-brejo, perereca-verde, sapo-ferreiro e perereca-do-litoral

Para quem faz trabalho de campo, reconhecer vocalizações é essencial para localizar espécies de interesse ou fazer um inventário zoológico. Haddad afirma que os próprios especialistas têm necessidade de um guia como o CD recém lançado, uma vez que a fauna de anuros varia ao longo da mata atlântica.

Em muitos países uma abundância de guias de campo permite a qualquer pessoa investigar a natureza a seu redor. No Brasil, até agora existiam guias sonoros somente para cantos de aves, como os de autoria do ornitólogo Jacques Vielliard, da Unicamp. Outros países da América Latina, como Bolívia, Argentina e Panamá, já têm cantos de anuros disponíveis em CD. Nos Estados Unidos e na Europa a oferta é bem maior. Segundo João Giovanelli, um dos autores do CD brasileiro, a idéia surgiu do trabalho feito pela fonoteca da Biblioteca de Londres. Entre outras coisas, o acervo inclui uma riquíssima coleção de sons naturais, que se pode ouvir pela internet. O site traz também listas de guias sonoros de outras partes do mundo.

A Unesp de Rio Claro também possui um acervo que inclui vocalizações colhidas por Haddad desde a sua graduação, assim como amostras cedidas por colaboradores. O material já é suficiente para que, em breve, seja compilado um guia sonoro para o cerrado e o pantanal.

A mata atlântica abriga cerca de 50% da diversidade de anuros do Brasil, muitas das quais só ocorrem nela (endêmicas). Com a drástica destruição sofrida por esse ecossistema (resta apenas 7% de área original), muitas destas espécies podem estar ameaçadas de extinção. Segundo a Lista da Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção, 13 espécies de anuros da mata atlântica estão ameaçadas.

Leia mais:

– Informações sobre sons da natureza (em espanhol)

– Fonoteca zoológica do Museu Nacional de Ciências Naturais de Madri (em espanhol e inglês)