Tilápia mais confiável para o consumidor

“A rastreabilidade de alimentos é vista como um meio de restabelecer a confiança dos consumidores e limitar a distribuição de produtos de procedência duvidosa e qualidade inadequada”, explica a professora Marília Oetterer (Esalq/USP). Ela coordena um projeto que visa estabelecer parâmetros e rastrear o cultivo da tilápia.

“A rastreabilidade de alimentos é vista como um meio de restabelecer a confiança dos consumidores na cadeia de abastecimento e limitar a distribuição de produtos de procedência duvidosa e qualidade inadequada”, explica a professora Marília Oetterer, do Departamento de Agroindústria, Alimentos e Nutrição da Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” (Esalq/USP). Ela coordena um projeto iniciado em março, que visa estabelecer parâmetros para rastrear o cultivo da tilápia. Apoiados pela Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), os pesquisadores desenvolverão um padrão de qualidade para o pescado. A idéia é avaliar todas as etapas envolvidas na cadeia produtiva, desde a qualidade da água de cultivo até o alimento embalado para consumo.

Tilápias / Foto: Augusto Hauber

A necessidade de estimular o consumo de pescados é uma das principais justificativas deste projeto. Marília acredita que o baixo consumo no Brasil está relacionado, além do preço relativamente elevado e do traço cultural, às características da maioria dos pescados oferecidos atualmente à população. Dentre as “características indesejáveis”, destacam-se o mal-cheiro e a rápida deterioração, decorrentes de alimentos produzidos, pescados e processados em lugares inapropriados, com técnicas inadequadas e em más condições de higiene. Por isso, embora muitos problemas de segurança alimentar se manifestem no fim da cadeia produtiva, suas causas estão no setor de produção primária.

“A rastreabilidade permite ao consumidor decidir com maior consciência sobre a compra dos produtos e, ao mesmo tempo, possibilita que o produtor e/ou industrial detecte e corrija um problema através de rápidos mecanismos de localização”, completa a pesquisadora.

Apesar da rastreabilidade de pescados não ser obrigatória no Brasil, constitui-se num diferencial fundamental para os produtores que exportam e, também, para os que atuam somente no mercado interno. Isso porque, além da preocupação com a inocuidade e a qualidade dos alimentos, os consumidores estão atentos a sistemas sustentáveis de produção agropecuária e, especificamente, ao declínio da população de peixes.

Marília Oetterer afirma que esta é a primeira vez que o cultivo da tilápia é rastreado. O alvo do estudo são duas unidades de produção de tilápia em tanques, localizadas no Estado de São Paulo, a Fazenda Palmares, em Igaratá, e a Fazenda Santa Ana Aquacultura, em Garça. Uma delas também processa o produto.

Seguindo o rastro

A rastreabilidade inclui a análise de diferentes aspectos da água de cultivo: microbiológicos (presença de coliformes fecais e de Salmonella, por exemplo); físico-químicos (como pH, temperatura, alcalinidade); e biológicos (presença de algas). Para a tilápia in natura são analisados os aspectos higiênicos, físico-químicos e sensoriais (aparência, cor, textura e sabor). Já para a tilápia minimamente processada (filés refrigerados e congelados) prioriza-se a análise dos aspectos microbiológicos, físico-químicos, sensoriais, assim como as preferências do consumidor, características do mercado e preços.

Durante este projeto, os peixes serão capturados em tanques-terra e submetidos à depuração em tanque com água corrente, permanecendo cinco dias sem alimentação, para a eliminação de quaisquer resíduos. Após o período de depuração, são pesados e colocados, ainda vivos, em caixas de isopor, em camadas intercaladas com gelo. Hipotérmicos, são transportados ao Setor de Processamento de Alimentos da Esalq, onde serão limpos e refrigerados para a realização das análises. O objetivo é avaliar as substâncias que comprometem, ou não, a segurança do alimento sob o aspecto higiênico e nutricional. Os resíduos serão utilizados para elaboração de silagem e extração de óleo de pescado.

A partir daí, serão levantadas as informações pertinentes para o estabelecimento da rastreabilidade da tilápia, as quais identificam o alimento e seu movimento pelos elos de distribuição da cadeia. Englobam, por exemplo, a identificação de fornecedores de alevinos e de ração; a identificação do proprietário e o registro da fazenda de cultivo; o método de despesca; os resultados das análises químicas e bacterianas; o controle de temperatura; controle de doenças; identificação do produto embalado, refrigerado e transportado; os registros da primeira venda (identidade do comprador e do vendedor, quantidades e preços), entre outros.

Seqüestro de carbono torna-se mais eficiente com bioreator

Grupo de pesquisadores da Unicamp investe para aumentar a taxa de consumo de gás carbônico, principal causador do efeito estufa. Por meio de um fotobiorreator que utiliza microalgas, o gás carbônico foi sequestrado de maneira 44 mil vezes mais eficiente que processos de árvores de reflorestamento.

