Envolvimento com a leitura é negligenciado pelas políticas

Pesquisa aponta que o envolvimento com a leitura é influenciado por heranças culturais impregnadas no cotidiano das escolas, nas regras das bibliotecas e na subjetividade dos professores, e também, e especialmente, pelas políticas públicas de leituras.

Este ano teve início o Plano Nacional da Leitura e do Livro (PNLL), a primeira tentativa de ação coordenada entre os Ministérios da Educação (MEC) e da Cultura (MinC), criado em 2005 como conseqüência do Ano Ibero-americano da Leitura. Com a meta de dobrar o índice nacional de leitura até 2008, um dos pontos fundamentais do PNLL é o fortalecimento econômico do setor livreiro por meio de linhas de financiamento com o “BNDES Pró-Livro” e programas de incentivo fiscal, como o “Imposto Zero”, que implica a desoneração da cadeia produtiva do livro. Embora ainda não esteja consolidada, a nova política de fomento à leitura recebe críticas por incentivar mais o crescimento das editoras do que o envolvimento dos leitores com os livros, repetindo os mesmos erros de ouros programas vigentes.

“Mais uma vez, podemos observar que, subjacentes a uma pretensa política de valorização do livro e da leitura, encontram-se os interesses econômicos dos grandes grupos editorias, cujos maiores clientes são o governo federal e os governos estaduais com seus programas de aquisição de livros”, critica Carlos Eduardo de Oliveira Klébis em sua dissertação de mestrado sobre o papel da escola, da biblioteca e dos professores na formação de leitores, apresentada no dia 08 de agosto, na Unicamp.

Livros dividem espaço com material de limpeza
Foto: Carlos Klébis

 

No estudo, o pesquisador observa que o envolvimento com a leitura é influenciado por heranças culturais impregnadas no cotidiano das escolas, nas regras das bibliotecas e na subjetividade dos professores, e também, e especialmente, pelas políticas públicas de leituras.

A própria desarticulação entre o Ministério da Educação (MEC) e o Ministério da Cultura (MinC) desde 1985 sinaliza para os desafios e dificuldades de criar na escola uma política cultural de formação de leitores. Distinguindo-se um planejamento do outro, a relação da educação com a cultura foi seccionada e os programas e projetos governamentais em torno do livro, da biblioteca e da leitura colocados em prática nas últimas duas décadas não conseguiram a profundidade e consistência necessária para serem eficientes de fato.

Os principais programas de aquisição e distribuição de livros do governo federal são o Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), instituído em 1985, e o Programa Nacional Biblioteca na Escola (PNBE), criado há dez anos. Mantidos pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) sob a coordenação do MEC, o primeiro concentra os recursos na compra de livros didáticos que são distribuídos gratuitamente aos alunos da rede pública, e o segundo na aquisição de coleções para-didáticas e de livros literários destinados às bibliotecas escolares.

Ao contrário do PNLD, que permite a participação dos professores na escolha dos livros a serem adquiridos, o PNBE exclui essa participação. Além disso, ignora em seu projeto a designação de um bibliotecário para as bibliotecas escolares e não oferece subsídios para a organização, catalogação e circulação dos acervos entre os estudantes. “O PNBE não fomenta nem dinamiza as bibliotecas escolares. Não é nada além de um programa de distribuição de livros”, aponta Klébis.

Alimento para traças

Por conta dessa falha no planejamento do PNBE, apesar de abarrotadas de livros, muitas bibliotecas escolares permanecem trancadas e inacessíveis os alunos e aos professores. “Se, por um lado, as políticas distributivas de livros conseguiram despejar montanhas de livros nas escolas, por outro, muito pouco ou quase nada se empenham no sentido de oferecer condições para que os leitores possam ter acesso às bibliotecas escolares”, comenta.

O resultado, o pesquisador descreve a partir de sua própria experiência como professor de uma escola pública da periferia da cidade de Campinas: “na biblioteca, o acervo de mais de cinco mil livros divide espaço com vassouras e produtos de limpeza. Com medo de desgaste e extravio dos livros, ela está permanentemente fechada aos alunos, e se tornou um depósito, servindo apenas para satisfazer a gula das traças”.

Ao seu relato, ele reuniu os de mais 264 professores da rede pública estadual, compilados entre 2004 e 2005, no curso “Teia do Saber” da Unicamp. Os depoimentos foram colhidos nos primeiros dias de cada curso e permeiam todas as análises de seu estudo, intitulado Leitura e envolvimento: a escola, a biblioteca e o professor na construção das relações entre leitores e livros. “O professor atua como o mediador entre livros e estudantes. A escola é a estrutura que torna a leitura possível e a biblioteca é o espaço por excelência da leitura”, explica o autor.

Além da inacessibilidade das bibliotecas, o autor destaca que a preocupação dos professores com as avaliações, e em cumprir com os programas, atropela uma etapa fundamental da leitura: a contemplação. Este momento é importante porque nele são criados vínculos entre leitores e livros.

