Mercado contribui para má compreensão da nanotecnologia

A nanotecnologia já está sendo comercializa, mas são poucos os que compreendem o que ela quer dizer. Henrique Toma, do Instituto de Química da USP, afirma que parte do mau uso do termo é gerado por empresas que incorporam a tecnologia no rótulo como estratégia de marketing, mesmo sem conter nano substâncias.

Os produtos da nanotecnologia já estão sendo comercializados, mas ainda são poucos os que entendem o que é essa tecnologia. Para Henrique Eisi Toma, professor do Instituto de Química da Universidade de são Paulo (USP) e palestrante da Nanotec Expo 2006, realizada no mês passado, as discussões devem dar maior atenção ao mau uso do termo “nano” e à incompreensão do que seja esse tipo de tecnologia pela maioria da população. O professor afirma que parte da confusão é gerada pelas empresas. “Hoje é possível encontrar no mercado produtos com rótulos ‘nano’ que não tenham nanotecnologia incorporada e vice-versa”, diz.

Segundo Toma, a maioria da população não tem idéia do que seja a nanotecnologia. “É o universo do muito pequeno, do invisível”, diz, “e, por isso, as pessoas têm fascínio, por um lado, e um grande receio, por outro”. A escala nanométrica equivale a um bilionésimo de metro (nanômetro), ou seja, é cerca de 70 mil vezes menor do que a espessura de um fio de cabelo, o que permite a criação de novos materiais, produtos e processos baseados na capacidade de manipulação direta de átomos e moléculas.

A compreensão sobre o tema alimenta comportamentos oportunistas por parte de algumas empresas que lutam para ter a indicação de nanotecnologia nos rótulos de seus produtos como um trunfo de marketing. “Mesmo que seus produtos não incorporem nanotecnologia, há empresas que colocam essa indicação com o intuito de criar uma imagem de modernidade e progresso tecnológico”, afirma o pesquisador.

Por outro lado, há empresas que preferem esconder de seus rótulos a presença de componentes nano, justamente para evitar o preconceito da população que tem pouca intimidade com o tema. “O comportamento das empresas não segue um padrão, pois vemos O Boticário colocar a indicação de nano em seus produtos ao mesmo tempo em que a L’Oreal e a Lancôme, que também utilizam compostos nanotecnológicos em suas formulações, preferem não apresentar essa informação nos seus rótulos”, exemplifica o pesquisador referindo-se a empresas de cosméticos. Outros exemplos de empresas nacionais que oferecem produtos com nanotecnologia são a Natura, a Suzano Petroquímica e a Embrapa.

No mercado mundial, já existem vários produtos com nanotecnologia incorporada e que prometem bons resultados, como tecidos resistentes a manchas e que não amassam, capeamento de vidros e aplicações anti-erosão a metais, filtros solares de rápida penetração, material para proteção contra raios ultravioleta, pó anti-bactérias, equipamentos médicos, produtos para limpar materiais tóxicos, cosméticos, sistemas de filtragem do ar e da água, microprocessadores e equipamentos eletrônicos em geral, com melhor desempenho.

Essa grande diversidade de aplicações esconde, no entanto, eventuais riscos que a tecnologia possa oferecer. As discussões éticas acerca dessa manipulação atômica e molecular ainda são incipientes, mas fundamentais para a melhor compreensão sobre a tecnologia. O receio com relação aos efeitos descontrolados da nanotecnologia não é totalmente infundado, uma vez que inúmeras substâncias em nano escala mudam suas propriedades originais, potencializando sua ação, por exemplo, tornando-se mais tóxicas, flexíveis, resistentes ou melhores condutoras de energia. No caso de um filtro solar com partículas nanométricas, o produto passa a ser absorvido com mais intensidade e atinge camadas de pele mais profundas. As conseqüências dessa absorção pelo corpo ainda são pouco compreendidas. “Tal como o alumínio, que pode ser usado tanto para a fabricação de produtos úteis para a sociedade como para construir uma bomba, os elementos nanotecnológicos podem ter efeitos benéficos ou nefastos, de acordo com as intenções que orientam sua formulação”, enfatiza Toma.

A desinformação sobre o tema não está restrita ao Brasil. Federico Neresini, especialista em sociologia da ciência e professor da Universidade de Pádua, na Itália, realizou uma pesquisa sobre a percepção pública da nanotecnologia entre os italianos e verificou que apenas 28% deles já ouviram falar sobre ela. De modo geral, a nanotecnologia é vista de forma positiva, como algo que será capaz de melhorar a vida das pessoas. “Todavia, esse universo muito pequeno também provoca certo receio na população, pois são percebidos maiores riscos de descontrole dos processos envolvendo a nanotecnologia”, afirma o pesquisador. Nos Estados Unidos, um estudo realizado por Jane Macoubrie, da Universidade da Carolina do Norte, e publicada na edição abril-julho do periódico Public Understanding of Science, demonstrou que a população tem pouca confiança na capacidade do governo em gerenciar riscos nas questões relativas à nanotecnologia.