Fotógrafos discutem preservação de imagem digital

A fotografia digital traz novos desafios para a preservação de imagens que compõem o acervo de centros de documentação e museus e também arquivos pessoais. Essa foi uma das questões discutidas durante o 1º Fórum Latino-Americano de Fotografia de São Paulo. Um seminário sobre o tema reuniu especialistas no início de outubro, no auditório do Itaú Cultural. Para muitos fotógrafos, a película fotográfica ainda é o meio mais seguro de conservação de uma imagem.

Desde sua invenção, a fotografia tem sido utilizada como instrumento para a memória: um ínfimo recorte do tempo e do espaço que, registrado através da luz, poderá ser perpetuado por séculos. Porém, se não preservarmos essa imagem ela desaparecerá, como efêmera que é. A fotografia digital também se mostra frágil, colocando novos desafios para a preservação. Para muitos fotógrafos, a película fotográfica ainda é o meio mais seguro de conservação de uma imagem.

Essa foi uma das questões tratadas no 1º Fórum Latino-Americano de Fotografia de São Paulo, durante o seminário sobre a preservação da produção contemporânea, realizado no início de outubro, no auditório da sede do Itaú Cultural. Na mesa estavam presentes várias autoridades no assunto como Sandra Baruki, coordenadora do Centro de Conservação e Preservação Fotográfica (CCPF) da Funarte, Patrícia Di Filippi, coordenadora do laboratório de restauro da Cinemateca de São Paulo, Leandro Melo, professor do Centro Universitário Senac e Millard Schisler, representante brasileiro no Rochester Institute of Technology e que, por 13 anos, foi diretor da George Eastman House, ambas instituições dos Estados Unidos.

Como fazer para que milhões de imagens produzidas todos os anos não se percam? Como protegê-las da ação do tempo e garantir que elas continuem a comunicar ao longo de outras gerações? Desde o início da fotografia digital esse debate se tornou fundamental dentro dos centros de documentação e museus e, agora, começa a ganhar lugar também nas maletas fotográficas e nos arquivos pessoais de todos aqueles que adoram fotografar. Durante anos a chamada síndrome do vinagre foi a grande vilã que deteriorou quilômetros de rolos de filmes fotográficos, com seus fungos corroendo a história da vida privada de famílias em todo o globo. Porém, além da corrosão, existe um problema tecnológico: as indústrias estão produzindo cada vez menos papel fotográfico.“Além da restauração, existe a questão do material. Se uma imagem, hoje, estraga, muitas vezes você não pode fazer outra, pois não existe mais o papel. E a película fotográfica ainda é o meio mais seguro de conservação de uma imagem”, afirma Sandra Baruki, ao tratar da dificuldade de preservar os milhares de fotogramas que fazem parte de acervos públicos e privados. Baruki ressalta, ainda, a incerteza quanto ao tempo de vida dos suportes tecnológicos que, voltados para o mercado, podem desaparecer rapidamente das prateleiras das lojas fotográficas, deixando milhões de arquivos presos em um formato incompatível.

Essa preocupação também esteve presente nas intervenções de Millard Schisler e de Patrícia Di Filippi. Ambos lembraram a necessidade da preservação preventiva: que o próprio fotógrafo selecione e organize periodicamente suas imagens, mantendo-as atualizadas com as mudanças tecnológicas. “O que se guarda acaba tornando-se a nossa história e o que não é guardado se perde e é apagado de nossas memórias”, alerta Millard, para quem é importante que se tenha em mente que algo sempre se perderá, e que por isso precisamos escolher o que queremos guardar, principalmente diante da possibilidade, com a fotografia digital, de se produzir grande quantidade de imagens. Por isso, seria fundamental uma seleção periódica, para impedir que aquilo que é realmente importante se perca junto com todo o resto. Seguindo este raciocínio, Schisler e DiFilippi ressaltam a questão da velocidade com que novas tecnologias são colocadas e retiradas no mercado e como esta rapidez é um dos principais fatores de risco para a perda da memória fotográfica. Para evitá-la, é preciso sempre migrar os arquivos para a tecnologia mais recente, evitando que eles fiquem presos em um suporte obsoleto (como aconteceu com os disquetes).

