Empreendedorismo fajuto?

Ao mesmo tempo em que o Brasil está em sétimo no ranking mundial de empreendedorismo, as estatísticas de mortalidade de empresas são altas. O último levantamento concluído pelo Sebrae/SP, em outubro de 2005, aponta que 56% das empresas encerraram as atividades antes de completar cinco anos.

Segundo pesquisa divulgada pelo Global Entrepreneurship Monitor (GEM), em meados de março deste ano, o Brasil ocupa o sétimo lugar no ranking mundial de empreendedorismo. Apesar disso, o último levantamento do Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas) mostra que 56% das empresas paulistas encerraram as atividades antes dos cinco anos de vida. Especialistas no assunto apontam a falta de planejamento do negócio e de capacitação do empreendedor como os principais fatores que levam ao insucesso.

Para o coordenador do Centro de Empreendedorismo e Novos Negócios da Fundação Getúlio Vargas (FGV), José Augusto Correa, a pesquisa divulgada pela GEM apresenta falhas, pois não dimensiona verdadeiramente o empreendedorismo mundial. Ele aponta, por exemplo, que as ações inovadoras realizadas dentro das empresas não são contabilizadas pelo levantamento, mesmo assim essas medidas são consideradas empreendedorismo.

Sobre a porcentagem apontada pelo Sebrae de empresas fechadas, Correa afirma que é preciso diferenciar ’aventura’ de ’empreendedorismo’ e detecta falhas que levam ao fracasso de muitas pequena e micro empresas. Ele argumenta que o negócio a ser aberto deverá ter “um traço de inovação” para ter boas chances, e exemplifica com uma idéia simples: “Um salão de cabeleireiro pode ser um bom negócio em um bairro aonde esse tipo de serviço ainda não seja ofertado. A inovação de um negócio pode até ser a oferta do melhor atendimento de determinado ramo”, declara. No entanto, muitos negócios são abertos sem a presença de qualquer inovação, inclusive por pessoas que não têm muitas informações sobre a área ou um perfil empreendedor.

Para ele, isso reflete uma tendência mundial da diminuição de postos de trabalho em função da terceirização de serviços, que tem como conseqüência a busca por negócios próprios. José Carlos Dornelas, consultor e especialista em empreendedorismo, faz uma análise diferente sobre o que leva à abertura de empresas. Em sua opinião, é o desemprego existente no país que não deixa opções aos profissionais e os faz montar negócios próprios como alternativa de renda.

Na opinião do coordenador do Centro de Empreendendorismo, ainda existe um outro elemento que compõe esse panorama: o Brasil é hostil à criação de novos negócios. Entre os motivos para essa afirmação ele aponta o excesso de burocracia para abrir e gerenciar uma empresa, a legislação trabalhista complicada e a falta de cultura que incentive pequenas iniciativas empreendedoras. No que se refere posição ocupada pelo Brasil no ranking de empreendedorismo, Dornelas, diferente de Correa, diz que o sétimo lugar demonstra a “criatividade e espírito empreendedor do brasileiro, sua vontade de arriscar e vencer”.

Planjamento aumenta chances de sucesso

Apesar das diferenças de avaliação sobre o que leva a abertura de empresas e sobre o ranking da GEM, tanto Correa, quanto Dornelas são enfáticos ao apontarem a necessidade de elaboração de um plano de negócios para os novos empreendimentos. “Ao verificar a viabilidade econômica do empreendimento, estudar a estrutura do mercado, risco do negócio e previsão de investimentos, a idéia pode nem sair do papel”, diz Dornelas, “dessa forma não se gasta dinheiro e tempo com algo que daria errado”, completa.

Para o Brasil ter um “empreendedorismo saudável”, Correa defende que o governo deve remover barreiras que limitam a livre entrada de capital privado no financiamento das empresas e a livre iniciativa. A redução da taxa de juros para que os investidores privados troquem as aplicações bancárias e optem por financiar negócios é outra medida recomendada por ele para a diminuição das mortes de empresas.

Mesmo considerando alto o índice de mortalidade de empresas, situado em 56%, o gerente de pesquisas econômicas do Sebrae/SP, Marco Aurélio Bedê, sinaliza que a redução da mortalidade de empresas contida na redução das estatísticas precisa ser evidenciada. A queda foi de 15 pontos percentuais, passou de 71%, na pesquisa finalizada em 2000/01, para 56%, no relatório de outubro de 2005.

“Os motivos dessa queda significativa no índice de mortalidade – analisa Bedê – está em uma série de políticas públicas, adotadas nos últimos dez anos, benéficas para as micro e pequenas empresas”. Entre as medidas citadas por ele estão: a adoção do estatuto nacional para as micro e pequenas empresas, simples federal e paulista, criação do banco do povo, além de liberação de crédito para as micro e pequenas empresas. Ele diz ainda que os empreendedores estão, lentamente, conscientizando-se da necessidade de buscar gerenciamento para o negócio.

