Colocação profissional aumenta autonomia de deficientes

Ministério do Trabalho e Emprego realiza em Brasília conferência para discutir a inclusão no mercado de trabalho de jovens com deficiência . Já em São Paulo, pesquisa realizada na Unifesp aponta que pessoas com síndrome de down que têm emprego são mais sociáveis, comunicativas e independentes.

A participação no mercado de trabalho de pessoas com deficiência ganha destaque com um evento promovido pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). Realizada no dia nove de abril e com o lema “Nada sobre nós, sem nós”, a Conferência Livre foi a primeira a dar voz ao contingente de jovens que têm algum tipo de deficiência e está em busca de emprego.

O principal objetivo da conferência foi levantar propostas de ação que possam ser implementadas pelo MTE visando a qualificação e inclusão profissional de pessoas com deficiência. A dificuldade de acesso ao mercado de trabalho, o crescimento profissional com dignidade e a discriminação foram os temas debatidos. As propostas levantadas serão enviadas à Conferência Nacional da Juventude, que acontece entre os dias 27 e 30 de abril. Ainda nesse semestre, o ministério vai lançar o Plano Setorial de Qualificação (Planseq) em âmbito nacional e específico para pessoas com deficiência.

A luta das pessoas com deficiência para garantir o acesso justo ao emprego não é nova. Mesmo com instrumentos como a Lei de Cotas, a maior parte das pessoas que têm algum tipo de deficiência está à margem do processo produtivo. E, para essas pessoas, o prejuízo pode não ser apenas financeiro, mas também social.

Socialização e comunicabilidade

Uma pesquisa realizada na Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) aponta que pessoas com síndrome de down que trabalham têm melhor socialização e comunicação, mais autonomia, maior capacidade de lidar com dinheiro e assumir responsabilidades, além de sonhos e metas mais realistas.

Maria Luiza Gomes Machado, psicóloga, psicopedagoga e funcionária do Setor de Capacitação e Orientação para o Trabalho da Associação dos Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE) de São Paulo realizou um levantamento junto a 36 pessoas com síndrome de down leve e moderada, com idades entre 20 e 29 anos, que freqüentavam a instituição.

A pesquisadora havia notado em seu trabalho na APAE que, ainda que as pessoas com síndrome de down fossem maioria entre as atendidas pela instituição, poucas chegavam à etapa de capacitação e orientação para o trabalho. Segundo ela, a maior parte era encaminhada para programas ocupacionais. A inquietação sobre os motivos que levavam a esse quadro deu origem a sua dissertação de mestrado, realizado pelo Programa de Pós-Graduação em Distúrbios da Comunicação Humana, Campo Fonoaudiológico, sob orientação da professora Brasília Maria Chiari.

A psicóloga procurou detectar quais habilidades adaptativas eram mais importantes para a inclusão profissional, qual era a expectativa dos pais em relação ao futuro profissional de seus filhos e de que forma essa expectativa influenciava na obtenção das referidas habilidades. Por fim, comparou o grupo dos incluídos no mercado de trabalho ao dos não incluídos para saber qual apresentava maiores índices de alteração comportamental.

Das 36 pessoas com síndrome de down, selecionadas aleatoriamente por Machado, nove trabalhavam. Foram realizadas entrevistas com essas pessoas e seus pais, bem como testes para determinar a escala de maturidade social de cada uma.

Os nove indivíduos que trabalhavam apresentaram maior autonomia, desinibição, organização, interação social e senso de responsabilidade. Também demonstravam maior disponibilidade para realizar tarefas, eram mais tolerantes a frustrações e limites e tomavam mais iniciativa diante dos problemas. “O ambiente de trabalho organiza a mente da pessoa. E as normas que regulamentam esse ambiente são levadas para o cotidiano”, explica Machado.

Ela detectou também que a expectativa dos pais tem papel importante no futuro profissional dos filhos. “Todos os pais de filhos incluídos anteviam um futuro profissional. Já entre os não incluídos, 97,8% dos pais nunca acreditaram que seus filhos chegariam ao mercado de trabalho”, revela. Segundo Machado, as expectativas dos pais afetam o futuro dos filhos na medida em que, ao acreditarem que a inclusão profissional é possível, procuram dar espaço para a autonomia e para as conquista individuais.

