Pesquisa e extensão em região de nascentes da bacia do rio Capivari

No Parque Itajaí, em Campinas (SP), o trabalho de pesquisa sobre a qualidade da água e sobre a importância da proteção da área de nascente dos rios está sendo utilizado para informar e educar a população local, além de permitir que a própria população participe de todo esse processo.

As pesquisas para a preservação do meio ambiente em áreas urbanas nem sempre têm um rápido retorno para a comunidade. Mas no Parque Itajaí, em Campinas (SP), o trabalho de pesquisa sobre a qualidade da água e sobre a importância da proteção da área de nascente dos rios está sendo utilizado para informar e educar a população local, além de permitir que a própria população participe de todo esse processo.

Nessa região, encontram-se três pequenas nascentes que fazem parte da bacia do rio Capivari. Mas, por se encontrar em plena área urbana, as nascentes correm risco de rápida degradação, o que ameaça a saúde do próprio rio. Um primeiro passo para tentar proteger essas nascentes foi dado a partir de uma parceria estabelecida entre a comunidade local, a Unicamp e a prefeitura de Campinas.

A comunidade local está organizada em um grupo de agricultores urbanos que receberam permissão da prefeitura para iniciar o projeto de uma horta comunitária. Essa horta está localizada junto à área de proteção permanente, onde se localizam as nascentes. Foi nessa área, e com o auxílio dos agricultores, que Clarisse Maria Boni de Oliveira, aluna do Laboratório de Entomologia Aplicada, do Instituto de Biologia da Unicamp, desenvolveu o seu estudo sobre as características fisico-químicas e biológicas do riacho formado pelas nascentes, em projeto vinculado à Pró-Reitoria de Extensão e Assuntos Comunitários da Unicamp e ao Laboratório de Ecologia de Águas Continentais da Unesp de Botucatu. No trabalho, os parâmetros físico-químicos e a presença de insetos aquáticos foram usados para avaliar a qualidade da água.

Com o término de seu projeto de pesquisa, Clarisse de Oliveira voltou ao Parque Itajaí para apresentar os resultados para os agricultores locais. “A situação da área de proteção permanente é complicada, pois ainda tem muito lixo na região do entorno (em volta da nascente e ao longo do riacho)”, alerta. “Felizmente, pelo levantamento das famílias de insetos, a saúde ecológica do rio ainda está boa. Porém, se nada for feito, em pouco tempo esses animais desaparecerão”, continua. Mesmo mantendo a saúde ecológica, isso não indica que a água esteja em condições de ser consumida pela população. “Apesar de termos resultados indicando que o rio ainda tem uma qualidade razoavelmente boa em termos de saúde ecossistêmica, a sua potabilidade está comprometida. E o processo de degradação ambiental é visível”, completa Giovanna Garcia Fagundes, uma das orientadoras do projeto, juntamente com Mohamed Habib, ambos do Instituto de Biologia da Unicamp.

Para engajar os agricultores na preservação das nascentes e da área de proteção permanente, também foram discutidas junto ao grupo as ações necessárias para se manter e melhorar a saúde do rio. A idéia foi usar os indicadores de qualidade estudados para auxiliar na conscientização e educação para conservar as nascentes. “Qual o papel dos agricultores na conservação das nascentes? De não jogar lixo, de trabalhar com os consumidores e com a comunidade do entorno para conservação, para recompor a mata ciliar”, explica Fagundes. Outra preocupação foi fazer uma ponte com a vida dos agricultores, apontar a função desses sistemas para a atividade agrícola local. “Esses dados coletados também vão mostrar a importância desse sistema para a agricultura, funcionado como um mecanismo de educação para conservação. Ou seja, além da água, que poderia ser utilizada na irrigação, o sistema vai oferecer amenização de temperatura; os bichos que nascem no riacho estarão conectados com o controle de pragas na horta; ele permite a infiltração da água no lençol freático, entre outros”, enumera.

