Falta de informação impede que vasectomia seja mais praticada

Pesquisa realizada na USP revela que os homens submetidos à vasectomia estão satisfeitos com o método simples, rápido e gratuito de esterilização. Mas a cirurgia ainda é pouco realizada no país quando comparada a métodos femininos de contracepção.

O que muda na vida do homem após uma vasectomia? Pesquisa realizada na Faculdade de Saúde Pública da USP revela que a maioria (97%) dos que fizeram a cirurgia estão satisfeitos. Apesar de simples e disponível no SUS, a vasectomia ainda está bem aquém (em números) quando comparada à esterilização feminina. Só no ano passado, pouco mais de 14 mil vasectomias foram realizadas no serviço público enquanto que a laqueadura foi responsável pela internação de mais de 37 mil mulheres. Para a enfermeira Nádia Maria Marchi, autora da pesquisa, a falta de informação e o machismo contribuem para este quadro.

Nos últimos anos, houve um aumento considerável na procura por esse tipo de cirurgia no Brasil. Em 2002, foram 5824 procedimentos oferecidos pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e, em 2005, este número mais do que dobrou chegando a 14334 – metade delas realizada no estado de São Paulo.

Desde 1997 a vasectomia é oferecida gratuitamente no SUS e indicada para homens acima de 25 anos, com dois filhos vivos ou nos casos onde a gravidez leve ao risco de vida. Não há uma estimativa do número total de vasectomias no país, já que o Ministério da Saúde não tem controle do serviço privado. A última Pesquisa Nacional sobre Demografia e Saúde, realizada em 1996, apontou que só 2,6% das mulheres em idade reprodutiva tinham companheiros vasectomizados.

Em todo o mundo estima-se que 5% dos casais tenham aderido a esse método de contracepção, sendo que as porcentagens mais altas ocorrem em países como a Nova Zelândia e Reino Unido (ambos com 18%), Canadá (16,2%), Estados Unidos (14,9%) e China (10,2%). Em países da África, Europa Oriental e América Latina a prevalência de vasectomia é de cerca de 1%.

O pequeno número de solicitações de vasectomia tem relação com a falta de acesso dos homens a informações adequadas e serviços de boa qualidade, assim como aos preconceitos e idéias equivocadas em relação a seus efeitos sobre a virilidade masculina. Além disso, os homens esbarram ainda no menor número de métodos de contracepção para eles. Enquanto só contam com essa cirurgia ou preservativo, as mulheres têm a sua disposição uma variedade maior de escolhas que passam pelo DIU, a camisinha feminina, a pílula anticoncepcional e a do dia-seguinte, o adesivo e controle hormonal, além da cirurgia de ligadura de trompas. O maior número de opções para as mulheres parece ser um retrato do machismo existente na sociedade, mas os médicos alegam que as diferenças na anatomia e fisiologia dos dois sexos, ainda não permitiram que os cientistas desenvolvessem uma droga capaz de, por exemplo, parar a produção de espermatozóides sem rejeição do organismo e com boa eficácia. “O organismo da mulher é mais fácil de ser controlado” relata o secretário-geral da Sociedade Brasileira de Urologia Luciano Favorito.

Alternativa benéfica

Mais de 200 homens residentes na cidade de Campinas (SP) submetidos à vasectomia, entre os anos de 1998 e 2004, e registrados no Ambulatório de Planejamento Familiar da Secretaria de Saúde da cidade foram pesquisados por Nádia Marchi. Mais da metade deles (52,7%) optou pela cirurgia por ser um método mais fácil, simples e rápido que a esterilização feminina (ligadura de trompas). De fato, após essa cirurgia o homem pode voltar dirigindo pra casa.

Ao todo, 212 pacientes da rede pública de Campinas foram questionados sobre as conseqüências da cirurgia em suas vidas. A maioria era católica, não branca, vivia com a companheira, com ensino fundamental concluído, renda per capita de até R$ 300 e com idades entre 30 e 39 anos quando fez a vasectomia. Grande parte decidiu pela cirurgia por conta própria, por considerarem já possuir um número ideal de filhos e ser a vasectomia segura e infalível na contracepção. Além disso, muitos relataram que o sexo ficou melhor e mais tranqüilo depois da cirurgia já que a possibilidade de gravidez passou a ser nula, justamente o contrário do que a grande maioria pensa. É preciso que o governo e a mídia divulguem campanhas de esclarecimento da população, para quebrar as lendas em torno da cirurgia.“O principal benefício do homem que faz vasectomia é a melhora da qualidade de vida sexual, que passa a ser mais tranqüila, sem prejuízos à virilidade do homem.” conclui Luciano Favorito.

