Museus de ciências ampliam reflexão sobre sua interface com o público

Em 2008, a mediação museu de ciências-visitantes ganha mais visibilidade com lançamento de livros e realização de cursos e eventos que abordam o papel dos profissionais que interagem com o público.

Central no funcionamento de museus e centros de ciências, o trabalho do mediador, pessoa que realiza a interface entre a instituição e seus públicos externos, vem ganhando destaque nos últimos anos. Dois mil e oito aparece como um ano emblemático nesse processo, com a publicação de livros e a realização de cursos e encontros abordando a temática.

“A mediação determina como a informação vai ser divulgada e apreendida. O mediador é a voz da instituição”, explica Martha Marandino, coordenadora do Grupo de Estudo e Pesquisa em Educação Não Formal e Divulgação em Ciência (Geenf), da Universidade de São Paulo (USP). Apesar da crescente importância atribuída ao trabalho dos mediadores, falta investimento em formação. “Sabemos que a formação dos monitores ainda é pouco explorada, apesar de já haver algumas iniciativas, principalmente nos próprios museus”, afirma.

Buscando suprir essa lacuna, Marandino organizou o livro Educação em museus: a mediação em foco, lançado em abril e disponível no site do Geenf na Internet. Ele traz reflexões sobre as dimensões educativas e comunicacionais dos museus e sobre o papel dos mediadores, além de propor atividades que podem ser utilizadas na formação desses profissionais.

O livro também é usado como material de apoio em outra iniciativa do Geenf, um curso de difusão que leva o mesmo nome. A primeira edição do curso começou em 15 de abril e segue até 17 de junho, totalizando 48 horas de aulas teóricas e práticas. A demanda surpreendeu os organizadores, que pretendem agora levar o curso a outras cidades, mantendo como público-alvo monitores de museus, alunos de licenciatura em pedagogia e professores. “A grande procura pelo curso demonstra uma sensibilização sobre a importância da mediação e o anseio por formação”, avalia Marandino.

Outro grupo que tem se dedicado à reflexão sobre mediação é o do Núcleo de Estudos da Divulgação Científica do Museu da Vida, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), coordenado por Luisa Massarani. Em setembro de 2007, o Núcleo lançou o livro Diálogos & Ciência: Mediação em museus e centros de ciência em parceria com a Dotik (Treinamento Europeu para Jovens Cientistas e Monitores de Museus) e com o apoio da Associação Brasileira de Centros e Museus de Ciência (ABCMC).

A publicação, também disponível para download gratuito, reúne concepções e estratégias de mediação em museus e centros de ciência de países como Portugal, México, Itália, França e Reino Unido, além do Brasil. “Percebemos que, muitas vezes, a mediação é feita de forma intuitiva e sem intercâmbio entre as instituições”, explica Massarani. “Por isso, procuramos criar espaços de compartilhamento de experiências e reflexão”, completa.

Um segundo volume do livro será lançado em setembro deste ano, simultaneamente a um evento sobre mediação que o Museu da Vida está organizando com outros parceiros, como o Geenf. Segundo Massarani, o evento acontecerá entre 1 e 6 de setembro no Rio de Janeiro, e trará convidados da Colômbia, Chile, Uruguai, México, Estados Unidos, Itália e Malásia. Gratuito e destinado a pessoas que trabalham ou se interessam por mediação, contará com palestras, mesas redondas e oficinas.

Experiências

A interface entre o museu e seu público é realizada através de estratégias como vídeos, computadores, áudio-guias e textos, mas a figura do profissional que se relaciona com o visitante é uma das principais formas de mediação. Nomenclaturas (monitor, educador, facilitador, mediador, entre outras) e concepções sobre seu papel são bem variadas. “Alguns museus tem a concepção de que a visita deve estar toda focada nesse profissional. Já outros, acreditam que essa figura do mediador não deve existir. Um terceiro grupo prega que o mediador intervenha quando for requisitado”, revela Massarani.

É o caso do Museu de Ciências e Tecnologia da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. “Além de acompanhar a utilização dos experimentos da exposição, os estagiários são orientados a intervir somente quando o visitante solicita”, revela Emilio Jeckel Neto, diretor do museu. Para ele, a mediação tem importância fundamental para evitar que o visitante fique sem respostas para as suas dúvidas e para facilitar e induzir ao raciocínio científico na busca de novo conhecimento com a ajuda dos experimentos disponíveis. “Os estagiários não são meros ‘respondedores’ de perguntas, mas devem ajudar o visitante a encontrar uma resposta que leve ao aprendizado significativo do fenômeno ou princípio”, pontua Jeckel.

Massarani acredita que não existe uma fórmula pronta e única para a questão da mediação. “São necessárias estratégias diferentes de acordo com cada caso, cada necessidade, inclusive em um mesmo museu”, afirma. Públicos distintos, como alunos de escolas públicas ou visitantes com algum tipo de deficiência, requerem abordagens distintas. Da mesma forma, exposições e temas diversos pedem formas de mediação diferentes.

Já Marandino enfatiza a importância da formação dos mediadores. “Algumas instituições não vêem relevância na formação e outras não têm a estrutura para realizá-la, apesar de já podermos identificar mudanças e investimentos maiores nessa formação”, lembra. Além disso, muitos museus e centros de ciências trabalham apenas os conteúdos específicos de cada exposição com seus mediadores. Contudo, ela acredita que a mediação é um espaço de produção de conhecimentos nos campos da comunicação e da educação e, por isso, a formação dos profissionais requer reflexão sobre sua prática e aprofundamento em temas como os perfis de público, teorias de educação e de comunicação pública da ciência, entre outros.

Os especialistas apontam também a importância de cada instituição criar seu próprio repertório de mediações e diversificar o papel do mediador. “O trabalho do mediador não pode estar restrito ao contato com o público. Cabe a ele também pesquisar e avaliar os resultados do trabalho desenvolvido”, finaliza Marandino.