Para o pesquisador, o envolvimento é outra etapa imprescindível para que os estudantes desenvolvam o prazer pela companhia dos livros. Da mesma maneira que em uma relação amorosa, em que a pessoa primeiro se envolve por um interesse inicial, que é o desejo, e só depois começa a construir, desenvolver uma relação, conhecendo melhor o outro e aceitando suas idiossincrasias, assim deveria ser o processo de formação de leitores. “O que acontece, no entanto, é que esse primeiro envolvimento fica fora. O discurso sobre leitura se preocupa em desenvolver habilidades de leitura. Mas não vemos nesse discurso a preocupação em aproximar o sujeito dos livros, em proporcionar uma convivência”.

Zona rural ocupa espaço significativo e torna-se multifuncional

Apesar da região de Campinas ser conhecida por seu desenvolvimento no setor tecnológico, a zona rural ocupa um espaço significativo na economia e na distribuição espacial do município, segundo a socióloga do Núcleo de Estudos da População (NEPO) da Unicamp, Luzia Conejo Pinto.

Os agricultores da região de Campinas receberão R$ 525 mil do governo do Estado de São Paulo para o desenvolvimento de atividades no campo. A verba foi aprovada em julho e liberada a partir de agosto através do Programa SAI (Sistema Agroindustrial Integrado) e será utilizada para atividades de assistência técnica, cursos, seminários e orientação para produtores rurais. Apesar da cidade ser conhecida por seu desenvolvimento no setor tecnológico, a zona rural ocupa um espaço significativo na economia e na distribuição espacial do município, segundo a socióloga do Núcleo de Estudos da População (NEPO) da Unicamp, Luzia Conejo Pinto.

A pesquisadora fez um levantamento sóciodemográfico da zona rural da cidade e detectou transformações significativas nos últimos 20 anos. “Houve um rearranjo tanto econômico, quanto populacional da zona rural em diversos lugares no Brasil, e Campinas acompanha essa tendência”, diz. O modelo de desenvolvimento do país que gerou crescimento das cidades e o conseqüente êxodo do campo retiraram parte da importância econômica da zona rural e houve diminuição da população, tanto que no Censo de 2000, Campinas possuía 953.218 pessoas vivendo na cidade, o que representava 98,33% da população total contra 16.178, equivalente a 1,67%, de pessoas na zona rural. “Apesar dessa diferença parecer gritante, precisamos entendê-la no contexto: Houve perda de população que de 1940 a 2000 reduziu-se a metade, mas nesse mesmo período, a população urbana apresentou crescimento constante e muito alto. A população rural de 2000 é perfeitamente compatível com as situações rurais, seja por volume como por densidade demográfica”, diz.

Para compreender como ocorreram as transformações na zona rural, a pesquisadora optou por uma abordagem integrada do município e detectou que grande parte das pessoas que trabalha na zona rural reside nos trechos urbanos. “Atualmente, a integração entre as duas áreas é muito maior do que no passado”, diz Luzia.

Além da diminuição populacional, há significativas mudanças na economia da área rural de Campinas. “A agropecuária deixou de ser a única atividade econômica e abriu espaço para uma zona rural multisetorial marcada pela presença de serviços”, diz Luzia. A agropecuária representa 30% das atividades e o espaço rural adquiriu outras funções como turismo, preservação ambiental e entretenimento. “Muitas pessoas estão trabalhando em restaurantes e hotéis-fazenda”, afirma. Para Luzia, o campo está desenvolvendo atividades atreladas à dinâmica da cidade.

A forma de organização familiar na zona rural também segue essa dinâmica, o que torna comum as famílias compostas por pessoas que trabalham em diferentes setores. “São freqüentes os casos de pessoas que trabalham na cidade, mas residem no campo porque os demais membros da família trabalham na zona rural”, diz Luzia.

A pesquisadora detectou ainda que a escolaridade na zona rural continua baixa. “Houve avanços, principalmente nos anos 90, mas o índice continua baixo”, afirma. “O mesmo vale para a renda do trabalhador do campo: melhorou, mas ainda é baixa”, completa.

Houve melhora significativa, segundo o levantamento de Luzia, nas condições de vida e salubridade principalmente na canalização de água nos domicílios, na universalização da energia elétrica e na conseqüente aquisição de bens eletroeletrônicos como geladeira e televisão.

A zona rural de Campinas revelou-se heterogênea com seis grandes áreas, cada uma com suas peculiaridades, mas algumas características são comuns a todas: a presença de atividades produtivas agrícolas e não agrícolas.

Movimentos sociais integram Conselho Nacional de Habitação

A proposta dos movimentos sociais, de que a habitação exerça sua função social, obteve um bom resultado no início do mês de agosto, quando tomaram posse os membros do Conselho Gestor do Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social (FNHIS).

A proposta dos movimentos sociais, de que a habitação exerça sua função social, obteve um bom resultado no início do mês de agosto. Tomaram posse os membros do Conselho Gestor do Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social (FNHIS), com formação paritária, isto é, composto por membros da sociedade civil e governo. O Conselho Gestor é responsável pelo controle na utilização dos recursos destinados à habitação. Com esse dinheiro, serão financiados programas habitacionais, voltados para a população de baixa renda. O Conselho deverá estabelecer diretrizes e critérios para a destinação dos recursos do Fundo, assim como aprovar orçamentos, planos e metas.