“De olho” nas redes de comunicação

Uma tecnologia desenvolvida por Eduardo Mobilon, da Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação da Unicamp, vai possibilitar que profissionais da área de telecomunicações fiquem literalmente “de olho” nas redes de comunicações ópticas, acompanhando seu desempenho em tempo real, e a um custo menor em relação aos analisadores convencionais.

Uma tecnologia em desenvolvimento pelo doutorando Eduardo Mobilon, da Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação (FEEC) da Unicamp, vai possibilitar que profissionais da área de telecomunicações fiquem literalmente “de olho” nas redes de comunicações ópticas, acompanhando seu desempenho em tempo real, e a um custo menor em relação aos analisadores convencionais (osciloscópios digitais de amostragem e medidores de taxa de erro).

Mestre em engenharia elétrica pela mesma universidade e pesquisador do Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Telecomunicações (CPqD), que integra o projeto Giga, Mobilon se inspirou num artigo no qual o pesquisador grego George Moustakides, atualmente professor do Departamento de Engenharia Elétrica e de Computação da Universidade de Patras, apresentou uma técnica para reconstrução de diagramas de olho por meio de processamento digital de sinais. Trata-se de um procedimento matemático que, aplicado a um conjunto de amostras obtidas do sinal óptico de comunicação, permite a construção de uma figura com formato semelhante ao de um olho humano. Esta figura, conhecida como “diagrama de olho”, permite aos pesquisadores avaliar a característica dos sinais transmitidos. “O próprio autor sugeria a aplicação da técnica na monitoração de redes ópticas de comunicação, mas o trabalho era apenas teórico e experimental, sem o desenvolvimento de nenhum equipamento”, relata Mobilon, que decidiu, então, colocá-lo em prática.

Após um minucioso estudo da teoria matemática apresentada no artigo e a realização de vários experimentos em laboratório para avaliação e validação da técnica, ele criou o Analisador de Diagrama de Olho (ADO). Seu trabalho de doutorado inclui o estudo das aplicações deste equipamento na monitoração de redes de comunicações ópticas.

“De acordo com nossa pesquisa bibliográfica, a implementação em hardware (a criação do ADO a partir dessa teoria) é a primeira no Brasil e no mundo”, ressalta o pesquisador. Tanto que embora ainda nem tenha defendido sua tese (o que deverá ocorrer no final do próximo semestre) seu trabalho já tem conquistado reconhecimento. Ele foi apresentado em congressos internacionais como o 49th IEEE Midwest Symposium on Circuits and Systems (MWSCAS-2006), em Porto Rico; o IEEE International Telecommunications Symposium (ITS- 2006), em Fortaleza; e o IEEE International Microwave & Optoelectronics Conference (IMOC-2005), em Brasília.

O ADO destina-se a monitorar a qualidade de transmissão dos sinais ópticos em redes de telecomunicações. Essa qualidade pode ser comprometida por fenômenos físicos de propagação, como a dispersão cromática ou o efeito Brillouin – um espalhamento da luz causado pela interferência de ondas acústicas, no núcleo da fibra, que limita a potência da transmissão óptica – ou ainda por degradações pelo envelhecimento dos componentes do sistema. A própria propagação por centenas de quilômetros de fibras ópticas, que requer o uso de amplificadores ópticos, faz com que os sinais se tornem mais ruidosos e sofram distorções, dificultando a recepção no destino.

