Uma tecnologia em desenvolvimento pelo doutorando Eduardo Mobilon, da Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação (FEEC) da Unicamp, vai possibilitar que profissionais da área de telecomunicações fiquem literalmente “de olho” nas redes de comunicações ópticas, acompanhando seu desempenho em tempo real, e a um custo menor em relação aos analisadores convencionais (osciloscópios digitais de amostragem e medidores de taxa de erro).
Mestre em engenharia elétrica pela mesma universidade e pesquisador do Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Telecomunicações (CPqD), que integra o projeto Giga, Mobilon se inspirou num artigo no qual o pesquisador grego George Moustakides, atualmente professor do Departamento de Engenharia Elétrica e de Computação da Universidade de Patras, apresentou uma técnica para reconstrução de diagramas de olho por meio de processamento digital de sinais. Trata-se de um procedimento matemático que, aplicado a um conjunto de amostras obtidas do sinal óptico de comunicação, permite a construção de uma figura com formato semelhante ao de um olho humano. Esta figura, conhecida como “diagrama de olho”, permite aos pesquisadores avaliar a característica dos sinais transmitidos. “O próprio autor sugeria a aplicação da técnica na monitoração de redes ópticas de comunicação, mas o trabalho era apenas teórico e experimental, sem o desenvolvimento de nenhum equipamento”, relata Mobilon, que decidiu, então, colocá-lo em prática.
Após um minucioso estudo da teoria matemática apresentada no artigo e a realização de vários experimentos em laboratório para avaliação e validação da técnica, ele criou o Analisador de Diagrama de Olho (ADO). Seu trabalho de doutorado inclui o estudo das aplicações deste equipamento na monitoração de redes de comunicações ópticas.
“De acordo com nossa pesquisa bibliográfica, a implementação em hardware (a criação do ADO a partir dessa teoria) é a primeira no Brasil e no mundo”, ressalta o pesquisador. Tanto que embora ainda nem tenha defendido sua tese (o que deverá ocorrer no final do próximo semestre) seu trabalho já tem conquistado reconhecimento. Ele foi apresentado em congressos internacionais como o 49th IEEE Midwest Symposium on Circuits and Systems (MWSCAS-2006), em Porto Rico; o IEEE International Telecommunications Symposium (ITS- 2006), em Fortaleza; e o IEEE International Microwave & Optoelectronics Conference (IMOC-2005), em Brasília.
O ADO destina-se a monitorar a qualidade de transmissão dos sinais ópticos em redes de telecomunicações. Essa qualidade pode ser comprometida por fenômenos físicos de propagação, como a dispersão cromática ou o efeito Brillouin – um espalhamento da luz causado pela interferência de ondas acústicas, no núcleo da fibra, que limita a potência da transmissão óptica – ou ainda por degradações pelo envelhecimento dos componentes do sistema. A própria propagação por centenas de quilômetros de fibras ópticas, que requer o uso de amplificadores ópticos, faz com que os sinais se tornem mais ruidosos e sofram distorções, dificultando a recepção no destino.
O novo equipamento permite uma análise de baixo custo semelhante à oferecida pelo uso de dois instrumentos comerciais muito caros: o osciloscópio digital de amostragem e o medidor de taxas de erros. Obviamente, explica Mobilon, tais equipamentos desempenham funções muito mais complexas e análises de precisão muito maior. Porém, seu alto custo normalmente inviabiliza sua instalação fixa em campo para monitoração das redes. São levados para campo apenas quando necessário para investigar algum problema já ocorrido. Já o ADO, devido ao seu baixo custo – estima-se em cerca de apenas 10% do custo de um osciloscópio de amostragem convencional – pode ficar permanentemente instalado em pontos estratégicos de qualquer rede óptica, por adaptar-se aos equipamentos de qualquer fabricante, e pode fornecer dados para verificação contínua da qualidade do sistema de comunicação, permitindo ações preventivas e corretivas, como um novo roteamento da transmissão por outra fibra antes que uma interrupção total aconteça.
Como se forma um diagrama de olho?
Os osciloscópios de amostragem convencionais exibem formas de onda em sua tela que representam o comportamento de um sinal elétrico em função do tempo. A coleta de amostras dos sinais ocorre de forma sincronizada com um sinal de referência denominado “sinal de relógio”, normalmente obtido por circuitos eletrônicos de alto custo destinados à “recuperação de relógio” do sinal analisado. O ADO trabalha sem necessidade desse sincronismo. “Este é um dos fatores que contribuem para o seu baixo custo”, afirma Mobilon.
Dotado de uma interface de conversão opto-elétrica, o ADO captura amostras dos pulsos de luz que correspondem aos bits transmitidos. Se os pulsos fossem transmitidos de forma seqüencial e repetitiva (1 0 1 0 1 0, por exemplo) a imagem a ser verificada na tela do computador seria a de uma onda “quadrada”. Mas ao se converter um sinal de voz ou imagem para o formato digital, os bits ocorrem de maneira aleatória (sem uma seqüência previsível e repetitiva). Assim, o equipamento constrói curvas sobrepondo pulsos em uma mesma janela de tempo. Alguns pulsos mostram uma transição de subida no nível de tensão (representando normalmente os bits 1) e outros uma transição de descida (representando os bits 0). A visualização simultânea desses pulsos é que forma uma figura semelhante a um olho.
As figuras acima representam três diagramas de olho, indicando diferentes condições do sinal analisado. No primeiro (à esquerda), há muito ruído óptico, causado por amplificações sucessivas, por exemplo. No segundo (o do meio), há distorções causadas por dispersão cromática, um fenômeno de propagação na fibra óptica. No terceiro (à direita), o sinal é considerado muito bom.
A análise dessa imagem, segundo o pesquisador, permite a verificação do desempenho do sistema de comunicação. Quando há ruído no sinal, o diagrama de olho revela traços mais espessos (nos bits 1, 0 ou em ambos). A partir de cálculos estatísticos realizados com amostras do diagrama de olho obtido por um osciloscópio ou pelo ADO é possível a estimação de um parâmetro conhecido como taxa de erro de bit, que é utilizado para avaliação do desempenho de sistemas de transmissão. Além da espessura dos traços, outras distorções nos pulsos, capazes de penalizar o sistema de comunicação, podem ser observadas por meio do diagrama de olho.