Brasil não permite patenteamento de células-tronco

Na maioria dos países do mundo, inclusive no Brasil, o patenteamento de células-tronco é proibido. A Lei de Propriedade Industrial proíbe a concessão de patentes para seres vivos, no todo ou em parte, com exceção dos microrganismos transgênicos que atendam aos requisitos de patenteabilidade que não sejam mera descoberta.

Na maioria dos países do mundo, inclusive no Brasil, o patenteamento de células-tronco é proibido. A Lei de Propriedade Industrial (Lei n.º 9.279/96), em vigor desde14/05/97, proíbe a concessão de patentes para seres vivos, no todo ou em parte, com exceção dos microrganismos transgênicos que atendam aos requisitos de patenteabilidade que não sejam mera descoberta. Na verdade, a patente tem que ser concedida em cima de invenções e não de descobertas ou de conhecimento. Assim, o material modificado em laboratório ganha natureza de “invenção e pode ser patenteado. A simples produção de células-tronco não pode ser protegida por patente, a menos que se agreguem conhecimentos para torná-las tecnicamente úteis e comercialmente aplicáveis.

De acordo com o doutor Nivaldo dos Santos, professor da Universidade Católica de Goiás e da Universidade Federal de Goiás e coordenador do Núcleo de Patentes e Transferência de Tecnologia do estado de Goiás, “ nos termos da Lei n.º 9.279/96, são patenteáveis as invenções que atendam aos requisitos da novidade, atividade inventiva e aplicação industrial.” Para ele, “dentro do ordenamento jurídico brasileiro não há possibilidade de apropriação patenteária ao que diz respeito às células-tronco. Muito embora haja inúmeros pedidos de depósitos de patentes no INPI (Instituto nacional de Propriedade Industrial) nessa área, a lei proíbe tal concessão”.

As empresas de biotecnologia, após modificarem o material encontrado, buscam proteção para seus investimentos junto às patentes. “A patente em si é o modo de proteção que o inventor possui”, diz Santos. Entretanto, o patenteamento de produtos da biotecnologia pode fazer com que os pesquisadores se tornem menos receptivos em compartilhar material e informação. De acordo com Santos, “é natural que ocorra essa falta de receptividade, os investimentos são altos e, normalmente, quando os resultados já podem ser vistos, os investidores desejam logo o que foi investido e os lucros”.

Ludmilla Evelin, pesquisadora do Núcleo de Patentes e Transferência de Tecnologia de Goiás e da Rede Estadual de Propriedade Intelectual e Gestão da Inovação, defende o patenteamento das células-tronco, contudo antes de defender esse lado tão problemático e detentor de diversos debates éticos, apoia um instrumento jurídico capaz de tutelar a pesquisa em todos os seus aspectos, e mais que as pesquisas, o direito à vida. “O desenvolvimento do Brasil deve ser o primeiro objetivo quando esse assunto for discutido. As pesquisas devem acontecer e o patenteamento também, desde que esse conhecimento colabore para a melhoria da qualidade de vida de nossa sociedade e abra maiores oportunidades de concorrência com os demais países”, defende.

Europa

Na Europa são permitidas as patentes de microorganismos como bactérias e vírus até linhagens celulares e elementos isolados do corpo humano, como seqüências de material genético, mas o patenteamento do corpo humano como um todo ou de suas partes, nos vários estágios de sua constituição e de seu desenvolvimento, bem como a simples descoberta de um de seus elementos não podem constituir invenções patenteáveis. As células-tronco, como são parte do corpo humano, não podem ser objeto de direitos de propriedade industrial, bem como qualquer procedimento que inclua este tipo de célula ou outras obtidas a partir delas.

De acordo com Santos, “na Europa, sobretudo na França, o debate bioético tem enfatizado a censura à comercialização do corpo humano. Em 1987, o Comité Consultatif National d’Etique francês emitiu um aviso sobre o uso de células humanas, manifestando posição contrária à sua comercialização. Essa posição foi recentemente confirmada em outro parecer sobre patenteamento das seqüências de DNA identificadas no âmbito do Projeto Genoma Humano. Por outro lado, a Comissão Européia, defendendo a adoção de um instrumento mais abrangente de proteção patenteária, dá relevo à importância da indústria biotecnológica na área médica e considera a ameaça à indústria européia representada pela concorrência de empresas norte-americanas e japonesas.”

Estados Unidos

Os EUA são a única nação que emitiu patentes sobre células-tronco embrionárias humanas, tanto para o método de extração como para as próprias células-tronco. A Suprema Corte declarou, em meados da década de 80, que um microorganismo vivo feito pelo homem é matéria patenteável como manufatura e composição de matéria, relata Santos.

Em 1998, a equipe do biólogo James Thomson, na Universidade de Wisconsin, isolou as primeiras células-tronco de embriões humanos e a patente dessas células foi parar nas mãos da Fundação de Pesquisa Wisconsin Alumni (Warf), ligada à universidade. A Warf licenciou então a patente para a Corporação Geron, companhia californiana que pagou por grande parte da pesquisa de Wisconsin e que possui direitos exclusivos de comercialização no país para três tipos de células derivadas de células-tronco embrionárias, tidas como as mais promissoras em termos clínicos.

Entretanto, muitos pesquisadores americanos temem que as restrições da Warf possam atrasar o desenvolvimento da pesquisa com células-tronco no país. Com o controle de uma patente como esta, a Warf e a Geron poderiam bloquear o caminho da pesquisa com células-tronco, tanto pelo controle de taxas para os pesquisadores usarem as células patenteadas como pela proibição de seu uso. Então, em setembro de 2001, a Wisconsin permitiu que cientistas de outras universidades conduzissem suas próprias pesquisas baseadas nessas patentes.