Ribeirinhos do Solimões usam tecnologias para sustentabilidade local

As comunidades que vivem à beira do Rio Solimões, entre Coari e Manaus (AM), passaram a usufruir tecnologias voltadas ao desenvolvimento auto-sustentável da região. Agricultura, pesca e uso de plantas medicinais foram os segmentos focalizados pelo Programa Desenvolvimento Rural e Sustentabilidade em Comunidades Ribeirinhas do Amazonas, através do projeto Piatam, vinculado à Petrobrás.

As comunidades que vivem à beira do Rio Solimões, entre Coari e Manaus (AM), – trecho do transporte de petróleo e gás gerenciado pela estatal Petrobrás – passaram a usufruir tecnologias voltadas ao desenvolvimento auto-sustentável da região há cerca de um ano. Agricultura, pesca e uso de plantas medicinais foram os segmentos focalizados pelo Programa Desenvolvimento Rural e Sustentabilidade em Comunidades Ribeirinhas do Amazonas, através do projeto Potenciais Impactos e Riscos Ambientais na Indústria do Petróleo e Gás no Amazonas (Piatam), vinculado à empresa governamental. Pesquisadores e comunidades destacam que o projeto tem contribuído para uma maior agregação de valor aos produtos locais, bem como melhoria da qualidade de vida população e do ambiente.

As tecnologias foram desenvolvidas a partir da coleta de dados, estudos e análises das condições socioeconômicas, culturais e ambientais das comunidades ribeirinhas, buscando atender as demandas regionais. A coordenadora do programa, Therezinha de Jesus Pinto Fraxe, professora da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), instituição parceira do Piatam, explica que a proposta inicial era tornar os agricultores independentes do mercado. “A preocupação foi criar tecnologias para que eles próprios possam, por exemplo, produzir suas sementes e controlar as pragas, tornando-os mais independentes de insumos externos e mais próximos de uma auto-sustentabilidade”, afirma.

Na produção agrícola, por exemplo, foi caracterizada uma ferramenta para o uso de repelentes naturais para o controle de pragas em plantações de fumo. Além disso, uma máquina de desfibrilar a malva e a juta foi adquirida para facilitar o trabalho dos agricultores. As comunidades também adotaram como fertilizante um húmus feito a partir da decomposição controlada de plantas aquáticas, que diminuem o uso de agrotóxicos nas lavouras. Por meio deste processo, incorporam-se nutrientes ao solo, o que permite obter resultados eficazes na produção de frutas, verduras e plantas ornamentais, explica Therezinha. “Nossa várzea possui lençol freático muito baixo, por causa disso é fácil de ser contaminado. Para evitar esse problema criamos tecnologias a partir do plantio orgânico”, completa.

Na produção pesqueira os moradores ribeirinhos aprendem a usar caixas de polietileno adequadas para o armazenamento de peixe e aprendem a manejar os lagos a partir de metodologias participativas. Com as novas ferramentas, os pescadores locais poderão agregar mais valor ao seu trabalho e comercializar mais peixe sem interferir na reprodução dos peixes. “Neste caso, os pescadores revitalizam seus conhecimentos acerca dos lagos, pois muitos não os deixavam descansar na época da procriação, o que levava à uma redução drástica de cardumes”, observa a coordenadora do programa, criado há mais de um ano.

Além disso, um campo pouco explorado pelas comunidades – o uso medicinal da biodiversidade de flora – também foi estimulado. Therezinha conta que muitas mulheres idosas fazem remédios caseiros, mas com certa limitação na fabricação. Os pesquisadores elaboraram algumas cartilhas sobre plantas medicinais e o poder dos princípios ativos das plantas, visando ampliar o etnoconhecimento sobre as plantas e seus usos.

Diálogo entre comunidades e pesquisadores

A população ribeirinha do Solimões manteve-se desconfiada e resistente à implantação do programa inicialmente, conta Therezinha. Em sua opinião, essa barreira foi criada há muitos anos porque a região já serviu como experimento de tecnologias pré-fabricadas que trouxeram danos aos moradores, como mortes por intoxicação, mutilação por uso desordenado de moto-serra, entre outros. Preocupado em produzir pesquisas e desenvolver tecnologias em diálogo com os moradores e suas necessidades o Projeto Piatam realizou durante quatro anos estudos na região. Nesse tempo, 30 profissionais, dentre pesquisadores, mestrandos, doutores e graduandos, buscaram levantar os problemas enfrentados pelas comunidades e criar alternativas auto-sustentáveis. “Cada comunidade precisa de uma ferramenta tecnológica específica, desenvolvida conforme o tipo de estrutura socioambiental e o cultivo existente. Por isso precisamos desse tempo para a implantação do programa, afim de reduzir os impactos ambientais e agregar valores à produção local”, explica Therezinha.

