Pesquisadores defendem a aplicação de novos recursos para ensino de anatomia

O uso de softwares com imagenologia, que permitem o estudo de imagens de estruturas, órgãos e sistemas com o objetivo de identificar patologias, e de peças plastinadas como novos recursos didáticos foram o alvo de discussões no XXVI Congresso Chileno e no VII Congresso de Anatomia do Cone Sul. Os eventos aconteceram simultaneamente na Faculdade de Medicina da Universidade do Chile, em Santiago, durante os dias 12 a 15 de outubro.

O uso de softwares com imagenologia, que permitem o estudo de imagens de estruturas, órgãos e sistemas com o objetivo de identificar patologias, e de peças plastinadas como novos recursos didáticos foram o alvo de discussões no XXVI Congresso Chileno e no VII Congresso de Anatomia do Cone Sul. Os eventos aconteceram simultaneamente na Faculdade de Medicina da Universidade do Chile, em Santiago, durante os dias 12 a 15 de outubro.

Dos 235 trabalhos, na forma de painéis e exposições orais, 30 abordavam métodos alternativos para o ensino de Ciências, todos defendendo a utilização desses recursos principalmente para aulas de anatomia em cursos de graduação da área de Saúde. Esses artifícios têm duas vantagens. A primeira é tornar as aulas mais atraentes para os alunos, auxiliando a aprendizagem. E a segunda está na substituição das peças anatômicas, com odor indesejável e tóxico de formol, por peças que transmitem imagens próximas a realidade dos órgãos e tecidos humanos.

Por meio da técnica de plastinação, as substâncias orgânicas de corpos mortos são substituídas por materiais plásticos (silicone, resina de epóxi e poliéster) para que os tecidos e órgãos permaneçam maleáveis, inodoros e secos. Esse método foi desenvolvido pelo anatomista alemão Gunther von Hagens, em 1977, possibilitando o estudo macroscópico de cadáveres sem os incômodos odores ou as mudanças de tonalidade produzidas nos tecidos normalmente pelas substâncias químicas de conservação tradicionais.

Von Hagens criou polêmica em 1995 quando transformou seus corpos plastinados em esculturas de arte no Japão, exibindo-os ao público sob o título de “Mundo dos corpos” (Körperwelten, em alemão) Na Europa, sua exposição já atraiu milhões de visitantes. Atualmente, as universidades brasileiras e chilenas utilizam peças cadavéricas fixadas em formol por um longo período de tempo. O problema é que essas peças deterioram naturalmente com o passar dos anos, fazendo com que os tecidos e órgãos percam suas características. Além disso, existe a dificuldade de se conseguir a doação de cadáveres para o estudo em aulas e para a realização de pesquisas.

A restrição do uso de animais em aulas práticas

A pesquisadora Ana Lúcia Duarte, da Universidade Lusíadas em Santos, litoral de São Paulo, apresentou alguns dos seus resultados sobre o uso de animais e métodos alternativos no ensino médico durante o congresso. Duarte aplicou um questionário para 124 alunos de Medicina de diferentes estágios do curso, avaliando o comportamento desses alunos em relação às aulas práticas de vivissecção com animais. Cerca de 72,5% dos alunos do sexo masculino mostraram-se favoráveis ao uso de animais em aulas práticas, enquanto 42% das alunas são favoráveis a aplicação de métodos alternativos em substituição a vivissecção.

Segundo a pesquisadora, “métodos alternativos são benéficos porque reduzem o número de animais empregados em aulas práticas, estimulando o conceito de ética na experimentação animal nos alunos de graduação. Porém, muitos médicos cirurgiões são contra esses métodos, pois acreditam que o aluno necessita de treinamento para realizar a dissecção, que só pode ser adquirido por meio das aulas práticas de vivissecção.” Os dados completos dessa pesquisa deverão ser publicados futuramente em revista brasileira de ensino de ciências.


Cadáver plastinado
Cadáver submetido a técnica de plastinação exibido no no XXVI Congresso Chileno/VII Congresso de Anatomia do Cone Sul.

Peça cadavérica plastinada
Membro inferior humano plastinado exibido no XXVI Congresso Chileno/VII Congresso de Anatomia do Cone Sul.

