Pesquisadores e professores reinventam a botânica escolar

Acaba de ser lançado, no dia 14 de novembro, o livro “A Botânica no ensino básico: relatos de uma experiência transformadora”. A obra descreve o trabalho feito por pesquisadores da Unicamp e do Instituto Agronômico de Campinas (IAC) e professores de uma escola pública de ensino fundamental de Campinas, a EMEF Padre Francisco Silva.

Acaba de ser lançado, no dia 14 de novembro, o livro “A Botânica no ensino básico: relatos de uma experiência transformadora”. A obra descreve experiências do trabalho empreendido por pesquisadores da Unicamp e do Instituto Agronômico de Campinas (IAC) e professores em uma escola pública de ensino fundamental de Campinas, a EMEF Padre Francisco Silva.

Fruto de projetos integrados de pesquisa desenvolvidos desde 1993 na área da botânica, financiados pela Fapesp e coordenados pela professora do Instituto de Biologia da Unicamp, Luiza Kinoshita, o livro nasce do desafio de tornar agradáveis e acessíveis aos alunos e professores da rede pública os conceitos científicos da área de botânica.

O trabalho abarcou todas as disciplinas da grade curricular do ensino fundamental em classes de 6.ªs séries, nos anos de 1999 e 2000. “A metodologia e a abordagem peculiar dos conceitos botânicos, porém, podem ser aplicados a todas as classes, do ensino fundamental ao médio”. É o que afirmou, em entrevista, Kinoshita. “O diferencial desta experiência, narrada no livro, é que ela foi construída por pesquisadores e professores, num trabalho conjunto. Assim, os professores puderam conhecer mais do nosso trabalho como pesquisadores. Trabalhamos juntos, aprendendo uns com os outros”, complementou.

O trabalho coletivo produziu uma botânica diferente do que tradicionalmente já era trabalhada na escola, e também diferente da botânica resultante das pesquisas realizadas na universidade. Um dos capítulos, “Campinas do Mato Grosso”, narra as visitas temáticas dos alunos a áreas nativas de vegetação de uma fazenda no município de Campinas, para que pudessem observar os efeitos da devastação do meio-ambiente, e a conseqüente transformação do cenário urbano.

O ensino da Botânica permeou todas as atividades de um ano letivo inteiro. Conceitos de educação ambiental puderam ser trabalhados de forma inédita e integrada, atentando para sua presença no cotidiano. Dos alimentos consumidos às árvores existentes nas calçadas, das plantas nativas às artificiais, das visitas temáticas aos conceitos aprendidos em sala-de-aula, o passeio por estes temas acabou gerando diferentes enfoques sobre o tema. “Pesquisadores da Faculdade de Educação (FE) da Unicamp, que também participaram do projeto, realizavam avaliações periódicas e administravam seu planejamento. Com isto, os professores da escola tornavam-se mais observadores de suas próprias práticas, envolvendo-se inteiramente. Não conseguiam mais dar aulas como antes”, afirma a botânica. Tal acompanhamento ainda serviu de estímulo para que novas formas de ensino, e de planejamento pedagógico, pudessem continuar a ser implementadas, mesmo após o término do projeto, em 2001.

“A experiência pela qual passamos possibilitou, tanto aos professores da escola pública quanto aos pesquisadores, repensar a prática e transformá-la. Nós, professores, continuamos buscando ‘brechas’ para realizarmos trabalhos interdisciplinares que possibilitem múltiplos olhares para os conhecimentos científicos”, afirma a professora de português Maria Ângela Pinheiro, participante do projeto. Em conjunto, os participantes do projeto construíram um currículo diferenciado para a botânica, possibilitando a aprendizagem de seus vários aspectos (históricos e geográficos, literários, estéticos, afetivos, corporais e científicos). “Todos os envolvidos aprenderam e também ensinaram bastante”, ressalta. Foi esse trabalho que estimulou Maria Ângela a voltar aos bancos da universidade. Sua dissertação de mestrado, defendida em fevereiro de 2006 na FE da Unicamp, narra sua experiência neste projeto e o trata como um dos objetos de seu estudo.

