Cordão umbilical não deve ser descartado, diz estudo da USP

Atualmente, os bancos de cordão umbilical armazenam apenas o sangue do cordão umbilical, enquanto o próprio tecido do cordão é descartado. Um estudo realizado pelo Centro de Estudos do Genoma Humano da USP, publicado em outubro pela revista Stem Cells, mostrou que esse tecido jogado fora é rico em um tipo especial de células-tronco, chamadas mesenquimais.

Atualmente, os bancos de cordão umbilical armazenam apenas o sangue do cordão umbilical, enquanto o próprio tecido do cordão é descartado. Um estudo realizado pelo Centro de Estudos do Genoma Humano da USP, publicado em outubro pela revista Stem Cells, mostrou que esse tecido jogado fora é rico em um tipo especial de células-tronco, chamadas mesenquimais. Os pesquisadores compararam amostras de sangue do cordão umbilical com o tecido do próprio cordão, obtidos dos mesmos doadores, e avaliaram a presença de células-tronco mesenquimais, que são capazes de se diferenciar em vários tipos de células, como as precursoras de cartilagem, ossos, gordura, músculos e neurônios.

Embora células-tronco mesenquimais tenham sido isoladas de apenas uma dentre as 10 amostras de sangue analisadas, foi possível cultivar esse tipo celular a partir de todas as amostras de tecido do cordão umbilical. Baseados nesses resultados, os pesquisadores sugerem que se estoque também o próprio cordão umbilical além do sangue contido nele, para aplicações terapêuticas e científicas futuras. “As células-tronco mesenquimais poderiam ser utilizadas no caso de fraturas ósseas, reparo de cartilagem, reconstituição de um dente, ou doenças musculares, tais como distrofias”, afirma Mariane Secco, principal autora do artigo.

Essas células-tronco podem ser obtidas a partir de outros tecidos, como a medula óssea, tecido adiposo, polpa dentária, placenta, além do sangue do cordão umbilical e de uma variedade de tecidos fetais, como o baço, pulmão, pâncreas, rins e fluidos amnióticos. Até recentemente, a medula óssea era considerada a melhor fonte desse tipo de célula, tanto para aplicações terapêuticas como clínicas. “Diante da dificuldade da punção da medula, que é feita por cirurgia e requer o uso de anestesia geral, o cordão umbilical surge como uma fonte alternativa e mais vantajosa para terapia celular”, diz Secco. “Neste caso, a obtenção é simples, segura, não interfere no parto, e não prejudica a mãe ou o bebê. Além disso, o cordão umbilical é um material que é descartado após o nascimento”, completa.

Atualmente, o sangue de cordão umbilical é armazenado porque ele é rico em um outro tipo de células-tronco, denominadas hematopoiéticas – precursoras das células sanguíneas. Desde a década de 80, essas células são utilizadas em transplantes no caso de doenças hematológicas (sanguíneas), tais como leucemias e anemias. O sangue de cordão umbilical é estocado e preservado em tanques de nitrogênio, em soluções especiais que mantêm a viabilidade das células. Teoricamente, nessas condições, a viabilidade e as características das células congeladas se mantêm indefinidamente. Entretanto, “na prática, isso ainda não foi avaliado, visto que este tipo de serviço é ainda recente, e não foi possível testar como se encontram as células após longos intervalos de tempo”, relata a pesquisadora.

A presença das células-tronco mesenquimais no sangue de cordão é controversa. Alguns trabalhos relatam o sucesso em seu isolamento, enquanto outros demonstram ausência ou baixa eficiência no isolamento dessas células a partir de sangue de cordão umbilical humano. Dados ainda não publicados pela equipe da USP indicam que o isolamento de células-tronco a partir do sangue de cordão umbilical é ao redor de 10%. “Este trabalho foi realizado por um dos colaboradores do nosso grupo, o professor Oswaldo Keith Okamoto, anteriormente à publicação dos nossos resultados. Ele obteve a mesma taxa de sucesso no isolamento de células-tronco mesenquimais do sangue de cordão umbilical (10%), porém em um número muito maior de amostras (100 amostras). Portanto, seus resultados apenas confirmam aquilo que estamos divulgando: o sangue de cordão umbilical é pobre em células-tronco mesenquimais”, conta Secco.

