Pesquisadores do LNLS desvendam estrutura de proteína ligada à leucemia

Um estudo realizado no Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS), em conjunto com varias instituições de pesquisa, mais perto de elucidar a função da proteína SBDS humana envolvida na rara síndrome Shwachman-Diamond (SDS), cujos portadores têm predisposição para desenvolver leucemia.

A química Juliana Oliveira chegou mais perto de elucidar a função da proteína SBDS humana envolvida na rara síndrome Shwachman-Diamond (SDS), cujos portadores têm predisposição para desenvolver leucemia. Estudos anteriores indicavam que a molécula participa do metabolismo do RNA – intermediário entre a instrução codificada no DNA e as proteínas – dos ribossomos, que são como microlinhas de montagens celulares de proteínas. “Estudamos a estrutura tridimensional dessa proteína humana e a função de uma proteína que está relacionada diretamente a sua estrutura”, conta Oliveira. “Fizemos estudos sobre a interação da SBDS humana com RNA e verificamos que essa proteína interage diretamente com RNA. Além disso, também mapeamos essa região de interação. Esse é o primeiro trabalho que demonstra a interação direta da SBDS com o RNA.”

O trabalho, que é parte de seu doutoramento, foi realizado sob orientação da física Ana Carolina Zeri, do Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS), em Campinas, que participou recentemente de um experimento em que pinças ópticas foram usadas para ver como os ribossomos funcionam. A proteína foi analisada com ressonância magnética nuclear no Centro de Biologia Molecular Estrutural do LNLS. “Escolhemos a SBDS, porque ela está relacionada com uma doença humana. Entender o que acontece com essa proteína dentro da célula pode ajudar a desvendar as bases moleculares envolvidas no progresso da leucemia”, explica. Apesar de rara, em crianças, depois da fibrose cística, a SDS é a segunda causa mais comum de insuficiência pancreática.

A proteína SBDS tem cerca de 250 aminoácidos e encontra-se altamente conservada, isto é, assemelha-se a equivalentes encontrados em plantas, Archaea (antigas arqueobactérias, agora consideradas um reino à parte), leveduras e outros vertebrados. No entanto, seu papel ainda é desconhecido. “É difícil descobrir o papel exato de uma proteína dentro da célula, mesmo que essa molécula seja fundamental”, disse Oliveira. Geralmente uma proteína participa de vários processos celulares distintos e, somente com diversos estudos e abordagens distintas, os pesquisadores conseguem identificar as diferentes vias em que atua. “E, assim, por fim chegam à função específica que ela exerce para a célula como um todo”, completa.

Uma vez que a versão humana da proteína não formou cristais, Oliveira e Zeri produziram versões recombinantes da molécula com os isótopos estáveis e não-radioativos C13 e N15. Marcada dessa forma, a proteína pode ser submetida à espectroscopia por ressonância magnética nuclear. “Esse trabalho é um marco em nosso laboratório, pois é uma molécula grande, que exigiu que explorássemos os limites da técnica”, comenta Zeri. Para fazê-lo, foi preciso contar com o apoio de vários outros pesquisadores; entre eles, Nilson Zanchin, pesquisador do LNLS, que estuda a biogênese de ribossomos, o químico associado ao laboratório de RMN Mauricio Sforça, e uma colaboradora na Inglaterra, Tharin Blumenschein. “A resolução dessa estrutura aqui no LNLS só foi possível, pois contamos com equipamentos de última geração, e temos o apoio da instituição para seu funcionamento”, completa Zeri.

Mutações relacionadas com a SDS levaram os cientistas ao gene que codifica a SBDS humana e se situa no cromossomo 7. “Evidências indiretas indicam que essa proteína apresenta um papel bioquímico fundamental e conservado dentro da célula, provavelmente na biogênese dos ribossomos ou no processamento de RNA”, acrescenta ela. Agora, Oliveira estuda as propriedades dinâmicas da ligação da SBDS com o RNA e prepara um artigo descrevendo a estrutura da proteína e a interação com o RNA. “Mas ainda tem bastante trabalho a ser feito para se entender o mecanismo de ação dessa proteína no processo de biogênese de RNA ribossômico”, afirma. Afinal, a biossíntese, ou seja, a construção do ribossomo requer uma ação coordenada de centenas de proteínas diferentes. Por outro lado, síndromes que envolvem falhas herdadas da medula óssea constituem modelos genéticos de grande utilidade para a compreensão da gênese das leucemias, porque o defeito genético pode ser identificado e o risco de leucemia é muito alto. Dentre essas síndromes, a SDS representa uma das mais comuns.

