Conflito no Congo mata 3,9 milhões

O conflito que assolou a República Democrática do Congo, entre 1998 e 2004, matou aproximadamente 3,9 milhões de pessoas, número que só perde para as mortes cometidas durante a Segunda Guerra Mundial. Os dados são de um levantamento recente da mortalidade no Congo feito por pesquisadores de diversos institutos como o National Centre Epidemiology and Population Health, da Austrália, e Internacional Rescue Committee, dentre outros, publicado no periódico The Lancet, em 7 janeiro deste ano.

O conflito que assolou a República Democrática do Congo, entre 1998 e 2004, matou aproximadamente 3,9 milhões de pessoas, número que só perde para as mortes cometidas durante a Segunda Guerra Mundial. Os dados são de um levantamento recente da mortalidade no Congo feito por pesquisadores de diversos institutos como o National Centre Epidemiology and Population Health, da Austrália, e Internacional Rescue Committee, dentre outros, publicado no periódico The Lancet, em 7 janeiro deste ano.

A pesquisa traz mais dados alarmantes: a taxa de mortalidade no Congo é de 2,1 mortes para cada 1.000 habitantes por mês, o que significa mais de 1.700 mortes por dia. Antes do início do conflito a taxa de mortalidade era 75% menor. Ainda de acordo com os pesquisadores, a mortalidade no país é maior que a taxa da região do sub-sahara (1,5 mortes/1000hab/mês), considerada até então uma das maiores do mundo. A pesquisa inclui tanto as mortes violentas oriundas dos combates, como as motivadas por doenças e subnutrição. No caso de mortes violentas, os homens maiores de 15 anos são as principais vítimas – 71% dos casos, sendo que as mulheres representam 18% e os jovens com menos de 15 anos, 10%.

Para chegar a esses dados, a pesquisa realizou visitas em 19.500 residências do país. A subnutrição foi responsável por 10,9% das mortes na região leste, que teve 13.500 residências pesquisadas, e por 8,1% na região oeste, com 6.000 casas visitadas. Considerando o país todo, algumas doenças como diarréia, malária e infecções respiratórias foram as responsáveis por 50% das mortes. Os pesquisadores também argumentam no artigo que doenças como essas poderiam ser facilmente tratadas em outros contextos, mas não no Congo, que faz parte do conflito que ficou conhecido como Africa’s first world war – que atingiu diversos países da região central do continente e inclui o conflito no Congo.

Os pesquisadores acreditam que a redução da violência pode diminuir muito a taxa de mortalidade, não só porque menos pessoas morrerão em combate direto, mas porque as mortes indiretas também diminuirão. Uma das saídas propostas na pesquisa é a intervenção de organizações internacionais.

As Forças de Paz da Organização das Nações Unidas (UN, sigla inglês) possuíam, em outubro de 2004, 16.700 soldados no Congo com objetivo de promover a paz. No entanto, a African Union declarava na ocasião que eram necessários 45 mil soldados para estabilizar a situação no país. De acordo com a pesquisa, a intervenção na região do Congo pode aumentar o acesso aos serviços médicos, aos remédios e a água tratada, o que diminuiria bastante o índice de mortalidade, já que a maioria das mortes não acontece em conflitos diretos. Apesar dos argumentos explicitados no artigo, as propostas de intervenção em países em conflito encontram várias posições divergentes, compondo uma questão polêmica, que de forma freqüente incita debates.

Conflito interminável Mesmo com o fim oficial do conflito em 2004, os massacres continuam a acontecer na República Democrática do Congo. A ONG Médicos Sem Fronteiras divulgou, no dia 12 de janeiro, os 10 conflitos mais negligenciados pela mídia em 2005, dentre os quais está o do Congo. Desde novembro do ano passado, os embates entre o exército congolês (FARDC) e os rebeldes Mai Mai deslocaram milhares de pessoas da província de Katanga. Em dezembro, nessa mesma província, homens armados atacaram cerca de 3 mil pessoas que foram obrigadas a fugirem para não serem mortas.

