Após um período conturbado de contingenciamentos de repasses e alterações no Conselho de Reitores das Universidades Estaduais Paulistas (Cruesp), governo e reitores reuniram-se no início de fevereiro e entraram num acordo que pode restaurar o poder das universidades.
Desde janeiro, quando Serra assumiu o governo, as estaduais USP, Unicamp e Unesp viram sua autonomia, garantida pela Constituição Federal de 1988, esmorecer. Por meio de decretos, o governo alterou a composição do Cruesp, com a introdução do secretário de Ensino Superior na presidência do conselho – José Aristodemo Pinotti, e congelou provisoriamente parte dos repasses às instituições. Também exigiu das universidades a solicitação prévia à pasta do Planejamento para transferir verbas entre grupos de despesas. “As últimas reuniões com o governador restauraram quase todo o poder perdido com as medidas instituídas no novo mandato e o receio criado há um mês já não existe, mas abalou a comunidade acadêmica e ainda restam alguns ajustes a serem feitos”, diz o José Tadeu Jorge, reitor da Unicamp.
Há 18 anos, as universidades estaduais paulistas recebem um repasse fixo da arrecadação do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) recolhido pelo governo do estado e têm autonomia para decidir onde aplicar seus recursos. Inicialmente, o orçamento ficou estabelecido em 8,4% da arrecadação, mas o percentual foi elevado para 9,57% em 1996, sendo a divisão interna desse valor feita pelo Cruesp.
Segundo Tadeu Jorge, a possibilidade de gestão financeira e orçamentária possibilitou às universidades paulistas traçar seus planos para o futuro, organizar seu dia-a-dia, estabelecer políticas próprias de racionalização e de investimentos de acordo com o fluxo das demandas sociais e o comportamento da economia. Sem essa autonomia, haveria um retrocesso, concordam reitores e comunidade acadêmica nas diversas manifestações que fizeram junto à mídia.
Mas por que, pela primeira vez em quase duas décadas, tais medidas foram tomadas? O governo alega que não seria possível liberar os recursos porque a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2007 ainda não foi aprovada. Mas o atraso na aprovação da LDO também ocorreu em 2006, embora menor, e não houve contingenciamento. A suspensão dos repasses atingiu igualmente todos os órgãos do governo. Para Tadeu Jorge, “os membros da nova equipe do governo não tinham familiaridade com as formas de funcionamento dos órgãos governamentais e trataram as universidades como outros órgãos, a exemplo dos institutos de pesquisa, que não têm autonomia”.
O decreto que altera a composição do Cruesp foi rapidamente modificado ante as reações das autoridades acadêmicas e a presidência voltou à posse de Suely Vilela, reitora da USP. O secretário de Ensino Superior permanece no conselho. A importância da presença de um dos três reitores na presidência do Cruesp está no fato de ser o presidente quem define as pautas das questões de interesse das universidades. Com relação aos recursos, a liberação já foi negociada e se dará em duas fases. Em caráter emergencial, deverão ser liberados 45% dos recursos contingenciados na próxima semana. O restante será repassado em março.
Depois de tanto alarde o governo retrocedeu, mas ainda resta uma pendência: a proibição do remanejamento de recursos entre grupos de despesas. Isso significa que os gestores das universidades estaduais paulistas não têm liberdade para transferir recursos da pasta “pessoal” para a pasta “investimento”, por exemplo, embora seja possível modificar a composição do orçamento dentro de cada rubrica.
A transferência entre grupos de despesa, conforme decreto governamental, seria uma atribuição privativa do governo do estado. Por outro lado, a autonomia de gestão financeira das universidades está garantida pela Constituição. Na semana que vem, técnicos da Secretaria do Planejamento devem se reunir com os reitores para resolver essa questão. “Queremos encontrar uma maneira de preservar a autonomia das universidades dentro da legalidade”, diz o reitor da Unicamp. “Esperamos que as universidades estaduais não apenas voltem à situação anterior, mas que se aproximem do Estado para auxiliar na formulação de políticas públicas”, conclui.