P&D de fármacos é centralizada em países desenvolvidos

Um estudo apresentado ao Instituto de Geociências da Unicamp, no início deste mês, discute a centralização de pesquisa e desenvolvimento (P&D) de fármacos nos países desenvolvidos. De um total de 93 laboratórios de P&D, pertencentes as oito maiores empresas farmacêuticas do mundo, 46 deles estão na Europa, 28 nos Eua e 13 no Japão. Esse levantamento faz parte da dissertação de mestrado de Vanderléia Radaelli.

De um total de 93 laboratórios de pesquisa e desenvolvimento (P&D) pertencentes as oito maiores empresas farmacêuticas do mundo – Pfizer, GlaxoSmithKline, Novartis, Roche, Merck, Abbott Laboratories, Aventis e Eli Lilly – 63% estão localizados nos Estados Unidos, Europa e Japão (ver mapa abaixo). Desses, 46 estão na Europa, 28 nos EUA e 13 no Japão. Essa concentração da P&D de fármacos é o tema da dissertação de mestrado de Vanderléia Radaelli, apresentada ao Instituto de Geociências no início deste mês. O título do trabalho é “A inovação na indústria farmacêutica: forças centrípetas e forças centrífugas no processo de internacionalização”. Para realizar a pesquisa, Radaelli analisou os relatórios anuais das oito maiores empresas de fármacos do mundo, e acompanhou as notícias veiculadas pela mídia sobre o assunto.

 

A pesquisadora explica que para compreender o mercado e a distribuição da P&D em fármacos é preciso saber que todos os grandes laboratórios têm origem na Europa e Estados Unidos. A presença forte dessas empresas em seus locais de origem demonstra que para conquistarem o desejado sucesso no mercado internacional, as empresas precisam ser competitivas em seus mercados de origem, aponta Radaelli. Das empresas investigadas Pfizer, Abbott Laboratories, Eli Lilly e Merck são norte-americanas; GlaxoSmithKline é britânica; Novartis e Roche são suíças e o Aventis é formada com capital francês e alemão.

Outro aspecto que justifica essa concentração dos laboratórios de P&D em fármacos está no tamanho e distribuição do mercado consumidor. Em 2004, o faturamento do mercado farmacêutico mundial (vendas em drogarias e farmácias) foi estimado em US$ 518 bilhões, sendo que 88% das vendas centram-se nos EUA, Europa e Japão. Desses três, só os EUA responde por 45% do total das vendas, sendo o principal mercado de fármacos responsável pela circulação de US$ 233 bilhões. Em sua pesquisa, Radaelli constatou que os laboratórios gastam entre 11 e 20% do faturamento em P&D ao ano.

Mas por que no Japão existem 13 laboratórios de P&D em fármacos, se nenhum laboratório tem origem japonesa? De acordo com Radaelli dois motivos esclarecem essa questão: infra-estrutura e potencial científico. Oferecendo pessoal qualificado e boas condições para a instalação desses centros, o Japão conquistou a atenção e os investimentos das empresas de fármacos. Dos 13 laboratórios de pesquisa instalados nesse país a maioria deles está voltado para as pesquisas oncológicas e neurodegenerativas.

O aspecto temporal para uma indústria que vive de inovações, como a indústria farmacêutica, é muito importante, ressalta a pesquisadora. Entre pesquisas, testes e licenciamento um remédio levava em média 25 anos para ser comercializado. Para tentar encurtar esse período os laboratórios de fármacos estão firmando, atualmente, parcerias com outras empresas ou instituições de pesquisa. “A idéia é maximizar a capacidade de um medicamento chegar mais rapidamente ao mercado, economizar tempo para ter mais rendimentos com o produto”, sintetiza. Dessa forma, os laboratórios preferem investir nos países aonde possam ser firmadas parcerias.

A regulamentação da proteção para invenções da indústria de fármacos é outro ponto a favor da centralização das pesquisas. “Os laboratórios preferem investir em países onde as regras de patenteamento já estejam definidas”, ressalta ela. Segundo Radaelli, o medicamento tem em média 12 anos de proteção por patente, a qual é solicitada bem antes do produto ser comercializado. O patenteamento é feito, em geral, quando os testes pré-clínicos estão sendo realizados, o que disponibiliza pouco tempo de proteção efetiva para o medicamento.

Testes clínicos e produção é descentralizada

Irlanda, Índia e China são os alvos atuais da descentralização dos laboratórios. Radaelli destaca, porém, que as empresas de fármacos estão realizando nesses três países testes clínicos e produção de medicamentos. Ela afirma que “atividades mais nobres de pesquisa” ainda não foram transferidas para esses países e, não serão tão cedo.