A violência entre facções inimigas atinge principalmente os civis. Nas regiões de Ituri, Norte Kivu e Kivu Sul houve saques e estupros contra a população. Somente em Ituri, entre janeiro e maio de 2005, a ONG Médicos Sem Fronteiras atendeu cerca de 80 mil civis que haviam fugido de suas casas com medo dos ataques.

O congolês Kasonga Nkota, que está refugiado no Brasil, aponta que o resultado desse “conflito interminável” é a falência das instituições do país, deixando a população sem assistência. Quando perguntado sobre as possíveis soluções para a República Democrática do Congo, Knota aponta que somente a democratização do país pode mudar a situação de calamidade.

Em dezembro do ano passado, a nova constituição foi votada e aprovada por 84,31% dos eleitores, segundo informação divulgada pelo presidente da Comissão Eleitoral Independente, Apollinaire Malu Malu. Estão previstas para 30 de junho desse ano, eleições presidenciais e legislativas. Essa será a primeira eleição desde a independência do país em 1960. Para Knota, esse processo eleitoral é polêmico porque a população votou a constituição sem saber o seu conteúdo. “O povo não participou do processo de escrita da constituição, assim como a oposição ao governo”, afirma.

Knota alega ainda que o presidente Joseph Kabila tem o apoio de países como a França e Bélgica, fato que facilitou a aprovação da nova constituição. Independentemente da legitimidade do processo eleitoral na República Democrática do Congo, o fato é que os esforços para a diminuição da violência e da miséria ainda não surtiram efeitos.

De acordo com o relatório da ONG Médicos Sem Fronteiras: a mortalidade infantil cresce assim como a subnutrição e as mortes por doenças como malária, AIDS e cólera – situação parecida com a retratada na pesquisa publicada no periódico The Lancet. Os dados do artigo em conjunto com os da ONG revelam que atrocidades se repetem mesmo com a criação dos tribunais de Nuremberg, após a Segunda Guerra, que se propunham não apenas julgar os crimes cometidos contra a humanidade, mas acima de tudo criar meios para evitar que pudessem se repetir.

Combate à pobreza rural tem novas perspectivas com idéia de território

Programas sociais voltados ao desenvolvimento no campo têm usado o conceito de território para reduzir a pobreza no campo. Segundo o professor do Instituto de Economia (IE) da Unicamp, José Maria Silveira, essa combinação é favorável, pois oferece ferramentas e recursos financeiros, por meio de ações locais, para fortalecer o segmento e supri-lo em suas diversas necessidades, tais como: previdência rural, infra-estrutura, aumento de produtividade e, conseqüentemente, geração de renda. Apesar dos benefícios da associação há cautelas a seguir. Silveira ressalva que se não houver uma regulamentação ajustada para os novos usos do meio rural esse sistema beneficiará apenas alguns atores sociais, não promovendo um desenvolvimento integral e sustentável das áreas rurais.

Programas sociais voltados ao desenvolvimento no campo têm usado o conceito de território para reduzir a pobreza no campo. Segundo o professor do Instituto de Economia (IE) da Unicamp, José Maria Silveira, essa combinação é favorável, pois oferece ferramentas e recursos financeiros, por meio de ações locais, para fortalecer o segmento e supri-lo em suas diversas necessidades, tais como: previdência rural, infra-estrutura, aumento de produtividade e, conseqüentemente, geração de renda. Apesar dos benefícios da associação há cautelas a seguir. Silveira ressalva que se não houver uma regulamentação ajustada para os novos usos do meio rural esse sistema beneficiará apenas alguns atores sociais, não promovendo um desenvolvimento integral e sustentável das áreas rurais.

“Com o conceito de território é possível sair da polarização que existia anteriormente entre rural e urbano, agrícola e industrial, do ponto de vista das políticas públicas, e conferir maior visibilidade à economia local”, argumenta Silveira. Desta forma, as necessidades da comunidade rural, incluindo as diferentes dimensões do território e sua complexidade, passam a ser o foco dos programas de combate à pobreza rural. Garante-se assim que suas especificidades, que interagem no processo de construção de identidade socioeconômica e cultural, tornem-se importantes para o êxito de desenvolvimento sustentável no campo. Com essa abordagem, Silveira espera ser possível romper com o antigo padrão histórico de desenvolvimento rural baseado no autoritarismo, onde o progresso era tido como crescimento infinito a partir da incorporação crescente de recursos, vistos também como infinitos. Surgem novas perspectivas para transformações estruturais, capacidade de geração de renda e participação ativa no meio rural.