Para Leandro Melo, a preservação preventiva é fundamental para minimizar os fatores da degradação do material. Mas, lembra ele, a questão não é apenas o quê guardar, mas como guardar. Essa foi outra questão discutida durante o seminário: a extensão dos arquivos. O padrão utilizado e recomendado pelos centros de memória ainda é o ponto tiff. A idéia proposta foi a de se salvar imagens com duas resoluções diferentes, uma mais baixa – para facilitar o acesso – e uma alta, destinada a um arquivo permanente. Ponto comum na fala de todos os palestrantes, portanto, é a preocupação com a vida dos arquivos: cada fotógrafo deve criar um sistema de catalogação de suas imagens que permita sempre revê-las, pois apenas com a revisitação é que a memória permanece viva.

A sugestão feita por Schisler é a de que cada amante da fotografia faça um livro por ano, escolhendo as fotografias que mais lhe significam: “monte, escreva legendas, dê um nome e mande encadernar com capa dura. Pronto: você terá uma prática forma de guardar viva suas memórias”.

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Síndrome do vinagre Esse nome lhe é atribuído pelo forte odor de vinagre gerado pela reprodução de fungos nas películas fotográficas de acetato. O processo ocorre por causa do acondicionamento inadequado. Ele pode expor a película à umidade e às altas temperaturas, favorecendo a proliferação de fungos devido ao ácido acético residual da revelação, que permanece na película, e se liga com os cristais de prata do filme fotográfico. Assim, partes da imagem terminam cobertas por esse fungo e partes são corroídas por ele.

A influencia de partículas suspensas no clima

Dos mecanismos que influenciam o clima, a suspensão de partículas no ar é o que causa mais dúvidas aos pesquisadores. Dois projetos para 2008 pretendem entender como isso ocorre na floresta.
Dos mecanismos que influenciam o clima, os aerossóis (ou a suspensão de partículas no ar) são os que mais causam dúvidas aos pesquisadores. Sabe-se hoje que a emissão de partículas pelas queimadas na Amazônia, por exemplo, têm importante influência na formação de nuvens da região. Uma pesquisa internacional, coordenada pelo Experimento de Grande Escala Atmosfera-Biosfera da Amazônia (LBA, na sigla em inglês), pretende agora entender como ocorre a formação dos aerossóis pela floresta.

As alterações no uso da terra da Amazônia, como desmatamento, queimadas e os efeitos da urbanização, têm grande impacto na concentração de partículas suspensas. “Já sabemos que as emissões provocadas pelo homem influenciam o clima local”, disse o físico Theotonio Mendes Pauliquevis, do Instituto de Pesquisas Amazônicas (Inpa) e do LBA. “Mas é preciso compreender tanto a área perturbada, quando a não perturbada para poder fazer a comparação”.

A pesquisa deve começar em janeiro de 2008 e ocorrerá em duas fases, a primeira com duração de um mês e, a seguinte, de dois anos. Dois grandes projetos encabeçam a parceria de pesquisas. O AMAZE que deve fazer estudos mais detalhados num período curto sobre a composição natural dos aerossóis e química das moléculas, está sendo coordenado por Pauliquevis, pelo físico Paulo Artaxo, da Universidade de São Paulo (USP), e pelo químico da Universidade de Harvard, Scot Martin. Já a iniciativa européia, EUCAARI, ficará por dois anos na região coletando dados a fim de melhorar os modelos computacionais sobre os efeitos dos aerossóis no clima, reduzindo as incertezas do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, sigla em inglês) em relação ao assunto. Os europeus farão o mesmo tipo de levantamento na Índia, China e África do Sul.

Segundo Pauliquevis, pela primeira vez uma estrutura grandiosa é levada ao interior da floresta para coletar os dados. “Esse tipo de pesquisa só funciona com a união de vários institutos, devido ao elevado custo dos equipamentos”, explicou o físico. Uma torre, confiscada de japoneses que capturavam borboletas para o tráfico de animais silvestres, foi doada pela polícia federal e será o centro de coleta de informações. Na borda de uma estrada, próximo à BR-174 que liga Manaus (AM) à Boa Vista (RR), foi instalado um container que abriga os equipamentos para tratar os dados coletados.