Nenhuma novidade em afirmar que o “pulmão do mundo” não é Amazônia. As microalgas e cianobactérias respondem pela produção da maior parte do oxigênio do planeta. Mas é em uma espécie de microalga, a Aphanothece microscopica Nägeli, que um grupo de pesquisadores da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) investe para aumentar a taxa de consumo do gás carbônico (CO2), principal causador do efeito estufa. Por meio de um fotobiorreator (reator que usa luz e organismos vivos), elas fazem a conversão do CO2 em oxigênio de forma mais eficiente.

Fotorreator
O CO2 é injetado é convertido em biomassa. Crédito: Eduardo Jacob Lopes

Os dados preliminares apontam que a assimilação de gás carbônico das microalgas ou cianobactérias no fotobiorreator é 44 mil vezes maior se comparado aos processos de seqüestro de carbono das árvores de reflorestamento (Pinus e Eucalipto). Ou seja, em escala laboratorial, a remoção do carbono pela microalga fica em torno de 100 gramas do gás por hora a cada grama de cianobactéria, chamada de matéria seca. Já as árvores, apresentam taxa de consumo de 0,0023 gramas de gás carbônico por hora.

Entre os Mecanismos de Desenvolvimento Limpo (MDL) para a remoção de gás carbônico do meio ambiente,o florestamento (conversão de terra que não foi florestada por um período mínimo de 50 anos em ambiente com vegetação) e reflorestamento são alternativas reconhecidas pelo Acordo de Marraqueche de 2001. No entanto o pesquisador da Faculdade de Engenharia Química (FEQ), Eduardo Jacob Lopes, aponta algumas limitações do seqüestro de carbono a partir de árvores. “As áreas de floresta existentes não permitem o aproveitamento de biomassa formada (madeira) e a formação de novas áreas é considerada inviável frente ao desenvolvimento agrícola por razões econômicas”, opina.

Há oito anos estudando a utilização dessa cianobactéria em processos industriais, o engenheiro afirma que o emprego de microalgas é uma tecnologia limpa por não gerar resíduos. Além disso, a biomassa produzida é comercialmente interessante. “Para fazer um paralelo, metade do peso desse organismo unicelular é proteína, já a carne bovina tem 18% desse composto, embora a primeira não tenha a mesma qualidade. Por outro lado, dos 10% de lipídeos (gorduras) que as microalgas possuem, metade são do tipo ômega três, ácido graxo essencial para o organismo humano”, avalia. Vitaminas, sais minerais e pigmentos contidos na cianobactéria também poderiam ser empregados na alimentação humana e animal.

Microalga
Além de não gerar resíduos, ela é fonte de ômega 3. Crédito Paula Soyama

Proveniente da região sul do Brasil, a Aphanothece microscopica Nägeli é fotoautotrófica, ou seja, em condições favoráveis, ela utiliza a fotossíntese para a manutenção de suas estruturas biológicas. Segundo Lopes, a eficiência de captura de gás carbônico e liberação de oxigênio das cianofíceas é superior a das árvores.

As condições de operação do fotobiorreator estão em avaliação, mas o engenheiro garante que o processo é viável, embora ainda haja uma previsão de gastos de instalação de um fotobiorreator em escala piloto ou industrial. O CO2 produzido em indústrias como a petrolífera – uma das principais fontes de gás carbônico-, pode ser transformado em biomassa. Quando armazenado, ele é injetado em um líquido contendo sais minerais e microalgas, que crescem de forma significativa. Em quatro dias, a massa de microalgas aumenta, de acordo com o pesquisador, 30 vezes.

Emissão de CO2

Segundo informações do site do Fórum de Liderança sobre Seqüestro de Carbono (CSLF, na sigla em inglês), o Brasil é responsável por 1,4% da emissão de gás carbônico do mundo, produzido por combustíveis fósseis. Apesar de ser o 16º na lista dos países produtores de gás carbônico, o país possui baixa emissão per capita. Ou seja, apesar da produção de CO2 ser crescente, a energia de hidrelétricas e a utilização do álcool como combustível – energias chamadas de verde, por não contribuírem para a emissão deste gás – são os principais responsáveis pela estimativa.

Pelo Protocolo de Quioto (Japão), o Brasil não entra na meta de reduzir a emissão de gás carbônico nos próximos anos. No entanto, o país pretende vender créditos de carbono para outros países desenvolvidos que se comprometeram, até 2012, a reduzir 5,2% da quantidade de gases poluentes medidos em 1990. Quando for testado em escala industrial, o fotobiorreator utilizará o sol como fonte de energia para a fotossíntese das microalgas e poderá ser, Lopes aposta, uma alternativa sustentável para o seqüestro de carbono, já que não gera resíduos químicos, produz biomassa e utiliza áreas menores que as de reflorestamento.

