Assinada moção contra extinção de comitê de divulgação científica do CNPq

Assembléia Geral Ordinária de Membros da SBPC reunida na noite de quinta-feira (17) aprovou uma moção enviada pela Associação Brasileira dos Centros e Museus de Ciência (ABCMC) ao ministro da Ciência e Tecnologia, Sergio Rezende, contra a extinção de um comitê temático que tratava de projetos e bolsas na área de divulgação científica no CNPq.

Assembléia Geral Ordinária de Membros da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) reunida na noite de quinta-feira (17) aprovou uma moção (abaixo) enviada pela Associação Brasileira dos Centros e Museus de Ciência (ABCMC) ao ministro da Ciência e Tecnologia, Sergio Rezende, contra a extinção de um comitê temático que tratava de projetos e bolsas na área de divulgação científica no Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Desde o começo do ano o comitê em questão já não figura no site da instituição, o que já impossibilitava o envio de projetos e, a partir de 2009, pode deixar de existir. A moção sugere também a criação de algum mecanismo permanente que possa substituir o comitê e que possa selecionar e financiar projetos de pesquisa, eventos ou outras atividades de divulgação científica, além de pesquisadores e profissionais da área.

Antonio Carlos Pavão, presidente da ABCMC, acredita que “a postura do CNPq vai contra a tendência nacional e internacional. Estados Unidos e Europa estão aumentando as verbas na área por entenderem a necessidade de socialização da ciência. No Brasil, o Ildeu Moreira de Castro, secretário de Popularização e Difusão da Ciência e Tecnologia (do Ministério da Ciência e Tecnologia), procura ampliar os projetos nessa área, enquanto o CNPq opta por uma postura conservadora e retrógrada. Isso não ajuda em nada a diminuir a distância entre os que fazem ciência e a sociedade. É um sinal claro da postura elitista daqueles que se acham ‘donos’ da ciência”, desabafou. Pavão acredita também que é necessário o reconhecimento dos pesquisadores, instituições e profissionais envolvidos no processo de democratização da ciência. “No caso dos museus e centros de ciência é reconhecido nosso valor como espaços de educação formal e informal, porém com essa decisão do CNPq perdemos espaço na discussão e financiamento para novos projetos, além de perder mão-de-obra qualificada, como é o caso dos bolsistas ou pesquisadores envolvidos com algum projeto em andamento”, afirma. Ele, porém, não deixa de citar iniciativas mais positivas na área, que é o caso dos projetos e bolsas temáticas das agências financiadoras estaduais como a Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e de suas equivalentes no Rio de Janeiro, Bahia, Minas Gerais e Pernambuco.

Leia a seguir o texto da moção

“Nos últimos anos têm crescido significativamente os programas de difusão e popularização da ciência no País, promovendo uma exploração ativa, o envolvimento pessoal, a curiosidade, o uso dos sentidos gerando a indagação e o interesse pela ciência. Este crescimento está explicitamente relacionado com a criação do Departamento de Popularização e de Difusão da Ciência e Tecnologia vinculado à Secretaria de Ciência e Tecnologia para Inclusão Social (SECIS) do MCT e do Comitê Temático de Divulgação Científica do CNPq. Como a atuação efetiva deste Comitê está suspensa, os projetos para esta área estão sem acompanhamento permanente para avaliação.

Desta forma, professores, pesquisadores e dirigentes de Centros e Museus de Ciências reunidos durante a 60º Reunião Anual da SBPC de 13 a 18 de julho de 2008 vêm solicitar ao Ministro da Ciência e Tecnologia, Dr. Sergio Machado Rezende, a manutenção de mecanismo permanente no CNPq para analisar, julgar, selecionar, acompanhar e financiar projetos de pesquisas, eventos e outras atividades de divulgação científica, bem como a formação de recursos humanos, que contemplem instituições e profissionais dedicados consistentemente à Divulgação e Popularização da Ciência e Tecnologia.”

Pesquisadores precisam de estímulo para divulgação científica

Em palestra realizada durante a 60a Reunião Anual da SBPC, em Campinas (SP), pesquisadora defende a divulgação científica como antídoto para melhorar a apropriação de conhecimento sobre assuntos de ciência e tecnologia e sugere estímulos a atividades de divulgação por cientistas.

“A circulação e a apropriação social de informação e conhecimento sobre ciência e tecnologia são fundamentais no desenvolvimento sócio-econômico de um país”. Foi partindo desta premissa básica que Maria Lucia Maciel defendeu que cientistas precisam ser estimulados a divulgar os resultados de suas pesquisas para um público mais amplo, em palestra realizada ontem (14), na reunião anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), em Campinas (SP).