Aparentemente, a SBDS só está envolvida com leucemias, mas não com outros tipos de câncer. “Uma das características clínicas da doença SDS é a disfunção na medula óssea, que causa anormalidades hematológicas, como anemia e leucemia, entre outras. Portanto, até o momento ainda não existem dados de relação da SBDS com outros tipos de câncer, apenas com aqueles relacionados a problemas hematológicos”, afirma Oliveira. “Mas não se pode descartar a possibilidade da relação desta proteína com outros tipos de câncer, uma vez que a síndrome SDS também causa problemas no pâncreas exócrino e má formação óssea”, pondera.

LNLS projeta acelerador de partículas mais potente

O Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS) apresentou para a imprensa, no último dia 10 de fevereiro, o projeto de um novo acelerador de particulas, o LNLS-2. Com 350 metros de extensão e gerando uma luz dezenas de milhões de vezes mais brilhante, o equipamento deverá colaborar com pesquisas que mantenham o país competitivo no cenário internacional.

Em 2018, um novo acelerador de partículas deve se somar ao que opera atualmente no Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS), em Campinas. “EM 10 ou 15 anos, haverá necessidade de uma nova fonte de luz síncrotron – disse o físico José Antônio Brum, diretor do LNLS – do contrário o país pode deixar de ser competitivo no cenário internacional”. Na América Latina, o anel do LNLS é o único do tipo.

O novo acelerador, chamado de LNLS-2, terá 323 metros de extensão, enquanto o atual LNLS-1 tem 93 metros, e produzirá uma luz mais brilhante – dezenas de milhões de vezes – e mais penetrante, permitindo “enxergar” com maior profundidade a intimidade da matéria. O novo anel terá porte comparável aos equipamentos recém-construídos na França, no Reino Unido e na Suíça.

Essa luz mais potente requer um aumento da energia aplicada ao feixe de partículas no tubo de ultravácuo, além do aumento da extensão do anel. Materiais e moléculas, que ainda não puderam ser estudados, poderão levar à descoberta de novas propriedades. “Já fizemos cristalografia com duas das linhas de luz existentes. No entanto, é difícil gerar cristais grandes de muitas proteínas, algumas delas de grande interesse, e fazer luz suficiente penetrar nelas para arrancar informações”, explica o físico Pedro Tavares, diretor Divisão de Aceleradores e Instrumentação do LNLS.

A máquina mais antiga não será imediatamente aposentada e funcionará por algum tempo em conjunto com a nova. “O importante é que, quando a que está em uso deixar de funcionar, já haverá outro anel funcionando. Esse é o momento de começar a construir uma nova”, disse Tavares.

O principal nicho a ser explorado pelo LNLS-2 são os raios X duros; o do LNLS-1 eram raios X moles e ultravioleta, apesar de ele também emitir luz na faixa do infravermelho e do visível. O raio x é uma radiação eletromagnética cujo comprimento de onda é menor do que o da radiação ultravioleta e que se encontra na região entre 10 e 10-2 nanômetros aproximadamente. Quando bombardeados por elétrons, todos os átomos emitem raios x com comprimentos de onda característicos. De forma bastante geral, a diferença entre raios x duros e moles é a freqüência dos raios, maior no primeiro, e o comprimento de onda, mais curto nesse mesmo caso.

Em operação para usuários desde 1997, o anel do LNLS incluiu o Brasil no grupo de países possuidores da tecnologia – há cerca de 60 no mundo. Concentrando muita luz numa região do espaço, o anel torna possível observar características de amostras muito pequenas. Diferente do acelerador de partículas Large Hadron Collider (LHC), o túnel síncrotron não realiza a colisão de prótons, mas sim a aceleração de elétrons com objetivo de obter a luz síncrotron. Acelerados, os elétrons geram uma luz tão potente, que chega a proporcionar o conhecimento da geometria e do posicionamento de átomos dentro de moléculas. Com informações do tipo, pode-se, por exemplo, descobrir o papel de uma proteína ou o sítio ativo por meio do qual realiza sua função, um alvo potencial para o desenvolvimento de fármacos.