O armazenamento do sangue do cordão umbilical em bancos públicos e particulares tem causado muitos dilemas éticos. “São várias as questões sobre o assunto: a probabilidade de o indivíduo vir a realmente utilizar essas células no futuro, a viabilidade das células com tempo, quem deve pagar pela manutenção desses bancos de células, etc”, diz Alysson Renato Muotri, um dos co-autores do artigo e pesquisador associado do laboratório de genética do Instituto Salk para Estudos Biológicos da Califórnia, nos Estados Unidos. “Não acho que o armazenamento do próprio cordão vai resolver diretamente nenhuma dessas questões. Acho que a facilidade de obter células diretamente do cordão deve funcionar como um estímulo para pesquisa básica. Pesquisadores deverão procurar entender melhor o real potencial dessas células e a melhor forma de aplicação terapêutica. Como conseqüência disso, os dilemas devem diminuir”, acredita.

Outro dilema é que as opiniões são divergentes quanto ao armazenamento do sangue de cordão umbilical em bancos públicos e particulares. “Há quem defenda que seria mais vantajoso armazenar o sangue do cordão umbilical em bancos públicos, visto que a chance do próprio indivíduo ter uma doença do sangue (por exemplo, leucemias) é muito pequena e, se a doença for genética, o indivíduo não poderá usar suas mesmas células, que também apresentarão o mesmo defeito no gene. Sendo assim, não se justificaria pagar um alto valor para armazenar seu próprio material”, afirma Secco. Como o comprimento do cordão umbilical humano pode chegar até a 45 cm e o grupo utiliza apenas um pequeno fragmento de 7 cm para isolar uma grande quantidade de células mesenquimais, “é sugestivo a divisão da amostra, sendo que metade poderia ser estocada em um banco público e a outra metade seria armazenada no banco particular”, sugere.

Em suma, o armazenamento de sangue e de tecido do cordão umbilical permitiria o máximo aproveitamento de células-tronco mesenquimais e hematopoiéticas para possíveis aplicações terapêuticas no futuro. “A grande mensagem que gostaríamos de transmitir é: não descartem o cordão porque ele é rico em células-tronco mesenquimais que poderão ser importantes para diversas finalidades terapêuticas”, finaliza Secco.

Reforma tributária próxima do Congresso, mas ainda longe de um consenso

A reforma tributária voltou a estar em pauta devido às discussões sobre a renovação da CPMF. “Nós precisamos abrir mão das nossas propostas individuais e construir uma proposta consensual para o país. Estamos perto e vamos mandar logo [para o Congresso Nacional]”, declarou o presidente Lula, em programa de rádio no fim de outubro.

A reforma tributária, debatida há anos e tida como uma necessidade para impulsionar o crescimento do país, voltou a estar em pauta devido às discussões sobre a renovação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF). O presidente Lula, em programa de rádio Café com o Presidente no fim de outubro, afirmou que a maior dificuldade da reforma é conciliar os diferentes interesses da União, dos estados e municípios, mas que o texto está quase pronto. “Nós precisamos abrir mão das nossas propostas individuais e construir uma proposta consensual para o país. Estamos perto e vamos mandar logo [para o Congresso Nacional]”, declarou o presidente.

A reforma tributária tem como objetivo simplificar a cobrança de impostos em âmbito federal, estadual e municipal. Os impostos como o PIS, Cofins, IPI, Cide Combustíveis, ICMS e ISS dariam lugar a apenas três: o Imposto de Valor Agregado Federal (IVA Federal), o Imposto de Valor Agregado Estadual (IVA Estadual) e o Imposto sobre Vendas e Varejo, na esfera municipal.

