Melhora no diagnóstico permitirá detecção precoce de Alzheimer

O Alzheimer afeta cerca de um milhão de brasileiros. O diagnóstico disponível é feito quando o paciente já apresenta perda de memória com déficits cognitivos. Este quadro poderá ser minimizado com o aperfeiçoamento dos critérios de diagnóstico, a exemplo do trabalho liderado pelo neurologista Bruno Dubois, que permitirá detectar a doença em estágio inicial, aumentando a eficácia dos tratamentos disponíveis.

Em 1984, foi desenvolvido um dos critérios de diagnóstico de Alzheimer mais utilizados nos dias de hoje, o NINCDS-ADRDA. De lá para cá houve muitos avanços no combate à doença que, apenas no Brasil, afeta um milhão de pessoas. No entanto, o diagnóstico é feito quando o paciente apresenta perda de memória com déficits cognitivos. Este quadro poderá ser minimizado com o aperfeiçoamento dos critérios de diagnóstico da doença, a exemplo do trabalho liderado pelo neurologista francês Bruno Dubois, que permitirá detectar o Alzheimer em estágio inicial, aumentando a eficácia dos tratamentos disponíveis.

Para a equipe de Dubois, já estava mais do que na hora de usar esses avanços em prol de um NINCDS-ADRDA revisado e moderno. Os resultados, publicados em artigo no periódico britânico Lancet Neurology (vol. 6, ed. 8, 2007), foram baseados na associação de dados e parâmetros de análise clínica com exames laboratoriais, análise de líquor, ressonância magnética e tomografia por emissão de pósitrons (PET, na sigla em inglês) em regiões específicas de ação da doença, como o hipocampo e o córtex entorrinal. Muitos desses processos já fazem parte do diagnóstico atual da doença, inclusive no NINCDS-ADRDA. Mas a combinação de tais métodos da forma como propõe a equipe de Dubois é que pode levar a um diagnóstico precoce.

Azheimer
O primeiro sintoma de Alzheimer é amnésia. Imagem: Bill Sanderson / Bruno de Bois et. al

“Com o diagnóstico novo, mostrando parâmetros que apontam para lesões compatíveis com a doença, é possível tratar precocemente”, explica Benito Damasceno, coordenador do Departamento de Neurologia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Segundo ele, os critérios atuais de diagnóstico só permitem que se detecte o Alzheimer quando o paciente manifesta outros déficits cognitivos, sejam de linguagem, percepção, destrezas motoras ou funções executiva, que é quando se perde a capacidade de realizar tarefas fora de casa, como fazer compras.

O novo critério ainda precisa da aprovação por consenso da comunidade médica nos congressos internacionais e comitês de ética para ser utilizado clinicamente. Além disso, é preciso ressaltar que sua realização é mais cara e alguns procedimentos necessários a sua prática ainda não estão disponíveis no Brasil. O Alzheimer não tem cura. Os tratamentos medicamentosos atuais conseguem apenas estabilizar temporariamente a deterioração do tecido cerebral em parte dos pacientes, além de restabelecer alterações de humor geradas pela doença como apatia e depressão. Apesar da incerteza quanto à eficácia, tais remédios custam caro. O custo do tratamento mensal sai por R$ 200 em média e são comuns efeitos colaterais que vão de problemas gastrintestinais à tontura, falta de apetite com ocorrência de anorexia, sonolência e suor corpóreo elevado. “Não se pode criar outra doença além da que o indivíduo já tem”, enfatiza Damasceno.

Entre os fatores que desencadeiam o Alzheimer está a ação nociva de, principalmente, duas proteínas: a beta-miloide e a tau hiperfosforilada. Enquanto a primeira age mais na região externa do neurônio, causando uma reação inflamatória, destrutiva, a segunda age no interior celular, destruindo a arquitetura da célula, seus microtúbulos. O resultado é que os neurônios não conseguem mais transportar substâncias.

Despreparo no diagnóstico

Atualmente, o Sistema Único de Saúde (SUS) permite que se façam exames clínicos e laboratoriais para o diagnóstico de Alzheimer. Tomografia convencional e ressonância magnética também são pagas pelo Estado em regiões em que existam tais equipamentos.

“Não é difícil diagnosticar a doença. Mesmo com os métodos pagos pelo SUS chegamos a um diagnóstico eficaz de 80%. Os demais 20%, apesar de preencher os critérios de Alzheimer, mostram outra lesão na análise patológica pós-morte do paciente”, afirma o neurologista.

​_​_Damasceno também diz que, atualmente, mais casos de Alzheimer são diagnosticados que no passado graças à melhor capacidade de diagnóstico dos médicos. Isso ocorreu devido, em parte, ao patrocínio da indústria farmacêutica no aperfeiçoamento desses profissionais. “A intenção da indústria é que os médicos prescrevam seus medicamentos em pacientes que realmente tenham a doença pois, caso contrário, eles [os medicamentos] vão falhar”, defende.

