Desnutrição infantil no NE pode ser controlada em dez anos

Por Carolina Octaviano

Estudo constatou que, além da escolaridade da mãe, a disponibilidade de serviços de saneamento básico e o aumento do poder aquisitivo também foram responsáveis pelo declínio da desnutrição em crianças do Nordeste brasileiro. O trabalho, realizado por pesquisadores do Núcleo de Pesquisa Epidemiológicas em Nutrição e Saúde e do Departamento de Nutrição da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP) e feito por meio da análise de documentos de duas décadas (1986 – 1996 e 1996 – 2006) provenientes do programa Demographic Health Surveys, revelou que, na primeira década estudada (1986 – 1996), os principais fatores para a diminuição da desnutrição foram a melhoria na escolaridade materna e a disponibilidade de serviços de saneamento. Já no segundo período (1996 – 2006), foram decisivos o aumento do poder aquisitivo das famílias mais pobres e, novamente, a melhoria da escolaridade materna. O estudo aponta ainda para resultados futuros, pois, se a taxa de declínio observada entre 1996 e 2006 for mantida, em menos de dez anos o problema da desnutrição infantil no Nordeste poderá ser controlado.

Para Ana Lúcia Lovadino de Lima, doutora em saúde pública pela USP e uma das pesquisadoras responsáveis pelo estudo, “a evolução da escolaridade materna (fator que está presente nas duas décadas estudadas) teve um importante impacto na diminuição da desnutrição infantil, principalmente no segundo período. Isso se deve ao fato da escolaridade da mãe estar fortemente associada com o cuidado que ela dará ao filho e, com isso, a uma saúde adequada da criança”. Entretanto, de acordo com a pesquisadora, deve-se ter em mente a importância de todos estes fatores interligados. “A evolução conjunta dos outros fatores estudados e da escolaridade materna contribuiu de forma importante para que a evolução ocorresse de forma acelerada. A evolução isolada de qualquer um dos fatores não teria permitido aumento tão significativo”, afirma. Pois, para que se obtenha a nutrição e a saúde adequadas, uma série de fatores deve ser levada em consideração, entre eles: o acesso à uma alimentação adequada; aos serviços de saúde; às condições adequadas de moradia e higiene e etc. “A escolaridade já teve uma evolução importante que precisa ser mantida, mas outros aspectos também essenciais precisam evoluir para que a prevalência da desnutrição infantil alcance índices ainda menores”, complementa.

Ana Lúcia salienta também que os resultados encontrados na pesquisa foram mais positivos do que o grupo de pesquisadores esperava. “A prevalência de desnutrição infantil no Brasil vinha diminuindo nas últimas décadas, mas de forma desigual entre as regiões. No último período estudado observamos que a região Nordeste do país apresentou índices similares às regiões mais desenvolvidas, como a Sudeste e Sul, indicando diminuição das desigualdades de desenvolvimento inter-regionais”, completa. Deve-se ressaltar ainda que a meta estipulada pelas Nações Unidas referentes à desnutrição infantil já foi ultrapassada na região. “A meta do milênio é reduzir a prevalência da desnutrição infantil observada antes da década de 90 em 50% até o ano de 2015. Essa meta já foi atingida na região, por isso será facilmente ultrapassada”, explica. A pesquisadora afirma que “a principal contribuição que o estudo deixa é em relação à indicação de quais são os aspectos que precisam de maior investimento público para o combate ao problema”, conclui.

Ômega 3 e 9 auxiliam no controle da fome e no gasto energético

Até alguns anos atrás acreditava-se que a obesidade se devia, em grande parte, ao valor energético dos alimentos que os indivíduos ingeriam. A tese, na verdade, não estava de todo errada, mas faltava ainda uma explicação mais profunda sobre como esse complexo mecanismo de ação se desenvolvia ao nível celular. Diante deste questionamento, os pesquisadores do Laboratório de Sinalização Celular (Labsincel), da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp, foram buscar em modelos animais outras explicações para a gênese da doença e fizeram uma descoberta importante: a ação dos ômegas-3 e 9 pode ser de grande valia nesse processo e trazer novas perspectivas para quem sofre com a doença que assola parcelas cada vez maiores da sociedade moderna.