A experiência de cooperação entre pesquisadores e professores, instituições de pesquisa e escola é demonstrada no livro “A Botânica no ensino básico” como uma possibilidade efetiva de trabalho que pode resultar numa experiência prazerosa e estimulante para ambos. A proposta de ensino multidisciplinar, exposta no livro, tentou sincronizar os “tempos” das instituições de pesquisa e laboratórios com os da sala-de-aula, fazendo com que o conhecimento científico pudesse ultrapassar barreiras, tornando possível que também fosse gerado na escola.

Entusiasmada com o êxito do trabalho, a pesquisadora Luiza Kinoshita gostaria de que ele servisse de inspiração a outras escolas, e outros professores. “Nosso desejo seria distribuir o livro nas escolas, como forma de estímulo para outros projetos. Seria ótimo que outras escolas públicas pudessem aproveitar alguma parte de nossa experiência”, concluiu.

O livro, editado pela editora Rima, com co-edição da Fapesp, é organizado por Luiza Sumiko Kinoshita, Roseli Buzanelli Torres, Jorge Yoshio Tamashiro e Eliana Regina Forni-Martins. E é escrito por todos os pesquisadores, professores e alunos que trabalharam no projeto.

A gente não quer só comida! Consumidor quer informações sobre o que come

O número crescente de pessoas que se alimentam fora de casa é acompanhado pelo também crescente número das que gostariam de ter acesso a maiores informações sobre o que lhes é servido, mesmo em restaurantes que já disponibilizam informações nutricionais aos seus clientes. É o que mostram pesquisas realizadas por Michele Sanches e Vanessa Maestro, da Faculdade de Engenharia de Alimentos da Unicamp.

O número crescente de pessoas que se alimentam fora de casa é acompanhado pelo também crescente número das que gostariam de ter acesso a maiores informações sobre o que lhes é servido, mesmo em restaurantes que já disponibilizam informações nutricionais aos seus clientes. É o que mostram pesquisas realizadas por Michele Sanches e Vanessa Maestro, alunas do curso de doutorado em Alimentos e Nutrição da Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) da Unicamp.

Na pesquisa elaborada por Sanches, entre 250 consumidores (metade homens, metade mulheres) residentes em Campinas e que costumam alimentar-se fora de casa, 64% deles concordaram que “deveriam ser lançadas campanhas para esclarecer a população como interpretar as informações nutricionais sobre os alimentos”. Esse anseio, no entanto, por enquanto é quase uma utopia: ainda não existe nada regulamentado sobre a obrigatoriedade de fornecimento dessas informações pelos restaurantes e as constatações das pesquisadoras foram que as ações nesse sentido ainda são incipientes. Há um longo caminho a ser percorrido até que os gerentes e donos de restaurantes resolvam atender a essa necessidade.

O estudo de Sanches, buscou identificar a freqüência do consumo de refeições fora de casa, que tipos de estabelecimentos eram mais freqüentados, os fatores que influenciam a escolha dos locais e quais as atitudes dos consumidores em relação à informação nutricional. A pesquisa constatou que o almoço é a refeição realizada com maior freqüência fora do domicílio, que o self service é o local preferido pelos entrevistados e que quase 89% deles têm realmente uma atitude positiva com relação às informações nutricionais fornecidas pelos restaurantes.

Já Maestro se ocupou em identificar iniciativas de fornecimento de informação nutricional em restaurantes de Campinas. Ela conversou com 114 gerentes, sendo 20 de estabelecimentos do tipo fast food e 94 do tipo full service, sorteados aleatoriamente entre as cinco regiões do município. Esse estudo contabilizou quantos dentre eles oferecem tais informações e de que tipo (se informam o conteúdo de calorias, gorduras ou a existência de opções light, por exemplo), além de avaliar se havia cálculo nutricional e, caso não houvesse, por qual motivo. A pesquisa levantou ainda os meios utilizados para veicular as informações (cardápio, folders, página eletrônica), as vantagens e dificuldades alegadas pelos gerentes que não oferecem informação nutricional e a quantidade de estabelecimentos que contam com um responsável técnico.

