Descentralização na captação de chuvas minimiza impactos

As enxurradas de verão se repetem todos os anos trazendo grandes prejuízos para os centros urbanos. Jorge Henrique Prodanoff, pesquisador da Escola Politécnica da UFRJ, aponta erros na forma atual de captação da água da chuva em grandes piscinões. O ideal, afirma, seria a descentralização por meio de micro-reservatórios de captação.

Com a chegada do verão, os grandes centros urbanos voltam a sofrer com um velho problema: as enchentes deixam mortos, desabrigados e causam prejuízos para o comércio e a indústria. Apesar de ser uma catástrofe anunciada, as medidas tomadas ainda não resolveram o problema de forma integral. Jorge Henrique Alves Prodanoff, pesquisador da Escola Politécnica da UFRJ, aponta erros na forma atual de captação da água da chuva em grandes piscinões. Para ele, a forma mais correta seria a descentralização por meio de micro-reservatórios de captação espalhados pela cidade.

“Ao contrário de uma Estação de Tratamento de Esgoto (ETE), onde a captação é concentrada, quanto mais espalhado o sistema de controle de cheia e qualidade de água da chuva, mais barato e menores são as probabilidades de dar algo errado”, explica. De acordo com Prodanoff, o ideal seria que em cada casa houvesse uma cisterna – com cerca de dois ou três mil litros para coletar e armazenar a água da chuva. O cidadão poderia, inclusive, ser beneficiado diretamente com uma redução no IPTU por um curto período de forma a amortizar os custos de instalação de um sistema de coleta de água da chuva, sugere o pesquisador. “Um sistema de coleta composto de dois reservatórios, estrutura de captação, bomba, filtro, canalização, válvulas gira em torno de 1500 a 2000 reais”, informa Prodanoff, e continua “a economia gerada pelo uso da água da chuva pode ser da ordem de 500 a 700 reais, variando de região para região e do preço da concessionária. Ou seja, água na cisterna é água fora das ruas e dos rios e algum dinheiro no bolso do contribuinte e menos dinheiro de impostos gastos para limpar as ruas e construir piscinões”, argumenta.

Para o especialista, um município que busca soluções espacialmente distribuídas poderia minimizar os efeitos negativos de uma enchente, caso o sistema dos grandes piscinões falhe. “A descentralização é uma tendência mundial”, diz.

Em São Paulo e Rio de Janeiro, metrópoles aonde o cimento e o asfalto vêm ganhando terreno, há uma crescente taxa de impermeabilização do solo, o grande problema gerador das enxurradas. Na capital paulista, o Código de Obras estipula que 15% da área do terreno deve ser permeável. Além disso, o município paulista, assim como o Rio de Janeiro, já possuem Decreto de Lei que obriga os donos de terrenos com mais de 500 m² de área construída ou cobertura impermeável (incluindo estacionamentos) a deixarem, ao menos, 30% da área com piso drenante ou construir reservatórios temporários de água da chuva, que foram apelidados de “piscininhas”. “No Rio isso não tem efeito direto quase que nenhum, ao contrário de São Paulo, que nesse ponto está um pouco mais adiantado”, revela o pesquisador. Isso acontece, segundo Prodanoff, pois a exigência na Lei carioca só se aplica para as novas construções que tenham áreas impermeabilizadas superior a 500m², excluindo então as construções antigas. Já no município paulista, a Lei se aplica também às construções antigas.

Sério problema ambiental Além das enxurradas, a chuva nos centros urbanos causa um problema ambiental grave, mas pouco conhecido no país. A água lava uma grande quantidade de sujeira nas superfícies impermeáveis, fruto de uma imensa produção de resíduos sólidos da sociedade urbana atual. Entre as principais fontes poluidoras listadas por Prodanoff estão os resíduos lançados com a pavimentação das ruas, os gases lançados dos motores dos veículos, a deposição atmosférica, o lixo, os locais de construção e as redes de esgotos deficientes. Para se ter uma idéia, a primeira meia polegada (12,5 milímetros) de chuva, chamada de impacto da carga de lavagem sobre a bacia urbana, tem qualidade comparável ao esgoto primário, ou até inferior.

As análises do pesquisador estão na tese “A avaliação da poluição difusa gerada por enxurradas em meio urbano”, orientada por Flávio Borba Mascarenhas, que conquistou o Prêmio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) de tese na área de engenharia, no final de 2006.

Prodanoff explica que sua investigação se preocupou em classificar a água da chuva como causadora de impactos significativos nos corpos d’água receptores e no ambiente aquático. No Brasil, pesquisas como essa ainda são incipientes. Levantamentos feitos em cidades nos EUA e países desenvolvidos, que obtiveram êxito na coleta e tratamento da águas residuais, têm mostrado que as fontes de poluição difusa passaram a ser as maiores causadoras de degradação da qualidade das águas superficiais. “Além disso, as enxurradas podem conter quantidades significativas de substâncias tóxicas”, afirma.

A solução, acredita o especialista da UFRJ, seria o gerenciamento integrado das cheias urbanas, que deve abranger aspectos quantitativos e qualitativos dos escoamentos urbanos. No que diz respeito à quantidade, uma saída seria a descentralização na captação das águas da chuva, enquanto a qualidade poderia ser alcançada com um maior tempo na decantação da água coletada, sendo necessária, para isso, a descentralização do sistema.

De acordo com Prodanoff, o gerenciamento das cheias urbanas sob uma nova e inovadora ótica está começando a ser desenhada no Brasil. “Trata-se do desenvolvimento sustentável da drenagem urbana com o objetivo de imitar o ciclo hidrológico natural. Existem diversos exemplos práticos onde engenheiros, planejadores, paisagistas e outros especialistas tiveram sucesso na reintegração da água na paisagem urbana”, exemplifica.