Técnica inovadora analisa vestígios de petróleo à distância

Inovações tecnocientíficas importantes no campo da exploração do petróleo, que não miram necessariamente o pré-sal, têm sido realizadas no Brasil, como uma pesquisa premiada pela Petrobras e realizada no Instituto de Geociências da Unicamp. O trabalho abriu possibilidades de avaliação à distância de vestígios de petróleo (líquido ou gás) no mar ou em terra.

Após a descoberta das reservas de petróleo na camada do pré-sal, na bacia de Santos, os esforços brasileiros concentraram-se, principalmente, na obtenção e produção de tecnologia capaz de extrair petróleo daquela região. Mas outras inovações tecnocientíficas importantes no campo da exploração do petróleo, que não miram necessariamente o pré-sal, também têm sido realizadas. É o caso da pesquisa premiada pela Petrobras, de Talita Lammoglia e de seu orientador, Carlos Roberto Souza Filho, ambos do Instituto de Geociências (IG) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). O trabalho abriu possibilidades de avaliação à distância de vestígios de petróleo (líquido ou gás) no mar ou em terra.

Graças a essa inovação, tornou-se possível “qualificar os tipos de petróleo por meio do sensoriamento remoto”, afirma Souza Filho. Ou seja, hoje podemos conhecer detalhes das características físico-químicas de vestígios de petróleo à distância, sem que amostras desse petróleo tenham que ser coletadas.

O chamado sensoriamento remoto permite, com auxílio de satélites ou aviões devidamente equipados, a análise à distância da superfície terrestre. Neste caso específico, o sensoriamento remoto é responsável pela captação e análise da radiação solar refletida pelas manchas de petróleo em várias faixas do espectro eletromagnético, desde o campo da luz visível – ou seja, em frequências em que o olho humano opera e é capaz de perceber cores, de acordo com a reflexão ou a absorção da luz refletida a partir dos objetos – até o infravermelho, em frequências mais baixas, invisíveis ao olho humano. Como as diferentes moléculas presentes na natureza absorvem diferentes frequências da radiação solar – inclusive na imensa faixa invisível a nós -, quando analisamos o espectro da radiação solar refletida por uma amostra de petróleo, podemos inferir sua composição química de acordo com as frequências em que a radiação foi absorvida.

A primeira etapa da pesquisa foi coletar diferentes amostras de petróleo e elaborar uma biblioteca de óleos. Essas amostras, então, foram caracterizadas de acordo com a análise do espectro eletromagnético. As análises permitiram que fosse feita uma relação entre esses resultados obtidos em laboratório e a densidade do óleo. “O petróleo pode ser classificado de acordo com sua composição química”, afirma Lammoglia. “Um exemplo de classificação é pelo grau API, que é uma medida de densidade relativa do óleo. Quanto maior o grau API de uma amostra de petróleo, menos denso ele é. E quanto mais ’leve’ o petróleo, maior é o valor de mercado dos seus derivados”, explica a pesquisadora.

A segunda etapa da pesquisa foi a comparação dos resultados das análises laboratoriais com a medida da luz solar refletida por uma exsudação no mar, registrada por sensoriamento remoto. Exsudações são vazamentos naturais de petróleo e gás que ocorrem na maioria das bacias petrolíferas. Na história da exploração de petróleo, muitos campos foram descobertos a partir da detecção de exsudações. “O nosso trabalho permitiu não só o mapeamento dessas exsudações por satélite, mas também a inferência do grau API dos óleos exsudados na superfície do mar”. Os resultados que os pesquisadores obtiveram pela análise espectral por sensoriamento remoto foram compatíveis com as características conhecidas da exsudação estudada, o que indica o sucesso da nova técnica.

Os benefícios dessa inovação para o país são muitos. Ganha a exploração de petróleo, que contará com análises à distância sobre a composição e, consequentemente, sobre o potencial econômico do óleo, reduzindo consideravelmente os esforços necessários para isso. E se beneficia, igualmente, a capacidade de monitoramento ambiental, já que vazamentos de navios petroleiros poderão também ser identificados e caracterizados.

“Até hoje havia detecção de exsudações de petróleo e de gás por meio de radar, mas ainda não havia uma técnica que permitisse inferir as propriedades físico-químicas do que havia sido detectado”, lembra Souza Filho. Talita, que cursa seu doutorado no IG e atualmente trabalha na Petrobras, reconhece que a técnica ainda é pouco utilizada, mas “a tendência é que, com o tempo, seja mais aplicada, tanto para a exploração petrolífera quanto para o monitoramento ambiental”.