Na corrida para antecipar o lançamento de novos produtos, os laboratórios têm dificuldade de encontrar voluntários para os testes clínicos nos países desenvolvidos. Sem examinar na pesquisa as razões para essa “disponibilidade em colaborar” com as empresas de fármacos, Radaelli explica que “a população auxilia os laboratórios a economizarem tempo, e conseguirem antecipar o lançamento de produtos, usufruindo mais da exclusividade da patente”.

A pesquisadora esclarece que Índia, China e Irlanda têm mão-de-obra barata, abundante e qualificada, além de uma série de políticas de atração como incentivos fiscais e isenção de taxas para produtos ofertados às empresas de fármacos. Ela destaca ainda que cada país tem vantagens específicas. Produzir na Irlanda significa ter acesso fácil ao mercado consumidor europeu a baixos custos. A Índia tem experiência na produção de medicamentos e pessoal com domínio da língua inglesa. Por sua vez, a China, oferece infra-estrutura como energia elétrica a preços baixos e poucos encargos trabalhistas, além de ter um mercado consumidor gigantesco.

Gestão do conhecimento nas organizações ainda tem falhas

A gestão do conhecimento revela-se uma prática extremamente valiosa e nada trivial. “Sua complexidade reside na contradição de gerir ou controlar um processo que, por natureza, precisa de liberdade para existir, sob o risco de perder sua dimensão criativa”, afirmou Gilson Schwartz, professor de Economia da Informação da USP em evento promovido pelo Centro de Pesquisas Renato Archer.

O grande dilema dos detentores de conhecimento é decidir entre compartilhar e proteger o que sabem. Enquanto o compartilhamento é capaz de gerar uma rede sinérgica de soluções, a proteção evita a apropriação e o uso indiscriminado do conhecimento por concorrentes. Nesse contexto, a gestão do conhecimento revela-se uma prática extremamente valiosa e nada trivial. “Sua complexidade reside na contradição de gerir ou controlar um processo que, por natureza, precisa de liberdade para existir, sob o risco de perder sua dimensão criativa”, afirmou Gilson Schwartz, professor de Economia da Informação da USP, no evento “Manhãs de Inovação”, promovido pelo Centro de Pesquisas Renato Archer (CenPRA) no último dia 27.

Schwartz fez uma retrospectiva do processo de discussão da política industrial no Brasil e da reconfiguração do Sistema Nacional de Inovação estabelecida desde o final do governo de Fernando Henrique Cardoso, destacando a enorme quantidade de editais atualmente encaminhados para a solicitação de recursos governamentais para projetos relacionados à Ciência, Tecnologia e Inovação. “Foi uma grande conquista”, diz Schwartz, “mas a cultura das organizações, sejam privadas ou públicas, ainda é bastante contraditória e falha em muitos aspectos”.

Essa contradição aparece, por exemplo, no sistema de apresentação de propostas da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), órgão ligado ao Ministério de Ciência e Tecnologia (MCT). O sistema exige a obtenção dos formulários por meio de computadores que operam com Windows, apesar da opção do governo Lula pelo uso de softwares livres desde 2003. Assim, os projetos elaborados pela equipe do professor, que optou pelo uso de softwares livres, precisam utilizar o sistema operacional proprietário Windows para terem acesso ao Formulário de Apresentação de Propostas (FAP) da Finep.

Para a criação da Cidade do Conhecimento – um programa da USP que promove a criação, a incubação e o desenvolvimento de projetos por meio de redes digitais colaborativas – Schwartz teve de enfrentar a burocracia que, segundo ele, acaba sendo um grande entrave à realização de projetos. “Os projetos existem, mas, enquanto o sistema cobra produtividade dos pesquisadores, a estrutura tolhe essa produtividade”, lamenta. A plataforma de currículos Lattes, bastante utilizada pelos pesquisadores do país, também apresenta deficiências que desestimulam os profissionais. A produção dos músicos, de acordo com o especialista, é muito mal avaliada: “trabalhos de meses são tomados como produções pontuais pelo sistema, o que não é justo”.

No mesmo evento, foram também apresentados dois casos de sucesso em gestão do conhecimento: o caso da empresa química Buckman, apresentado pelo gerente da divisão de Especialidades Laerte Carvalho, e o caso do Centro de Tecnologia Canavieira, exposto por Rogerio Salles Loureiro. Ambos salientaram que o conhecimento deve ser visto como um ativo valioso dentro da nova economia e que suas instituições utilizam a gestão do conhecimento para acelerar o alcance de suas metas e objetivos estratégicos. Apenas as tecnologias da informação não são suficientes para garantir o diferencial competitivo pretendido pelas empresas, que passam a dar mais atenção à ’economia do conhecimento’ e aos espaços necessários para efetivar as trocas econômicas e sociais como forma de gerar melhores oportunidades de negócios inovadores. “A gestão do conhecimento abrange práticas que visam evitar a multiplicação inútil de esforços e promover o compartilhamento do conhecimento dentro da empresa”, diz Loureiro. “Mas cada insituição tem suas especificidades e para cada tipo de problema há um tipo de solução”, completa.