Para contribuir com esta nova panorâmica entram no cenário os programas direcionados para o combate à pobreza rural, como o Programa Integrado de Desenvolvimento (PID) e o Desenvolvimento Rural Sustentável e a Redução da Pobreza Rural no Nordeste do Brasil. Esses programas têm como premissa as políticas de financiamento adequadas às demandas e realidades regionais, contando com uma parceria com os governos municipal, estadual e federal. “Ações macroeconômicas juntamente com recursos financeiros financiados pelos programas não resolvem a questão da pobreza rural, mas sim a aplicação de metas de universalização direcionadas para a região necessitada”, observa o professor de economia. O secretário de Desenvolvimento Territorial do Ministério de Desenvolvimento Agrário (MDA), Marcelo Duncan, em entrevista ao site do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) também concorda: “os planos precisam valorizar os recursos locais para que soluções práticas sejam admitidas”.

Ressalvas aos programas

Com a mudança no cenário político, na última década, houve um enfraquecimento da iniciativa federal e fortalecimento da participação local/regional. As parcerias “institucionais” passaram a lidar melhor com a heterogeneidade do uso da terra e do espaço social rural, de forma a oferecer melhores respostas de regulação para os diferentes níveis de desenvolvimento no meio rural. Entretanto, “a comunidade rural precisa ter participação ativa em todo o processo, seja na seleção de benefícios, seja na implementação de projetos e uso de planos de combate à pobreza rural”, acautela Silveira. A preocupação e as formas de atuação dos próprios atores sociais fazem diferença: “é imprescindível que a população do campo tenha clara definição do problema e das áreas prioritárias, capacidade de articulação e coordenação entre agentes de diferentes naturezas – do técnico ao político – para obter êxito neste contexto”, reforça ele.

Eventos

Alguns eventos debateram a abordagem territorial no combate à pobreza no rural no final do ano passado. O Workshop Internacional Estratégias de combate à pobreza rural no Brasil: situação atual e perspectivas, realizado em novembro do ano passado no IE da Unicamp, do qual participaram Silveira e Duncan. E os seminários Investimentos dirigidos e questões de zoneamento econômico-ecológico no corredor biológico da Mata Atlântica na Bahia-Espírito Santo, Territórios rurais: articulando políticas públicas e demandas sociaise Abordagem territorial como estratégia de desenvolvimento: definição, políticas e práticas, realizados pelo Grupo Banco Mundial.

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Comunidades à frente de seu desenvolvimento

Pesquisadoras analisam as informações climáticas divulgadas pela mídia

Capazes tanto de auxiliar na prevenção aos riscos ambientais, como de moldar a percepção das pessoas a respeito dos eventos meteorológicos e climáticos, as informações relativas às ciências atmosféricas têm ganhado destaque cada vez maior na mídia. Essa situação vem despertando o interesse de pesquisadores sobre a qualidade com que estas informações estão sendo divulgadas e como elas influenciam na percepção do público.

O destaque cada vez maior que os veículos de comunicação dão aos fenômenos meteorológicos e climáticos vem despertando o interesse de pesquisadores da área das ciências atmosféricas sobre a qualidade com que essas informações estão sendo divulgadas pela mídia e como elas influenciam na percepção das pessoas. “Muitas vezes, a precisão nas informações sobre tempo e clima é a diferença entre vida e morte”, destaca a geógrafa Lucí Hidalgo Nunes, do Instituto de Geociências da Unicamp, referindo-se à relevância do acesso a esse tipo de informação como forma de diminuir a vulnerabilidade das pessoas frente aos riscos ambientais.

Para exemplificar sua afirmação, a pesquisadora lembra do caso do furacão Catarina, que atingiu parte do litoral do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina em março de 2004 e provocou a morte de 11 pessoas, além de grandes prejuízos econômicos. Na ocasião, a população de Santa Catarina foi informada pelo rádio sobre como identificar os sinais de evolução do furacão e como se proteger dele. “Nesse caso, foi uma junção da comunidade científica com a mídia trabalhando de maneira muito séria e, com isso, muitas pessoas certamente foram salvas”, destaca a geógrafa.