O novo equipamento permite uma análise de baixo custo semelhante à oferecida pelo uso de dois instrumentos comerciais muito caros: o osciloscópio digital de amostragem e o medidor de taxas de erros. Obviamente, explica Mobilon, tais equipamentos desempenham funções muito mais complexas e análises de precisão muito maior. Porém, seu alto custo normalmente inviabiliza sua instalação fixa em campo para monitoração das redes. São levados para campo apenas quando necessário para investigar algum problema já ocorrido. Já o ADO, devido ao seu baixo custo – estima-se em cerca de apenas 10% do custo de um osciloscópio de amostragem convencional – pode ficar permanentemente instalado em pontos estratégicos de qualquer rede óptica, por adaptar-se aos equipamentos de qualquer fabricante, e pode fornecer dados para verificação contínua da qualidade do sistema de comunicação, permitindo ações preventivas e corretivas, como um novo roteamento da transmissão por outra fibra antes que uma interrupção total aconteça.

Como se forma um diagrama de olho?

Os osciloscópios de amostragem convencionais exibem formas de onda em sua tela que representam o comportamento de um sinal elétrico em função do tempo. A coleta de amostras dos sinais ocorre de forma sincronizada com um sinal de referência denominado “sinal de relógio”, normalmente obtido por circuitos eletrônicos de alto custo destinados à “recuperação de relógio” do sinal analisado. O ADO trabalha sem necessidade desse sincronismo. “Este é um dos fatores que contribuem para o seu baixo custo”, afirma Mobilon.

Dotado de uma interface de conversão opto-elétrica, o ADO captura amostras dos pulsos de luz que correspondem aos bits transmitidos. Se os pulsos fossem transmitidos de forma seqüencial e repetitiva (1 0 1 0 1 0, por exemplo) a imagem a ser verificada na tela do computador seria a de uma onda “quadrada”. Mas ao se converter um sinal de voz ou imagem para o formato digital, os bits ocorrem de maneira aleatória (sem uma seqüência previsível e repetitiva). Assim, o equipamento constrói curvas sobrepondo pulsos em uma mesma janela de tempo. Alguns pulsos mostram uma transição de subida no nível de tensão (representando normalmente os bits 1) e outros uma transição de descida (representando os bits 0). A visualização simultânea desses pulsos é que forma uma figura semelhante a um olho.

 

As figuras acima representam três diagramas de olho, indicando diferentes condições do sinal analisado. No primeiro (à esquerda), há muito ruído óptico, causado por amplificações sucessivas, por exemplo. No segundo (o do meio), há distorções causadas por dispersão cromática, um fenômeno de propagação na fibra óptica. No terceiro (à direita), o sinal é considerado muito bom.

A análise dessa imagem, segundo o pesquisador, permite a verificação do desempenho do sistema de comunicação. Quando há ruído no sinal, o diagrama de olho revela traços mais espessos (nos bits 1, 0 ou em ambos). A partir de cálculos estatísticos realizados com amostras do diagrama de olho obtido por um osciloscópio ou pelo ADO é possível a estimação de um parâmetro conhecido como taxa de erro de bit, que é utilizado para avaliação do desempenho de sistemas de transmissão. Além da espessura dos traços, outras distorções nos pulsos, capazes de penalizar o sistema de comunicação, podem ser observadas por meio do diagrama de olho.

Olho humano transmite um milhão de bits por segundo

O nervo óptico de um olho humano transmite cerca de um milhão de bits por segundo. Este é o cálculo que pesquisadores da Universidade de Pensilvânia e de Princeton publicaram na revista Current Biology. Para chegar ao número, eles partiram de experimentos medindo a quantidade de informação transmitida pela retina de porcos da Índia e, a partir disso, fizeram uma estimativa comparada à formação do olho humano.

O nervo óptico de um olho humano transmite aproximadamente um milhão de bits por segundo. Este é o cálculo que pesquisadores da Universidade de Pensilvânia e de Princeton publicaram na revista Current Biology, de julho deste ano. Para chegar a esse número, eles partiram de experimentos medindo a quantidade de informação transmitida pela retina de porcos da Índia e, a partir destes valores, fizeram uma estimativa comparada à formação do olho humano. O neurofisiologista brasileiro Cezar Saito relativiza o resultado, mas aponta as contribuições do estudo para essa área de pesquisa.