A agente de saúde que vive na Comunidade Nossa Senhora das Graças, Maria Madalena de Souza Lima, 37 anos, é uma entre os moradores que se mostra otimista com o programa. Ela diz que após a implementação houve maior incentivo à produção local. “Nós estávamos muito parados aqui porque não tínhamos motivação e nem sabíamos como produzir alimentos para nossa subsistência. Hoje plantamos milho, criamos galinha e também fazemos adubo. Meu marido, que é pescador, também está aprendendo a comercializar o peixe. Com tudo isso nós reduzimos nossa dependência dos alimentos da cidade. É uma economia para nós! ”, relata.

Para criar as ferramentas tecnológicas os pesquisadores também levaram em consideração as características da região, tais como: os múltiplos domínios paisagísticos e ecológicos; contrastes de terras altas e secas (firmes) e terras baixas e úmidas (várzeas); a biodiversidade de flora e fauna; e as diferenças socioculturais, que revelam os diversos modos de uso e apropriação dos recursos naturais da região. Ao todo o Programa Desenvolvimento Rural e Sustentabilidade em Comunidades Ribeirinhas do Amazonas atende 20 comunidades e cerca de dez mil pessoas. As populações estão em comunidades, como Santa Luzia do Buiuçuzinho, Esperança II, Lauro Sodré, Matrinxã, Santo Antonio, Bom Jesus, Nossa Senhora de Nazaré, Nossa Senhora das Graças e Santa Luzia do Baixio.

Robô facilitará pesquisa na Amazônia

O trabalho de pesquisadores que atuam na região amazônica, especificamente onde há a construção do gasoduto que ligará Coari a Manaus, terá um importante coadjuvante: o Robô Ambiental Híbrido. Os primeiros testes foram realizados entre os dias 18 e 24 de maio nas comunidades Nossa Senhora das Graças e Nossa Senhora da Ilha do Baixio.

O trabalho de pesquisadores que atuam na região amazônica, especificamente onde há a construção do gasoduto que ligará Coari a Manaus, terá um importante coadjuvante: o Robô Ambiental Híbrido. A criação é de uma equipe de cientistas que integra o Projeto Ferramenta Cognitiva para a Amazônia (Cognitus), um dos três traçados do Projeto Potenciais Riscos Ambientais da Indústria do Petróleo e Gás na Amazônia (Piatam), desenvolvido em parceria com a Universidade Federal da Amazônia (Ufam) e a Petrobras. Os primeiros testes foram realizados entre os dias 18 e 24 de maio nas comunidades Nossa Senhora das Graças e Nossa Senhora da Ilha do Baixio.

Robô atravessa manguezais e enfrenta correntezas com facilidade
Créditos: Márcio Melo

O robô, que a gosto da equipe do Centro de Estudos da Petrobras (Cenpes) deverá ser batizado como Chico Mendes, em homenagem ao seringueiro e ambientalista morto em 1988, já está patenteado. “O projeto foi iniciado em março do ano passado, quando passamos a fazer vários estudos na região do Solimões para reconhecimento das características do local e assim usar ferramentas e um equipamento adaptado ao ambiente. A partir deste estudo, construímos um protótipo que tem a capacidade de atravessar manguezais e correntezas, subir em uma rampa ou duto e andar em terra firme”, explica o chefe do laboratório de robótica do Cenpes, Ney Robinson Salvi dos Reis.

