Cresce a participação da ciência no meio audiovisual

Nos últimos 20 anos, os meios audiovisuais brasileiros têm cedido cada vez mais espaço para a ciência. Essa é a opinião do professor de Física da UFRJ e diretor do Departamento de Popularização e Difusão da Ciência e Tecnologia do Ministério de Ciência e Tecnologia (MCT), Ildeu de Castro Moreira.

Nos últimos 20 anos, os meios audiovisuais brasileiros têm cedido cada vez mais espaço para a ciência. Essa é a opinião do professor de Física da UFRJ e diretor do Departamento de Popularização e Difusão da Ciência e Tecnologia do Ministério de Ciência e Tecnologia (MCT), Ildeu de Castro Moreira, que coordenou no início do mês o Festival de Cine e Vídeo Científico do Mercosul (Cinecien), promovido pela Rede Especializada de Ciência e Tecnologia do Mercosul (RECyT). “É o interesse pela ciência de forma geral que sustenta produções sobre o tema em diversos meios e ações pró-ativas, como a construção de museus de ciência”, diz.

Entre os eventos recentes sobre a participação da ciência nas produções audiovisuais estão o seminário “História da ciência no cinema”, promovido em outubro de 2005 pela Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal de Minas Gerais, o Simpósio Ciência e Arte 2006, realizado no Rio de Janeiro no mês de outubro e, no mesmo mês, a II Mostra de Ciência no Cinema em Campinas do Labjor/Unicamp.

Apesar do crescimento e da boa qualidade de muitas produções audiovisuais sobre ciência no Brasil, há ainda muito a ser feito para que o país se aproxime da realidade internacional. Moreira acredita que essa presença da ciência no vídeo decorre de uma onda de interesse científico, que sucede outras, como a fase de 1870 (grande interesse pela ciência aplicada), a da década de 1930 (quando o Brasil começou a se pronunciar em ciência básica) e o período pós Segunda Guerra Mundial.

Para se ter uma idéia de como o país ainda está em posição desfavorável no contexto mundial, basta constatar que enquanto cerca de 20% dos europeus freqüentam museus anualmente, no Brasil, essa cifra cai para aproximadamente 1%. Em número de planetários, o Brasil apresenta apenas 10% da quantidade observada na Índia (que está em torno de 300).

Outro aspecto a se considerar na produção de vídeos sobre ciência é a carência de produções de ficção de qualidade. “O Brasil poderia explorar mais a vertente da ficção para levar a ciência ao grande público”, afirma Moreira, “essa é uma forma excelente de aprendizado com entretenimento e talvez seja a mais difícil de se produzir”. O que ocorre, muitas vezes, é a criação de imagens que passam uma visão deturpada da ciência, com conceitos científicos errados. “Um desserviço prestado à sociedade”, lamenta.

Mas muitas produções que abordam o tema da ciência, se não transmitem os assuntos de forma plenamente satisfatória, trazem ao público o assunto como tema de discussões relevantes. Moreira cita a novela “O Clone”, transmitida pela rede Globo em 2001, como um veículo de massa que levou a população a pensar sobre questionamentos importantes, embora tenha cometido deslizes informativos, como a estereotipagem da figura do cientista, entre outros.

O Festival Cinecien, que acaba de ocorrer, teve uma primeira versão no ano passado, na Argentina, e mostra-se mais aberto à participação dos países mercosulinos. Segundo Moreira, neste ano, o regulamento foi discutido pelos países do bloco de forma mais integrada. Quanto aos resultados, o coordenador do evento está bastante satisfeito. Foram submetidos 184 filmes e premiados quatro, além de oito menções honrosas e da premiação de uma categoria especial (veja a lista de filmes premiados). As categorias de premiação foram: vídeos e filmes didáticos, programas para TV, longas e curtas-metragens documentários e ficção. Segundo o físico, a presença do Brasil no festival foi significativa, o que revela uma penetração mais efetiva da ciência no cotidiano das pessoas. “O material produzido no Brasil é muito rico, com temas que variam de nanotecnologia a astronomia, e a divulgação por meio de eventos como esse é fundamental para que as produções tenham maior acesso a recursos de órgãos de fomento”, afirma.