O exemplo retrata uma situação de exceção não somente pela raridade do fenômeno (foi o primeiro furacão registrado no Brasil), mas também porque a divulgação de informações com qualidade parece não ser a regra que prevalece na mídia. A própria pesquisadora da Unicamp fez essa constatação ao avaliar a cobertura realizada por pelo jornal O Estado de São Paulo sobre o fenômeno El Niño, entre 1997 e 1998. Na pesquisa, que faz parte de um projeto mais amplo desenvolvido em conjunto com pesquisadores da Argentina e do Paraguai, Lucí Nunes analisou sistematicamente todas as matérias que se referiam ao fenômeno veiculadas nas 396 edições do jornal publicadas entre maio de 1997 e maio de 1998, correspondente ao período de maior intensidade do El Niño daquela ocasião. A pesquisadora avaliou cada notícia em relação à qualidade e precisão das informações do ponto de vista científico, bem como o espaço e destaque dados a ela e o tema abordado.

De acordo com Lucí Nunes, embora tenha encontrado notícias de boa qualidade, a prevalência foi de matérias com informações imprecisas ou equivocadas. Segundo ela, também houve muitos exageros: “O El Niño foi relacionado a quase tudo”, aponta a pesquisadora, fazendo referência ao fato de eventos sem nenhuma ligação com o fenômeno terem sido associados a ele, como foi o caso de uma notícia que atribuía ao El Niño um evento meteorológico ocorrido na Rússia, região que não sofre os efeitos do fenômeno.

Além disso, a pesquisadora aponta que o sensacionalismo na cobertura foi marcante e as incertezas que a comunidade científica tinha a respeito da evolução do fenômeno não foram comunicadas de maneira adequada ao público, pois não era possível distingüir claramente pelas matérias entre o que era conhecido pelos cientistas e aquilo que eles desconheciam ou tinham dúvidas. Como conseqüência, afirma a geógrafa, a imprensa criou uma expectativa falsa sobre a intensidade do El Niño, já que os impactos do fenômeno no sudeste do Brasil não foram tão grandes como se poderia supor por meio da leitura das notícias divulgadas à época. Comparando aquela cobertura com a feita atualmente, Lucí Nunes acredita que, apesar de ter havido melhora na divulgação das informações a respeito das ciências atmosféricas, alguns problemas crônicos ainda persistem e se devem tanto à falta de especialização dos jornalistas para cobrir a área como à dificuldade dos cientistas se comunicarem de um modo compreensível com os jornalistas.

Para a também geógrafa Maria da Graça Sartori, da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM-RS), esses problemas são bastante evidentes na divulgação que vem sendo feita sobre as mudanças climáticas globais. “Exagerada e parcial”, resume ela, apontando quais os principais problemas que detecta nesta cobertura. O exagero é dado, segundo a pesquisadora, pela espetacularização e catastrofismo que são usados nas notícias para atrair a atenção do público, apontando como conseqüência do aquecimento global qualquer variação nas condições climáticas que ocorrem normalmente quando se compara, por exemplo, uma mesma estação em anos sucessivos. Segundo ela, é isso ocorre atualmente com as notícias sobre ondas de calor e de frio que atingem, respectivamente, partes dos hemisférios sul e norte do planeta.

Para a pesquisadora, o sensacionalismo e a parcialidade que caracterizam a cobertura feita pelos veículos de comunicação afetam diretamente a maneira como o público sente e interpreta os eventos relacionados a tempo e clima, tendo em vista que a percepção dos indivíduos sobre tais eventos é cada vez mais intermediada pela mídia.

Lucí Nunes também atribui à mídia um papel fundamental como intermediadora da percepção climática, conforme pôde verificar a partir de uma pesquisa de mestrado que orientou, na qual a mestranda avaliou a percepção climática de moradores do município de Campinas (SP). “Muito da percepção que uma pessoa tem se baseia no ela ouve dizer ou vê indiretamente [por meio de veículos de comunicação], e não no que ela vivencia”, afirma a Lucí Nunes, citando os resultados da pesquisa.