A pesquisadora da Universidade Federal do Rio de Janeiro destacou que os debates atuais e intensos sobre ciência e tecnologia (C&T) são restritos a um universo microscópico: poucas pessoas participam de tais discussões, que têm conseqüências práticas como o uso de transgênicos na agricultura, células-tronco na medicina, ativação de usinas nucleares, transposição do rio São Francisco, apenas para citar alguns exemplos. “São assuntos da maior relevância e que incidem na vida cotidiana”, afirma Maciel, que também é diretora do Instituto Ciência Hoje e coordenadora do Laboratório interdisciplinar sobre informação e conhecimento (Liinc). No entanto, chama a atenção o alto grau de desconhecimento da população sobre tais temas, independentemente do grau de instrução, o que gera, por exemplo, decisões desinformadas por parte dos políticos.

Tal desconhecimento não é resolvido apenas com o acesso à informação e ao conhecimento possibilitado pelas novas tecnologias de informação e comunicação. Em países periféricos como o Brasil, o problema não é receber o conhecimento. “Você recebe o conhecimento, mas este não é apropriado e acaba sendo apropriado apenas por aquele que o produz”, pondera a pesquisadora.

Sendo assim, como solucionar o problema desta precária apropriação? Um antídoto, sem dúvida, é a educação. No entanto, seus primeiros efeitos só seriam sentidos daqui a uns 20 anos, afirma a pesquisadora. Nesse contexto, entra em cena a divulgação científica, como um antídoto válido e importante e que pode abarcar uma proporção maior da população nas diversas discussões sobre C&T. Para Maciel, o “cidadão comum” tem direito à informação correta e precisa para, entre outras coisas, multiplicar suas possibilidades de escolha. “Na Dinamarca, comitês de cidadãos participam da decisão de temas científicos que serão financiados”, exemplifica a pesquisadora.

No Brasil, ela constatou dois tipos de barreira ao fluxo de informação científica, entraves que terminam por limitar ou retardar o desenvolvimento de uma divulgação científica de qualidade. A primeira barreira é entre os cientistas e a imprensa: dificuldade de comunicação entre cientista e jornalista e espaço restrito na “grande imprensa”. Resgatando uma fala de três anos atrás, também na SBPC, Maciel observou uma melhora nestes quesitos: aumento de espaço e criação de editorias de ciência em alguns jornais, apesar da redução radical da editoria de ciência do jornal Folha de São Paulo.

Citando estudos de percepção pública da ciência realizados pelo Ministério da Ciência e Tecnologia, pelo Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo Científico da Universidade Estadual de Campinas (Labjor/Unicamp) e pelos cientistas Crodowaldo Pawan e Luisa Massarani, a pesquisadora destacou que o público continua interessado por assuntos de ciência, mas por outro lado, segue frustrado por não obter informação suficiente e de qualidade.

Além de ocupar pouco espaço na grande imprensa – assuntos de C&T ocupam menos de 3% do tempo de notícias das emissoras de rádio, por exemplo – Maciel destacou também que na última campanha eleitoral para presidente apenas um candidato – o atual senador Cristovam Buarque – falou de C&T como uma de suas propostas de governo e apenas um editorial comentou o assunto.

O segundo tipo de barreira, segundo a pesquisadora, está colocado entre os organismos governamentais e a divulgação pelos cientistas. “Há uma total falta de estímulo, apesar de algumas iniciativas presentes como o comitê de divulgação científica do CNPq, liderado pelo Prof Ildeu de Castro Moreira e a semana Nacional de C&T”. O esforço existe, mas é um esforço de certa forma esquizofrênico, pois estimula a divulgação científica, mas desestimula o cientista de divulgar, segundo Maciel. Hoje em dia o cientista vive em função do currículo Lattes, tanto por imposição do CNPq quanto da CAPES. Os critérios de excelência considerados nas avaliações de bolsas, projetos e programas de pós-graduação valorizam a publicação de artigo científico em periódico internacional e, com isso, os cientistas padecem de pouco tempo para escrever divulgação científica. “Há avanços mas entraves”, conclui.

Por fim, Maciel propôs agendas de pesquisa e de ação. Dentro da agenda de pesquisa algumas questões são atualmente estudadas dentro do projeto “Informação pública e divulgação científica: relações de produção e de difusão social da informação em ciência”, liderado pela pesquisadora.

Para a agenda de ação, Maria Lucia Maciel sugere que trabalhos de divulgação científica passem a contar pontos para os pesquisadores, tanto na avaliação de programas de pós-graduação quanto para os pesquisadores individuais. Além disso, “incluir em todos os editais de apoio a pesquisa a obrigatoriedade de atividades de divulgação”, aconselha.