Os impactos socioambientais das mudanças climáticas no litoral paulista

Iniciado em 2009 e com duração prevista de quatro anos, um projeto da Unicamp vem estudando o crescimento urbano, a vulnerabilidade e a adaptação às mudanças climáticas no litoral de São Paulo, tanto em suas dimensões ecológicas quanto sociais.

Um grupo de cientistas da Unicamp está estudando as consequências das mudanças climáticas no litoral de São Paulo. Iniciado em 2009 e com duração prevista de quatro anos, o projeto “Crescimento urbano, vulnerabilidade e adaptação: dimensões sociais e ecológicas das mudanças climáticas no litoral de São Paulo” se desenvolve enquanto diversos empreendimentos de grande porte continuam sendo implementados ou planejados para a região.

Entre os temas abordados pelo estudo estão as questões espaciais e demográficas que irão condicionar a adaptação das populações costeiras às mudanças climáticas, os conflitos sociais em relação ao uso de recursos naturais, a atuação de governantes locais e regionais e os impactos na biodiversidade. A equipe do projeto é formada por cientistas de diversas áreas, entre eles demógrafos, cientistas sociais, biólogos e ecólogos. São pesquisadores e alunos do Núcleo de Estudos e Pesquisas Ambientais (Nepam) e do Núcleo de Estudos de População (Nepo), ambos da Unicamp, além de colaboradores de outras instituições, sob a coordenação geral de Daniel Hogan, pesquisador do Nepo e do Nepam.

Os cientistas dos dois núcleos de pesquisa têm anos de experiência em estudos na região do litoral paulista. “Mas, na área de mudanças ambientais globais, é a primeira grande pesquisa empírica que nós vamos fazer”, conta a pesquisadora Leila da Costa Ferreira, do Nepam. O estudo é parte do Programa Fapesp de Pesquisas sobre Mudanças Climáticas Globais, que reúne outros nove projetos. “Somos dez grandes grupos de pesquisa analisando a questão das mudanças climáticas. Isso não é fácil em qualquer lugar do mundo. Do ponto de vista da política científica, institucional, vai ser um impacto muito grande”, avalia Leila Ferreira, que coordena o componente do projeto responsável pelo estudo das políticas públicas relacionadas às mudanças ambientais globais.

Quinze municípios do litoral de São Paulo, além de Cubatão, estão sendo estudados pela equipe da Unicamp. A região de Caraguatatuba concentrará boa parte das pesquisas, porque é para ela que estão sendo planejados empreendimentos como o Centro Integrado de Tratamento de Resíduos Sólidos, a Unidade de Tratamento de Gás de Caraguatatuba, o Gasoduto Caraguatatuba-Taubaté, a ampliação do porto de São Sebastião e a duplicação da rodovia Tamoios.

“O impacto dessas grandes obras, em termos de opinião pública, dos moradores locais, é impressionante”, conta Lúcia da Costa Ferreira, do Nepam, coordenadora da equipe que analisará questões ligadas aos conflitos entre expansão urbana e cobertura florestal. Para a pesquisadora, as populações de Caraguatatuba, Ubatuba e São Sebastião têm consciência da dimensão dos empreendimentos, ainda que não haja consenso sobre seus impactos. Entre as preocupações está a possibilidade de perda da vocação turística da região, principalmente em Caraguatatuba. “Por isso, o projeto foi muito bem-vindo. Não estamos levando a eles um tema. Estamos compartilhando um tema que pra eles é premente”, argumenta Lúcia Ferreira. Ela lembra que a região tem uma longa trajetória de mobilização política.

O pesquisador Roberto do Carmo, do Nepo, membro da equipe voltada ao estudo de questões demográficas, aponta outro aspecto da análise de impacto dos empreendimentos, relacionado ao potencial de geração de empregos. Carmo lembra que as obras de construção civil absorvem grande quantidade de mão de obra não-qualificada, que acaba como excedente. “É uma situação bastante complexa e que temos visto com frequência no Brasil. As pessoas chegam, se instalam, trabalham e, quando acaba aquela construção, não conseguem uma inserção mais definitiva. Isso gera uma série de dificuldades para as pessoas e para a cidade, que muitas vezes não consegue se estruturar pra recebê-las”, argumenta Carmo.