Ao final da apresentação dos resultados na comunidade, as perguntas respondidas com o auxílio dos agricultores vão servir como material para a elaboração de um folheto com fins educativos. “O folheto trata das nascentes e da área de preservação permanente e poderá ser utilizado como uma ferramenta, pelos agricultores, para educação ambiental da a comunidade do entorno da horta”, explica Clarisse de Oliveira. A participação dos agricultores, na sua concepção, é fundamental: “O conhecimento deve ser construído a partir de uma troca de experiências. Assim, o folheto foi formado por todos os participantes do projeto.” Esse desdobramento da pesquisa seria uma forma de contribuição prática para a preservação dessa área. “O primeiro trabalho em que faremos uso desse material será no mutirão de limpeza para a recuperação da nascente, que será realizado dia 12 de dezembro”, conta a pesquisadora Giovanna Fagundes.

Além da sua importância na proteção da área de nascentes, o trabalho também tem irradiações sociais, pois trata os agricultores locais como protagonistas de todo esse processo. “Promover a participação do grupo na problematização de sua realidade e na geração de soluções e conhecimento gera a autonomia e o empoderamento destes atores, o que, do ponto de vista social, é extremamente importante”, defende Fagundes. Isso significa que a proteção ambiental e o desenvolvimento social caminham juntos e podem se beneficiar um do outro. “Os agricultores são os protagonistas da preservação desse riacho, da sua nascente, da mata ciliar e também do material utilizado para a educação ambiental nessa área. A conscientização da população local é uma importante chave para a preservação desse ambiente”, completa Clarisse.

Múltiplos sentidos da imagem para o ensino e a divulgação científica

“O que é manipular uma imagem? Eu posso manipular uma imagem, mas eu posso manipular os sentidos que ela provoca?”, indagou a professora da Universidade Estadual de Santa Cruz, na Bahia, Elenise Cristina Pires de Andrade, em sua apresentação no Foro Iberoamericano de Comunicação e Divulgação Científica, que aconteceu na Unicamp entre os dias 23 e 25 de novembro.

“O que é manipular uma imagem? Eu posso manipular uma imagem, mas eu posso manipular os sentidos que ela provoca?” Com essas palavras, a pesquisadora do Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo (Labjor) da Unicamp e professora da Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC), na Bahia, Elenise Cristina Pires de Andrade, iniciou sua apresentação no Foro Iberoamericano de Comunicação e Divulgação Científica, que aconteceu na Unicamp entre os dias 23 e 25 de novembro.

O trabalho, intitulado “Vidas e conhecimentos trans-versando uma metodologia de ensino de bios-logia”, trouxe o tema sobre o uso das imagens em ensino, pesquisa e divulgação das ciências biológicas.

A proposta metodológica de Andrade, que tem como inspiração os estudos culturais da ciência, é “duvidar, estranhar uma normalidade das imagens em ensino-pesquisa-divulgação das ciências biológicas carregadas e marcadas de representatividades que as amarram aos conceitos e teorias dos fenômenos do mundo”. Isso implica, primeiramente, ver a ciência como um “artefato cultural” e não como a representação de uma verdade absoluta, uma tradução da realidade. “Os artefatos culturais intensificam-se não pela representatividade de um mundo que se quer mostrar, mas na produção de sentidos múltiplos, sem a necessidade de verdadeiro ou falso”, afirma a pesquisadora.

Andrade nos trouxe como exemplo de imagens canônicas que nos são oferecidas pelo cardápio da divulgação científica: escadas evolutivas que vão da ameba ao astronauta ou do chipanzé ao homem sentado à frente do computador para retratar a história do planeta ou da humanidade. “Muitas vezes, um ‘obrigar a ver’, im-posto através de uma cultura única, que se quer explicativa, diretiva, reducionista, talvez”, acrescenta a pesquisadora.