Unidades de conservação são criadas em Santa Catarina; Paraná ainda aguarda

Duas unidades de conservação em Santa Catarina foram criadas no último dia 20 por meio de decretos do governo federal. Entre os ecossistemas abrangidos pelas unidades, destacam-se matas com araucárias e campos naturais a elas associados. Outras cinco unidades de conservação que contemplam tais ecossistemas estão previstas para o Paraná, porém liminares na Justiça estão impedindo sua criação.

Duas unidades de conservação em Santa Catarina foram criadas no último dia 20 por meio de decretos do governo federal. Entre os ecossistemas abrangidos pelas unidades, destacam-se matas com araucárias e campos naturais a elas associados. Outras cinco unidades de conservação que contemplam tais ecossistemas estão previstas para o Paraná, porém liminares na Justiça estão impedindo sua criação.

A criação das duas unidades em Santa Catarina, no entanto, não garante a implantação efetiva delas, já que agora o Ministério do Meio Ambiente (MMA) tem que disponibilizar recursos humanos e financeiros para gestão das áreas. “A alocação de recursos é sempre um problema”, admite Maurício Mercadante, diretor do Programa Nacional de Áreas Protegidas do MMA. De acordo com ele, a verba disponível até o momento é de R$21 milhões, que será utilizada para a regularização fundiária das áreas abarcadas pelas unidades.

Tanto as unidades criadas em Santa Catarina como as previstas para o Paraná são resultado de um processo iniciado em 2002, quando foram definidas áreas prioritárias para conservação nos dois estados. Após a conclusão dos estudos de um grupo de trabalho coordenado pelo MMA, que determinou quais dessas áreas eram adequadas para serem transformadas em unidades de conservação e quais deveriam ser seus limites, as propostas foram apresentadas em audiências públicas para discussão. No caso das recém-criadas unidades de Santa Catarina – o Parque Nacional das Araucárias e a Estação Ecológica da Mata Preta – suas áreas finais (12.841 e 6.563 hectares, respectivamente) correspondem a 84% do que havia sido proposto inicialmente pelo MMA.

Ao longo do processo, grupos contrários à criação das unidades têm usado diferentes estratégias para tentar impedir sua implementação. “Há um lobby bastante grande liderado por setores ligados a madeireiros, grupos que historicamente têm destruído as florestas com araucárias”, explica Miriam Prochnow, coordenadora-geral da Rede de Organizações Não-Governamentais da Mata Atlântica (RMA). No Paraná, proprietários de terras que deverão ser desapropriadas entraram com ações na Justiça que barram a criação das unidades. Segundo Mercadante, o MMA está contestando as ações. “Assim que as liminares do Paraná forem derrubadas, faremos o encaminhamento à Presidência dos decretos para criação das unidades de conservação daquele estado”, afirmou. Outras ações na Justiça já haviam sido usadas para impedir a realização de algumas audiências públicas programadas durante a fase de consulta popular.

Mas vias não-legais também foram utilizadas pelos opositores, aponta a coordenadora da RMA. De acordo com ela, derrubadas de mata para plantio de reflorestamento e queimadas foram feitas em algumas áreas para descaracterizar o patrimônio natural e, assim, tentar evitar que as unidades de conservação fossem criadas. O representante do ministério, no entanto, assegura que tais ações não vão alterar os objetivos do órgão. “A descaracterização das áreas não afetará a criação das unidades”, garante Mercadante.

Além das denúncias contra as ações de destruição dos remanescentes de matas com araucárias, os ambientalistas têm se mobilizado para pressionar o governo para criação das unidades. A RMA está liderando uma campanha pela internet para que as pessoas enviem mensagens à ministra Marina Silva (Meio Ambiente) manifestando apoio à criação das unidades. Em um mês de campanha, quase quatro mil pessoas enviaram suas manifestações, segundo a RMA.

Patrimônio ameaçado

Além da histórica extração por madeireiras da araucária (Araucaria angustifolia, também conhecida por pinheiro-do-paraná ou pinheiro-brasileiro) e outras árvores de interesse comercial, o reflorestamento de Pinus e a agricultura (com destaque para a soja) são as principais atividades econômicas que atualmente ameaçam a preservação dos remanescentes de matas com araucárias. Estima-se que estes remanescentes representem apenas 3% da cobertura original das matas com araucárias, que são consideradas como parte do bioma Mata Atlântica e cuja área de ocorrência natural são os planaltos do sul e sudeste brasileiros.