A principal dificuldade para fazer pesquisas duradouras nos confins da Amazônia é a manutenção dos equipamentos e o fornecimento de energia elétrica. A idéia inicial era colocar o container dentro da floresta, mas os pesquisadores convenceram-se que a tarefa seria impossível e mantiveram o container próximo ao local do estudo. “O maior destaque do projeto é termos conseguido montar uma grande infra-estrutura. A iniciativa tornará possíveis várias outras propostas científicas importantes para a região”, informou Pauliquevis.

Aerossóis e nuvens

Os aerossóis têm vital importância do ponto de vista climático e da composição química da atmosfera. Essas partículas suspensas no ar atuam na absorção e espalhamento da radiação solar, na formação das nuvens, na reciclagem dos nutrientes em ecossistemas, entre outras funções importantes. Elas são fundamentais para a formação da variedade de ambientes existentes no planeta.

No entanto, a ocupação desordenada da Amazônia, principalmente no “Arco do desmatamento” – região leste onde ocorre a maior parte da ocupação – tem aumentado o número de aerossóis na atmosfera. Embora em número bem menor, essas partículas também são emitidas naturalmente pelas florestas. As mais finas, menores que 2 micrômetros (µm) de diâmetro, são gases biogênicos emitidos pela vegetação e que sofrem reações químicas na atmosfera, mudando da fase gasosa para sólido ou líquido. Já as partículas mais grossas (maiores que 2 µm) são primárias, isto é, são fragmentos de folhas, grãos de pólen, bactérias e fungos suspensos no ar.

Ao chegarem à atmosfera, os aerossóis podem funcionar como núcleos de condensação, possibilitando a formação de nuvens. O vapor de água adere a essas partículas, ganhando peso para precipitar em forma de gotas. “As nuvens têm papel chave na questão climática, pois refletem a radiação solar de volta ao espaço, diminuindo a temperatura”, disse Pauliquevis.

Mas quando o ar está saturado dessas partículas ocorre o efeito inverso, as gotículas não conseguem se unir e são formadas nuvens gigantescas que não precipitam. Os pesquisadores constatam, por exemplo, uma grande bruma de aerossóis oriundo da fumaça formada nas queimadas do arco do desmatamento. “Essa névoa sobrevoa grande parte da América do Sul reduzindo a temperatura por onde passa”, conta Artaxo.

As nuvens influenciam ainda a fotossíntese das plantas. Quando em grande quantidade na atmosfera, os aerossóis bloqueiam a radiação solar por completo interrompendo também esse processo. Os pesquisadores acreditam que a complexidade dos aerossóis torna mais importantes os estudos voltados a eles. Sobre a emissão natural das partículas, será possível ter mais informações sobre como a floresta influencia e é influenciada pelo clima. Uma questão bastante atual nos dias de hoje.

Pesquisas mostram efeitos da poeira na saúde humana

Qual a relação entre a fumaça da queimada da cana e as doenças respiratórias e cardiovasculares? E quais são os efeitos de partículas no ar em pacientes asmáticos? Esses foram temas de pesquisas apresentadas no Congresso Brasileiro de Geoquímica, que ocorreu em outubro, na cidade de Atibaia (SP).

Do campo à cidade, o homem está em constante contato com uma diversidade de partículas suspensas no ar. Uma pesquisa na cidade de Araraquara, região central do estado de São Paulo, buscou entender a relação entre a fumaça decorrente da queima da cana-de-açúcar e doenças respiratórias e cardiovasculares na população local. Na capital do estado, outra pesquisa verificou os efeitos de partículas no ar em pacientes asmáticos tratados pelo Hospital Universitário (HU) da Universidade de São Paulo (USP). Ambas pesquisas foram apresentadas nas conferências de Geologia Médica que ocorreram durante o Congresso Brasileiro de Geoquímica, em outubro na cidade de Atibaia (SP).

De acordo com o geoquímico porto-riquenho José Centeno, do Instituto de Patologia das Forças Armadas Norte-Americanas, a poeira carrega consigo uma série de elementos, naturais e minerais, que são prejudiciais à saúde. “As vias aéreas são bastante vulneráveis a esses elementos; a sílica, por exemplo, pode causar vários problemas respiratórios”, informou. Elementos radioativos – urânio e radônio – e metais pesados – como chumbo, mercúrio, arsênio e cádmio – são grandes vilões à saúde do homem. Além destes, destacam-se compostos naturais como pólen, partículas de madeira, fungo e sacarina, dentre outros.

