Físicos da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), do Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS) e da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), descrevem em artigo publicado em novembro na Nature Nanotechnology, como se deformam e rompem fios nanométricos feitos de ligas metálicas. A pesquisa demonstra a geração no laboratório de fios de liga metálica da menor espessura possível, contendo átomos de diferentes tipos. Os resultados fornecem informações essenciais para compreender e poder utilizar ligas feitas de diferentes metais que possibilitam reforço estrutural ou condução de energia elétrica em nanodispositivos eletrônicos.
“A criação de uma liga nanométrica já é um grande desafio. Devido à facilidade com que os átomos se deslocam, a tendência na criação de uma liga é que esta agregue pouca quantidade de diferentes metais, ou seja, o material metálico tende a se auto purificar, expulsando o material que considera impureza, mesmo que as porcentagens iniciais sejam as mesmas, por exemplo, 50% de cobre e 50% de prata. A formação de ligas modificadas pode melhorar as propriedades dos materiais puros, como o aço (ferro misturado com cromo e níquel), que é muito mais resistente que o ferro puro”, diz Daniel Ugarte, pesquisador do LNLS e professor de física na Unicamp. “Coloca-se uma certa medida de macarrão e de molho, mas depois de aquecido há menos molho e o macarrão se expande. Ou seja, no final do processo, da mistura, não é a mesma coisa”, compara.
Esta pesquisa colabora para a área de criação de ligas nanométricas, ao sugerir quais metais podem ser misturados para manter a liga nanométrica estável. “A pesquisa mostra em que momento a junção de metais, como ouro e prata, por exemplo, possibilita o rompimento da liga a partir da redução de seu tamanho em nanométrico”, diz Ugarte. Há, portanto, um limite para cada liga. “Uma goma de mascar, à medida que se estica e ela se afina, há um momento em que se rompe”, ilustra.
Em eletrônica, cada vez mais os dispositivos estão em escala nanométricas e a conexão entre eles é feita por fios metálicos. Ligas metálicas nanométricas podem apresentar resistência elétrica menor e ponto de fusão maior, melhorando suas propriedades para aplicação. Destaca-se a utilidade das ligas metálicas nanométricas para o transporte de energia elétrica em nanoeletrônica.
“Um dos focos mais avançados da eletrônica é a criação de sistemas que utilizam simultaneamente as propriedades elétricas e magnéticas dos elétrons, denominada de spintrônica. Assim, é possível medir não apenas a carga dos elétrons, mas também o magnetismo. Para isto, é necessária a utilização de metais magnéticos altamente reativos, sendo que o estudo de ligas nanométricas pode gerar fios com o núcleo de metais magnéticos cobertos (protegidos) por outro metal menos reativo, a partir da combinação correta dos átomos de metais”, diz Ugarte.
Os pesquisadores, através de experimentos e pesquisas básicas que duraram dois anos, chegaram à menor e mais resistente liga metálica de ouro e prata. Para isso, foi preciso considerar as mudanças possíveis da organização de um sistema de átomos. Os pesquisadores viram que se os experimentos forem trabalhados de modo correto é possível chegar à liga de menor tamanho possível. Com isso, destacam a importância das pesquisas teóricas para se chegar à aplicação prática.
A questão básica para a nanotecnologia: “Como se comporta uma liga quando seu tamanho é reduzido às escalas nanométricas”, segundo Ugarte, finalmente foi desvendada pelos pesquisadores brasileiros através da criação de metodologias para estudar as ligas, fotografias e desenhos de um sistema ideal que mostra como os átomos se arranjam e de que materiais são formados. Os avanços em nanotecnologia focados em ligas metálicas podem contribuir para as áreas de metalurgia, para produzir ferramentas, e construção civil, para reforçar estruturas.
Seguindo a tendência em se fazer cada vez mais coisas menores em microeletrônica, diversos países estudam ligas metálicas nanométicas, como Espanha, Holanda e Estados Unidos, com destaque para as pesquisas realizadas no Brasil e Japão. Existem poucos laboratórios como o LNLS no mundo que poderiam possibilitar os experimentos avançados, principalmente a captação de imagens de átomos através do microscópio. Ugarte também destaca a importância da associação entre pesquisadores de universidades e do laboratório para a completude do estudo.
O Laboratório Nacional de Luz Síncroton
Pesquisadores, não apenas do Brasil, mas de todo o mundo, submetem pesquisas para o Laboratório Nacional de Luz Síncroton (LNLS), que chega a atender 450 projetos por ano. Tanto as iniciativas privadas quanto públicas utilizam o laboratório, que tem demanda muito maior por parte das universidades. Atualmente, a maioria dos usuários provém principalmente de São Paulo, Rio de Janeiro, Paraná, Rio Grande do Sul e Minas Gerais; mas o laboratório também recebe pesquisadores de países da América Latina, principalmente da Argentina e Chile.
O objetivo do LNLS é prover estrutura para a comunidade científica. Para acompanhar a evolução tecnológica de outros laboratórios do mesmo ramo, de outros países, o LNLS planeja expansão, com o desenvolvimento de equipamentos com maior capacidade em um novo prédio, pois boa parte de sua estrutura foi desenvolvida com equipamentos da década de 80. O laboratório é operado pela Associação Brasileira de Luz Síncroton, sem fins lucrativos, que tem representantes do governo federal, da indústria nacional, de universidades e do CNPq. A verba do LNLS é votada no Congresso Nacional e cobre em torno de 80% do orçamento do laboratório. Os investimentos, que não são contemplados no orçamento, são adquiridos através de parcerias, projetos com a Fapesp e a Finep.