Fora do mercado

Já entre os pais dos não incluídos, predominaram sentimentos ambivalentes sobre a possível conquista profissional e prevaleceu a superproteção. “Ao superprotegerem os filhos, não lhes permitiram desenvolver suas habilidades”, avalia a pesquisadora. Sendo assim, as pessoas com síndrome de down não incluídas tampouco manifestavam grande interesse de colocação no mercado de trabalho.

E foi nesse mesmo grupo que Machado constatou mais alterações comportamentais, como birra, teimosia, insegurança, ansiedade, irritabilidade e impulsividade. “Essas pessoas se mostraram mais dependentes e infantilizadas e com menos desenvoltura”, diz.

Com relação à colocação da pessoa com deficiência no mercado, a pesquisadora enfatiza a importância não apenas da pessoa com síndrome de down estar capacitada, mas também do empregador estar disposto a fazer essa inclusão, adaptando-se quando necessário. “É preciso colocar a pessoa certa no lugar certo”, resume. A pessoa com deficiência deve exercer funções adequadas a sua capacidade cognitiva, mas, no geral, deve respeitar as mesmas regras impostas aos demais trabalhadores.

Pela sua experiência na APAE, Machado relata que, por conta da Lei de Cotas, diversas empresas estão fazendo a inclusão profissional. Ainda que muitas contratem pessoas com deficiência apenas para cumprir as exigências, outras já descobriram efetivamente o valor dessa mão-de-obra. “E quando essa pessoa percebe que consegue produzir, que está sendo útil e recebe elogios pelo trabalho realizado, ganha confiança e aumenta sua auto-estima”, explica.

Água salobra do semi-árido pode ser usada em culturas

Pesquisas pretendem ajudar a desenvolver as regiões de semi-árido através de empreendimentos capazes usar de forma racional e controlada a água salobra comum nessas regiões.

Conseguir usar a água salobra em criações e culturas vegetais seria uma solução importante para muitas regiões do semi-árido brasileiro. Nesses lugares há ocorrência de águas subterrâneas salobras. A hidroponia, a cultura de microalgas e a criação de tilápias são aplicações que alguns cientistas estão encontrando para esse líquido. O engenheiro agrônomo Tales Miler Soares, da Esalq-USP, em Piracicaba (SP), é um dos que se debruçam sobre esse tema.

Soares e sua equipe verificam condições para o uso da água salobra na hidroponia. Ele apostou que nesse tipo de cultura, que utiliza meio aquoso no lugar da terra, as plantas iriam tolerar uma maior salinidade do que se estivessem no solo. Os resultados mostraram que ele estava correto. Além da estrutura experimental desenvolvida em Piracicaba, outras duas estão sendo finalizadas com resultados semelhantes, uma em Cruz das Almas-BA (Universidade Federal do Recôncavo da Bahia) e outra em Ibimirim-PE (Universidade Federal Rural de Pernambuco).

Numa próxima etapa, as pesquisas devem avaliar o desempenho dessas estruturas em regiões do semi-árido. Com isso, serão estudados e antecipados os problemas que uma cultura hidropônica enfrentaria nessas áreas e os experimentos seriam condizentes com o tipo e com a disponibilidade de água salobra nelas encontrado. Além disso, seria estudado um melhor aproveitamento da solução nutritiva ‘envelhecida’ e salinizada de descarte dos cultivos hidropônicos. “No Brasil, alternativas como o emprego do rejeito em tanques de criação de tilápias e de camarão vem sendo estudadas nos últimos anos.”diz Soares “Por outro lado, em muitas comunidades, tem-se testemunhado o descarte do rejeito no meio-ambiente, sem qualquer critério técnico para essa destinação”, lamenta o pesquisador.

Um destino adequado para essas águas descartadas da hidroponia seria o cultivo controlado de microalgas. Essa atividade pode minimizar o problema da contaminação dos corpos d’água pelo rejeito do processo de hidroponia pois ela aproveita os nutrientes descartados. Esse foi o foco da pesquisa do químico, Fabiano Cleber Bertoldi, da Universidade Federal de Santa Catarina. Segundo Bertolti, a utilização dessa água residual no cultivo de microalgas minimiza e evita a eutrofização dos corpos d’água. A eutrofização é um fenômeno causado pelo excesso de nutrientes, principalmente nitrogênio e fósforo, ocasionado por efluentes agrícolas, urbanos ou industriais num corpo d’água, que leva a proliferação excessiva de algas. Quando as algas se decompõe, consomem o oxigênio da água, provocando a morte de peixes e de outros animais aquáticos. Além de deixar o corpo d’água pobre em oxigênio, algumas espécies de algas produzem toxinas que contaminam fontes de água potável. “Entretanto, vê-se a necessidade de maiores estudos sobre a potencialidade de microalgas no tratamento de resíduos hidropônicos, possibilitando a utilização da biomassa algal numa ampla ordem de compostos”, diz Bertoldi.