Mais difícil do que implantar a gestão do conhecimento nas organizações é pensar sua responsabilidade social estratégica, questão que foi entendida pelos palestrantes como fundamental. “Não adianta uma empresa ter excelência na gestão do conhecimento e achar que isso basta. O contexto social desfavorável imporá limites à sua expansão e por isso deve ser preocupação de todos”, lembra Schwartz.

Mestrado profissionalizante divide docentes, mas é tendência nacional

O número de mestrados profissionalizantes oferecidos pelas universidades públicas cresce a cada dia no país. Porém, nem todos os docentes são a favor dessa iniciativa, que deve ser ampliada no Brasil.

A Universidade Federal de Viçosa (UFV) está com inscrições abertas até 15 de maio para seu primeiro mestrado profissionalizante em zootecnia. Os responsáveis pela criação do novo curso buscam estabelecer parcerias com o setor produtivo, adaptando o conhecimento científico às necessidades do mercado. Apesar deste tipo de pós-graduação estar em uso há quase dez anos no país, nem todos apóiam a iniciativa. “O que há por trás do ensino superior profissionalizante é a mercantilização do ensino e a complementação salarial dos docentes envolvidos, com a quebra da dedicação exclusiva.” acredita Aloízio Soares, professor do departamento de zootecnia da UFV.

No caso do curso da universidade mineira, o receio do pesquisador está relacionado à participação de quinze professores que também lecionam nos cursos de graduação e pós-graduação. Segundo Soares, eles ficarão sobrecarregados com as atividades da nova modalidade. Mas Sebastião Campos Valadares Filho, coordenador da pós-graduação na UFV, justifica que “se um docente der aula uma vez por semana, em um ano, não prejudicará suas atividades, já que as aulas presenciais ocorrerão em módulos, a cada dois meses”.

Outro temor dos que são contrários ao mestrado profissionalizante oferecido nas instituições públicas está no processo seletivo dos alunos, vinculado a empresas financiadoras dos cursos e que acabam tendo suas atividades desenvolvidas com infra-estrutura das universidades públicas mas diretamente voltados para os interesses privados. “A seleção é feita através das empresas que podem pagar para seus funcionários cursarem o mestrado profissional e não por méritos acadêmicos, e ao final se formam empregados, não pesquisadores preocupados com a ciência”. lamenta Soares.

Ao final desse tipo de mestrado, os alunos recebem diploma e podem atuar, inclusive, como docente de universidades, apesar deste não ser o objetivo inicial do programa. A possibilidade gera mal estar na academia, uma vez que o curso não capacita para a atividade de pesquisa científica.

Vantagens e diferenças

Quando se iniciou a pós-graduação no Brasil, a idéia era desenvolver cursos de mestrado que atendessem tanto a academia como o mercado. Depois veio a especialização lato sensu, também com fins mercadológicos, a exemplo de modelos desenvolvidos em países como os Estados Unidos, que também exportaram o Master in Business Administration (MBA), que originalmente é um mestrado profissionalizante.

Apesar de similares na duração e nos objetivos, a principal diferença entre um mestrado profissionalizante e a especialização está na avaliação pela a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Ensino Superior (Capes), órgão pertencente ao Ministério da Educação (MEC). Ela informa o nível do mestrado, de acordo com critérios próprios. Isto, ao menos em tese, garante cursos de melhor qualidade. Apesar de ter os mesmos objetivos, a especialização lato sensu não é avaliada pelo MEC. Portanto, nem a Capes, nem o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP) sabem estimar a quantidade de cursos oferecidos no país.

Tendência nacional

Atualmente, dos mais de 3.400 cursos de pós-graduação recomendados pela Capes, 2.067 são de mestrado acadêmico, 1.182 de doutorado e 175 mestrados profissionalizantes. Esta última modalidade envolve mais de 5 mil alunos e a expectativa do órgão é que, em cinco anos, esta participação cresça dos atuais 8% para 25%.

De acordo com Jorge Guimarães, presidente da Capes, as empresas que contratam profissionais com essa formação com certeza elevam sua eficiência e produtividade. “Com os mestrados profissionais a Capes contribui para o crescimento econômico brasileiro e abastece melhor o setor social, a administração pública e o setor privado com recursos humanos de alto nível.” diz.

Em 2005, o órgão recebeu 159 projetos de novos cursos de mestrado profissional. As áreas mais procuradas foram administração, odontologia, engenharias e saúde coletiva, área na qual o órgão pretende formar 6 mil profissionais.

Mesmo com resistência de parte dos docentes, a Capes quer incentivar até o doutorado profissional, em áreas como contabilidade, cirurgia, odontologia e administração. “Por que não, já que tais profissionais vão atuar num mercado tipicamente não acadêmico?” finaliza Guimarães. Resta saber se o curso não será apenas mais uma novidade do mercado educacional.