As evidências cada vez mais concretas sobre a ocorrência do aquecimento global têm movido governos a pensarem nas formas de mitigação de impactos e adaptação a um novo modelo econômico. Voltados a esse tema, especialistas discutiram as medidas que o governo brasileiro deve tomar para evitar grandes problemas no abastecimento de água no futuro. A conferência ‘Gestão das águas frente ao aquecimento global’ ocorreu durante o 2º Congresso Brasileiro de Jornalismo Ambiental, em Porto Alegre, e reuniu jornalistas, cientistas e estudantes no início de outubro.
Segundo o coordenador nacional do Programa Água Doce, Renato Saraiva Ferreira, da Secretaria de Recursos Hídricos e Ambiente Urbano, do Ministério do Meio Ambiente (MMA), o governo federal mostra preocupação com a questão das mudanças climáticas ao criar uma secretaria especificamente sobre o tema. Ele destacou ainda a Lei das Águas que, em 1997, instituiu a Política Nacional dos Recursos Hídricos, um importante marco legal na gestão das águas no Brasil.
Ferreira apontou diferenças no modo de pensar antes e depois da Lei das Águas. No passado, o recurso hídrico era uma propriedade particular e a água era vista como um recurso infinito, justificando a produção a qualquer custo. Hoje, a água é tida como um bem público gerido pelo governo, e, pelos princípios da sustentabilidade.
Para ele, o novo modo de pensar está de acordo com a atual crise climática. “A palavra da moda é ‘adaptação’, mas precisamos caminhar para a transição de um novo modelo de desenvolvimento”, enfatizou Ferreira. Ele citou alguns dos vários efeitos das mudanças climáticas na oferta e demanda da água no Brasil e no mundo. “Já está acontecendo. Em Recife, o mar não pára de avançar sobre a praia de Boa Viagem”, exemplificou, se referindo a um dos cartões postais da capital pernambucana.
Um dos principais motivos para a atual crise, na visão do executivo do MMA, é o crescimento populacional. Há 2000 anos, a população mundial era 3% da atual e os recursos hídricos eram os mesmos. “Os problemas atuais não são causados pelo homem, mas pelo modelo econômico vigente”, enfatizou. É o que também pensa o engenheiro civil Marcio Rosa de Freitas, da Secretaria de Habitação e Desenvolvimento Urbano do Rio Grande do Sul.
“O crescimento humano é comparável ao de uma cultura de bactérias”, enfatizou. Sobrepondo a curva de crescimento das duas espécies, ele explicou que as bactérias têm uma fase de arranque, em que há uma adaptação ao novo ambiente, e uma fase exponencial, quando a quantidade de recursos permite um período de crescimento rápido. “Com o homem foi igual, passamos um período crescendo pouco, mas a população aumentou rapidamente após a revolução industrial”.
No caso das bactérias, após o crescimento acelerado ocorre uma fase estacionária, quando há um acúmulo de toxinas devido ao metabolismo. Posterior a isso, ocorre o declínio da espécie com a morte em massa dos indivíduos. O homem, ao explorar sobremaneira o meio ambiente estaria passando, na comparação do engenheiro, pela fase estacionária.
Questões ambientais
Os debatedores concordaram que, apesar da urgência do tema, o jornalismo ambiental não deve se limitar à cobertura das mudanças climáticas. Foi com esse pensamento que o congresso enfocou outras pautas ambientais que permeiam o dia-a-dia das redações jornalísticas, ou que ao menos deveriam estar mais presentes.
Na conferência ‘Cidades Sustentáveis’, por exemplo, o jornalista André Trigueiro, da Globo News, criticou a cultura do consumismo bem típico da sociedade capitalista em que as pessoas são medidas pelo que tem. “É um crime duplo, pois ostenta-se onde há escassez e os recursos da natureza são exauridos”, enfatizou. Na mesma conferência, o engenheiro civil, Miguel Aloyso Sattler, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, comentou que a principal sustentabilidade a ser pensada é a da própria espécie humana. “Estamos em contato diário com uma quantidade tão grande de produtos tóxicos que criamos cada vez mais novas doenças”, disse.
O debate sobre o papel do jornalista ocorreu na conferência ‘Mudanças Climáticas’. Os especialistas criticaram o sensacionalismo e a imprecisão de muitas matérias sobre o aquecimento global. O 2º Congresso Brasileiro de Jornalismo Ambiental foi realizado pelo Núcleo de Ecojornalistas do Rio Grande do Sul e pela EcoAgência – Informações em Rede. Ao final do congresso, foi definido o próximo encontro em Cuiabá (MS), em 2009.