O projeto One Laptop per Child (um laptop por criança), idealizado pelo pesquisador americano Nicholas Negroponte, do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT, na sigla em inglês), como uma alternativa de inclusão digital para as crianças carentes do mundo, pode ser adaptado para se enquadrar à realidade brasileira. Segundo a idéia original do projeto, cada criança em idade escolar dos países participantes receberá um laptop, de custo de US$ 100, arcado pelo Estado. Esse aparelho seria usado pelas crianças não só para desenvolver atividades escolares, como também fora da escola, em casa.
No Brasil, entretanto, a proposta deve ser alterada para um laptop por aluno, ou seja, os aparelhos ficariam restritos ao uso na escola, uma vez que o Ministério da Educação (MEC) avalia como arriscado o transporte desses aparelhos pelas crianças para suas casas.
“O risco de nossos alunos transitando com equipamento é uma das maiores preocupações. Portanto, esta questão será tratada com a máxima cautela”, afirmou José Eduardo Bueno, coordenador do Departamento de Infra-Estrutura tecnológica educacional do MEC. Segundo Bueno, essa opção também está sendo testada pelo MIT, onde o projeto está sendo desenvolvido. “Em Maine, onde o MIT acompanha um projeto de utilização de 7 mil laptops por alunos da rede pública já há alguns anos, apenas alguns jovens estão levando os computadores para casa, como piloto para verificar o nível de risco desta ação”, explica.
Mas a adaptação do projeto é vista como uma distorção por alguns pesquisadores. José Armando Valente, do Núcleo de Informática Aplicada à Educação, da Unicamp, afirma que com um computador por aluno, o projeto assume outra característica. “A idéia do computador estar em casa é para a comunidade se beneficiar, não só o aluno, para que todos comecem a ter acesso à tecnologia digital. É um processo de apropriação do núcleo familiar”, avalia.
Segundo Valente, no caso do uso do computador ficar limitado à escola, seria importante se avaliar o ganho educacional que a aquisição dos laptops teria frente ao uso de desktops em laboratórios de informática nas escolas. “A discussão deve começar pelo aspecto educacional, do que vai ser feito com essa máquina, e não se o aparelho deve ser verde ou amarelo. O lado educacional é que determina o software e que máquina é necessária para se rodar esse software”, destaca. Somente depois desta discussão, aponta o pesquisador, faria sentido se definir se os laptops são necessários.
Adaptado ou não à realidade de violência implícita no Brasil, o projeto ainda está em avaliação e terá um custo inicial de pelo menos US$ 100 milhões, porque o preço de US$ 100 por aparelho só será atingido a partir da produção em larga escala. Dessa forma, cada país participante deverá adquirir pelo menos um milhão de máquinas logo no primeiro pedido. As máquinas serão importadas de um único produtor, a empresa taiwanesa Quanta Computer, escolhida pela ONG One Laptop Per Child para produzir os laptops.
O modelo do aparelho também ainda está em desenvolvimento: não se definiu qual a melhor opção de monitor, que deve poder ser visualizado mesmo debaixo de sol; nem uma fonte de energia alternativa, já que a primeira idéia, de se utilizar uma manivela, foi abandonada porque o movimento poderia avariar o equipamento. O preço também não está definido. Negroponte afirmou ser possível que a primeira leva de laptops saia por US$ 130, mas que em um ano de produção esse preço caia para apenas US$ 50.
Mesmo com os contratempos, o MEC está se mostrando otimista quanto à aquisição dos laptops a partir de 2007. Desde a visita de Negroponte ao Brasil, em março, o governo federal reafirmou seu interesse em participar do projeto, que também conta com o interesse de outros países em desenvolvimento: Argentina, África do Sul, Índia, China, Egito, Nigéria e Tailândia.
Segundo Bueno, do MEC, a aquisição dos laptops pode ser uma saída para suprir a demanda por laboratórios nas escolas brasileiras. “A demanda por utilização das tecnologias da informação e comunicação na educação é muito grande e as desigualdades regionais também”, afirma. De acordo com o ele, seriam necessários ainda cerca de 7 mil laboratórios de informática em escolas de ensino médio para que todos os municípios brasileiros tenham pelo menos uma escola com laboratório.
“Os laboratórios são importantes, mas não proporcionam uma disponibilidade de tempo para uma melhor exploração no processo pedagógico. Os alunos e professores, quando muito, conseguem duas ou três horas semanais de acesso”, explica Bueno. Com os laptops, segundo ele, os alunos teriam mais oportunidade de contato com a tecnologia. Além disso, a comunidade não sairia prejudicada com a permanência dos aparelhos nas escolas. “Defendemos que a escola publica esteja aberta e integrada na comunidade local, emprestando a sua estrutura para os projetos sociais e comunitários”, conclui.