De acordo com o projeto, os investimentos em infra-estrutura ligados à extração e transporte de petróleo e gás vão condicionar as medidas de mitigação, as vulnerabilidades socioambientais e ecológicas e as respostas adaptativas às mudanças climáticas. Mitigação, vulnerabilidade e adaptação, além dos ricos, são conceitos que permeiam as discussões sobre o tema, como explica Carmo. O pesquisador aponta que a mitigação esteve em evidência na cobertura da Conferência do Clima (COP-15), com a discussão do que fazer em relação às emissões CO2 frente ao aquecimento global. “É um tipo de discussão importante, mas no qual a questão da organização do sistema produtivo acaba se sobressaindo sobre os outros elementos que talvez sejam mais importantes, relacionados com a dinâmica social: riscos, vulnerabilidade e adaptação”, explica Carmo. “É importante pensar na mitigação, mas isso não leva em conta que já existe uma situação hoje em que esses eventos extremos e outros fenômenos, como os riscos decorrentes da elevação do nível do mar, por exemplo, já estão tendo impacto sobre a população”, completa o pesquisador.

É importante identificar as situações de risco e os grupos populacionais que as vivenciam, a vulnerabilidade desses grupos e os recursos que podem mobilizar para enfrentá-los. “É preciso começar a pensar também em adaptação; em como a sociedade, os grupos sociais, os indivíduos vão se adaptar a essa nova realidade; em qual conjunto de políticas públicas vai ser importante pra que esses grupos sociais possam se adaptar”, defende Carmo.

O estudo da Unicamp vai definir áreas prioritárias para a análise da vulnerabilidade, que Carmo lembra estar relacionada não só à exposição aos riscos, mas à capacidade de resposta a eles. “Não é só a questão da elevação do nível do mar, mas é como as pessoas ou grupos sociais estão organizados ou que tipo de ativos sociais e econômicos possuem para enfrentar esses riscos. Pode ser que populações expostas aos mesmos riscos, com a mesma condição econômica, venham a ser mais ou menos vulneráveis em decorrência dos ativos não só econômicos, mas de acesso a políticas públicas, organização social”, argumenta o pesquisador.

Para Leila Ferreira, a questão das mudanças climáticas globais tem diferentes dimensões e, nesse contexto, as ciências do clima têm tido um avanço maior do que as áreas voltadas às dimensões humanas. “Quando se analisa isso internacionalmente, é gritante. Não só do ponto de vista do número de cientistas na área das ciências do clima e na das dimensões humanas, mas em termos de verba”, argumenta a pesquisadora, que defende a integração entre as ciências naturais e as sociais na análise do tema. “O que pretendemos fazer é pensar as dimensões humanas do ponto de vista dos conflitos sociais, das políticas públicas, da dinâmica demográfica e da biodiversidade. Pensar mudanças climáticas nas suas diferentes dimensões, focando as dimensões humanas”, argumenta Leila Ferreira.

Lúcia Ferreira, do Nepam, afirma que tanto as ciências ecológicas quanto as sociais possuem dimensões próprias, mas há, entre elas, a região de interface dos sistemas socioecológicos. “É sobre isso que nós vamos falar. Há uma interface, que a gente costuma chamar de lugar do uso de recursos, que não pode ser olhada só sob o ponto de vista da sociedade ou sob o ponto de vista dos sistemas biológicos. Uso de recursos é o nosso diferencial”, defende.

A equipe do projeto trabalha com a perspectiva de que as previsões do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) estão, de maneira geral, corretas. Para Carlos Alfredo Joly, pesquisador do Instituto de Biologia da Unicamp e do Nepam, a queda de credibilidade do IPCC é, em parte, resultado de interesses econômicos. “Como em todos os trabalhos de síntese em que se usa uma base muito ampla, pode-se ter erros, mas são pontuais. No geral, eles são altamente confiáveis e as diretrizes, as grandes conclusões, têm base científica para suportar”, avalia o pesquisador. Joly coordena a equipe que analisará impactos na biodiversidade.

Ele lembra que não há dados históricos para a região que permitam avaliar se as mudanças estão acontecendo. Sistemas de medida estão sendo implantados em um momento em que essas alterações podem já estar ocorrendo. Para Joly, antes que inundações de áreas costeiras sejam percebidas, serão notadas alterações no sistema de saneamento. Com mudanças no nível do mar e na pressão da coluna de água, é provável que alguns dos emissários submarinos que hoje jogam esgoto a alguns quilômetros da costa passem por um processo de reversão. Há, ainda, a possibilidade de salinização de pontos de captação de água para as cidades.