Outro ecossistema associado às matas com araucárias que se encontra bastante degradado e que está contemplado por algumas das unidades de conservação de Santa Catarina e Paraná é o de campos naturais, formações vegetais sobre solos rasos e frágeis em que predominam gramíneas e leguminosas rasteiras. “A destruição dos campos acaba sendo maior do que a das araucárias porque a população não sente isso como uma perda muito importante”, destaca o geógrafo Lindon Fonseca, do Instituto de Geociências da Unicamp.

Fonseca coordenou dois projetos de caracterização e gestão do patrimônio natural dos Campos Gerais, desenvolvidos pela Universidade Estadual de Ponta Grossa (PR), instituição da qual o geógrafo fazia parte à época da realização do projeto (abril de 2001 a dezembro de 2003). Situada no 2º Planalto do Paraná (região leste do estado), os Campos Gerais apresentam importantes fragmentos de campos naturais e matas com araucárias. Como proposta final dos projetos coordenados por Fonseca, foram apontadas três áreas de interesse imediato à conservação, as quais ainda apresentam áreas de campos e araucárias, que preservam suas características naturais, bem como possuem sítios naturais e arqueológicos de interesse turístico e de preservação do patrimônio.

O geógrafo, no entanto, lamenta que grande parte destas áreas não tenha sido contemplada pelas unidades de conservação propostas pelo MMA para a região dos Campos Gerais. “Muitas áreas importantes foram deixadas de fora e outras menos importantes foram incluídas sem que ficassem muito claros quais os critérios utilizados para delimitar as unidades de conservação”, critica Fonseca.

Leia mais na ComCiência:

– Perspectivas da recuperação e do manejo sustentável das florestas de araucária

Acidente Vascular Cerebral compromete aprendizado das crianças

Ao contrário do que estava registrado nos livros médicos, o Acidente Vascular Cerebral (AVC) compromete funções cerebrais e afeta o desenvolvimento cognitivo das crianças. É o que vêm constatando um grupo de pesquisadores da Unicamp, que desde a década de 1990 estuda o AVC infantil, doença comumente diagnosticada em adultos, mas ainda pouco conhecida em crianças.

Ao contrário do que estava registrado nos livros médicos, o Acidente Vascular Cerebral (AVC) compromete funções cerebrais e afeta o desenvolvimento cognitivo das crianças. É o que vêm constatando um grupo de pesquisadores da Unicamp, que desde a década de 1990 estuda o AVC infantil, doença comumente diagnosticada em adultos, mas ainda pouco conhecida em crianças.

“Em geral, a idéia passada pela literatura era de que o AVC na infância teria bom prognóstico, porque, exceto pela hemiplegia (paralisia parcial do corpo), aparentemente a criança não apresentava qualquer outro comprometimento. Na verdade, como a seqüela cognitiva não é tão visível como a motora, não se dava muita importância para esse aspecto” comenta a pedagoga e pesquisadora do grupo, Sônia das Dores Rodrigues. Ainda existem poucos estudos sobre o desenvolvimento cognitivo da criança após o AVC e, conforme conta a pesquisadora, as seqüelas da doença na infância não são tão conhecidas como nos adultos. “À medida que novos estudos estão sendo realizados sobre este tema, mais detalhes são acrescentados”, completa.

Rodrigues, juntamente com neurologistas, fisioterapeutas e psicólogos, realiza testes em crianças com diagnóstico confirmado de AVC, desde a fase aguda da doença, para conhecer os prejuízos nas funções cognitivas. No ano passado, a pedagoga publicou nos Arquivos de Neuro-Psiquiatria uma pesquisa demonstrando que o desempenho cognitivo desses pacientes nos testes aplicados foi significativamente inferior ao das crianças da mesma idade que nunca tiveram a doença.