Estudos recentes desenvolvidos pelo laboratório, coordenado por Lício Velloso, mostraram a forte relação entre dietas ricas em gorduras saturadas – como as presentes nas carnes bovina e suína, e em seus derivados como leite, queijos e manteiga – e o mecanismo de ação da doença em neurônios de uma região do cérebro chamada hipotálamo, responsável pelo controle da fome e do gasto energético. De acordo com esses estudos, as dietas ricas em gorduras saturadas geram um tipo de inflamação local que acaba influenciando em seu funcionamento. Quando prolongado, esse processo inflamatório pode levar à morte de neurônios e, consequentemente, à perda do controle neural. Uma vez inflamado, o hipotálamo perde parte de suas funções ao ter reduzida a sua capacidade de “percepção” entre o momento de sinalizar para o organismo a estocagem e a queima de energia. Logo, algumas pessoas, quando expostas a essas dietas, perdem gradativamente o controle da fome e passam a consumir mais calorias do que gastam, tornando-se obesas com o decorrer do tempo.

A boa notícia é que uma pesquisa recente realizada no Labsincel traz nova luz para esta questão: o estudo mostrou como a ação dos ácidos graxos insaturados ômega-3 e ômega-9 (presentes respectivamente na semente de linhaça e no azeite de oliva) é capaz não apenas de interromper como também reverter este processo inflamatório causado pelas dietas ricas em gorduras saturadas. O estudo, intitulado “Ácidos graxos mono- e poliinsaturados no controle da inflamação hipotalâmica em animais obesos e diabéticos”, foi realizado por Dennys Esper Cintra em seu pós- doutorado, com supervisão de Lício Velloso.

A pesquisa revelou ainda que o ômega-9, ao contrário do que se sabia até o momento, é mais potente em reverter essas condições do que o ômega-3, descrição inédita na literatura. Até o momento, apenas o ômega 3 é reconhecido como um clássico anti-inflamatório. Realizada em modelos experimentais, a pesquisa comparou a ação dos ácidos graxos insaturados ômega-3 e ômega-9 no hipotálamo de camundongos obesos e diabéticos e demonstrou que essas substâncias são capazes não apenas de atenuar a inflamação e restabelecer o processo de sinalização celular que controla o apetite como também de interromper os sinais de morte celular que vinham se instaurando.

A pesquisa mostrou, no entanto, que para que os resultados sejam efetivamente alcançados é preciso uma ingestão contínua dessas substâncias, somada à descontinuidade da ingestão elevada de alimentos ricos em gordura saturada, ou seja, é preciso que haja uma reeducação alimentar, pois uma vez interrompido o tratamento os neurônios voltam a sofrer o processo de apoptose (morte celular).

Os experimentos demonstraram que a perda de peso não deveu-se apenas à recuperação do controle nervoso da fome, mas também porque tais substâncias aumentaram o gasto energético dos animais. Quando infundido diretamente no hipotálamo, ou mesmo quando consumidos por via oral, ambos ômega 3 e 9 aumentam a expressão de uma proteína chamada de UCP-1 no tecido adiposo marrom, proteína esta que é responsável pelo aumento do gasto energético. Com isso, a atividade das proteínas da via da insulina e da leptina foi restaurada. Os animais se tornaram muito mais tolerantes à glicose e também mais sensíveis às ações da insulina, antes prejudicada pela obesidade.

Um fator surpreendente demonstrado no estudo foi o fato de a resposta mais interessante ter sido demonstrada nos grupos que receberam as menores concentrações na dieta, tanto de ômega 3 quanto de ômega 9, e ainda de serem correspondentes a quantidades passíveis de consumo no dia-a-dia por meio de um acréscimo natural desses alimentos em nossas refeições diárias, sem a necessidade de suplementos alimentares. Alimentos como semente de linhaça marrom, óleo de soja, sardinha e canola apresentam custos razoáveis e também são excelentes fontes de ômega-3. Da mesma forma, o azeite de oliva, óleo soja, abacate e amendoim são fontes saudáveis de ômega-9.