Interdependência marca relações entre Estado e mídia no Brasil

Octavio Penna Pieranti, pesquisador da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas, analisa, em artigo publicado no periódico Lua Nova, a relação de interdependência da mídia e políticas brasileiras e defende a necessidade de uma revisão urgente das leis que atualmente regulam a comunicação social no Brasil.

A mídia, no Brasil, não pode ser entendida sem a política. Isso porque, desde a chegada da imprensa em território brasileiro, essas duas esferas de poder são marcadas por uma relação de interdependência. Octavio Penna Pieranti, pesquisador da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas (Ebape), analisa em artigo publicado na última edição de Lua Nova: revista de cultura e política (n° 68), essa relação e confirma a necessidade de uma revisão urgente das leis que atualmente regulam a comunicação social no Brasil.

O pesquisador começou sua análise na origem da imprensa no Brasil, no século XVIII, seguiu até 1962, quando o Código Brasileiro de Telecomunicações (CBT) foi criado, passou pelo período da ditadura militar, a abertura democrática, até chegar à crise na mídia brasileira – da década de 1990 até o início deste século.

Durante o período do regime militar, os setores de radiodifusão e de imprensa foram analisados sob dois vértices. O primeiro refere-se aos investimentos em infra-estrutura e a modernização das transmissões de rádio e televisão, que durante os governos militares, notadamente o de Castelo Branco (1964-67) e de Arthur da Costa e Silva (1967-69), se destacaram com grandes investimentos em melhorias técnicas. O segundo analisa o controle exercido pelo governo através do corte de ajuda financeira às empresas não alinhadas ao regime e através da repressão e da censura naquelas antipáticas às leis militares. O Ato Institucional número 1, por exemplo, de 1964 e o Ato Institucional número 5, de 1968, suspenderam as garantias constitucionais. Outras medidas foram tomadas para limitar a liberdade de expressão. “O Decreto-Lei 898, de 1969, conhecido como Lei de Segurança Nacional, e a Lei 5.250, de 1967, conhecida como Lei de Imprensa, estabeleceram limitações à manifestação de pensamento e à liberdade de imprensa. Aliadas a outros dispositivos legais, essas regulamentações facilitaram a coerção, por parte de atores ligados ao governo federal, a profissionais de imprensa”, explica Pieranti.

Com o fim do regime, o primeiro civil no comando do Ministério das Comunicações foi Antonio Carlos Magalhães, que permaneceu no cargo durante todo o governo de José Sarney. “A família Magalhães é dona da TV Bahia (afiliada da TV Globo) e de jornais e controla outras emissoras no interior do estado”, lembra Pieranti. Ele enfatiza ainda o caso da reeleição do presidente Fernando Henrique Cardoso, cuja aprovação da emenda que autorizou a reeleição teria sido possível graças – entre outros fatores – a distribuição, pelo Ministério das Comunicações, de 1.848 Estações Retransmissoras de Televisão (RTVs). “Quase 400 dessas RTVs, principalmente as destinadas a deputados, senadores e prefeitos, receberam autorização para funcionar em dezembro de 1996, apenas um mês antes da votação em primeiro turno da emenda da reeleição na Câmara dos Deputados. As concessões, mais uma vez, contribuíram decisivamente para que o poder público pudesse aprovar uma medida polêmica”, afirma.

Antigas práticas foram não apenas mantidas como também ampliadas, como é o caso do atual regime de concessão pública de rádio e TV para parlamentares, embora o código de ética o proíba. Não é novidade que inúmeros parlamentares detém concessões de meios de comunicação. Segundo dados divulgados pela Agência Repórter Social, um terço dos senadores e mais de 10% dos deputados eleitos para o mandato de 2007 a 2010 controlam rádios ou televisões. No entanto, no último dia 20 de dezembro, os parlamentares da Comissão de Ciência, Tecnologia, Comunicação e Informática (CCTCI) da Câmara, responsáveis por analisar e aprovar as concessões, rejeitaram 83 pedidos alegando falta de documentos para uma análise detalhada dos pedidos (leia matéria). publicada na Carta Maior.

