Caramujo africano ameaça mais o equilíbrio ambiental do que a saúde pública

Por seu potencial transmissor de doenças, a atual proliferação do caramujo africano Achatina fulica no país tem sido considerada um problema de saúde pública. Mas, segundo o pesquisador Carlos Graeff Teixeira, da PUC do Rio Grande do Sul, a espécie introduzida no Brasil nos anos de 80 ameaça mais o equilíbrio ambiental que a saúde da população.

Se você encontrar alguns caramujos africanos em seu quintal, não precisa ficar alarmado. Esses moluscos podem estragar o seu jardim ou a sua horta, mas é pouco provável que coloquem em risco a sua saúde ou a da sua família. Segundo o médico e pesquisador dos laboratórios de Biologia Parasitária e de Parasitologia Molecular da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), Carlos Graeff Teixeira, o caramujo africano é uma tragédia do ponto de vista do desequilíbrio ambiental como animal exótico introduzido sem controle, mas não representa uma grande ameaça à saúde pública.

Essa constatação foi obtida na bancada de seu laboratório. Teixeira e seu grupo estudaram a susceptibilidade do caramujo africano (Achatina fulica) à infecção pelas larvas dos vermes Angiostrongylus costaricensis e cantonensis, espécies causadoras da angiostrongilíase meningoencefálica (tipo de meningite) e da angiostrongilíase abdominal (que compromete os órgãos abdominais). Os cientistas avaliaram também o potencial infectante do animal portador, isto é, sua habilidade de transmitir a infecção. “Estes moluscos foram expostos às larvas dos dois [vermes] e poucos deles apresentaram estabelecimento de infecção que permitisse a evolução das larvas de primeiro estágio, que saem nas fezes dos roedores, para larvas de terceiro estágio, que são infectantes para os vertebrados, incluindo o homem”, diz Teixeira. De 244 caramujos, somente um foi infectado.

Caramujo Africano
Caramujo ingerindo vegetal contaminado experimentalmente.
Foto cedida por Carlos Graeff Teixeira.

 

Ciente desses achados mesmo antes da sua publicação na revista Memórias do Instituto Oswaldo Cruz em 2007, o Ministério da Saúde divulgou, em nota, que o caramujo africano não representava risco significativo para a saúde pública, pelo baixo potencial de transmissão que apresentava. A nota recomendou, porém, o uso de luvas ou sacos plásticos na captura dos caramujos.

E embora o risco de contaminação não seja nulo, ainda não foram registrados casos de angiostrongilíase decorrentes do contato com o caramujo africano no Brasil. Teixeira explica que os principais hospedeiros moluscos do Angiostrongylus costaricensis, por exemplo, são as lesmas, especialmente as dos gêneros Phylocaulis e Sarasinula. O médico conta que em Cariacica, Espírito Santo, dois indivíduos apresentaram meningite eosinofílica no ano passado. “Estas duas pessoas estavam embriagadas e relatam terem dividido ao meio uma lesma e cada um ingeriu uma metade, numa espécie de ’desafio’”, conta o pesquisador. Os exames de sorologia de ambos foi positivo para o gênero Angiostrongylus, o mesmo encontrado em lesmas do gênero Sarasinula, que estavam no local. Tais achados foram também publicados na revista Memórias do Instituto Oswaldo Cruz.

Mas o problema é que esse caramujo gigante terrestre – que carrega consigo uma concha marrom escura com listras esbranquiçadas, no formato de um cone – é uma praga agrícola, que pode destruir hortas, jardins e plantações de subsistência. O voraz Achatina fulica devora tudo que encontra pela frente, pois se alimenta de cerca de 500 tipos de plantas. Consome desde papel até tinta de parede.

Achatina fulica foi trazido da África para o Brasil nos anos 80 por criadores de escargot para fins comerciais. Quando descobriram que a espécie era imprópria para o consumo humano, os caramujos foram libertados no ambiente. Sem predadores naturais no país, esses animais, que são hermafroditas, encontraram aqui o lugar perfeito para uma ampla e descontrolada proliferação.