Lei paranaense de rotulagem de transgênicos confronta Estado e União

A Lei estadual de rotulagem para produtos contendo materiais transgênicos, regulamentada pelo governo do Paraná em março, levanta dúvidas quanto a sua possível inconstitucionalidade. “A Constituição permite a simultaneidade de Estados e União na legislação sobre um mesmo assunto, mas jamais uma lei estadual pode contrariar uma lei federal”, explica o advogado Celso Luchesi.

A Lei estadual de rotulagem para produtos contendo materiais transgênicos, regulamentada por decreto pelo governador do Paraná Roberto Requião em março, é considerada por alguns apenas uma complementação da lei federal, e para outros, uma medida inconstitucional. As diferentes interpretações da lei ocorrem entre os próprios advogados e expõem o confronto de poder entre os Estados e a União. “A Constituição permite a simultaneidade de Estados e União na legislação sobre um mesmo assunto, mas jamais uma lei estadual pode contrariar uma lei federal”, explica o advogado Celso Luchesi.

O decreto federal 4.680/2003 determina a obrigatoriedade da rotulagem para produtos contendo materiais transgênicos acima de 1%, enquanto a lei paranaense (Lei 14.861/2005) não especifica proporções para a rotulagem desse tipo de produto e por isso está sendo contestada judicialmente. A lei paranaense visa não apenas obrigar a rotulagem dos alimentos geneticamente modificados (OGM) ou que possuam algum ingrediente transgênico na sua composição destinados ao consumo humano ou animal, mas também estabelece o controle e a fiscalização sobre a comercialização de matérias-primas e produtos que contenham OGMs.

“Essas práticas já estavam previstas pela lei federal, mas nunca foram cumpridas”, afirma o advogado do Instituto de Defesa do Consumidor (Idec) Paulo Pacini. Para ele, a Lei 14.861 está de acordo com o Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/1990). “O Código determina que os consumidores têm o direito de receber informações claras sobre a quantidade, a qualidade e a composição dos produtos consumidos”, diz. Além disso, Pacini considera a lei de rotulagem do Paraná totalmente pertinente, pois ainda não há estudos suficientes que determinem os efeitos os OGMs sobre o meio ambiente e o organismo humano. “Há estudos que atestam efeitos prejudiciais de transgênicos sobre a saúde humana e o meio ambiente, veiculados no site do governo do Paraná”(http://www.pr.gov.br/).

Desde dezembro do ano passado, o Partido da Frente Liberal (PFL) move uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 3645) contra a legislação do Paraná, alegando que ela não respeita o limite de 1% de OGMs nos produtos, estabelecido pelo decreto federal, abaixo do qual não seria necessário indicar a presença de transgênicos por meio do rótulo com o triângulo amarelo contendo a letra “T”. O advogado Luchesi concorda que a lei paranaense não considera o limite pré estabelecido pelo decreto 4.680 e que provavelmente o Supremo Tribunal Federal vai considerá-la inconstitucional.

Rótulo contém transgênicos

A disputa ganhou novo impulso no caso das exportações de soja transgênica pelo Porto de Paranaguá. No último dia 4, o governo do Paraná prometeu voltar ao Supremo Tribunal Federal (STF) para defender o direito de o Porto paranaense exportar apenas soja convencional, em resposta à decisão da 3ª Turma do Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região, em Porto Alegre, que revigorou liminar liberando a exportação de transgênicos pelo terminal paranaense. O governador Requião argumenta que a decisão fere a legislação federal (Lei de Biossegurança), que proíbe a mistura da soja transgênica com a convencional.

O confronto de poder entre os Estados e a União tem raízes na formação do Brasil. A diretora do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB) Lúcia Avelar lembra que a disputa de poderes entre os estados federados e a união remonta à época em que os estados eram províncias autônomas. “A coroa portuguesa concedeu vários poderes às províncias, inclusive para a realização de comércio exterior, deixando ao Estado a tarefa de subsidiar as instâncias locais sem intervir diretamente em sua autonomia”, explica.

O ponto de inflexão foi a centralização promovida pelo governo de Getúlio Vargas de forma “quase autoritária”, segundo Avelar. Realizaram-se vários tipos de arranjos para tentar coordenar as relações de poder entre os Estados e a federação, a legislação foi aperfeiçoada, mas ainda não existe consenso. Hoje temos exemplos de leis que vigoram apenas em determinados locais, como o rodízio de automóveis na cidade de São Paulo. “No caso da lei de rotulagem de transgênicos no Paraná, embora seja um direito do consumidor, o conflito de forças envolve também os empresários agrícolas e nesse embate vence sempre o mais forte”, adianta a pesquisadora.