Informatização deve agilizar registro de marcas e patentes no INPI

Atualmente registrar uma marca ou patentear uma invenção pode levar de 5 a 10 anos. Mas a digitalização do INPI promete reduzir substancialmente este período e acelerar o processo de inovação no país.

Quem cria uma marca ou faz uma inovação e deseja protegê-la comercialmente no Brasil deve procurar o Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI), providenciar uma série de documentos e esperar por 5 a 10 anos. Durante o período de espera, o requerente não tem a propriedade industrial de sua criação reconhecida. Mas essa realidade está com os dias contados, pelo menos no que se refere aos pedidos de registro de marcas, conforme afirma o presidente do Instituto Roberto Jaguaribe. “Até novembro deste ano a informatização do registro de marcas no INPI deverá eliminar o uso de papel e reduzir o tempo de espera para obtenção do registro para menos de um ano”, diz.

O INPI decidiu informatizar primeiro o registro de marcas, pois há um estoque maior de pedidos e os processos são mais simples, comparativamente às patentes. Atualmente, há cerca de 600 mil pedidos de marcas e 130 mil pedidos de patentes aguardando parecer.

A informatização do registro de marcas está em fase de testes, aguardando homologação, e deverá conferir maior eficiência e transparência nos processos, com estímulos aos investimentos e redução da pirataria. De acordo com Jaguaribe, o investimento na informatização do sistema de registro de marcas teve custo aproximado de R$ 6 milhões. Apesar do elevado volume de investimento, não há previsão de aumento nos custos para o registro de marcas.

Não está tão adiantada, no entanto, a informatização do registro de patentes. Mesmo quando concluída, o uso de papel não deverá ser totalmente eliminado, dada a complexidade de alguns anexos nesse tipo de documento, mas o INPI prevê que o tempo de espera para o registro de uma patente caia de cerca de 9 anos para 4,5 anos em 2007. A redução do tempo de registro de uma patente para menos de 4 anos ainda não está prevista, pois exigiria mudanças na legislação sobre propriedade industrial.

As expectativas dos usuários do INPI são grandes. Para a Inova, agência de inovação da Unicamp encarregada pela efetivação dos pedidos de patentes da universidade, a redução do tempo para o registro das patentes terá impactos significativos sobre o estímulo à inovação na universidade. Ciro de Lacerda, assessor técnico em propriedade industrial da Inova, diz que o sistema em papel atrasa muito a efetivação do registro, prejudicando os requerentes. “Ainda não sentimos nenhum efeito da informatização do INPI, os processos continuam em papel e lentos, mas o sistema on-line deverá mudar esse quadro, aproximando-se do que acontece em países desenvolvidos”, diz.

A demora na concessão de patentes é muitas vezes apontada como um entrave à inovação no país, pois gera incerteza para os investidores e permite que exploradores se aproveitem indevidamente de inventos e idéias que aguardam o registro. “Ainda assim, acredito que os maiores entraves à inovação no Brasil não decorram das deficiências do INPI, que reconheço, mas da falta de cultura de inovação das empresas”, afirma o presidente do Instituto.

Para Roberto Castelo Branco Coelho de Souza, consultor e ex-diretor geral adjunto da Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI), a demora para se registrar uma patente causa um dano muito grande para a economia nacional. “Espero que a informatização do INPI não seja apenas a reprodução do processo que era realizado em papel para o meio computacional, pois o mesmo procedimento ineficiente em outro meio não trará efeitos significativos”, diz. Souza identifica ainda o problema do corporativismo no órgão como um entrave à sua eficácia e acredita que a autonomia deve estar acima dos confrontos políticos.

Lacerda esclarece que a posse do número de protocolo, e, posteriormente, do número de patente requerida, já confere ao requerente direitos sobre seu invento seja para licenciá-lo ou para proteger-se ante as ameaças de concorrentes. “Mas muitos empresários acreditam que só terão direitos sobre a invenção depois da aprovação do pedido, anos depois, e por isso são desestimulados a inovar”, afirma.

Na Inova, após a produção do relatório de solicitação da patente, o pedido é encaminhado ao INPI e, em 48 horas, o requerente já recebe um número de protocolo, que é substituído pelo número de patente requerida em três meses. Ainda assim, de acordo com o assessor técnico do órgão, “não é confortável essa longa espera, pois o inventor pode ter sua patente recusada e os licenciadores podem sentir-se prejudicados por terem passado anos pagando pelo uso de uma invenção sem valor”.