O grupo de pesquisadores norte-americanos verificou o fluxo de transmissão de informações analisando o comportamento das células ganglionares da retina de porcos da Índia, que visualizavam vários tipos de filmes em cenas naturais. O neurofisiologista Cezar Saito, da Universidade Federal do Pará, explica que as células ganglionares são neurônios que estão localizados na retina. No experimento, foi medida a taxa de informações para sete tipos de células ganglionares. A transferência de informação na retina dos porcos foi verificada pelos norte-americanos através de uma série de multieletródios, que permite o registro de vários neurônios simultaneamente.

Os pesquisadores verificaram que as taxas de transmissão de informações variaram de acordo com o tipo de célula, mas todos os tipos de células tiveram a mesma eficiência de codificação, ou seja transmitiram a mesma quantidade de informação. Isso acontece, segundo Saito, porque as células que transmitem informações com mais rapidez, o fazem por um período mais curto e produzem mais erros do que aquelas que disparam mais lentamente e por um período maior.

Então foi calculada a proporção de cada tipo de célula para o tamanho do campo receptivo, ou seja para a área do espaço que uma célula ganglionar está “olhando” em um dado momento e também para o fator de cobertura, que indica quantas células estão “olhando” para uma mesma área do espaço.

A conclusão foi de que aproximadamente 105 células ganglionares transmitem 875 mil bits por segundo. Com aproximadamente 106 células ganglionares, a retina humana transmite dados na freqüência aproximada de uma conexão de internet banda larga via DSL.

O uso de multieletródios nesse tipo de pesquisa já está se consolidando. “É uma técnica cujo uso vem se ampliando desde a última década”, afirma Saito. Segundo ele, essa ampliação se deve a três fatores: aos avanços na fabricação dos microeletródios e de hardwares para aquisição de sinais com múltiplos canais; ao desenvolvimento de softwares para a separação e reconhecimento dos potenciais de ação (ou impulsos nervosos) captados paralelamente nesses múltiplos canais; e, por último, ao uso de técnicas que aumentam a estabilidade e a duração do registro multiunitário (instrumento usado para entender as funções do sistema nervoso central).

“O emprego de multieletródios otimiza o experimento, já que um grande número de neurônios é registrado ao mesmo tempo, e também permite analisar como a resposta de um neurônio é influenciada pelas atividades dos neurônios adjacentes, um fenômeno comumente encontrado nos circuitos neurais, inclusive na retina”, diz o pesquisador da UFPA.

Saito destaca, entretanto, que e abordagem do trabalho publicado na Current Biology é válida até certo ponto, pois, segundo ele, as células ganglionares dos primatas não são qualitativamente e nem quantitativamente iguais às do porco da Índia e, portanto, não transmitiriam a mesma quantidade de informação. “Existem várias diferenças entre o sistema visual do porco da Índia e o do ser humano. Só para citar um exemplo, o porco da Índia enxerga um número menor de cores diferentes do que o homem”, explica. Saito afirma, ainda, que somente estudos usando retinas de primatas não-humanos ou mesmo humanos, replicando essa metodologia, poderiam fornecer um valor mais acurado da quantidade de informação conduzida pelo nervo óptico.

Os resultados mostraram o quanto é eficiente o processamento de dados no sistema nervoso, mas muitas perguntas ainda permanecem em aberto, como, por exemplo, por que certas imagens não “excitam” certos tipos de células. Saito diz que, de fato, os estudos fisiológicos corroboram a existência de ​_vários tipos de células ganglionares, algumas com propriedades bem específicas. “No sapo, por exemplo, há células que respondem vigorosamente somente na presença de um estímulo que simula uma mosca voando”, explica.

Por outro lado, o cálculo ainda é considerado útil, porque permite estimativas iniciais de parâmetros básicos, como poder e eficiência, além de revelar como a informação visual é distribuída entre os diferentes componentes neurais e fornecer um sentido de escala para se pensar no sistema visual como um todo. “Os estudos que caracterizam a codificação da informação visual nas células ganglionares possuem importantes aplicações práticas, pois projetamos que no futuro as próteses retinianas poderão substituir a retina natural e permitir que pessoas com deficiências visuais possam enxergar”, avalia Saito.

De acordo com o pesquisador brasileiro, quantificar o número de informações, a velocidade do envio desses sinais, a duração da resposta, e várias outras propriedades das células ganglionares, são informações imprescindíveis para o desenvolvimento de próteses que possam substituir de modo eficiente a retina.