Para o uso de empresas e indústrias, que requerem sigilo dos resultados de pesquisa, o preço de custo é de 700 reais por hora. Já para pesquisadores, podem ter acesso gratuito desde que tornem públicos seus resultados. Há mais de mil usuários por ano, sendo que 25% pertencem ao campo da biologia, enquanto o restante é da área de ciência de materiais.

Para que se iniciem os trabalhos de construção do LNLS-2, o Ministério da Ciência e Tecnologia liberou 2 milhões de reais no final de 2008. O projeto foi apresentado à imprensa em coletiva no dia 10 de fevereiro.

Percepção ambiental é povoada de imagens-clichê

Os slides shows e vídeos caseiros invadiram escolas e universidades. Mais do que mostrar que qualquer um é capaz de tais composições, o uso disseminado dessas tecnologias dá a ver o tipo de contato com as imagens de natureza de professores e alunos.

Os slides shows e vídeos caseiros invadiram escolas e universidades. Programas de uso simples viabilizam criações com imagens fotográficas, sons e vídeos que antes eram impossíveis para quem não sabia manusear a complexa aparelhagem de uma ilha de edição. Mais do que mostrar que qualquer um é capaz de tais composições, o uso disseminado dessas tecnologias dá a ver o tipo de contato com as imagens que alunos e professores têm, em especial, quando o assunto é natureza: passarinhos dando comida para os filhotes, flores que se abrem em bebês, latas jogadas em meio às matas e rios, crianças abraçadas às árvores, animais dormindo no lixo, cenas com fundos verdes etc.

Imagem-clichê mas que apresenta múltiplos sentidos criados pela biologia e produções artísticas

 

Esse tipo de imagens está espalhada por propagandas, novelas e noticiários e resulta de escolhas que querem conduzir e capturar o expectador. Esta é uma das conclusões da professora Lucia Estevinho Guido, da Universidade Federal de Uberlândia, que em seu doutorado trabalhou com as imagens do Repórter Eco da TV Cultura e percebeu como em 15 anos de programa os planos, enquadramentos e narrativas se repetiam: closes, fundos de cena verdes e até mesmo a frase de abertura e fechamento do programa: “Repórter Eco, imagem e ação em defesa do meio ambiente começa agora”.

A padronização no contato com as imagens, o que ensinam esses tipos de composições, e os efeitos de poder e controle que esses discursos imagéticos organizam e desorganizam chamaram a atenção de Antonio Carlos Rodrigues de Amorim, professor da Faculdade de Educação (FE) da Unicamp. Em suas aulas com estudantes da graduação que desenvolviam trabalhos audiovisuais percebeu que “os alunos não conseguiam ver as imagens fora de determinados sentidos. Não havia um trabalho de detalhamento da imagem, de explorar as potencialidades e limitações das imagens. Não parecia ser na imagem, ou na tensão com as imagens, que os sentidos poderiam proliferar. Estamos aprendendo a encher as imagens com as coisas do mundo sem pensar a própria imagem repletas de clichês”. Reconhecer as potencialidades do clichê como um limite intenso do sentido, cujo excesso é plano de forças para o vazio, é a argumentação principal do pesquisador na análise das imagens.

Experimentações criativas

 

Como parte do projeto de pesquisa que coordena – “Educação, Ciências e Cultura: territórios em fronteiras”, financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo – e afim de criar um espaço que proporcionasse o questionamento e a experimentação com as imagens, Amorim propôs à professora de biologia e educação ambiental Ionara Urrutia Moura, do Colégio Técnico de Campinas (Cotuca), um curso de elaboração de vídeos que trabalhasse com imagens e percepção ambiental numa aposta em “esvaziar as imagens dos clichês”, diz Amorim. O trabalho resultou na criação de vídeos (assista aqui) sobre a escola feitos pela professora e pelos estudantes Maria do Carmo B. Barros, Ricardo de U. Moura, Barbara M. Teixeira, Clóvis M. Neves e Danilo de O. Pessoa. Nos vídeos a fotografia e a imagem do cinema foram trabalhadas nas suas potências de imagem (seja congelada ou editada).