O atual modelo fiscal é tido como insustentável para o setor produtivo, pois é complexo e cumulativo, gerando o chamado ‘efeito cascata’, ou seja, o imposto é cobrado repetidamente nos vários elos da cadeia produtiva. Além disso, leva à conhecida guerra fiscal, mecanismo que permite aos estados e municípios modificar as alíquotas de seus tributos para atrair empresas e investidores. De acordo com o professor Francisco Lopreato, do Instituto de Economia da Unicamp, o sistema tributário brasileiro tem sua origem no Código Tributário Nacional de 1965 e, desde então, vem sofrendo emendas e leis para adaptá-lo às mudanças econômicas. “Todos esses ajustes criaram uma deturpação muito forte e, o sistema precisa ser revisto”, afirma.

A idéia de unificação dos tributos é considerada boa por Lopreato. Ele explica que um imposto de valor agregado elimina o ‘efeito cascata’, pois possui um sistema de créditos que funciona da seguinte maneira: quando uma empresa vende matéria-prima a uma outra, ela paga o imposto. No momento que esta segunda empresa agrega valor ao produto pronto (através da produção) e o revende, ela usa o valor pago pela primeira empresa como crédito dedutível do valor de seu imposto, recolhendo apenas proporcionalmente ao que ela adicionou. Atualmente, o ICMS estadual funciona desta maneira.

“Em princípio, o IVA é positivo, pois expande este conceito do valor agregado a outros tributos. O risco que temos é o de na unificação, optarmos pelas alíquotas praticadas mais altas e criar um imposto único muito alto”, pondera o economista. Esta é uma possibilidade que afetaria o setor produtivo. O problema é que como existem diversas alíquotas, os estados que praticam as mais altas, irão pressionar para a unificação nestes valores, para não perderem arrecadação. “A harmonização dos diversos interesses é o maior desafio”, conclui Lopreato.

Um ponto polêmico da unificação das alíquotas é a perda de espaço dos governos estaduais, pois os mesmos não poderiam definir a sua estrutura tributária. Lopreato defende que na reforma tributária seja discutida também a distribuição dos impostos. Atualmente, grande parte das verbas municipais passa diretamente do governo federal para os municípios. “Isso é um problema grave, pois os estados estão perdendo poder, mas eles é que conhecem melhor as necessidades de cada cidade”, afirma.

Ao perder a possibilidade de determinar as alíquotas de seus impostos, os estados também ficarão impossibilitados de fazer a ‘guerra fiscal’ para atrair novas empresas. Entretanto, para o pesquisador da Unicamp, esta política de incentivos existe no vácuo de uma política nacional de desenvolvimento industrial regional, que se mostra necessária. A guerra fiscal, segundo ele, faz com que os estados concedam incentivos de maneira desorganizada e, muitas vezes, nem obtenham benefícios muito grandes.

Outra grande discussão é a proposta da tributação dos impostos no destino da mercadoria, ao contrário do que ocorre atualmente, em que o imposto incide na origem. Os estados essencialmente exportadores de bens industrializados, como São Paulo e Amazonas, perderão receita. Internacionalmente, a tributação é feita no destino. Lopreato diz que para São Paulo o prejuízo será menor, já que o estado produz muito, mas também consome bastante. No Amazonas, devido aos incentivos da Zona Franca de Manaus, a diferença entre o consumo e a produção é extrema, e por isso, segundo Lopreato, essa questão necessitará atenção especial.

O economista da Unicamp defende um modelo de distribuição da arrecadação per capita, um sistema de transferências vertical entre a união, os estados e os municípios, e horizontal, entre os estados e municípios, considerando a população. “Isso precisa ser estudado; se você analisar as diferenças entre cidades muito próximas, como na região metropolitana de Campinas, em que se tem Paulínia com um recurso per capita dez vezes maior do que as outras, verá que é preciso mudar isso e distribuir os recursos de uma forma mais uniforme”.