Somente 25,4% dos restaurantes analisados por Maestro fornecem informação nutricional e esse índice é maior entre os restaurantes fast food. O tipo de informação mais empregado é a declaração de nutrientes, com destaque para a informação do valor energético e de macronutrientes (proteínas, gorduras e carboidratos que fornecem quilocalorias) de alguns pratos. O local mais usado para a disposição das informações é o cardápio, com 48,3% das citações.

Entre as conclusões do estudo, uma das mais interessantes para a pesquisadora é que a implementação de informação nutricional nos restaurantes, de acordo com os gerentes, não alcançou a expectativa deles em aumentar o faturamento. “Percebe-se que esse fator é motivo de grande preocupação, sendo referido como uma das dificuldades mais importantes na manutenção desse tipo de ação”, relata Maestro. Em relação às dificuldades imaginadas pelos gerentes que não adotam a informação nutricional, percebeu-se que há uma preocupação maior com o custo para a elaboração da informação nutricional do que com fatores relativos aos funcionários (falta de tempo ou capacitação) e ao cardápio (falta de um receituário padrão, grande variedade de preparações).

Com base nesses dados, Sanches acredita que os proprietários e gerentes dos restaurantes só irão se ocupar em fornecer essas informações se o consumidor solicitá-las, levados pela competitividade: quem fornecer o que o consumidor está pedindo fica com essa fatia de mercado. Por isso, avalia, a mudança começaria a partir de um consumidor consciente.

Essa consciência, na opinião de Maestro, exige um trabalho contínuo e de longo prazo. Ela defende que o ensino fundamental deveria ter disciplinas de nutrição em seu currículo, como forma de estimular as crianças a ler e aplicar no cotidiano as informações nutricionais. “Crianças menos conscientes sobre a importância de uma dieta saudável serão adultos menos educados e motivados para tanto”, aponta. “A mídia também tem sua parcela de culpa, pois incentiva o consumo de alimentos calóricos, ricos em sódio e gorduras, como os sanduíches, e não incentiva o consumo de frutas, verduras e legumes”, acusa. Em sua opinião, os nutricionistas poderiam estimular seus clientes que necessitam de uma dieta de baixas calorias a exigir esse tipo de informação nos restaurantes que freqüentam ou mesmo reivindicar a criação de novos pratos mais saudáveis.

O grande desafio, define Maestro, está em o consumidor não somente ler mas entender e fazer uso das informações nutricionais. “É preciso que sejam elaborados programas com estratégias bem definidas, com recursos didáticos pertinentes, com avaliação de impacto para definirmos qual é a melhor estratégia a ser usada”, defende. No entanto, lamenta, no Brasil o assunto é novo, ainda não existe nada a respeito. Ela acredita que uma das ferramentas que conseguirá atingir toda a população é a pirâmide alimentar. Trata-se de uma proposta educativa que esclarece o papel de cada alimento no organismo e apresenta as porções recomendadas para o consumo diário. A partir dela poderiam ser elaborados cardápios balanceados e toda essa informação poderia ser transmitida, por exemplo, por meio de cartazes fixados ao longo da fila nos restaurantes.

Outras estratégias sugeridas por Maestro seriam que fossem fornecidas informações nutricionais no cardápio e que se instalasse também um glossário próximo ao buffet sobre definições, funções dos nutrientes, etc. E se possível, que houvesse um nutricionista para tirar dúvidas dos clientes, caso fosse requisitado.

Lei propõe “expropriação organizada” de terras indígenas

Organizações sociais indígenas fazem duras críticas ao anteprojeto de Lei de Mineração em Terras Indígenas, que tramita no Congresso Nacional. A invasão das instalações da Companhia Vale do Rio Doce em Carajás (PA), no final do mês passado pelas comunidades indígenas Xikrin e Djudjêkô, mostra que o caminho a ser percorrido para uma regulamentação que propicie o diálogo entre as mineradoras e as comunidades ainda é longo.