O assessor em pesquisa e inovação, desenvolvimento de novos negócios e parcerias da Inova Unicamp, Carlos Tahin, lembra que confiabilidade, eficácia e atendimento são valores que passaram a fazer parte do sucesso empresarial. Na opinião dele, muitos profissionais são exímios na parte técnica da empresa, mas ruins como empreendedores por não terem conhecimento do mercado e não fazerem planejamento estratégico para a empresa. Segundo ele, sem visão empreendedora, dificilmente o negócio vai para frente.

No Brasil, laptops de US$ 100 podem ficar só nas escolas

O projeto One Laptop per Child (um laptop por criança), idealizado por Nicholas Negroponte, do MIT, como uma alternativa de inclusão digital para crianças carentes, pode ser adaptado para um laptop por aluno nas escolas do Brasil. Os aparelhos ficariam guardados na escola, uma vez que o MEC avalia como arriscado o transporte desses aparelhos pelas crianças para suas casas.

O projeto One Laptop per Child (um laptop por criança), idealizado pelo pesquisador americano Nicholas Negroponte, do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT, na sigla em inglês), como uma alternativa de inclusão digital para as crianças carentes do mundo, pode ser adaptado para se enquadrar à realidade brasileira. Segundo a idéia original do projeto, cada criança em idade escolar dos países participantes receberá um laptop, de custo de US$ 100, arcado pelo Estado. Esse aparelho seria usado pelas crianças não só para desenvolver atividades escolares, como também fora da escola, em casa.

No Brasil, entretanto, a proposta deve ser alterada para um laptop por aluno, ou seja, os aparelhos ficariam restritos ao uso na escola, uma vez que o Ministério da Educação (MEC) avalia como arriscado o transporte desses aparelhos pelas crianças para suas casas.

“O risco de nossos alunos transitando com equipamento é uma das maiores preocupações. Portanto, esta questão será tratada com a máxima cautela”, afirmou José Eduardo Bueno, coordenador do Departamento de Infra-Estrutura tecnológica educacional do MEC. Segundo Bueno, essa opção também está sendo testada pelo MIT, onde o projeto está sendo desenvolvido. “Em Maine, onde o MIT acompanha um projeto de utilização de 7 mil laptops por alunos da rede pública já há alguns anos, apenas alguns jovens estão levando os computadores para casa, como piloto para verificar o nível de risco desta ação”, explica.

Mas a adaptação do projeto é vista como uma distorção por alguns pesquisadores. José Armando Valente, do Núcleo de Informática Aplicada à Educação, da Unicamp, afirma que com um computador por aluno, o projeto assume outra característica. “A idéia do computador estar em casa é para a comunidade se beneficiar, não só o aluno, para que todos comecem a ter acesso à tecnologia digital. É um processo de apropriação do núcleo familiar”, avalia.

Segundo Valente, no caso do uso do computador ficar limitado à escola, seria importante se avaliar o ganho educacional que a aquisição dos laptops teria frente ao uso de desktops em laboratórios de informática nas escolas. “A discussão deve começar pelo aspecto educacional, do que vai ser feito com essa máquina, e não se o aparelho deve ser verde ou amarelo. O lado educacional é que determina o software e que máquina é necessária para se rodar esse software”, destaca. Somente depois desta discussão, aponta o pesquisador, faria sentido se definir se os laptops são necessários.

Adaptado ou não à realidade de violência implícita no Brasil, o projeto ainda está em avaliação e terá um custo inicial de pelo menos US$ 100 milhões, porque o preço de US$ 100 por aparelho só será atingido a partir da produção em larga escala. Dessa forma, cada país participante deverá adquirir pelo menos um milhão de máquinas logo no primeiro pedido. As máquinas serão importadas de um único produtor, a empresa taiwanesa Quanta Computer, escolhida pela ONG One Laptop Per Child para produzir os laptops.

O modelo do aparelho também ainda está em desenvolvimento: não se definiu qual a melhor opção de monitor, que deve poder ser visualizado mesmo debaixo de sol; nem uma fonte de energia alternativa, já que a primeira idéia, de se utilizar uma manivela, foi abandonada porque o movimento poderia avariar o equipamento. O preço também não está definido. Negroponte afirmou ser possível que a primeira leva de laptops saia por US$ 130, mas que em um ano de produção esse preço caia para apenas US$ 50.

Mesmo com os contratempos, o MEC está se mostrando otimista quanto à aquisição dos laptops a partir de 2007. Desde a visita de Negroponte ao Brasil, em março, o governo federal reafirmou seu interesse em participar do projeto, que também conta com o interesse de outros países em desenvolvimento: Argentina, África do Sul, Índia, China, Egito, Nigéria e Tailândia.

Segundo Bueno, do MEC, a aquisição dos laptops pode ser uma saída para suprir a demanda por laboratórios nas escolas brasileiras. “A demanda por utilização das tecnologias da informação e comunicação na educação é muito grande e as desigualdades regionais também”, afirma. De acordo com o ele, seriam necessários ainda cerca de 7 mil laboratórios de informática em escolas de ensino médio para que todos os municípios brasileiros tenham pelo menos uma escola com laboratório.