Outro momento que ilustra a interdependência mídia-política é a crise no setor de comunicações nos anos 1990. Consequentemente houve diminuição da circulação de revistas entre os anos de 2000 e 2002 de 17,1 milhões para 16,2 milhões de exemplares por ano, enquanto os jornais passaram de 7,9 milhões para 7 milhões de exemplares ao ano. Entre as emissoras de TV, a Manchete acabou vendida, depois de 15 anos de funcionamento, por estar afundada em dívidas. A dimensão da crise se tornou pública quando associações representativas das empresas do setor pediram ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) R$1,2 bilhão para a compra de papel jornal e de R$ 5 bilhões para o refinanciamento de dívidas. A intervenção pública no setor privado das comunicações põe em dúvida, acredita Pieranti, o papel essencial da imprensa que é o de fiscalizar o poder público. “Trata-se de pilares equivocados sobre os quais se organizam as empresas de radiodifusão e de imprensa: elas dependem excessivamente das verbas constantes do poder público e parecem preferir assim fazê-lo a buscar outras fontes de renda”, analisa.

Segundo o autor da pesquisa, em todos os períodos, inclusive no atual, é possível identificar um eixo central nas relações entre governo e meios de comunicação, seja através do repasse de verbas, empréstimos ou veiculação de propagandas de estatais. Por isso, ele é incisivo ao afirmar a urgente necessidade de reformulação das leis que regulam o setor de comunicações no Brasil. Outro ponto destacado são as legislações ultrapassadas e a fragilidade das leis mais recentes. “Tramitaram e ainda tramitam no Congresso Nacional diversos projetos de lei que têm como objetivo a regulação da atividade jornalística e da radiodifusão, faltando, ainda, passados quase vinte anos do fim do regime militar, suas aprovações“, explica. É necessário ainda políticas públicas mais transparentes para o setor de comunicações, de modo a facilitar investimentos sem o comprometimento da liberdade e da isenção da imprensa.

Leia mais:
Política rege concessões de rádio e TV

População desconhece órgãos que combatem a corrupção, revela pesquisa da UnB

Pesquisa da Universidade de Brasília (UnB) mostra que os órgãos de combate à corrupção no país são desconhecidos pela população. A constatação foi feita por alunos do curso de ciência política, que coordenados pelos professores Ricardo Caldas e Robson Pereira, entrevistaram 839 pessoas de diversas cidades do Distrito Federal.

Pesquisa da Universidade de Brasília (UnB) mostra que os órgãos de combate à corrupção no Brasil são desconhecidos pela população. A constatação foi feita por alunos da disciplina Teoria e Análise da Corrupção, do curso de graduação em ciência política. Coordenados pelos professores Ricardo Caldas e Robson Pereira, os estudantes entrevistaram 839 pessoas de diversas cidades do Distrito Federal. O estudo destaca que a sociedade não sabe com quais órgãos pode contar para denunciar a corrupção.

Os resultados da pesquisa revelam que a maioria dos entrevistados (55%) desconhece, por exemplo, as atribuições do Tribunal de Contas da União (TCU), o principal órgão de fiscalização do dinheiro e dos bens públicos. Algumas das competências do TCU são: apreciar as contas anuais do presidente da República; julgar as contas dos administradores e demais responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos; apreciar a legalidade dos atos de admissão de pessoal e de concessão de aposentadorias, reformas e pensões civis e militares; fiscalizar a aplicação de recursos da União repassados a estados, ao Distrito Federal e a municípios, dentre outras. Dos entrevistados, entre os que conhecem o Tribunal, quase 40% não confiam no seu trabalho.