Ainda segundo o pesquisador, as microalgas, que são comercializadas como fonte alternativa de proteína, podem também produzir até 30 vezes mais óleo do que a soja por unidade de área. Nos últimos anos, aproximadamente 75% da produção anual de biomassa microalgal foi direcionada para a fabricação de suplementos alimentares. Vários alimentos à base de extratos algais vêm sendo lançados no mercado de alimentos funcionais como: bebida à base de Chlorella e cápsulas de óleo enriquecido com carotenóides extraídos da biomassa da microalga Dunaliella.

Quanto ao seu cultivo, as microalgas apresentam vantagens sobre outras culturas, como tempo de geração curto. Elas são produzidas de forma contínua, ocupando áreas pequenas. Além disso, não estão sujeitas às variações ambientais, são facilmente controladas, não afetam drasticamente o meio ambiente (pois não precisam de aplicação de defensivos agrícolas) e apresentam uma multiplicação alta em pouco intervalo de tempo.

Outra vantagem apontada por Bertoldi na utilização da solução hidropônica residual no cultivo de microalgas é que, por ser rica em nutrientes, proporciona uma redução nos custos de produção, uma vez que, os nutrientes utilizados no processo representam aproximadamente 40% dos custos totais.

Os resultados da pesquisa de Bertoldi apontam para a viabilidade do uso da água residual de hidroponia para o cultivo da microalga Chorella vulgaris e parte de seu trabalho foi publicado recentemente em um artigo da revista Ciência Rural.

Aprendizagem: desafio à efetiva inclusão escolar

Não basta acesso e permanência na escola para garantir a tão aclamada inclusão educacional. Um projeto de recuperação, com enfoque na aprendizagem, desenvolvido por professoras de uma escola municipal de Campinas, traz propostas simples que querem garantir uma inclusão efetiva. Uma pesquisa sobre o projeto foi conduzida por pesquisadora do Nepp da Unicamp e a proposta foi selecionada, mês passado, como inovadora pela rede Innovemos da Unesco.

Durante muito tempo, dois problemas eram considerados o “calcanhar de Aquiles” da educação brasileira: o fracasso escolar, devido ao abandono precoce da escola pelos alunos e à repetência; e, em decorrência disso, a falta de vagas para todas as crianças em idade escolar. Segundo Cibele Yahn, pesquisadora do Núcleo de Estudos de Políticas Públicas (Nepp) da Unicamp, muito esforço foi feito nos últimos anos para “’empurrar o fluxo pra frente’, através, por exemplo, de medidas como o programa de ciclos e a progressão continuada”. Com isso, a universalização do ensino foi alcançada, mas esse avanço ainda é insuficiente, segundo Yahn, porque “antes a criança repetia e não aprendia, agora ela passa de ano e não está aprendendo”.

A discussão sobre educação no Brasil mudou depois de alcançada a universalização do acesso ao ensino fundamental. A meta de inclusão, que antes girava em torno do acesso das crianças à escola e da sua permanência no sistema passou a se voltar para o aprendizado. “Universalizou-se o acesso porque se trouxe as crianças pra dentro da escola. Mas e o que se faz dentro da escola?”, pergunta Yahn. Para a pesquisadora, “ter acesso é o primeiro passo da inclusão, mas está muito longe de ser uma inclusão efetiva. Uma inclusão efetiva requer oferecer condições de aprendizado para as crianças. O acesso e a permanência são passos para a inclusão, mas a partir daí ainda resta a pergunta: ‘elas estão aprendendo ou não estão aprendendo?”.

A pesquisadora comenta que, diante dos resultados mostrados pelas avaliações de desempenho, que têm sugerido uma deficiência no aprendizado geral dos alunos, algumas iniciativas municipais e estaduais (como em Campinas e no estado de São Paulo) têm sido tomadas para definir currículos e conteúdos mínimos que os alunos devam adquirir ao final de cada série. A adoção de políticas focadas na aprendizagem visa atender às novas exigências e às novas noções de qualidade e inclusão na educação.