“Os laboratórios são importantes, mas não proporcionam uma disponibilidade de tempo para uma melhor exploração no processo pedagógico. Os alunos e professores, quando muito, conseguem duas ou três horas semanais de acesso”, explica Bueno. Com os laptops, segundo ele, os alunos teriam mais oportunidade de contato com a tecnologia. Além disso, a comunidade não sairia prejudicada com a permanência dos aparelhos nas escolas. “Defendemos que a escola publica esteja aberta e integrada na comunidade local, emprestando a sua estrutura para os projetos sociais e comunitários”, conclui.

Estudo mostra relação da sociedade e de policiais com o Disque-Denúncia

O Disque-Denúncia da Central do Rio de Janeiro, em funcionamento há mais de dez anos, pode ser considerado uma experiência bem sucedida, segundo a socióloga Luciane Patrício, da Universidade Federal Fluminense (UFF), que pesquisou o trabalho desta Central e sua relação com a sociedade, os policiais, a mídia e os atendentes.

A participação anônima da população no combate à criminalidade por meio do Disque-Denúncia, no caso da Central do Rio de Janeiro, acontece há mais de dez anos e pode ser considerada uma experiência bem sucedida, segundo a socióloga Luciane Patrício, da Universidade Federal Fluminense (UFF), que pesquisou o trabalho desta Central e sua relação com a sociedade, os policiais, a mídia e os atendentes. “Houve a disseminação do modelo carioca para outros locais e o serviço continuou em funcionamento mesmo com as mudanças de governo e passagem de diferentes secretários de segurança”, justifica a pesquisadora.

O trabalho de Patrício buscou evidenciar, por meio da história e do contexto em que o serviço foi criado, como ele foi ganhando importância ao longo do tempo. O Disque-Denúncia do Rio de Janeiro, inspirado em iniciativas internacionais da década de 70, foi criado em 1995 por causa do aumento considerável do número de seqüestros. O modelo da primeira Central foi levado para outros estados: São Paulo, Goiás, Espírito Santo, Pernambuco e Bahia.

No ano passado, a Central recebeu 123.408 denúncias, sendo que as campeãs são referentes ao tráfico de drogas, seguidas por denúncias de furto e roubo (quando há violência contra a pessoa) de carro. De acordo com a assessoria de comunicação da Secretaria de Segurança Pública do Rio de Janeiro, a confiabilidade das denúncias gira em torno de 80 a 90%.

Na pesquisa, Patrício aponta que a mídia atua de duas formas em relação à Central Disque-Denúncia do Rio de Janeiro: por um lado dá publicidade e visibilidade ao serviço e, por outro, o utiliza como fonte, visto que o jornalismo acaba consultando o banco de dados da central em determinados trabalhos. “Por exemplo, se um jornalista está fazendo uma matéria sobre violência contra a mulher, além dos dados das delegacias, dos depoimentos de especialistas, da consulta e pesquisa sobre o tema, ele também divulga a quantidade de denúncias que o Disque-Denúncia recebeu no último ano. A mídia é, ao mesmo tempo, colaboradora e cliente”, afirma.

No que diz respeito à população, o Disque-Denúncia além de receber denúncias criminais, é acionado para outros tipos de demandas, tais como reclamações de serviços públicos, brigas com vizinhos, problemas por barulho, entre outros. Para Patrício, isso mostra um incremento na relação de confiança entre o denunciante e este serviço, “uma vez que será atendido e terá sua demanda registrada, mesmo que não se configure, em princípio, em um problema criminal”, explica a pesquisadora.

Em relação aos atendentes, Patrício trabalhou com dois grupos, de dez pessoas cada e percebeu que muitos deles não divulgam que trabalham no Disque-Denúncia por medo de represália. De alguma forma, eles constroem uma identidade muito semelhante à do policial, que esconde sua profissão.

A representação que a polícia faz do Disque-Denúncia segue caminhos opostos: alguns reconhecem que o serviço é um importante instrumento de coleta de dados que serve para auxiliar seu trabalho; em contrapartida, outros o relacionam ao “dedurismo”, ressaltando que é uma ferramenta mais usada para vingança e punição de policiais. A pesquisadora entrevistou o subsecretario de inteligência da Secretaria de Seguranca Pública do Rio de Janeiro, Coronel Romeu Ferreira, quatro policiais (dois civis e dois militares), todos envolvidos com atividades de investigação.

A pesquisa de Patrício pode levar ao desdobramento de outros estudos, pois as próprias informações registradas pelo Disque-Denúncia, utilizadas pela polícia no serviço de inteligência, poderiam também ser objeto de análise. “A forma como esta informação está ou não sendo utilizada é que pode ser objeto de uma discussão mais aprofundada”, sugere a socióloga.