Já em relação à Controladoria Geral da União (CGU), órgão que responde pelo Brasil perante a Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção (UNCAC), suas atribuições são desconhecidas por 68,4% dos entrevistados. Entre os 27,3% que têm noção do trabalho da CGU, 40,6% não acreditam na sua eficiência. A CGU é responsável por assistir ao presidente da República quanto aos assuntos que, no âmbito do poder executivo, sejam relativos à defesa do patrimônio público e ao incremento da transparência da gestão, por meio das atividades de controle interno, auditoria pública, prevenção e combate à corrupção.

De acordo com Robson Costa Pereira, presidente do grupo Cristãos Contra a Corrupção (Criscor) e um dos coordenadores do estudo, uma das premissas básicas de políticas públicas, a nível federal, é o conhecimento de um órgão e o reconhecimento de suas competências. Para divulgar seus trabalhos e resultados, os órgãos como o TCU e a CGU utilizam como meio principalmente a Internet, mas, segundo Pereira, os poucos que acessam os sites sentem dificuldades em encontrar informação básica com linguagem popular. “Para as grandes massas da sociedade civil, há muito pouco sendo feito para que os órgãos sejam conhecidos e respeitados. A população fica sabendo pela mídia o que está acontecendo, mas algumas informações são transmitidas de modo distorcido”, diz Pereira.

A pesquisa ainda revela que a falta de confiança em relação às instituições pode influenciar na maneira como é feita a fiscalização. “A cultura da corrupção sugere que mesmo o mais corrupto nunca assumirá. Por isso, a pesquisa também sugere que o serviço de fiscalização depende muito do relacionamento com a população. Grande parte de processos contra a corrupção são iniciados por indícios percebidos quase que por acaso (uma escuta, uma visita, etc). O que deveria acontecer é uma avalanche de denúncias sobre todo e qualquer tipo de corrupção para que estes órgãos entrassem em ação a partir da participação popular. Se não há confiança, não há interesse, se não houver interesse, não haverá denúncia”, afirma Pereira. As denúncias aos crimes de corrupção podem ser feitas de forma anônima, o que contribui para que as pessoas denunciem.

Após participar da recente cerimônia de posse do governador de São Paulo José Serra, no Palácio dos Bandeirantes, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso disse que o país assistiu, nos últimos dois anos, a um “descalabro” em relação à punição dos casos de corrupção, referindo-se à falta de punição em relação aos escândalos como o da “máfia das sanguessugas”. Já o presidente re-eleito, Luís Inácio Lula da Silva, no discurso de posse, afirmou que dentre as prioridades do governo nos próximos anos está o combate à corrupção.

A pesquisa da UnB mostra que, apesar do recente quadro de denúncias de corrupção na esfera pública do país, o brasileiro ainda tem esperança. A maioria (86,2%) acredita que o uso ilícito dos bens públicos pode ser combatido, principalmente pelo Ministério Público da União, a Polícia Federal e a própria sociedade civil. “Chegamos em um momento de amadurecimento, em que o povo percebeu que precisa participar mais do processo”, diz Pereira. Ele afirma que esse despertar da sociedade deve-se, principalmente, a uma profunda decepção com os três poderes que, ao invés de combaterem a corrupção, abrem espaço para ela.

Teóricos e analistas em corrupção

A matéria Teoria e Análise da Corrupção, da graduação em ciência política na UnB, aborda os temas mais recorrentes no estudo teórico da corrupção, como causas, conseqüências e custos gerados por ela. Os alunos trabalham com estudos de casos, comparando a experiência do Brasil no combate à corrupção com a de outros países. O analista político, ou cientista político, trabalha como um especialista na análise da conjuntura política para fornecimento de projetos de políticas públicas para autoridades governamentais ou para o setor privado. Os dados pesquisados por esses profissionais têm uma demanda importante, e muitas empresas estrangeiras fazem consultas a peritos brasileiros sobre o mercado e sobre a política antes de decidir investir no país.