O robô terá estrutura de fibra de vidro e acrílico, duas câmeras acopladas para visualizar os ecossistemas, GPS de posição 3D (latitude, longitude e altitude) e um manipulador (espécie de “braço” eletrônico) para a coleta de informações. Também compõe a máquina: um sensor para medir os parâmetros da água; um coletor e analisador à distância de larvas de mosquito; além de motores de suspensão e rodas especiais para um deslocamento independente do ambiente encontrado. Seu protótipo tem tamanho médio 1,60m e pesa 113kg, mas este peso deverá aumentar para 300 kg quando for construído o original. Pensando ainda em minimizar o impacto da presença do robô na floresta, os pesquisadores criaram um bateria elétrica recarregável com energia solar, ou seja, não-poluente e silenciosa, com durabilidade de três horas.

Robô é sucesso entre ribeirinhos. Créditos: Márcio Melo

A altura do robô Chico Mendes será de aproximadamente de 2,5 metros, para abrigar uma pessoa em seu interior. Entretanto, os pesquisadores não precisarão estar a bordo da máquina para realizar a pesquisa, pois poderão manipular o robô através de um controle remoto em uma espécie de laboratório flutuante ou caverna virtual. Neste ambiente, equipado com câmeras de vídeo, serão projetadas em terceira dimensão as imagens captadas na floresta. A idéia é fazer com que o pesquisador se sinta próximo de seu objeto de estudo e tenha uma dimensão maior do que está acontecendo, além de interagir com a população ribeirinha mesmo à distância. O encarregado de transformar em realidade virtual as informações coletadas pelo robô é o consultor técnico da Gerência de Métodos Científicos do Cenpes, Heitor Araújo.

Imagens inéditas

Durante o I Encontro de Jornalistas Parceiros do Piatam, em Manaus (AM), no dia 25 de maio, foram apresentadas as primeiras imagens do protótipo. Por meio de um vídeo os participantes puderam ver o robô em ação na floresta, atravessando manguezais, enfrentando correntezas e realizando subidas em rampas e dutos, procedimentos que serão corriqueiros para a máquina de monitoramento de ecossistemas amazonenses.

No vídeo foi possível perceber que o sucesso da máquina não ficou só entre pesquisadores, que destacaram a potencialidade tecnológica do robô, mas se expandiu entre as crianças das comunidades que acompanharam de perto os testes. Reis conta que a intenção do projeto é conquistar os pequenos ribeirinhos “para que cuidem e, principalmente, ajudem a sedimentar nas futuras gerações da região a idéia de que o robô não é um intruso, e sim um assistente dos pesquisadores e mais uma ferramenta brasileira à disposição deles”.

Para a garotada ribeirinha conhecer melhor o projeto, de forma lúdica e didática, foi desenvolvido o jogo Amazônia Brasileira Excursão do Projeto Piatam, criado pela designer Lucia Helena Ramos. Ele será distribuído na próxima excursão do projeto. “Esta é uma iniciativa não só para crianças, mas também para adultos voltada para a educação ambiental como uma forma de esclarecer como o robô vai atuar na área de pesquisa do Piatam. Também é um meio de estimular os jovens da região a se interessarem por pesquisas, e pelo que podem fazer para contribuir com a preservação ambiental”, acrescenta a designer.

Estavam presentes no encontro representantes das instituições parceiras do projeto: a Ufam; a Coordenação dos Programas de Pós-graduação de Engenharia (Coppe) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ); a Fundação Centro de Análise, Pesquisa e Inovação Tecnológica (Fucapi); o Instituto Nacional de Pesquisas Amazônicas (Inpa), e a Financiadora de Estudos e Projetos e Petrobras (Finep).

Surgimento da robótica

No livro recém-lançado Robô, filho pródigo: seremos seus bichos de estimação?, Heitor Shimizu, coordenador do setor on-line da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), explora o surgimento da robótica e os dilemas que envolvem sua criação, analisando a relação do robô com o homem no futuro e a evolução da própria inteligência artificial.

Brasil começa a desenvolver metodologia para seguros contra inundações

Pesquisadores da USP de São Carlos estão desenvolvendo uma metodologia para a implantação de um modelo de seguro contra inundações em bacias urbanas, que ainda não existe no Brasil. A pesquisa irá investigar a forma como se comporta a bacia e reunirá informações hidrológicas, hidráulicas, geográficas e topográficas do local, para saber qual o risco e custo dos seguros para áreas atingidas por enchentes.