Apesar dos avanços, o problema maior no diagnóstico da doença continua sendo o despreparo de alguns médicos. “Hoje em dia ainda tem neurologista que não consegue diagnosticar Alzheimer, pois acha que é outra coisa. Ou pior ainda. Basta o paciente se queixar de problema de memória para muitos profissionais diagnosticarem a doença ou indicarem uma tomografia sem fazer um exame detalhado ou exame de sangue para ver se há deficiência de vitamina B12 ou de hormônio da tireóide, fatores que também causam demência. E aí prescreve o medicamento precipitadamente”, lamenta Damasceno.

Entidades científicas querem a extinção do fumódromos

41 entidades profissionais e científicas apóiam uma mudança na lei 9294/96 para eliminar os locais públicos reservados a fumantes. A medida é recomendada pela Conferência das Partes da Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco (COP).

A Comissão Nacional para Implementação da Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco (CONICQ) elaborou uma manifestação de apoio à mudança na legislação nacional para eliminar de vez os fumódromos. O documento foi assinado não só pela diretoria da CONICQ, como também por 41 representações de entidades profissionais e científicas. A CONICQ é um órgão internacional formado pelos países que ratificaram a Convenção-Quadro sobre o tabaco, grupo do qual o Brasil faz parte.

A extinção dos locais públicos para fumar é recomendada pela Conferência das Partes da Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco (COP). Segundo o manifesto da CONICQ, “a COP orienta seus Estados Partes a adotar medidas legislativas para banir totalmente o ato de fumar em ambientes fechados e desaconselha qualquer sistema de ventilação como alternativa a essas medidas”. Essa orientação bate de frente com a lei 9.294, de 15 de julho de 1996, que permite o fumo em áreas destinadas a esse fim desde que isoladas e arejadas.

De fato, um estudo feito em Braga, Portugal, pelo grupo do biólogo José Precioso, do Instituto de Educação e Psicologia da Universidade do Minho, apresenta dados que comprovam que locais públicos como restaurantes e principalmente discotecas possuem altos níveis de poluição por fumo do tabaco.

O teor de nicotina no interior de um ambiente é medida pela quantidade de fumo de tabaco que seria inalada por uma pessoa ali presente. Para obter esses números, monitores equipados com filtros foram instalados dentro de locais públicos e, em seguida, analisados em laboratório.

Os resultados, publicados em outubro deste ano na Revista de Saúde Pública da USP e intitulado “Poluição do ar interior provocada pelo fumo do cigarro em locais públicos de Portugal” mostraram que os teores de nicotina nas discotecas foram os mais extremos, chegando a atingir 106,31 microgramas por metro cúbico.

Cartaz da campanha do Dia Nacional de Combate ao Fumo (26 de agosto) distribuído pelo Instituto Nacional do Câncer (INCA).

Já nos restaurantes, o nível de nicotina atingiu 1,54 microgramas por metro cúbico. Segundo os autores do estudo, esse valor é também alto e representa um risco especialmente grave para os funcionários desses estabelecimentos. Afinal, conforme a mesma pesquisa, a exposição à metade desse índice pelos funcionários durante cerca de 40 anos de trabalho já representa um grande risco de desenvolver câncer de pulmão. Por outro lado, Precioso afirma em seu artigo que “não há nenhum nível de exposição ao fumo ambiental do tabaco que se possa considerar sem risco”.

Esses dados atingem principalmente bartenders (barmen), garçons e outros trabalhadores desses estabelecimentos, sobretudo nos ambientes reservados para fumantes. Para Precioso, esses fumódromos deveriam ser eliminados. “Seria uma forma de proteger a saúde dos não-fumantes, pois o fumo ambiental do tabaco contém mais de quatro mil substâncias, sendo que cerca de 60 são cancerígenas”. O pesquisador ainda afirma que os níveis de nicotiva encontrados em algumas discotecas equivale ao consumo de 15 cigarros por dia para as pessoas que ficam expostas à fumaça durante oito horas diárias. “Ainda por cima, eles fumam tabaco sem filtro”, completa Precioso.

Segundo Precioso, “não é aceitável que os funcionários sejam obrigados a trabalhar num ambiente em que estão presentes substâncias cancerígenas”. Para ele, “o Estado tem a obrigação de estabelecer leis que protejam os trabalhadores dessa agressão”.

Precioso defende ainda que o fim dos fumódromos seria uma forma de encorajar os fumantes a abandonar o vício. Ele afirma que existem estudos mostrando que medidas como o aumento do preço do cigarro e as proibições de fumar em locais públicos são eficazes no incentivo ao abandono do tabagismo.

Modelos computacionais ajudam no entendimento da epilepsia

O Laboratório de Neurociência Experimental e Computacional, da Universidade Federal de São João del-Rei, desenvolveu modelos computacionais que são usados para testar hipóteses que possam ser verificadas por meio de experimentos biológicos. As pesquisas ali são concentradas nos aspectos neurobiológicos da epilepsia.

A neurociência computacional, campo interdisciplinar que une diferentes áreas, como neurobiologia, física, matemática aplicada, engenharia elétrica, ciência da computação e psicobiologia, criou modelos matemáticos e computacionais para simular e entender a função e os mecanismos do sistema nervoso. O Laboratório de Neurociência Experimental e Computacional (Lanec) da Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ), por exemplo, desenvolveu modelos computacionais que são usados para testar hipóteses que possam ser verificadas por meio de experimentos biológicos. As pesquisas ali são concentradas nos aspectos neurobiológicos da epilepsia – condição neurológica crônica comum, caracterizada por crises epilépticas repetidas – e utilizam modelos experimentais e modelos matemáticos.

