Movimento sindical indica origem de recursos para aumento permanente do salário mínimo

No fim deste mês deve acontecer, em Brasília, a “II Marcha Nacional pelo aumento do salário mínimo e pela redução da jornada”, convocada pelas principais centrais sindicais brasileiras. Uma das principais bandeiras das entidades será o aumento do salário mínimo para R$ 400. Entre os entraves frequentemente alegados para os pequenos aumentos dos últimos anos está o efeito na previdência social. Central Única do Trabalhadores propõe imposto sobre grandes fortunas como fonte para os recursos

No fim deste mês deve acontecer, em Brasília, a “II Marcha Nacional pelo aumento do salário mínimo e pela redução da jornada”, convocada pelas principais centrais sindicais brasileiras. Uma das principais bandeiras das entidades será o aumento do salário mínimo para R$ 400. Pela LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias), que deve ser votada até dezembro pelos deputados, o mínimo pode chegar a R$ 321 no ano que vem, isto é, ter uma variação de 6,97%, porcentagem que embute a alta do INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor, medido pelo IBGE) previsto em 5,03% e a variação real do PIB per capita estimada em 1,94%. Para a CUT, que apresentou uma agenda de reivindicações em que a valorização permanente do mínimo tem grande destaque, os recursos para um aumento contínuo real até 2012, poderiam vir da aplicação, de uma só vez, de um imposto de 1,5% sobre grandes fortunas.

Não há consenso sobre o impacto de um aumento do salário mínimo na economia. Efeitos indesejáveis como o aumento de preços, a quebra de pequenas empresas e de municípios são comumente lembrados. Além desses problemas, a conseqüência para os gastos com a previdência é um foco significativo da discussão. Estudos divergem com relação à viabilidade de aumentar o mínimo e, ao mesmo tempo, mantê-lo atrelado aos benefícios previdenciários.

Impactos da elevação do mínimo na previdência

Artigo publicado em outubro de 2004 pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, vinculado ao Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão), intitulado “Diagnóstico da Previdência no Brasil: o que foi feito e o que falta reformar?” (texto para discussão nº 1050) mostra que, a partir de meados da década de 1990, começaram a ocorrer sucessivos déficits entre arrecadações e despesas do INSS. Uma das causas do crescimento de gastos com inativos seria o “efeito SM”. Como 30% das aposentadorias são exatamente de um salário mínimo e como o este teve aumento médio de 4,7% ao ano (entre 1994 e 2004, usando o IPCA), seu crescimento teria pressionado as contas da previdência. Para não onerar as contas públicas, seria necessária uma reforma que desvinculasse o mínimo dos benefícios previdenciários.

Por outro lado, pesquisas publicadas em Salário Mínimo e Desenvolvimento, livro recentemente lançado pelo Instituto de Economia da Unicamp, explicitam indicadores diferentes. Para Sulamis Dain, professora da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, e Milko Matijascic, docente e pesquisador do Centro Salesiano de São Paulo, não se pode excluir a desvinculação das receitas da União – a DRU, que permite destinar até 20% do Orçamento da Seguridade Social (OSS) para outros fins – o cálculo dos gastos do INSS, como fez o IPEA. Em 1995, o salário mínimo se apropriava de 24,1% das despesas do OSS (que inclui saúde, assistência e previdência – algo também omitido pelo IPEA) ao passo que, em 2004, representou uma parcela menor (20,8%). A vinculação não seria um fator de descontrole do déficit orçamentário porque seus gastos são previstos – contrariamente ao que acontece com o serviço da dívida pública, que pode quase dobrar em dois anos, como de 1998 para 1999 e 2001 para 2002. Nesse sentido, segundo Anselmo Luís dos Santos e Denis Maracci Gimenez, professores do Instituto de Economia da Unicamp, para dobrar o salário mínimo em quatro anos haveria um gasto anual com a previdência de 0,5% do PIB, apenas 10% dos superávits primários dos últimos anos.

Impactos sociais da desvinculação

A questão não se limita aos termos contábeis, pois implica posicionamentos diversos quanto às prioridades da gestão pública. Para o estudo do Ipea, o aumento do piso previdenciário não diminui a desigualdade, não reduz a pobreza, não aumenta a capacidade de crescimento futuro da economia e nem contribui para atenuar o problema da violência. Isso porque não é a parcela de aposentados que concentra a pobreza extrema, não são eles que contribuirão para o crescimento futuro da economia e não são eles que engrossam as estatísticas criminais. Dessa forma, para aumentar o valor real do salário mínimo seria necessária uma emenda constitucional que o desvinculasse do piso da previdência.

Por autro lado, Para Dain e Matijascic a vinculação é defensável por razões contrárias. Entre 1981 e 2003, embora a participação de idosos na população brasileira tenha crescido 10%, o número de pessoas com mais de 60 anos em pobreza extrema caiu de 914 mil para 430 mil. A causa seria justamente a fixação o piso previdenciário ao salário mínimo e a ampliação da cobertura dos benefícios pela Constituição de 1988. O aumento do piso e do salário mínimo seriam fatores importantes na redução da pobreza. Os autores ainda apontam a seguridade como decisiva para o desenvolvimento, na medida em que ela foi fundamental para distribuir a renda e dinamizar economias nas regiões mais pobres do Brasil. Para eles, só depois que os valores do piso e do salário mínimo garantirem condições dignas à população, será possível retomar o debate sobre a desvinculação.