Para a equipe do projeto, as incertezas em relação às mudanças climáticas fazem parte da pesquisa em geral. “Nenhum tema científico, intelectual, no meu ponto de vista, não tem o campo da incerteza, da dúvida”, defende Leila Ferreira, do Nepam. “É um tema polêmico, controverso, mas como qualquer outro tema da ciência. Quanto mais pesquisa a gente fizer e quanto mais estudos desenvolver, melhor e maior será a polêmica”, completa a pesquisadora.

IPT investe em pesquisas nanotecnológicas

Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), acaba de adquirir microscópio eletrônico de varredura, que permitirá o aprimoramento de pesquisas na área de nanotecnologia. Setores farmacêutico e de cosméticos são alguns beneficiados por essa linha de estudos.

A possibilidade de produzir materiais por meio de princípios nanométricos acabou mudando completamente os métodos atuais de fabricação de produtos utilizados em áreas como biotecnologia, medicina e farmacologia. Estima-se, por exemplo, que cerca de 600 produtos contendo nanomateriais estão no mercado em todo o mundo. Pensando nesses avanços científicos em escala nano – prefixo usado para designar um bilionésimo) – o Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) acaba de adquirir um microscópio eletrônico de varredura (MEV), que permitirá aprimorar pesquisas nessa área.

“A ideia central é expandir o uso do equipamento para todos os laboratórios do IPT que busquem respostas em uma escala micrométrica ou nanométrica”, disse Marcelo Moreira, pesquisador do Centro de Tecnologia de Processos e Produtos (CTPP) do IPT. Um dos projetos de pesquisa em que o MEV dará suporte é na caracterização da espessura e morfologia de materiais visando a preparação de nanofibras aplicadas em novas vias de uso de medicamentos através de patches (adesivos). Diferente do uso de comprimidos, os adesivos têm a vantagem de liberar de maneira controlada os ativos farmacológicos na pele do paciente.

Segundo Moreira, o MEV recém-adquirido tem a vantagem de ser utilizado em diversos projetos que vão além de linhas de pesquisa em nanopolímeros e nanocosméticos. Com certas peculiaridades que o fazem diferente dos microscópios de varredura convencionais, o novo modelo possui uma fonte de elétrons FEG (field emission gun, em inglês), a qual permite uma alta ampliação da imagem, e um sofisticado sistema de vácuo. “Em termos de resolução, um MEV convencional atinge de 20.000 a 80.000 vezes, com a fonte FEG pode-se atingir de 300.000 a 500.000 vezes”, afirma Moreira.

A partir de um investimento do Governo do Estado de São Paulo de 1,046 milhão de euros, o CTPP conta ainda com uma câmara criogênica capaz de congelar amostras a serem analisadas no MEV. “Com esse modelo de microscópio e com a câmara criogênica, podemos observar qualquer tipo de material: metálico, não-metálico, células e materiais orgânicos contendo água”, diz o pesquisador, explicando a capacidade do MEV de caracterizar uma ampla gama de materiais.

Na opção de baixo vácuo pode-se observar amostras não-condutoras, assim como no modo de vácuo ambiental é possível caracterizar amostras contendo água em sua composição – recurso fundamental para viabilizar pesquisas em centros de biotecnologia. Nessas opções de vácuo a amostra sofre menos alterações para ser visualizada, isto é, interfere-se menos na estrutura da amostra por não ser mais necessária a retirada de água ou cobri-la com um material condutor (como o ouro) no momento da observação. Mais uma curiosidade é que o MEV permite observar organismos vivos, que podem se movimentar na hora da visualização.

Novo centro de bionanotecnologia

Entre as novidades de pesquisas na área nano, o IPT deve inaugurar, no final de 2010, o Centro de Bionanotecnologia, que vai agregar estudos em biotecnologia (desenvolvimento com organismos vivos), tecnologia de partículas (microencapsulação de componentes químicos e terapia medicinal, como em cosméticos), micromanufatura de equipamentos e metrologia.

Uma das propostas do centro, cuja edificação deverá custar em torno de R$ 21 milhões, é conter uma área destinada a encontros de pesquisadores para a discussão de projetos relacionados em nanotecnologia. No começo deste ano, o IPT reuniu representantes de empresas, centros de pesquisas e universidades no intuito de criar uma rede de inovação do Sistema Brasileiro de Tecnologia (Sibratec) na área de nanocosméticos.

A rede temática de centros de inovação tem como objetivo atender demandas específicas do setor de cosméticos por meio de uma maior aproximação da comunidade acadêmica com as empresas. Até então, foram articuladas 11 redes temáticas Sibratec de centros de inovação.