O processo de informatização não se limitará ao registro de marcas e patentes, mas deve atingir toda a gestão do órgão. O projeto chamado “INPI sem papel” visa aproveitar melhor os recursos da internet para agilizar o preenchimento e a análise de pedidos. Além da informatização, o Instituto está contratando novos examinadores. Até agora, de acordo com Beatriz Amorim, diretora de articulação e informação tecnológica do Instituto, foram contratados 460 novos servidores, entre os quais 320 examinadores e os demais de áreas administrativas.

Para digitalizar seu funcionamento, o INPI contratou o Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro), uma empresa vinculada ao Ministério da Fazenda que desenvolve softwares para atender as diversas necessidades do setor público, como o sistema de declaração do imposto de renda via internet. Segundo Roberto Jaguaribe, o Serpro tem a vantagem de não ter de participar de processos de licitações, o que acelera o processo.

Norte-americanos tentam evitar extinções com reprodução em cativeiro

Para combater doença que ataca anfíbios na América Central, um grupo de pesquisadores transportou representantes de várias espécies para os Estados Unidos. A iniciativa causa discordâncias de colegas, que acreditam que conservação tem que visar proteger a área natural de ocorrência dos animais.

A rã-de-vidro do Panamá está sendo dizimada pelo quitrídio.
Foto: Ron Holt

 

A extinção ameaça anuros (sapos, rãs e pererecas) na América Central, devido à doença causada pelo fungo quitrídio Batrachochytrium dendrobatidis. Segundo o pesquisador do zoológico de Atlanta (EUA) Joseph Mendelson, em fevereiro deste ano a doença chegou à região panamenha de El Valle. De fevereiro para cá, cada vez mais animais têm sido encontrados mortos. “Todos os dados e precedentes indicam que os anfíbios serão virtualmente eliminados do local antes do fim de 2006”, alerta o pesquisador, que faz parte de um esforço de criar os animais em cativeiro nos Estados Unidos e, em breve, no Panamá. A iniciativa gera protestos na comunidade científica, que questiona até que ponto esse tipo de intervenção é eficaz para proteger espécies ameaçadas.

A chegada do quitrídio a El Valle estava prevista em um estudo publicado em fevereiro deste ano, que demonstra o avanço da doença para o sudeste ao longo da Cordilheira Central panamenha. Os dados permitiram calcular quando o último enclave de várias espécies – El Valle – seria atingido.

O aviso antecipado permitiu que Mendelson e colegas organizassem uma operação de resgate, que retirou centenas de sapos do Panamá. Em tempos de caça à biopirataria a iniciativa causa desconfiança, mas os herpetólogos (especialistas em répteis e anfíbios) agiram com o aval das autoridades panamenhas.

Para obter a autorização de coleta os norte-americanos, em colaboração com o colega panamenho Roberto Ibáñez, apresentaram à Autoridade Nacional do Meio Ambiente (Anam, na sigla em espanhol) um relatório que demonstrava a iminência das extinções. Como resultado, foi feito o acordo de remoção dos animais, assim como a construção de instalações no próprio Panamá – o El Valle Amphibian Conservation Center (EVACC), construído pelo zoológico de Houston (EUA). Este centro só estará em pleno funcionamento em agosto próximo, o que poderpa ser tarde demais para os animais. Por isso, argumenta Mendelson, foi preciso começar o projeto nos Estados Unidos. Neste momento, novas coletas estão sendo feitas nas áreas já afetadas pelo fungo para transferir anuros para o cativeiro local e tratá-los.

Diversidade genética

Um ponto muito debatido da conservação em cativeiro é a dificuldade de manter diversidade genética adequada. Embora representantes de uma espécie sejam muito semelhantes a nossos olhos, há um imenso acervo oculto. É essa diversidade no patrimônio genético que permite a uma espécie reagir a doenças, por exemplo – os indivíduos com capacidade de resistência sobrevivem e se reproduzem. “Preservar 15 indivíduos não adianta, geneticamente a espécie está extinta”, argumenta Célio Haddad, herpetólogo da Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Rio Claro.

Joseph Mendelson concorda, e explica que o ideal seria montar uma população em cativeiro com um número muito grande de indivíduos não aparentados, de forma a manter variedade. Mas a realidade é outra. “O que faz um conservacionista quando só restam cinco indivíduos daquela população no planeta?”. Numa situação de emergência, ele defende que se faça o possível. É provável que a iniciativa fracasse em impedir extinções, mas o norte-americano acredita que as tentativas não prejudicam outras estratégias.