 

A apresentação do vídeos produzidos pelos alunos durante o Seminário MULTIPLICImagens, realizado em dezembro do ano passado, gerou uma movimentada conversa sobre os clichês que povoam as imagens voltadas à sensibilização ambiental. “De forma muito massificada nós estamos tomando contato com os mesmos tipos de imagens, apresentadas no mesmo formato e, ao trabalharmos com imagens, repetimos esses formatos e pensamos que é a forma única”, observou Ionara Moura, que relatou entusiasmada como o curso abriu brechas para a criação e o pensamento com imagens na escola.

Alik Wunder, fotógrafa que participou do curso e pós-doutoranda da FE-Unicamp conta que o curso durou 20h e foi organizado em cinco encontros de sábado: “nos dois primeiros foram trabalhadas reflexões sobre o olhar pelas imagens, técnicas básicas de composição, luz e sombra, enquadramento etc, no intuito de criar imagens que chamamos de inusitadas do ambiente escolar e entorno”. Também participaram do curso, na área de captação de imagens e edição em vídeo, Coraci Ruiz e Hidalgo Romero do Laboratório Cisco.

Chamou a atenção de Leandro Belinaso Guimarães, professor da Universidade Federal de Santa Catarina, e um dos convidados para o Seminário, a escolha dos alunos por apresentar nos vídeos os detalhes da arquitetura da escola, “pequenos fragmentos que trazem uma pergunta sobre o lugar onde se transita, onde se está, por onde se passa muitas vezes”. Já Anna Paula Martins, da Editora Dantes e coordenadora do projeto e exposição Gabinete de curiosidades de Domenico Vandelli, surpreendeu-se com a produção feita a partir de uma mesma “cesta de imagens” – um conjunto de fotografias e filmagens foi usado de diversas formas para compor vídeos diferentes – e com o uso dos programas simples de edição disponíveis nos computadores atualmente e com a escolha da escola como espaço para produção de vídeos que visam uma sensibilização para a questão ambiental. Num momento em que há uma disseminação de sentimentos de culpa e medo ligados à relação humanos-natureza e em que grandes empresas criam imagens corporativas ligadas à preservação “talvez a sensibilidade também precise de um vazio”, diz Anna.

Clichês e narrativas modernas

Entre as imagens que Amorim analisou em sua pesquisa junto ao Programa de Pesquisas em Caracterização, Conservação e Uso Sustentável da Biodiversidade do Estado de São Paulo (Biota) estão as imagens de copas de árvores: imagens em que as copas retilíneas deixam passar luz e que os cientistas usam para calcular a quantidade de biomassa a partir da quantidade de luz que entra nos substratos. Essas imagens são bastante utilizadas na divulgação do projeto e também em produções fílmicas para indicar a passagem do tempo. Nos filmes experimentais mais antigos explorados por Amorim alguns cineastas, com a intenção de experimentar uma imagem, filmavam uma copa de árvore, mais ou menos embaçada, fazendo com que a luz explodisse a nitidez da imagem. “Nessas imagens eles buscavam os sentimentos humanos, essas imagens eram uma expressão de sensações. É uma imagem clichê, mas que também tem esses vários outros sentidos possíveis, que podem ser explorados”.

Para o pesquisador da FE-Unicamp é instigante pensar em como certas imagens despertam sensações que são politicamente interessantes para o que se quer, como, por exemplo, proteger a natureza. O descolamento de natureza e cultura não é lago dado, mas uma invenção dos discursos “que estão muito mais interessados na busca de uma essência humana do que na fragmentação entre o biológico e o cultural, que não permitiria o homem, o sujeito, ele mesmo, ser encontrado”. A persistência do discurso da separação entre natureza-cultura mobiliza propostas das ciências e da educação em ciências de superação desta fragmentação, resgate da essência humana.

Seminário MULTPLICimagens

Realização: Projeto de Pesquisa “Educação, Ciências e Cultura: territórios em fronteiras no Programa Biota-Fapesp (Proc.2006/00752-9)”, desenvolvido desde 2006 junto ao Programa de Pesquisas em Caracterização, Conservação e Uso Sustentável da Biodiversidade do Estado de São Paulo, financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do estado de São Paulo (Biota/Fapesp) e o Grupo de Estudos Humor Aquoso, Laboratório de Estudos Audiovisuais (OLHO) da Faculdade de Educação/Unicamp. Coordenação geral: Antonio Carlos Rodrigues de Amorim.

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