Organismos sintéticos: apostas da biotecnologia preocupam

Na Science de 24 de janeiro foi oficialmente noticiada a construção do genoma completo da bactéria Mycoplasma genitalium. Em nota emitida na mesma data, o ETC Group manifesta sua preocupação: “a notícia abre as portas à construção de perigosos agentes bacterianos”. Apontam ainda que “até agora, os organismos sintetizados são vetores de doenças letais aos humanos”.

A biotecnologia abre outra frente além dos transgênicos: a biologia sintética. Na edição on-line da Science de 24 de janeiro, com o título Complete Chemical Synthesis, Assembly, and Cloning of a Mycoplasma genitalium Genome, foi oficialmente noticiada a construção do genoma completo da bactéria Mycoplasma genitalium. Mesmo sendo a menor bactéria de vida livre, comumente encontrada no trato urinário, abre possibilidades preocupantes nos possíveis rumos que as ciências biológicas poderão tomar. Em nota emitida na mesma data da publicação do artigo na Science, a organização ETC Group, com sede no Canadá, manifesta sua preocupação com a falta de controle das autoridades frente a estes novos avanços tecnológicos: “a notícia abre as portas à construção de perigosos agentes bacterianos”. Ainda nesta nota apontam que “até agora, os organismos sintetizados são vetores de doenças letais aos humanos”.

O que era apenas possibilidade – a transformação de organismos em banco de dados para a reprodução da vida e sua transformação em mercadoria – já está mais próximo de se concretizar. A equipe de pesquisadores, liderada pelo prêmio Nobel Hamilton O. Smith, da empresa de biotecnologia J. Craig Venter Institute, situada na cidade americana de Rockville, descreve como as 582.970 pares de bases do “cromossomo sintético” foram construídas. Vários fragmentos de DNA, previamente encomendados em empresas de biologia molecular dos Estados Unidos e Alemanha, foram “colados” e intercalados com marcadores, uma espécie de made by man, para diferenciar as seqüências sintéticas das seqüências naturais similares. O cromossomo sintético final foi inserido em uma levedura, o conhecido Saccharomyces cerevisia, para completar a sua síntese.

Dentre os pesquisadores da equipe, está John Craig Venter, o fundador do instituto que leva o seu nome e do The Institute for Genomic Research (TIGR). Venter aparece no Time Magazine como uma das 100 mais influentes personalidades do mundo em 2007 e ficou mais conhecido na época que presidiu a empresa Celera Genomics, responsável pelo seqüenciamento do genoma humano. No ano passado, segundo denuncias do ETC Group, o Instituto Craig Venter entrou com um pedido de patenteamento de um “genoma bacteriano mínimo”, que concederia direitos monopólicos exclusivos em mais de 100 países, incluindo o Brasil, sobre um organismo que pode crescer e reproduzir-se, composto por um conjunto de genes “essenciais”.

Daniel G. Gibson, outro membro da equipe, em uma entrevista à revista Scientific American, comentou que este experimento finaliza a 2ª etapa de um plano maior que é a construção de um organismo vivo. Experimentos para a 3ª e última etapa do projeto já se encontram em andamento.

“O último passo é demonstrar que o que eles sintetizaram é biologicamente ativo”, relata à Scientific Americam Eckard Wimmer, um biologista molecular da Stony Brook University, em Long Island, NY, que possui experiência na construção do vírus sintético da poliomielite, o primeiro vírus sintético construído. “Infelizmente, esse passo, que ainda falta ao grupo, é muito crítico”, adverte Wimmer, referindo-se à dificuldade do novo DNA funcionar.

Em 2002, a equipe de Eckard Wimmer construiu um vírus sintético da poliomielite que, quando inoculado em camundongos, provocou a paralisia e morte dos mesmos. Entretanto, estes experimentos não foram considerados o nascimento da “biologia sintética”, pois muitos pesquisadores não consideram os vírus como organismos vivos.

DNA delivery

Chrisopher A. Voigt, da University of Califórnia em São Francisco, em um artigo publicado na Nature Methods de janeiro de 2008, avalia que “a engenharia genética está se tornando uma ‘tecnologia de informação’” e “encomendar uma seqüência de DNA definida está tão fácil quanto encomendar uma pizza”. Ainda para Voigt “a capacidade de se construir um DNA, em vez de copiá-lo, irá permitir a concepção de novos organismos para resolver problemas da indústria, agricultura e medicina”.