A falta de políticas voltadas para a mineração em terras indígenas preocupa as organizações sociais envolvidas, que se mostram indignadas e fazem duras críticas ao anteprojeto de Lei de Mineração em Terras Indígenas, que tramita no Congresso Nacional. A invasão das instalações da Companhia Vale do Rio Doce em Carajás (PA), no final do mês passado pelas comunidades indígenas Xikrin do Catete e do Djudjêkô, é exemplo de que o caminho a ser percorrido para uma regulamentação que propicie o diálogo entre as mineradoras e as comunidades é longo e repleto de obstáculos.

“O anteprojeto deveria ser um mecanismo para fechar a lacuna da falta de políticas para as comunidades indígenas, entretanto, precisa ser reelaborado para cumprir este objetivo”, avalia o assessor de Políticas Indígena e Socioambiental do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), Ricardo Verdum. Uma das criticas feitas por Verdum à proposta toca na falta de participação das lideranças indígenas, como os coordenadores da Coordenação de Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), no processo de construção do texto. Quando muito, o texto se refere a participação das comunidades locais afetadas ou envolvidas no empreendimento minerário.Além disso, ele aponta a falta de referência no documento à Comissão Nacional de Política Indigenista (CNPI), instituída pelo governo federal em março de 2006.

Verdum avalia que a ausência no anteprojeto das noções de participação e controle social indígenas, sobre a gestão e os resultados da implementação política, torna evidente a preocupação mercantil e arrecadadora da iniciativa. “Não é à toa que ouvimos do Ministro da Justiça o discurso sobre os bilhões de dólares que poderão ser anualmente recolhidos aos cofres do governo”. Para ele, essa iniciativa poderá se configurar como uma “expropriação organizada, na prática, de territórios e riquezas indígenas”.

As associações de comunidades indígenas e as empresas reclamam da necessidade de políticas que equilibrem a negociação entre ambas, minizando os conflitos e evitando as invasões nas empresas parceiras, como as ocorridas ao longo deste ano, no Pará e Mato Grosso, por exemplo. Por conta da invasão, a Companhia Vale do Rio Doce cancelou os termos de compromisso que tinha com as comunidades indígenas Xikrin, onde previa desembolso de R$ 9 milhões este ano. O assessor de comunicação da Coiab, Paulino Montejo, reforça a necessidade da criação de políticas direcionadas à exploração de terras indígenas, uma vez que também há discordâncias entre as diversas comunidades indígenas. “Alguns índios querem expropriação, outros querem administrar o próprio negócio, é preciso maior discussão, antes de levar o debate ao congresso. Faremos isso no final deste mês”, afirma.

Entretanto, na análise feita pelo Inesc, o anteprojeto propiciaria abertura para outras empresas de mineração sem oferecer preferência para os povos indígenas. A proposta original é instituir dois regimes de exploração de recursos minerais: o especial para as atividades de pesquisa e lavra de recursos minerais em terras indígenas, e o de extrativismo mineral indígena. Ambos só poderão agir em terras indígenas homologadas. Diante de críticas e divergências entre os próprios índios, que não foram consultados para elaboração do texto da Lei, as comunidades se preparam para levar a pauta para um encontro nacional no final deste mês e aprofundar o debate.

E não é só isso. O anteprojeto propõe a criação de um fundo no âmbito do Ministério da Justiça a ser gerido pelo órgão indigenista federal: o denominado Fundo Compartilhado de Receitas sobre Mineração em terras indígenas. Este fundo deverá ser gerenciado pela Funai e não há sinais de que haverá alguma participação de líderes indígenas na gestão dos recursos.

O anteprojeto, embora seja entendido pelo governo federal como resultado da sua política democrática e de inclusão social, não atinge as expectativas das diferentes partes envolvidas no processo. “Por isso, os líderes indígenas vão barrar o processo, discuti-lo melhor, para ampliar os direitos indígenas e inseri-los no projeto”, resume Verdum.