Modificação genética de bactéria aumenta produção de hidrogênio

Cientistas da Universidade do Texas, nos Estados Unidos, conseguiram manipular geneticamente a bactéria Escherichia coli, conhecida por contaminar alimentos e causar doenças, e transformá-la numa fonte de hidrogênio, apontado atualmente como o combustível do futuro.

Um microorganismo há bastante tempo conhecido como transmissor de doenças pode vir a ser um importante aliado na geração de energia. Cientistas da Universidade do Texas, nos Estados Unidos, conseguiram manipular geneticamente a bactéria Escherichia coli, conhecida por contaminar alimentos e causar doenças, e transformá-la numa fonte de hidrogênio, apontado atualmente como o combustível do futuro.

A equipe de cientistas apagou seis genes específicos do DNA da bactéria e a alimentou com açúcar. Desta forma, os pesquisadores aumentaram em mais de cem vezes seu processo natural de conversão de glicose em hidrogênio por meio de fermentação. O resultado foi a produção de uma linhagem da bactéria capaz de produzir 140 vezes mais hidrogênio do que acontece no processo biológico normal. “Nós já sabíamos que a E. coli produzia hidrogênio, mas a quantidade que poderíamos fazê-la fabricar foi uma surpresa”, diz Gönül Vardar-Schara, integrante da equipe, em entrevista à ComCiência.

Os pesquisadores do Texas vinham há algum tempo realizando pesquisas com manipulação genética de microorganismos para a fabricação de hidrogênio. Este é o mais abundante e mais leve elemento conhecido, e tem um grande potencial para ser a fonte de energia do futuro: ele não polui, e as pesquisas para aumentar o seu rendimento estão evoluindo cada vez mais. A bactéria E. coli foi escolhida para a pesquisa por ser um microorganismo fermentativo – ou seja, ela produz hidrogênio através do processo de fermentação, e não pelo processo de fotossíntese.

Isso foi uma vantagem para o trabalho: o processo de fermentação produz mais hidrogênio do que o de fotossíntese; não depende da disponibilidade de luz; utiliza fontes de carbono variadas, como compostos orgânicos (dejetos); requer menos energia e é tecnicamente mais simples e estável se comparado com a fotossíntese. “Escolhemos trabalhar com a E. coli, pois possui muitas vantagens, como crescimento rápido e requerimentos nutricionais simples. Também porque são microorganismos fáceis de se manipular geneticamente”, aponta Thomas K. Wood, chefe da equipe de pesquisadores.

Trabalhar com microorganismos – especialmente bactérias, que são automaticamente associadas a doenças pela população – pode causar preocupações a respeito dos riscos para saúde que eventualmente poderiam trazer. Porém, a equipe afirma que a manipulação genética não produziu nenhuma espécie de super-bactéria – muito pelo contrário. De acordo com os pesquisadores, ao se apagar os genes do DNA da bactéria, ela se tornou menos competitiva e, conseqüentemente, menos perigosa.

“Trabalhamos com bactérias E. Coli geneticamente modificadas há anos, e é muito improvável que a transformemos num organismo perigoso à saúde através dessa modificação: ao contrário, elas são ainda mais seguras devido a isso, pois praticamente diminuímos seu risco à saúde”, tranqüiliza Wood.

Futuro

O processo de produção biológica de hidrogênio é promissor, mas os pesquisadores afirmam que ainda serão necessários muitos estudos antes de haver uma aplicação prática para a pesquisa. Existem muitos desafios a serem superados, como o de aumentar o rendimento das bactérias. Atualmente, são necessários 80 kg diários de açúcar para alimentar os microorganismos e conseguir que produzam hidrogênio suficiente para fornecer energia para uma residência média.

“O grande desafio agora é diminuir esse consumo de açúcar de 80 kg para 8 kg, e também fazer com que essa produção seja mais rápida”, aponta Toshinari Maeda, que também integra a equipe. “Os próximos desafios são criar modos de obter glicose de massas de plantas baratas e de dejetos de indústria”, completa Vardar-Schara.

O estudo avança em uma época que se aposta cada vez mais no hidrogênio como fonte de energia do futuro. “Nós realmente precisamos fazer essa transição de combustível para o hidrogênio, já que os tradicionais – petróleo e gás – estão acabando”, diz Wood. Usar esse elemento como combustível não só ajudaria a resolver a crise energética atual, como também seria a resposta para muitas questões ambientais. Afinal, sua utilização é totalmente limpa, não havendo emissões de partículas como monóxido de carbono, dióxido de carbono e óxidos de enxofre, que são responsáveis por problemas ambientais, como o aquecimento global, e por problemas de saúde, como alergias respiratórias.

A manipulação genética da bactéria E. coli vai ao encontro dessa tendência mundial, pois pode aumentar e baratear a produção de hidrogênio e ainda resolver uma das questões mais debatidas – e caras – sobre seu uso: o transporte e o armazenamento do elemento. Com a produção biológica do combustível, é possível controlar a quantidade de produção de hidrogênio.

Todos esses fatores contribuem para que a equipe de pesquisadores fique muito animada, apesar do longo caminho que ainda tem no futuro próximo. “Ainda temos de 5 a 10 anos de pesquisa pela frente, mas tudo bem. Afinal, a melhor parte do estudo é que não será preciso gastar bilhões de dólares para estocar hidrogênio, já que o mesmo será fabricado de acordo com a necessidade de cada um”, conclui Wood.