No caso dos animais transportados para o zoológico de Atlanta, a equipe coletou tantos indivíduos quanto possível, de 35 espécies que corriam maiores riscos de extinção, segundo estudos anteriores. Dessa forma, algumas espécies estão representadas por quatro indivíduos; outras, por 40. Longe do ideal, mas, de acordo com Mendelson, o possível. Ronald Gagliardo, também do zoológico de Atlanta, diz que já conseguiram reproduzir em cativeiro cerca de uma dúzia de espécies, algumas delas pela primeira vez no mundo.

Talvez seja possível manter os animais vivos e reproduzi-los em cativeiro. Mas o passo seguinte é ainda incerto. Para reintroduzir os anuros em seu ambiente original, muita pesquisa é ainda necessária. Retornar a áreas infectadas seria uma sentença de morte, afirma Gagliardo.

Estratégias de conservação

Além das dificuldades técnicas em se criar uma população representativa em cativeiro, muitos biólogos acreditam que iniciativas de conservação ex-situ (fora da área natural de distribuição) são perigosas. Kelly Zamudio, da Universidade Cornell (EUA), acha que elas “passam a idéia errada de que são a solução para problemas ambientais”.

Joseph Mendelson, porém, argumenta que este caso é especial. “Mesmo os habitats mais preservados do mundo e as leis mais restritivas estão fracassando em evitar extinções de anfíbios”. O quitrídio não respeita leis nem parques nacionais. Ele defende a importância de se fazer pesquisa básica para compreender a genética da resistência a doenças em populações remanescentes. No entanto, esses estudos demoram, e o herpetólogo argumenta que é necessário ter animais vivos para no futuro tentar reintroduzi-los no ambiente.

Mas o conceito de conservação ex-situ vem ganhando força, sobretudo nos Estados Unidos. É o que conta Bruno Pimenta, do Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). “Projetos desse tipo chamam muito a atenção da mídia, sendo altamente atrativos para doadores (empresas, fundações, etc.)”, afirma. Por isso, segundo ele, o enfoque de cativeiro foi destaque no Plano de Ação de Conservação de Anfíbios, um workshop que reuniu 60 cientistas de todo o mundo em setembro do ano passado em Washington (EUA). O pesquisador relata que a maioria de seus colegas foi contra a adoção dessa estratégia, que cresce em detrimento de investimento para estudos do meio ambiente e sua proteção.

No Brasil, o quitrídio foi detectado, mas até agora não se mostrou letal como na América Central. Até agora, o grande desafio de conservação é a perda de habitat devido a desmatamento. Haddad sugere que fazendeiros sejam obrigados a reconectar fragmentos de Mata Atlântica, de forma a proporcionar uma maior área viável para animais. “A conservação tem que ser feita in situ“, defende.

Ciências médicas abrem espaço para inclusão da espiritualidade

Uma técnica de intervenção terapêutica para pacientes em estágio terminal aponta, com aporte científico, que a espiritualidade pode ajudar a aliviar o sofrimento de quem está próximo da morte. O estudo dá força a uma tendência que, embora ainda muito polêmica, vem ganhando espaço no meio acadêmico desde a década de 1990: a inclusão da espiritualidade nas pesquisas científicas da área da saúde.

Uma técnica de intervenção terapêutica para pacientes em estágio terminal aponta, com aporte científico, que a espiritualidade pode ajudar a aliviar o sofrimento de quem está próximo da morte. O método, publicado no final de junho desse ano, no periódico britâncio The Scientific World Journal, foi o tema da tese de doutorado “Programa de treinamento para profissionais de saúde sobre a intervenção terapêutica: Relaxamento, Imagens Mentais e Espiritualidade (RIME) para re-significar a Dor Espiritual de Pacientes Terminais”, da psicóloga Ana Catarina Araújo Elias, apresentada no final do ano passado, na Unicamp. O estudo dá força a uma tendência que, embora ainda muito polêmica, vem ganhando espaço no meio acadêmico na última década: a inclusão da espiritualidade nas pesquisas científicas da área da saúde.