Na área agrícola, é visível a presença da fumaça proveniente da queima de cana-de-açúcar em sua colheita. Segundo o químico Willian César Paterlini, da Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Araraquara, o aumento da fumaça na estação seca, época das queimadas, pode estar relacionado à doenças como asma e hipertensão.

Paterlini fez parte de uma equipe, do Instituto de Química da Unesp, que mediu a concentração de partículas no ar daquela região entre junho de 2003 e maio de 2004, englobando portanto, o período das estações de seca e de chuvas. A essas medidas foi sobreposto o número de casos de internações por asma e hipertensão na rede pública de Araraquara, utilizando dados fornecidos pelo Ministério da Saúde.

“No caso da hipertensão houve coincidências entre o aumento da concentração de partículas e o número internações. Sempre que ocorreram picos nas emissões, três dias depois as internações também cresciam”, disse Paterlini apontando para um gráfico com as duas curvas coincidentes. Na estação de queimada teve um aumento de 131% da quantidade de partículas finas – até 2,5 microgramas (µg) de diâmetro – se comparada com a época em que não houve queimadas.

Paterlini destaca o dia 21 de junho de 2003 quando a concentração das partículas mais finas chegou a 74,5 µg/m3. Três dias depois as internações também bateram recorde. Para a Organização Mundial de Saúde (OMS) a concentração máxima recomendada dessas partículas é de 10 µg/m3. “A OMS tolera que em três dias do ano esse teor chegue a 25 µg/m3, mas em nossas medições 31 dias extrapolaram esse nível”, informou.

Em relação aos casos de asma, os números de internação mantiveram-se elevados por todo o período de pesquisa. Uma das hipóteses da equipe de Paterlini é que a asma possa estar também relacionada à poeira doméstica, como fungos e bactérias.

Bruma urbana

Se a fumaça formada pela queima da cana pode gerar danos à saúde humana, igual efeito tem as partículas suspensas no ar do meio urbano. Um estudo do Instituto de Geociências e da Faculdade de Medicina da USP, em conjunto com o Instituto de Pesquisas Espaciais (Inpe), mediu a composição das partículas geradas pelas emissões de veículos e indústrias, da cidade de São Paulo, e a sua influência em pacientes asmáticos tratados no Hospital Universitário.

A asma é uma doença causada pela inflamação das vias áreas. Problema de saúde mundial que piora a cada ano, a doença já é a quarta maior no Brasil, contando o número de casos tratados pelo Sistema Único de Saúde. “É uma doença que tem crescido na cidade de São Paulo e que está associada à poluição atmosférica”, disse a geoquímica Christine Bourotte, do Instituto de Geociências da USP e uma das autoras da pesquisa.

Foram selecionados 33 pacientes asmáticos que moram na região Leste da cidade. O perfil da mostra foi definido por um questionário que buscou informações sobre as condições de moradia e trabalho dos pacientes. A pesquisa observou 23 mulheres e 10 homens, com média etária de 40 anos. Dos pacientes, 63% disseram ser não-fumantes e 56% que tinham asma leve. Durante 60 dias foram feitas medições diárias de suas condições respiratórias por meio de um medidor de capacidade pulmonar.

Estação coletora mediu a qualidade do ar na Região Leste de São Paulo
Crédito: USP

Uma estação de coleta instalada no prédio da USP mediu a qualidade do ar. Diariamente os filtros foram analisados em laboratório para identificar a quantidade de poluentes encontrados no ar. Íons de cloro, magnésio, amônio, ferro e zinco foram os mais encontrados. “Esses elementos são muitos danosos à saúde, podendo inflamar as vias respiratórias”, considera Bourotte. Segundo ela, as partículas mais finas são as mais perigosas, pois penetram mais profundamente no corpo das pessoas podendo atingir os alvéolos pulmonares.

O cruzamento das informações atestou que há apenas uma tênue relação entre crises asmáticas e a qualidade do ar. “A relação causa e efeito não se mostrou nítida e direta”, reconheceu a pesquisadora, “mas a pesquisa serve para dar uma nova abordagem ao estudo da composição química das partículas suspensas no ar e de seus efeitos sobre a saúde humana”, concluiu.