O simples que funciona

Cibele Yahn coordenou uma pesquisa sobre projeto visando a recuperação de deficiência na aprendizagem de crianças do ensino fundamental. O projeto foi selecionado, em março deste ano, pela Rede de Inovações Educativas para América Latina e Caribe (Innovemos) da Organização das Nações Unidas pela Educação, Ciência e Cultura (Unesco). Foi desenvolvido por três professoras, de segunda e terceira séries, da Escola Municipal de Ensino Fundamental “Professora Dulce Bento do Nascimento” de Campinas, a partir de uma avaliação diagnóstica solicitada pela prefeitura, que identificou os alunos que iniciariam o ano letivo com defasagem em leitura e escrita.

Com horas extras de acompanhamento focado na aprendizagem dos alunos, elas conseguiram reverter uma situação de defasagem em português e matemática que poderia se tornar bastante problemática no longo prazo. Este resultado não só atende à forte demanda por qualidade no ensino, principal discussão quando se fala em educação hoje, como enfatiza uma noção que vem ganhando força: a de que a inclusão educacional requer mais do que o acesso e a permanência das crianças na escola, mas o seu efetivo aprendizado.

Segundo o depoimento da mãe de uma das alunas que iniciou a recuperação, “ela estudava na escola do Campo Belo, fez a primeira e a segunda série lá. Mas ela não estava aprendendo nada, o caderno dela só tinha rabisco”. A própria aluna complementa: “Quando eu estava lá eu pensei: ‘desse jeito eu nunca mais vou aprender’, e pedi para minha mãe: ‘Mãe, muda eu de escola?”. Cibele Yahn comenta também que, ao entrevistar esta aluna, ela disse não se lembrar do nome das professoras, “ou seja a escola não estabeleceu com ela vínculo nenhum”, avalia a pesquisadora. A criança estava na escola havia dois anos, não faltava, não atrasava, mas não tinha uma aprendizagem dentro dos parâmetros estabelecidos como satisfatórios. Yahn define essa situação como “armadilha da inclusão”: “ela estava totalmente excluída, mesmo dentro do sistema”. Para a pesquisadora, há o risco de crianças com defasagem na aprendizagem, como esta, serem tratadas como portadoras de necessidades especiais, quando não é este o caso.

No período extra de dedicação aos alunos, as professoras utilizaram desde métodos tradicionais, como a cartilha, até outros mais modernos, com materiais diversificados. Eles foram acompanhados, observados e avaliados periodicamente, segundo um critério simples de classificação: pré-silábico, silábico e alfabetizado. Segundo Yahn, a iniciativa das professoras “não tem mistério: é uma hora a mais de estudo, com uma atenção mais direta, focada no aluno e no seu aprendizado, acreditando nas possibilidades daquele aluno e dando as condições básicas para que ele aprenda”. Devido a essas características, o projeto foi considerado uma experiência inovadora pela Unesco. Embora simples, e com resultados considerados efetivos, a adoção de tais medidas não é padrão no Brasil.

A pesquisa realizada por Yahn mostrou que, ao término do primeiro semestre, todos os alunos estavam alfabetizados. Ao fim do ano, alguns alunos da terceira série estavam prontos apenas para acompanhar plenamente a terceira novamente, mas tinham zerado o déficit anterior; outros estavam efetivamente prontos para freqüentarem a quarta, porém outros, nem tanto: precisariam ter mantido o acompanhamento da recuperação no ano seguinte. Este é um problema, aponta a pesquisadora, quando se tem uma iniciativa particular, e não uma política adotada pela escola ou pela rede municipal, estadual e/ou federal. A falta de continuidade compromete a sua eficácia. No caso, o sucesso desta experiência local pautou mudanças na política municipal da cidade de Campinas. O plano de cargos para os docentes da rede, que entrou em vigor este ano, criou a carga-horária-pedagógica (CHP): três a quatro horas semanais dedicadas exclusivamente aos alunos e à melhoria de sua aprendizagem. Além disso, o projeto foi apresentado na semana passada em um seminário organizado pela rede Innovemos no Chile, visando à troca de experiências inovadoras em educação.