Os modelos experimentais são realizados com ratos de laboratório que são tratados, de acordo com normas internacionais para experimentação com animais, para desenvolverem crises epilépticas. Pode-se ainda utilizar fatias de cérebro desses animais, que são manipuladas quimicamente para reproduzirem as crises; ou ainda, são utilizadas culturas de neurônios retirados de cérebros de animais normais e epilépticos.

“Com o animal, registramos seus comportamento e atividade elétrica do cérebro. Com as fatias, além do registro da atividade elétrica, gravamos ainda imagens que, posteriormente, são processadas e revelam, dentre outras coisas, a área do tecido envolvida ao longo dos registros elétricos. Com neurônios isolados, registramos a atividade elétrica dentro da célula, bem como de estruturas da membrana celular, denominadas canais iônicos, que estabelecem a comunicação do interior do neurônio com seu exterior”, explica Antônio-Carlos Guimarães de Almeida, engenheiro biomédico e coordenador do Lanec.

Essas informações são, então, utilizadas para representar matematicamente a estrutura neuronal do tecido. Como são milhares de equações matemáticas, elas são resolvidas computacionalmente e segue-se um longo estudo visando reproduzir as atividades registradas. Quando os registros são reproduzidos, muita informação pode ser extraída do processo de indução e geração das atividades. “As contribuições são muito grandes com esse tipo de abordagem. Até mesmo o número de animais utilizados nas investigações acaba sendo reduzido, já que as simulações computacionais guiam melhor os novos experimentos que deverão ser realizados, evitando procedimentos desnecessários”, avalia Almeida.

Segundo ele, os modelos matemáticos desenvolvidos são inovadores porque permitem simular com maior detalhe a eletroquímica da atividade epiléptica, envolvendo desde movimentação iônica não só através da membrana neuronal e glial (células que compõem o cérebro), mas também ao longo de todo o meio que circunda essas células. “Reações químicas que descrevem as interações de drogas com mecanismos neuronais também são simuladas, permitindo investigar a atuação de fármacos durante as atividades”, complementa.

Os modelos, que são desenvolvidos há mais de 15 anos, fundamentam-se na representação dos fluxos iônicos através das membranas neuronais e gliais e ao longo de todo o tecido estudado. Para o cálculo desses fluxos, os mecanismos ou processos mais importantes para o transporte iônico são representados por meio de reações químicas que, por sua vez, são representadas matematicamente e implementadas computacionalmente. Com isso, pode-se dizer que tal procedimento consiste na construção de um tecido cerebral virtual para reprodução da atividade elétrica. “Como se tratam de modelos computacionais muito complexos e que envolvem um número muito grande de cálculos, esses modelos são processados em dois clusters de computadores do nosso laboratório de computação”, explica Almeida.

Para desenvolver esse tipo de pesquisa, o Lanec conta com uma equipe multidisciplinar com dois engenheiros, um especialista em computação, um físico, dois biólogos e um bioquímico, todos eles com mestrado e doutorado em áreas afins à neurociência. Os laboratórios que compõem o Lanec dão suporte à equipe em eletrofisiologia, histoquímica e imuno-histoquímica, cultura de células, purificação de enzimas e proteínas de membrana, computação serial e paralela e contam ainda com infra-estrutura de oficina de mecânica e eletrônica.

“Com nossos trabalhos, já somos capazes de reproduzir computacionalmente eventos epilépticos induzidos na ausência de sinapses químicas”, relata Almeida. As sinapses são estruturas de comunicação entre neurônios que envolvem a liberação de neurotransmissores. A grande maioria das drogas utilizadas no tratamento das epilepsias atua nessas estruturas. Entretanto, quando as crises se prolongam e tornam-se intensas, acredita-se que passem a ser sustentadas por conexões do tipo não-sináptica, daí a ocorrência de crises que são resistentes aos medicamentos usuais. “Com os modelos matemáticos, conseguimos reproduzir computacionalmente esse tipo de crise e entender os aspectos biofísicos que são preponderantes para a sustentação das atividades epilépticas. Esse tipo de informação é importante para a busca de drogas que interfiram nas atividades e sejam capazes de inibi-las”, diz o pesquisador.

No Brasil, a pesquisa sobre epilepsia segue mais ou menos a mesma tendência dos principais centros de pesquisa do mundo. “Acredito que no Brasil, os maiores avanços deverão se dar nos aspectos multidisciplinares da doença. Aí, ainda há muito a ser feito e a colaboração de especialistas de diferentes áreas, indo da engenharia à biologia, será essencial para se avançar ainda mais no conhecimento das epilepsias. A complexidade do cérebro e, portanto das epilepsias, reside na intricada relação entre mecanismos físicos, químicos e biológicos. Portanto, há muito que se investir na formação de grupos multidisciplinares para esse tipo de estudo”, finaliza Almeida.