No lugar de imagens com “espaços e tempos tão marcados por fixações de representatividade”, a autora prefere apostar em uma proposta metodológica da “multiplicação de sentidos” que uma imagem pode oferecer. O que haveria em comum entre a imagem de um berçário de estrelas, exibido na “V Semana de Física da UESC”, e a de sinais de RNA (material genético) no núcleo de uma célula eucariótica? Luzes, cores, sensações? A proximidade entre os mundos micro e macro explode e outras possibilidades de sentido podem vir à tona. “O ‘o que significa isso?’ sai de cena e a potência ‘do que seja ou não isso’ invade os momentos e pensamentos dos alunos da licenciatura (em biologia) e da professora”, apresenta Andrade.

Ao invés da preocupação em mostrar uma imagem “verdadeira” daquilo que a ciência oferece como conhecimento, está a proposta de incitar novas conexões entre conhecimentos, novos sentidos da vida. “Uma aposta em multiplicações e hibridizações em vidas (bios) e conhecimentos (logias) no atravessamento por diferentes perspectivas sobre a importância das formas, dos olhares, das linguagens, das sensibilidades no processo de produção e validação de conhecimento, enfocando a diversidade e respeitando as diferenças, ao possibilitar e propor uma educação dos sentidos na e com a elaboração de saberes singulares”, finaliza a autora.

Os alunos de Andrade no curso de licenciatura em ciências biológicas da UESC estão tendo a oportunidade de tomar contato com uma metodologia bastante singular sobre o ensino de ciências e biologia. A pesquisa da professora também faz parte do projeto “Biotecnologias de Rua”, do Labjor/ Unicamp.

Embrapa transforma jovens ribeirinhos em comunicadores científicos

A comunicóloga e pesquisadora da Embrapa-Rondônia, Vânia Beatriz de Oliveira, apresentou os objetivos do “Programa de educomunicação científica para a inclusão social de jovens ribeirinhos do rio Madeira”, durante o Foro Iberoamericano de Comunicação e Divulgação Científica, que aconteceu entre os dias 23 e 25, na Unicamp.

“Desenvolver atividades de educomunicação para a divulgação científica que proporcionem aos jovens rurais o protagonismo de ações, que internalizem conceitos, discutam e divulguem junto à comunidade ‘o que a ciência faz’ e ‘o que a sociedade pode fazer’ em relação aos impactos ambientais da atividade agropecuária”. Com essas palavras, a comunicóloga e pesquisadora da Embrapa-Rondônia, Vânia Beatriz de Oliveira, define os objetivos do “Programa de educomunicação científica para a inclusão social de jovens ribeirinhos do rio Madeira”, durante sua apresentação no Foro Iberoamericano de Comunicação e Divulgação Científica, que aconteceu entre os dias 23 e 25, na Unicamp.

O projeto visa educar cientificamente, sobre agropecuária e meio ambiente, os alunos da Escola Municipal de Ensino Fundamental “Deigmar Moraes de Souza”, localizada na comunidade Cujubim Grande do Rio Madeira, em Porto Velho, Rondônia.

O trabalho da pesquisadora na comunidade Cujubim Grande começou com o projeto “Comunicação para a gestão de recursos naturais”, da Embrapa, em 2004, que atende pequenos produtores da região. Ela conta que o projeto foi criado para diminuir a distância entre os pequenos produtores – com seus interesses, necessidades e conhecimentos tradicionais – e os pesquisadores – detentores do conhecimento científico desenvolvido para solucionar problemas na agricultura considerando a preservação ambiental. Dentro desse projeto de extensão rural, a comunicóloga e os pesquisadores perceberam que havia interesses diversos entre os ribeirinhos. A partir disso, foram montados grupos de estudos destinados a criar uma correspondência entre as tecnologias que a instituição poderia oferecer e a atividade dos produtores.

A necessidade de inclusão social dos jovens através de C&T surgiu pela própria demanda da comunidade e, também, pela percepção da pesquisadora de que a escola, que cedia o espaço para as reuniões entre pesquisadores e associação de produtores, poderia entrar no projeto. O resultado é o envolvimento direto de 360 alunos, do 1º ao 9º ano, e 20 professores da escola, desde o início do ano.

