Empresas privadas desenvolvem tecnologia militar para uso civil

O uso diversificado das tecnologias originalmente militares ocorre muitas vezes sem que as pessoas se dêem conta. A empresa nacional Atech Tecnologias Críticas surgiu no âmbito do Projeto Sivam e desenvolveu um sistema de monitoramento por sensores, com diversas finalidades civis, além do sistema Infopol, muito útil para o trabalho da polícia.

O uso diversificado das tecnologias originalmente militares ocorre muitas vezes sem que as pessoas se dêem conta. Poucos desconfiam que soluções como o Bilhete Único na cidade de São Paulo ou serviços de meteorologia partiram de uma empresa nascida com propósitos de defesa do espaço ocupado pela Amazônia. A empresa nacional Atech Tecnologias Críticas surgiu no âmbito do Projeto Sivam (Sistema de Vigilância da Amazônia) e desenvolveu também um sistema de monitoramento por sensores, com diversas finalidades civis, além do sistema Infopol, muito útil para o trabalho da polícia.

Os diretores da Atech, Cláudio Carvas e Giácomo Feres Staniscia, explicam que a empresa tem uma série de desenvolvimentos militares que acabaram aproveitados para o setor civil, as chamadas tecnologias duais. O Infopol, por exemplo, é um sistema de segurança pública composto por duas unidades, sendo que uma delas é responsável pela coleta de dados enquanto a outra analisa as informações exibidas em gráficos e mapas gerados pelo programa. Com os demonstrativos, a polícia é capaz de traçar o perfil da região analisada, com dados sobre a concentração populacional, a incidência e os horários de determinadas infrações, atualizados automaticamente. Assim, é possível fazer prognósticos e planejar ações de combate à violência nesses locais.

Outro benefício da tecnologia militar aproveitado pela polícia foi desenvolvido pela multinacional EADS. O sistema Tetrapol, utilizado em mais de trinta países e atualmente em implantação pela Polícia Federal brasileira, é um padrão de radiocomunicação 100% digital, capaz de localizar o usuário e acionar formas de socorrê-lo imediatamente por meio de uma rede de comunicação. O sistema será nacionalizado pela empresa Indústria de Material Bélico do Brasil (Imbel), por meio de uma parceria com o Grupo EADS, envolvendo a transferência de tecnologia.

Além do emprego em operações cotidianas, o Tetrapol também é utilizado com sucesso no trabalho de segurança de eventos de porte, como reuniões de cúpula do G8 – sete países mais industrializados do mundo e a Rússia – (onde é utilizada desde 1996), Copa do Mundo de Futebol e segurança de grandes empresas privadas.

Uma das soluções duais mais recentes é um sistema de monitoramento que envolve tecnologias selecionadas como prioritárias pelo Ministério da Defesa (fusão de dados, sistemas de informação, sensores e integração de sistemas). A tecnologia desenvolvida pela Atech é muito útil no monitoramento de dutos, transmissão de energia, agricultura de precisão e em situações emergenciais, como incêndios e derramamento de óleo. Esse sistema evolui para a navegação automática de precisão com a aeronave não tripulada, ainda em desenvolvimento com fins tanto militares como civis.

Projeto levará computadores a aldeias indígenas

Três aldeias da etnia Tukano participarão de uma experiência piloto de implantação de centros de computadores em comunidades indígenas. O projeto faz parte do Programa de Inclusão Social e Digital do Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia em parceria com o Ministério da Educação, a Universidade de Brasília e a Fundação Nacional do Índio.

Três aldeias da etnia Tukano participarão de uma experiência piloto de implantação de centros de computadores em comunidades indígenas. O projeto faz parte do Programa de Inclusão Social e Digital do Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (Ibict) em parceria com o Ministério da Educação (MEC), a Universidade de Brasília (UnB) e a Fundação Nacional do Índio (Funai).

Essas instituições irão investir em equipamentos, capacitação e acompanhamento. O MEC é responsável pelas escolas e conteúdos das aulas na região onde serão colocados os computadores. A UnB já desenvolve um projeto de pesquisa com essa etnia e a Funai está viabilizando professores para a capacitação em informática. O Ibict será responsável pela disponibilização de ferramentas, produtos e serviços que forem considerados adequados para as comunidades, além do investimento em recursos humanos.

Os três centros são o começo da proposta de formação de um corredor digital no Alto Rio Negro, uma região no estremo noroeste do Brasil, na fronteira com a Venezuela e Colômbia, nas cabeceiras do rio Negro. A região é habitada por 22 povos, entre eles os Tukanos, que serão os primeiros a receber os computadores. Cada aldeia receberá até dez computadores para a formação dos centros. “O objetivo do projeto é levar até às comunidades participantes informação e tecnologia como ferramentas de apoio ao ensino e desenvolvimento cognitivo”, afirma Cecília Leite, responsável pelo Programa de Inclusão Social do Ibict.

E o que essa inclusão de um elemento característico da cultura do não-índio – o computador – representaria para os indígenas? Segundo Cássia Ferri, pesquisadora da área de educação da Universidade do Vale do Itajaí (Univali), o projeto pode ser positivo, uma vez que, pela própria concepção do que é cultura, não se pode dizer que a inclusão digital entraria em conflito com a preservação da cultura indígena. Ferri explica que culturas são modos de viver, agir e pensar coletivos e dinâmicos. “Não se pode pensar em preservar a cultura indígena como se esta não estivesse em constante movimento: os povos indígenas – assim como outros grupos culturais – ao se relacionar com outras culturas estão sempre escolhendo os aspectos que devem preservar, os que devem abandonar, e os que devem modificar”, analisa.