Recentemente, foram implantadas algumas mudanças como a integração de cadastros estaduais, a nota fiscal eletrônica e o Sistema Público de Escrituração Digital (SPED), que estão contribuindo para a redução de custos com fiscalização, por parte dos governos, e para a queda dos custos empresariais com as áreas tributárias. Isto, aliado ao crescimento da economia, está também fazendo com que o Brasil tenha tido sucessivos recordes de arrecadação.

Lopreato entende que a atual discussão sobre a prorrogação da CPMF até 2011 deve ser feita dentro do contexto do sistema tributário como um todo. Entretanto, os desafios da reforma são enormes, e atingir um consenso será muito difícil.

UFSCar cria vagas exclusivas para indígenas

A UFSCar abre nesse mês as inscrições para o seu primeiro vestibular indígena. A iniciativa faz parte da Política de Ações Afirmativas da universidade e do Plano de Desenvolvimento Institucional, que prevê ainda a reserva de vagas para alunos de escolas públicas, em especial negros e pardos. No vestibular exclusivo para índios, que será realizado em fevereiro de 2008, cada curso contará com uma vaga criada exclusivamente para indígenas.

A Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) abre agora em novembro as inscrições para o seu primeiro vestibular indígena. A iniciativa faz parte da Política de Ações Afirmativas da universidade e do Plano de Desenvolvimento Institucional, que prevê ainda a reserva de 20% das vagas para alunos de escolas públicas das quais 35% para alunos negros e pardos saídos do ensino médio público (a meta é 50% até 2017).

O Grupo Gestor do Programa de Ações Afirmativas da UFSCar estudou durante dois anos a experiência de outras universidades. Segundo Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva, coordenadora do grupo, também foram promovidos debates no campus e realizadas consultas com lideranças indígenas e negras para discutir quais ações seriam implementadas.

No vestibular exclusivo para indígenas, que será realizado em data diferente dos demais (fevereiro de 2008), o objetivo é não só avaliar a educação formal mas contemplar os conhecimentos dos povos indígenas. “É importante lembrar que não será um vestibular mais fácil, apenas diferente”, destaca Petronilha.

Cada curso contará com uma vaga criada exclusivamente para indígenas. Diferentemente da USP, por exemplo, que oferece um curso exclusivo para professores indígenas, a UFSCar abre a possibilidade do índio se inscrever para qualquer um dos cursos. Não existe motivo para determinar quais cursos serão mais “adequados”.

Para concorrer às vagas exclusivas, o candidato deverá apresentar uma carta da liderança da aldeia onde vive e ter realizado ensino médio em escolas públicas. “Já recebi ligações de três estudantes do Alto Xingu interessados nos cursos”, lembra Petronilha que acredita que, mesmo não tendo indígenas nas proximidades, a UFSCar não pode restringir sua atuação às realidades locais. A universidade terá que rever seu programa de bolsas para alimentação, moradia e material, para que os ingressantes, vindos de comunidades distantes, possam permanecer no curso até sua conclusão.

O Grupo Gestor do Programa de Ações Afirmativas enxerga estas ações como parte integral das funções sociais da universidade pública, e entende que os mais diferentes segmentos da sociedade devem estar nela representados. Segundo a coordenadora do grupo, a universidade reproduz as desigualdades vigentes na sociedade: a grande maioria dos seus alunos é branca, oriunda das escolas particulares, tendo pouca ou nenhuma representação dos demais grupos.

Assim como a luta por maior participação política nas diferentes esferas do governo e da sociedade, pela garantia de direitos sociais e pelo respeito ao seu modo de ser e viver, o acesso à universidade também passa a ser uma reivindicação dos povos indígenas.

O objetivo do Programa de Ações Afirmativas da UFSCar que acontece a partir do vestibular de 2008, baseado em critérios sócio-econômicos e étnico-raciais, é trazer para a universidade populações à margem do ensino superior. Por essa razão, a universidade ganhou o Prêmio Camélia da Liberdade, destinado a instituições promotoras de ações que valorizem a cultura afro-brasileira, reconheçam e destaquem suas capacidades profissionais e estejam engajadas na luta contra a discriminação racial.