A proposta metodológica, tanto para os jovens quanto para os produtores, tem como princípio a interdisciplinaridade e envolve, primeiramente, uma etapa de sensibilização para as questões ambientais ligadas à comunidade. Esse trabalho de sensibilização, segundo Oliveira, foi iniciado com músicas que, de um modo geral, contemplassem temáticas ligadas à questão do fortalecimento da identidade do grupo, da riqueza da região em termos de biodiversidade e da compreensão da responsabilidade comum pelo meio ambiente. Posteriormente, foram utilizadas músicas de artistas com origem na cultura amazônica, como “Sabor Açaí”, de Nilson Chaves. Como exemplo, a pesquisadora conta que a partir dessa música o grupo pesquisou e criou um amplo conjunto de informações e conhecimentos a respeito do açaí, planta muito comum na região, utilizada para a geração de renda por meio da alimentação, da aplicação na construção civil, na tecelagem, etc. Esse é o tipo de trabalho que Oliveira desenvolve com os ribeirinhos: fazer com que eles próprios percebam os elementos do seu cotidiano para, assim, criarem uma identidade de respeito com o meio ambiente que parta de sua própria realidade.

“Quando você vai tratar da questão ambiental há um maniqueísmo muito grande: aquele que derruba, que queima é do mal e o protetor da natureza é do bem. A gente tem que ver como é a agricultura que eles praticam. A derrubada e a queima é uma prática do pequeno produtor. Então, a pesquisa não pode chegar lá e dizer ‘olha, agora não pode mais derrubar, não pode queimar’. Ela tem que começar a promover essas mudanças a partir da compreensão da realidade em que eles vivem, em que eles trabalham”, afirma a pesquisadora.

Após a etapa de sensibilização para as questões socioambientais, o passo seguinte é a inclusão dos jovens no universo científico que aproxima a Embrapa de seus familiares através de cursos, oficinas, excursões a campo e estágios para capacitação e educação científica de alunos e professores. A primeira experiência foi com o plantio do feijão de corda em regime comunitário na várzea do rio Madeira. A Embrapa entra com as variedades resistentes a pragas e doenças e, portanto, menos dependentes da utilização de defensivos agrícolas, desenvolvidas em suas pesquisas na área de biotecnologia. Os produtores entram com o conhecimento tradicional desse plantio, que é realizado há muitas gerações. A produtividade aumentou significativamente e os ribeirinhos do rio Madeira tornaram-se, inclusive, fornecedores do produto para o Programa Fome Zero.

O trabalho de educomunicação para a divulgação científica dos jovens é realizado por meio de dois grupos distintos. Um deles é o Jovem Pesquisador Científico. Com o apoio da professora de ciências e dos pesquisadores da Embrapa, eles visitam os laboratórios da instituição, fazem trabalhos de campo e têm contato com metodologias científicas para elaboração de projetos de iniciação científica ligados à produção do feijão de corda. Enquanto isso, outro grupo, o Jovem Divulgador Científico, tem contato com as metodologias da área de comunicação, sob a coordenação de Oliveira, e é responsável pela divulgação das pesquisas, que se realizará por meio de material impresso, em jornal e mural da escola, da criação de um blog e de videoclipes ambientais educativos. “E eles estão falando em rádio também; isso nem está no projeto, partiu deles”, acrescenta a pesquisadora.

O projeto ainda está em sua fase inicial, mas seus objetivos são bastante ousados. Entre eles, a criação de um “Cantinho da C&T” na biblioteca da escola e a divulgação científica dos projetos em cinco escolas do entorno, na Semana Nacional de Ciência e Tecnologia, pelos jovens educomunicadores. “O aumento do conhecimento científico e do interesse dos jovens pela C&T é necessário para o desenvolvimento do país”, finaliza Oliveira.