Antonio José de Araújo, membro da Executiva do Movimento Nacional de Luta por Moradia (MNLM), destaca que essa é uma grande conquista dos movimentos sociais que têm compromisso com a reforma urbana e com a moradia de interesse social. “Essa Lei foi sancionada depois de anos de luta. Com isso, garantimos a moradia como direito fundamental e não como mercadoria”.

Policiais avançam sobre população
Fonte: Midia Independente

 

Segundo informa, alguns pontos ainda devem ser trabalhados para o aperfeiçoamento da política habitacional no Brasil. “Embora seja um avanço, esse sistema ainda não saiu exatamente como achamos que deveria ser. Nossa batalha é para que existam recursos obrigatórios e permanentes”. De acordo com essa proposta, a política de habitação no país, deveria ter um repasse fixo do Governo Federal, assim como acontece com a educação e a saúde. Impossibilitando que as mudanças nas novas Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), modifiquem os rumos dos repasses dos recursos e inviabilizem o Fundo.

A composição de um Conselho com autonomia para decidir de que forma os recursos destinados à habitação pelo Governo Federal serão investidos, consolida um modelo de gestão participativa e democrática. Dentre os movimentos sociais que compõem o Conselho estão o Movimento Nacional de Luta pela Moradia (MNLM) e a União Nacional por Moradia Popular (UNMP). Já entre os Ministérios podemos citar o das Cidades, da Ciência e Tecnologia, Desenvolvimento Social e Combate à Fome, entre outros.

Apesar dessa conquista no que tange a questão habitacional para pessoas de baixa renda, graves problemas ainda levarão algum tempo para serem resolvidos. Segundo os dados da Fundação João Pinheiro, o déficit habitacional no Brasil, em 2000, apontava para 6,6 milhões de unidades habitacionais. (veja notícia)

Maria de Fátima Cabral Marques Gomes, coordenadora do Núcleo de Pesquisa e Extensão Favela e Cidadania (FACI) da Escola de Serviço Social/UFRJ, explica que esse déficit é apenas um aspecto das necessidades habitacionais que envolvem outras questões como inadequação de moradias e demanda demográfica. “A maior parte do enfrentamento do déficit habitacional tem sido realizada pela população através de inúmeras iniciativas individuais e coletivas, destacando-se a autoconstrução, e o mutirão, na maior parte dos casos sem apoio do poder público”.

Ivanete Araújo, coordenadora geral do Movimento dos Sem Teto do Centro (MSTC) em São Paulo, acrescenta que não tem tido possibilidades de diálogos com órgãos do governo. Ela lamenta que a polícia esteja agindo com muita violência e truculência em relação aos moradores sem teto. “Os policiais chegam com a ordem de despejo e têm que cumprir. Não adianta falar com o policial, quando a ordem de despejo veio do Secretário de Segurança do Estado. Percebe? Eles falam: ‘não sou eu, eu recebo ordens’, aí eles descem o cacete”.

São Paulo: recorde em imóveis vazios

Dados disponíveis no Ministério das Cidades mostram que o número de imóveis desocupados no Brasil é maior na região Sudeste. Cerca de 2.794.954 domicílios estão vagos nessa região. No entanto, quando mudamos a escala e olhamos para o estado de São Paulo, mais precisamente para o município de São Paulo, descobrimos que esse apresenta o maior número de imóveis vazios do Brasil.

Déficit habitacional em São Paulo
Fonte: Ministério das Cidades, 2000.

 

Na opinião de Ivanete Araújo, a situação permanece assim devido à falta de vontade política do governo. “Propostas para resolver o problema de famílias que precisam de habitação não faltam”, diz. A prática de ocupação dos imóveis vazios é antiga e nasceu com os movimentos pela luta por moradia. A reivindicação é de que se aplique a função social da moradia para esses vazios urbanos, atendendo famílias de baixa renda, moradores de rua, de cortiço e moradores de favela.

Gomes, da UFRJ, explica que o processo acelerado de urbanização brasileira na década de 1970 gerou uma forte segregação socioespacial, marginalizando uma grande camada da população do mercado formal de trabalho e excluindo-a do sistema de proteção social. Ela não acredita que a ocupação de imóveis vazios, ou mesmo a construção de novas unidades habitacionais possam resolver o grave problema da habitação brasileira. Defende, entretanto, que políticas habitacionais consistentes possam minimizar os conflitos urbanos, sobretudo se tomadas em sentido amplo e com a participação dos movimentos sociais.

“Ter uma casa significa ter acesso à educação, saúde, à cultura, ao lazer, ao transporte, ao emprego, ter acesso à cidade. Antes de tudo, é necessário que a política habitacional esteja articulada às demais políticas e, sobretudo, uma política de distribuição de renda para atenuar as desigualdades sociais que são gritantes na sociedade brasileira”, esclarece.

Leia Mais:

Déficit Habitacional no Brasil (Ministério das Cidades)