USP produz alternativa ao soro antiofídico

Pesquisadores da Faculdade de Medicina da USP de Ribeirão Preto estão produzindo uma substância que pode substituir o soro antiofídico em caso de acidentes com animais peçonhentos.

Uma pesquisa realizada na Faculdade de Medicina da USP de Ribeirão Preto (FMRP) resultou na produção de uma substância que poderá ser utilizada da mesma forma que é utilizado atualmente o soro antiofídico. Trata-se de um anticorpo monoclonal humano, uma substância produzida por engenharia genética que se liga às proteínas do veneno e, assim, bloqueia suas ações nocivas. Anticorpos monoclonais são proteínas produzidas em laboratório a partir de uma única célula de defesa, sendo, portanto, idênticas em relação às suas propriedades físico-químicas e biológicas.

“Após acidente com o animal peçonhento, os anticorpos administrados ao paciente irão se ligar às proteínas do veneno, impedindo sua ação”, explica José Elpidio Barbosa, professor do departamento de Bioquímica e Imunologia e coordenador do Laboratório de Imunopatologia Molecular da FMRP.

Para a produção do antiveneno, os pesquisadores utilizam uma biblioteca composta por bacteriófagos, desenvolvida pelo Centro de Engenharia de Proteínas da Universidade de Cambridge, na Inglaterra. Os bacteriófagos são vírus capazes de infectar bactérias e que expressam em sua superfície fragmentos de anticorpos capazes de identificar uma grande diversidade de alvos, inclusive as substâncias tóxicas dos venenos. Pela técnica utilizada, chamada phage display, os bacteriófagos são colocados em contato com veneno de cobra em tubos de ensaio, e aqueles que se ligam ao alvo são escolhidos e utilizados para infectar bactérias. No decorrer do processo, as bactérias recebem a informação genética dos vírus selecionados e passam a produzir anticorpos que evitam as lesões tóxicas causadas pelo veneno.

Anualmente, são notificados mais de 20.000 acidentes com serpentes peçonhentas ao Ministério da Saúde. Segundo dados da Fundação Nacional da Saúde (Funasa), entre 1990 e 1993, cerca de 90,5% dos casos notificados foram atribuídos às serpentes do gênero Bothrops (jararacas), 7,7% ao gênero Crotalus (cascavéis), 1,4% ao gênero Lachesis (surucucus) e 0,4% ao gênero Micrurus (corais verdadeiras).

O tratamento realizado quando uma pessoa é picada por uma serpente peçonhenta é feito com o soro antiofídico, produzido em eqüinos há mais de um século pelo Instituto Butantan, responsável pela produção de mais de 80% do total de soros e vacinas consumidas no Brasil. Por essa técnica, o veneno da serpente – ou de outro animal peçonhento, como escorpião ou aranha – é desidratado e cristalizado para armazenamento.

Para ser utilizado no processo de produção do soro antiofídico, o veneno é diluído e injetado no cavalo, que passa a produzir anticorpos para tentar combatê-lo. Quando o nível de anticorpos desejado é atingido, em média 40 dias depois da injeção do veneno, cerca de quinze litros de sangue do cavalo são recolhidos em três etapas, com um intervalo de 48 horas. O soro é obtido a partir da purificação e concentração do plasma (parte líquida do sangue) e, então, pode ser utilizado em pacientes.

Já a produção de anticorpos humanos pela técnica de phage display não utiliza animais para imunização e praticamente elimina o risco de ocorrerem reações adversas de hipersensibilidade, que são reações indesejáveis à presença da proteína do animal no corpo. Segundo Barbosa, não há necessidade de grandes quantidades de veneno para a produção da substância, o que é uma vantagem quando são utilizados na produção dos anticorpos animais que produzem pouco veneno, mas que podem provocar a morte, como a cobra coral, por exemplo. Além disso, não há necessidade de se manter um serpentário grande. Outra vantagem é que as bactérias produtoras destas moléculas permanecem vivas quando mantidas em congelador a -80ºC e podem ser utilizadas por longos períodos.

Até o momento, a substância foi testada com veneno de jararacussu e de cascavel, mas outros antivenenos estão sendo pesquisados. “Estamos estendendo nossas pesquisas para venenos de abelhas africanizadas, escorpião, aranha armadeira e serpente coral”, diz Barbosa. Segundo o pesquisador, ainda há um longo caminho a ser percorrido, como aperfeiçoar o método de purificação desses fragmentos, numa escala que permita a realização de ensaios mais avançados. “Precisamos conhecer melhor essas moléculas, seqüenciando-as para, se necessário, melhorar ainda mais a capacidade de bloquear os venenos. Mas elas já se mostraram eficientes, tanto em ensaios in vitro como in vivo, em camundongos”, explica. As pesquisas estão sendo financiadas pela Fapesp e pelo CNPq.