O crescente interesse da área médica pela espiritualidade também foi destacado no Seminário Internacional “Espiritualidade no cuidado com o paciente”, organizado pela Associação Médico-Espírita (AME) do Brasil, em São Paulo, em maio de 2005, por Harold G. Koenig, médico da Universidade de Duke, Estados Unidos. Segundo ele, entre 1908 e 1982 foram publicados apenas 101 artigos médicos sobre espiritualidade e/ou religiosidade. De 2002 a 2003, este número aumentou para mais de mil, e entre 2003 e 2005 surgiram mais 1.798 artigos sobre o tema.

Uma rápida busca no site do Centro Latino-Americano e do Caribe de Informações em Ciências da Saúde (BIREME), o maior banco de dados de literatura em saúde da América Latina, confirma essa transformação: mais de mil estudos relacionados à espiritualidade estão registrados no banco de dados desde 1993. Antes disso, nenhum trabalho foi publicado em língua portuguesa. Cruzando as palavras-chave “spirituality” e “health” (espiritualidade e saúde, em inglês) encontramos apenas vinte trabalhos entre 1966 e 1992, ao passo que entre 1993 e 2006 mais de 500 novos estudos foram publicados sobre o tema. Entre os vinte primeiros trabalhos, o mais antigo registrado é de 1984.

Reinaldo Ayres, conselheiro do Conselho Regional de Medicina de São Paulo (Cremesp), não acredita, no entanto, que esteja havendo uma mudança de padrões nas ciências médicas. “Não tenho a visão de que o ambiente das ciências médicas seja tão cético”. Segundo ele, tratar do doente em sua integralidade sempre foi e sempre será o paradigma de definição da ação do médico. “Na construção da relação médico-paciente não são somente os aspectos técnicos da medicina que devem ser considerados. Há seguramente um envolvimento de afetividade e empatia que se constituem em coisas do espírito“. Atitudes como respeito ao outro, acolhimento, participação de familiares, conforto, atenção às necessidades espirituais dos doentes trazem, de acordo com Ayer, “força” para enfrentar situações de grande adversidade como, por exemplo, a morte.

Avaliando o medo e o sofrimento

Nancy Mineko Koseki, oncologista clínica e coordenadora da Unidade de Cuidados Paliativos do Centro de Atenção Intensiva à Saúde da Mulher (CAISM), na Unicamp, afirma que embora reconheça-se que a dor espiritual afeta a dor física, os médicos ainda centralizam sua atenção no alívio da dor do corpo.“O que nós observamos na área médica é a preocupação com a cura da dor pelos remédios. A sedação do paciente terminal é muito comum nas enfermarias. Acredito que uma intervenção terapêutica como a RIME ajudaria a humanizar esse cuidado, reduzindo a necessidade dos medicamentos”.

A RIME é uma técnica de relaxamento e visualização de imagens mentais que tem como objetivo re-significar a dor espiritual, promovendo maior qualidade de vida no processo de morrer. O paciente é induzido a visualizar seres espirituais bondosos e acolhedores, paisagens celestiais, lugares bonitos e aconchegantes. Todos esses elementos da espiritualidade tiveram como base os relatos dos pacientes que passaram por uma “Experiência de Quase Morte” e voltaram a viver normalmente.

“Pacientes terminais sabem intuitivamente que estão morrendo e precisam expressar sua dor e serem compreendidos, por esta razão o ideal seria não dizer ao doente que ele está morrendo e sim, procurar ouvi-lo”, ressalta Ana Catarina.

A técnica começou a ser desenvolvida em 1998, quando a psicóloga, ao realizar um trabalho com crianças e adolescentes com câncer em fase terminal, percebeu um sofrimento psicológico e espiritual relevante. “Denominei este sofrimento de ‘Dor Simbólica de Morte’, representado pela ‘Dor Psíquica’ (medo do sofrimento e humor depressivo manifestado por angústias, tristezas e culpas) e pela ‘Dor Espiritual’ (medo da morte, medo do pós-morte, idéias e concepções negativas em relação ao sentido da vida e à espiritualidade e culpas diante de Deus)”, explica. Em sua tese de doutorado, a pesquisadora operacionalizou o treinamento da RIME para profissionais de saúde.

O método, no entanto, apresenta limitações. De acordo com a pesquisadora, ele só pode ser aplicado por profissionais que acreditam na vida espiritual pós-morte e pacientes que também tenham esta crença: “pacientes que não acreditam na vida pós-morte devem ser atendidos pelos métodos convencionais”.

Leia também: “O direito de morrer”, em http://www.comciencia.br/reportagens/2005/05/03.shtml