Ferri diz ainda que o projeto pode servir como instrumento para ampliar e socializar os elementos culturais que caracterizam os povos indígenas. De acordo com a pesquisadora, os movimentos em torno da educação escolar indígena se caracterizam pela luta por uma educação diferenciada, na qual a escola é caracterizada como um espaço de reflexão crítica e exercício da construção da autonomia indígena. “Esse não é um processo simples. A escola, tal como a conhecemos, é um elemento externo às culturas indígenas. Seu modo de funcionamento precisa ser recriado para se tornar um instrumento significativo para esses povos”, pondera. Dessa forma, ela afirma que o papel da tecnologia é se tornar mais um dos instrumentos que criam possibilidades para essa reinvenção da escola.

O líder representante da etnia que participará do projeto piloto, Álvaro Tukano, disse que os índios estão “famintos de tecnologia” e que a inclusão digital é muito importante para eles. Segundo ele, a inclusão digital não vai tirar as características e modo de vida indígena, mas sim aumentar a possibilidade de comunicação entre os índios. A pesquisadora da Univali concorda e também destaca que através dos computadores pode-se promover um diálogo intercultural entre crianças de diferentes escolas em diferentes pontos do país.

Ferri acrescenta que há outros investimentos prioritários a serem feitos nas aldeias indígenas, que implicam na sobrevivência da população, como a questão da demarcação de terra, a da saúde, da educação. “É preciso lembrar dos aspectos nutricionais e epidemeológicos que matam dezenas de crianças e adultos indígenas”, aponta. Entretanto, ela acredita que a tecnologia pode contribuir para melhorar esses aspectos levando mais informação aos povos beneficiados.

“O objetivo do programa é levar a informação científica e tecnológica, em linguagem adequada ao cidadão comum”, confirma Cecília Leite, do Ibict. “Temos uma grande interação com a academia e instituições de pesquisa, e agora, pretendemos contribuir para a ampliação da Sociedade da Informação no Brasil por meio de projetos que favoreçam a inclusão social e digital”, completa.

Software livre incentiva inovação tecnológica

Pesquisadora do Instituto de Economia da Unicamp defende que quanto maior o número de pessoas com acesso aos códigos-fonte de softwares, maior é a chance de novas criações técnicas.

O livre acesso aos códigos-fonte de programas de computador por empresas e pessoas é uma situação que permite a solução de problemas e criação de inovações tecnológicas. Esse é um dos argumentos apresentados pela pesquisadora Cássia Isabel Costa Mendes, em sua dissertação de mestrado intitulada “Software livre e inovação tecnológica: uma análise sob a perspectiva da propriedade intelectual”. Na pesquisa, Mendes defende que o software livre apresenta potencial para estimular a inovação tecnológica. O trabalho foi apresentado no final de fevereiro no Instituto de Economia da Unicamp.

De acordo com a pesquisadora, quanto mais pessoas tiverem acesso aos códigos-fonte dos softwares, maior é a chance de sua aprimoração, adaptação para novas funções ou utilização como base para novas criações tecnológicas. É nesse percurso que podem gerar inovações. Ela cita o acúmulo do progresso técnico, cujo desenvolvimento seria acelerado com o trabalho de agentes em rede, como sendo outro ponto positivo para aumentar a agilidade da criação tecnológica. “Quanto mais pessoas estiverem cooperando, mais rápido poderá ser o processo de desenvolvimento”, diz.

No âmbito da propriedade intelectual, entre as várias regras para softwares, a pesquisadora analisou a GPL (General Public License). Ela explica que essa regra possibilita usar, estudar, modificar e redistribuir o código-fonte dos programas de computador. Mendes argumenta ainda que a vantagem dessa licença é a sua forma de contrato de adesão, ou seja, a pessoa que modificar os códigos deve deixar as alterações efetuadas para serem livremente acessadas. Essa forma livre de licenciamento é chamada de copyleft, o qual a pesquisadora prefere denominar como “um novo modo de desenvolvimento das formas do direito autoral”.

Oportunidades de negócios em venda de serviços

Mendes aponta que mais empresas podem criar produtos e entrar no mercado num contexto de livre circulação de códigos-fonte, influenciando as formas de concorrência na indústria do software.

Mas como ganhar dinheiro com programas baseados no software livre? Oferecendo serviços, afirma a pesquisadora. Ela esclarece que o modelo de negócio no software livre é diferente. Com o software proprietário a rentabilidade se dá, principalmente, com a venda de licenças de uso. Já no caso do software livre, as empresas podem oferecer serviços como a adaptação de um programa para determinadas funções específicas para a empresa, ou fornecendo treinamento de pessoal.

Mesmo acreditando nas potencialidades de crescimento do software livre a pesquisadora estima que softwares proprietários e livres poderão coexistir. Esse fato decorre de aspectos como a existência de barreiras culturais para a adoção do software livre, custos de troca de software, necessidade de treinamento de pessoal e transformação de arquivos antigos.

Para saber mais leia:

A catedral e o bazar

Política e linguagem nos debates sobre software livre