Em outro artigo, que está sendo analisado para publicação na mesma revista, a psicóloga Inês Elcione, faz uma descrição mais detalhada dos déficits neuropsicológicos do acidente vascular nas crianças. Os resultados foram obtidos por meio de exames e teste aplicados em crianças que tiveram o AVC e um grupo da mesma faixa etária e escolar que não tiveram a doença (que os pesquisadores chamam de grupo controle). Entre as seqüelas, o estudo observou rebaixamento intelectual, dificuldades lingüísticas, viso-motoras, de organização e de integração espacial. Os pacientes estudados também apresentaram significativa diferença de desempenho da habilidade tátil, de leitura e de memória. “Em todos os exames, as crianças que tiveram AVC apresentaram resultados inferiores aos do grupo controle. Nos casos de reincidência do acidente vascular, verificamos resultados muito mais baixos, compatíveis com uma deficiência mental”, aponta a psicóloga. O desenvolvimento cognitivo dos pacientes antes da doença também foi levantado, em entrevistas com pais e professores. Segundo Elcione, em todos os pacientes pesquisados o desenvolvimento cognitivo estava normal até o AVC.

Essas seqüelas, no entanto, podem ser amenizadas se a criança receber acompanhamento adequado. A pedagoga Sônia Rodrigues ressalta que é importante conhecer as novas dificuldades da criança para planejar o melhor método de recuperação do desenvolvimento cognitivo. “Quanto antes o diagnóstico do comprometimento das funções cerebrais for realizado, maior é a chance de otimizar o desenvolvimento das funções cognitivas. Para isso existem métodos pedagógicos de intervenção bastante eficientes”.

Estudos no Brasil começaram na década de 90 Até hoje, o conhecimento sobre o AVC infantil é pouco difundido. No Brasil, as pesquisas sobre a doença tiveram início na década de 1990, incentivadas pela neurologista Maria Valeriana Leme Moura Ribeiro, criadora do grupo de estudos sobre AVC infantil do Departamento de Neurologia da Unicamp.“Na época, ninguém acreditava no AVC em crianças. Os exames de tomografia de crânio e ultra-som foram instalados no Brasil na década de 1990. Até 1992 o diagnóstico do acidente vascular cerebral era exclusivamente clínico, isto é, sem exames específicos. Na Unicamp, os aparelhos chegaram em 1993. Com a documentação em imagens, conseguimos comprovar o diagnóstico de AVC em crianças. Nós fomos os primeiros no Brasil”, lembra a médica.

O Acidente Vascular Cerebral resulta de uma deficiência na irrigação sangüínea do cérebro. Existem dois tipos de AVC: o isquêmico e o hemorrágico. O AVC isquêmico ocorre pela obstrução de uma das artérias do cérebro, que provoca a lesão do tecido cerebral que ficou sem o aporte sangüíneo adequado. Já o AVC hemorrágico ocorre por sangramento de uma das artérias do cérebro e parece apresentar menor número de seqüelas, mas a mortalidade é maior. O isquêmico, ao contrário, apresenta várias seqüelas, mas as chances de sobrevida são grandes.

Menos freqüente que nos adultos, cujas estatísticas mundiais são de 5 a 8 casos em mil habitantes por ano, o AVC afeta cerca de 15 crianças em cada 100 mil hab/ano, “de acordo com estatísticas realizadas em países ricos”, ressalta Ribeiro. No Brasil ainda não existem dados estatísticos, mas estima-se algo em torno de 18 por 100 mil hab/ano. A neurologista conta que no berçário de alto risco do Caism (Centro de Atenção Integral à Saúde da Mulher), na Unicamp, foram identificados 25 casos de AVC em recém nascidos a cada 10 mil nascimentos, “mais ou menos, oito casos por ano”.

Os sintomas do AVC nas crianças são semelhantes aos dos adultos. “De repente, a criança apresenta hemiplegia. Às vezes, a paralisia é precedida de convulsões”, descreve a neurologista. O AVC em crianças tem um diferencial em relação aos adultos: neles, as causas são relacionadas a pressão alta, diabetes, tabagismo ou à utilização de drogas. Nas crianças são muitas as causas: doenças no sangue, disfunções no sistema imunológico, infecções. “Ainda estamos rastreando outras causas. Mais ou menos 25% das crianças ficam sem a definição da causa básica”, comenta.

Além do comprometimento motor, de linguagem e de aprendizado geral a equipe começa a pesquisar as alterações no comportamento das crianças. Segundo a médica, os pesquisadores observaram que, após a doença, algumas crianças podem ficar mais passivas ou mais agitadas.