É prática comum fazer seguro de casa, carro e vida no país. Pesquisadores do Núcleo Integrado de Bacias Hidrográficas (NIBH) da Universidade de São Paulo (USP), no campus de São Carlos, estão desenvolvendo uma metodologia para a implantação de um modelo de seguro contra inundações em bacias urbanas, que ainda não existe por aqui. Este tipo de seguro já é feito na Europa: a maior resseguradora (empresa que assume o risco de outras seguradoras) do mundo, localizada na Alemanha, cobre não apenas danos causados por enchentes, mas por outros desastres naturais em vários países.

A pesquisa brasileira está sendo desenvolvida como parte do doutorado da engenheira civil Melissa Graciosa, mas a idéia já havia tomado forma no mestrado do economista Julian Righeto, também do NIBH, que analisou a viabilidade econômica da implantação de seguros em áreas de enchente. Apesar das grandes catástrofes envolvendo enchentes não acontecerem no Brasil, elas são recorrentes, principalmente nos verões, e o prejuízo anual do país é de R$1 bilhão.

Graciosa apresentou neste mês seu estudo na Jornada Iberoamericana sobre Inundações e Desastres Naturais, promovida pela Rede Iberoamericana para o Monitoramento e Prognóstico de Fenômenos Hidrometeorológicos (Prohimed), na Guatemala. No evento, participam pesquisadores da América Latina e Espanha. Esta rede, com o apoio da Organização Meteorológica Mundial, uma agência especial da Organizações das Nações Unidas, tem o propósito de fazer uma avaliação integrada de fortes chuvas e inundações em cada país, combinado com o conhecimento científico de meteorologia e hidrologia.

Os seguros contra inundações estão inseridos na gestão de riscos de desastres naturais, que é caracterizada por três fases: prevenção, ações de socorro e recuperação. O seguro hidrológico vem para viabilizar financeiramente a etapa de recuperação. “No Brasil, não temos dinheiro para a recuperação depois dos desastres”, diz a engenheira. “As seguradoras de carro têm estatísticas, sabem quantos automóveis quebram, quantos são roubados, ou seja, têm conhecimento do risco e do custo”, afirma Graciosa, que está desenvolvendo uma metodologia para descobrir o risco e o custo dos seguros para áreas atingidas por enchentes. Um dos pontos analisados pela pesquisadora são as curvas de dano. Ou seja, se o rio sobe um metro, o prejuízo será de quanto?

Sua pesquisa investigará a forma como se comporta a bacia, reunirá informações hidrológicas, hidráulicas, geográficas e topográficas do local, analisará a relação entre o volume e profundidade de inundação e quantificará o número de pessoas atingidas, a fim de descobrir o número de possíveis segurados. As análises nas quais se baseiam esse trabalho são feitas no Córrego do Gregório, região de comércio atingida constantemente por enchentes no centro da cidade de São Carlos. A maior dificuldade é que não existe um grande histórico de vazões, ou seja, dos níveis que o rio atingiu. Graciosa conta que os dados disponíveis são a partir de 2004, e por isso, sua pesquisa utilizará também dados do comportamento de outros rios.

“Para que uma seguradora possa entrar no mercado de seguros contra enchentes, são necessários vários dados que permitam um investimento com uma margem segura de arrecadação através de um prêmio ótimo determinado por meio de simulações do local, para que o investimento seja viável”, analisa Righeto que, em sua pesquisa também fez uma avaliação da percepção dos comerciantes que ocupam a região do córrego do Gregório sobre a problemática das enchentes. Ele fez uma análise em 300 lojas e concluiu que todos os comerciantes têm interesse por um seguro desse tipo, já que as obras contra enchentes são inúteis, porque sempre que chove forte, seus estabelecimentos são afetados. Righeto estudou ainda quanto os comerciantes estariam dispostos a pagar pelo seguro. “Varia de acordo com o tamanho do estabelecimento. De R$ 50 a R$ 100, dependendo da intensidade da enchente, seria um prêmio ótimo de acordo com o modelo de seguro contra enchentes que desenvolvi em meu mestrado”.

Os seguros contra enchentes, ao contrário de outros, depende do local em que vão ocorrer as inundações. “A idéia, com certeza, é muito recente. Ainda não existe nenhum seguro desse tipo no mercado brasileiro, pois o trabalho é muito extenso e, para se realizar na prática, há a necessidade de um estudo profundo de cada região que se pretende aplicar”, conclui o economista.